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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS

António Filipe Garcez José

Punitur quia peccatum est !!!!

DIREITO PENAL I
Universidade Autónoma de Lisboa
Ano lectivo 2005/2006 2ºsemestre
Aulas teóricas: ....................................Dr. Fernando Silva
Aulas práticas: ........................Dra. Sónia Reis
Bibliografia : Manual de Direito Penal Doutor Figueiredo Dias
Textos dos Drs. Rui Pereira, J. A. Veloso, Claus Roxin, Sónia Reis
Dicionário de DP e DPP dos Drs. Henrique Eiras e G. Fortes

Apontamentos e resumos do curso, passíveis de eventuais erros ("errare humanum est"), "destilados" por
António Filipe Garcez José, aluno n° 20021078,

FORMAS DO CRIME
Iter criminis Nuda cogitatio > actos preparatórios > tentativa > consumação

- actos preparatórios
Quanto às suas
fases -tentativa

- crime consumado

Quanto aos modos - Autoria simples Autoria material


Formas Autoria mediata
ou
do crime graus de
Co-autoria
(s. amplo) - Comparticipação
participação
Instigação
- cumplicidade Material
moral

- crime unitário - concurso aparente


(ou legal)
Quanto ao n° de
Crimes cometidos - concurso de crimes
- concurso Real
- crime continuado efectivo
(ou verdadeiro) ideal
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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
Actos preparatórios
São actos externos que conduzem a facilitar ou preparar a execução do crime,
desde que não constituam ainda começo de execução.

 São actos que preparam o crime mas ainda não são crimes. Comentário [filipe1]: Artigo 274º
Actos preparatórios
Quem, para preparar a execução de
 A noção de actos preparatórios interessa para se determinar se um acto é um dos crimes previstos nos artigos
272º e 273º, fabricar, dissimular,
ou não criminalmente punível. adquirir para si ou para outra pessoa,
entregar, detiver ou importar substância
explosiva ou capaz de produzir
 No caso de apenas terem sido praticados actos preparatórios não há explosão nuclear, radioactiva ou
própria para fabricação de gases
tentativa. tóxicos ou asfixiantes, ou aparelhagem
necessária para a execução de tais
crimes, é punido com pena de prisão
até 3 anos ou com pena de multa.
 Os actos preparatórios não são geralmente puníveis. (mas há situações em
que, por se revestirem de especial perigosidade, o legislador determinou a punibilidade) Comentário [Filipe2]: Artigo 22º
(Tentativa)
1 - Há tentativa quando o agente
 Os actos preparatórios são puníveis se constituírem crimes autónomos. praticar actos de execução de um
crime que decidiu cometer, sem que
(Ex: promoção ou fundação de organizações criminosas) este chegue a consumar-se.
2 - São actos de execução:
a) Os que preencherem um elemento
 Os actos preparatórios são puníveis quando a lei, em casos especiais, constitutivo de um tipo de crime;
determina a punibilidade. (ex: crimes de empreendimento, em que o legislador faz b) Os que forem idóneos a produzir o
resultado típico; ou
recuar a tutela penal, equiparando a tentativa à consumação crimes de mera actividade, c) Os que, segundo a experiência
crimes de perigo). comum e salvo circunstâncias
imprevisíveis, forem de natureza a
fazer esperar que se lhes sigam actos
das espécies indicadas nas alíneas
 Nos crimes de perigo comum previstos nos arts. 272° e 273° é punido anteriores.
quem praticar alguns dos actos preparatórios plasmados no artigo 274°.
Comentário [filipe3]: Artigo 22º
(Tentativa)
Tentativa (art. 22º) 1 - Há tentativa quando o agente
praticar actos de execução de um
É a realização incompleta do comportamento típico de um determinado tipo de crime que decidiu cometer, sem que
este chegue a consumar-se.
crime previsto na lei (Germano M. Silva) 2 - São actos de execução:
a) Os que preencherem um elemento
constitutivo de um tipo de crime;
 Há tentativa quando não foram praticados todos os actos de execução b) Os que forem idóneos a produzir o
resultado típico; ou
(tentativa inacabada) ou quando o agente pratica todos os actos de c) Os que, segundo a experiência
comum e salvo circunstâncias
execução de um crime que decidiu cometer, sem que o resultado típico se imprevisíveis, forem de natureza a
fazer esperar que se lhes sigam actos
produza (tentativa acabada). das espécies indicadas nas alíneas
anteriores.

 A tentativa é um tipo ideal porque resulta da articulação entre normas da Comentário [filipe4]: Artigo 23º
Parte Geral do CP (arts. 22° e 23°) com as de um dos tipos previstos na (Punibilidade da tentativa)
1 - Salvo disposição em contrário, a
Parte Especial. tentativa só é punível se ao crime
consumado respectivo corresponder
pena superior a 3 anos de prisão.
2 - A tentativa é punível com a pena
aplicável ao crime consumado,
especialmente atenuada.
3 - A tentativa não é punível quando for
Crime consumado manifesta a inaptidão do meio
empregado pelo agente ou a
Crime em que o agente realizou todos os elementos essenciais do tipo. inexistência do objecto essencial à
consumação do crime.

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 O iter criminis termina com a consumação. A consumação pode ser
formal ( jurídica) e material (exaurimento) do crime.

 Há consumação formal quando foi realizado o tipo legal de crime.

 Há consumação material (exaurimento) quando tiveram lugar através do Comentário [filipe5]: Consiste na
produção dos efeitos do crime, que, não
crime as consequências prejudiciais que o agente se propôs. sendo exigidos como elementos essenciais,
constituem a plena realização do objectivo
pretendido pelo agente

 Os crimes consumados podem ser crimes de consumação imediata ou Comentário [filipe6]: São aqueles em
que a consumação se dá imediatamente,
crimes de consumação permanente face à acção produzida. A acção posterior
não interfere na produção do resultado. É o
caso do crime de homicídio (art. 131°)
Autoria simples Comentário [filipe7]: São aqueles em
Há autoria singular quando o autor pratica o crime por si só. que a acção do agente é contínua. A
consumação perdura enquanto durar a
acção . É o que acontece no caso de
sequestro (art. 159°)
 Ao crime de autoria simples aplica-se a norma do tipo, tal como descrito na
parte especial do CP.

Comparticipação
Consiste no envolvimento de vários agentes na prática do facto jurídico ilícito-
criminal.

 a expressão comparticipantes abrange instigadores e cúmplices.

Instigação
O instigador cria dolosamente no autor uma vontade ex novo , convence outra
pessoa a praticar o crime.

Cumplicidade
É uma forma de participação criminosa que consiste em prestar auxílio ao autor
do crime; a participação do cúmplice não é determinante para gerar a resolução
criminosa.

Cumplicidade material
É a prestação de uma ajuda material para a execução do crime; o cúmplice
material ajuda materialmente na prática do facto típico e ilícito, fornecendo os
meios para a execução do crime.
Cumplicidade moral
É o auxílio moral à prática por outrém de um facto doloso (art. 27°/1). Trata-se de Comentário [Filipe8]: Artigo 27º
(Cumplicidade)
um conselho, um acto não determinante da prática do facto criminoso (se for 1 - É punível como cúmplice quem,
dolosamente e por qualquer forma,
determinante é autoria). prestar auxílio material ou moral à
prática por outrem de um facto doloso.
2 - É aplicável ao cúmplice a pena
fixada para o autor, especialmente
atenuada.

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Concurso de crimes
Acumulação de infracções que implica a punição do agente por uma pluralidade
de crimes. O concurso efectivo pode ser real ou ideal e homogéneo ou
heterogéneo.

Vários sistemas são possíveis para a determinação da pena em caso de


concurso :

- de absorção de todas as penas pela pena mais grave, embora


agravada;

- de cúmulo jurídico de penas formando uma única pena;

- de cúmulo material das penas efectivamente aplicadas

 O regime de determinação da pena única, em caso de concurso de crimes


encontra-se regulado no artigo 77° Comentário [filipe9]: Artigo 77º
(Regras da punição do concurso)
1 - Quando alguém tiver praticado
vários crimes antes de transitar em
Concurso efectivo julgado a condenação por qualquer
deles é condenado numa única pena.
Consiste na violação de várias normas jurídico-penais, devido à prática pelo Na medida da pena são considerados,
agente de diferentes acções (podendo um só facto constituir mais de uma acção em sentido em conjunto, os factos e a
personalidade do agente.
jurídico). São aplicadas diferentes normas para valorar o comportamento do agente 2 - A pena aplicável tem como limite
máximo a soma das penas
e todas concorrem para a determinação da sua responsabilidade. O agente pratica concretamente aplicadas aos vários
crimes, não podendo ultrapassar 25
dois ou mais crimes. A um conjunto plural de acções (em sentido jurídico), anos tratando-se de pena de prisão e
corresponde uma pluralidade de crimes. 900 dias tratando-se de pena de multa;
e como limite mínimo a mais elevada
das penas concretamente aplicadas
aos vários crimes.
O concurso efectivo pode ser real ou ideal 3 - Se as penas aplicadas aos crimes
em concurso forem umas de prisão e
outras de multa, a diferente natureza
Concurso real destas mantém-se na pena única
resultante da aplicação dos critérios
Se se verificar uma pluralidade de factos qualificáveis como crimes. estabelecidos nos números anteriores.
4 - As penas acessórias e as medidas
de segurança são sempre aplicadas ao
agente, ainda que previstas por uma só
Concurso ideal das leis aplicáveis.
Se o mesmo facto é qualificável como crime por diferentes normas incriminadoras
que concorrem numa classificação plúrima; no plano naturalístico há uma só acção
que viola várias vezes a mesma ou várias normas.
Concurso homogéneo
Quando a mesma acção preenche um conjunto de tipos de crimes iguais.

Concurso heterogéneo
No caso de os tipos de crime cometidos serem diferentes

Concurso aparente ou de normas

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Se as normas violadas só na aparência são aplicáveis cumulativamente, mas
na verdade ou se aplica uma ou se aplica outra.

 O concurso legal, aparente ou impuro, verifica-se quando o comportamento


do agente pode subsumir-se a várias previsões legais mas apenas uma
delas é aplicável ao facto por esgotar inteiramente o conteúdo da sua
ilcitude.

Entre as normas concorrentes podem verificar-se 3 tipos de relações :

de especialidade
Quando a norma especial contém todos os elementos de outra e lhe acrescenta
(sem a contrariar) um ou vários elementos especializadores. A norma especial
prevalece sobre a norma geral.

de consumpção
Nos casos em que, sendo potencialmente aplicáveis duas ou mais normas
criminais, uma delas consome a protecção que a outra visava. Só em concreto se
pode decidir qual das normas vai ser aplicada e essa será aquela que conceder maior protecção ao bem
jurídico.

- consumpção pura
Quando a norma que prevê e pune o crime mais grave consome a que
prevê e pune o menos grave.

- consumpção impura
quando um crime é meio para praticar outro mas em que se aplica a
norma do crime meio, porque o crime principal crime resultado é
consumido pelo crime meio.

de subsidiariedade
Quando a norma só se aplica se a outra não se aplicar.

CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE CRIME

Quanto ao Por acção


tipo de
Pura
conduta
Por omissão
Impura

Crimes gerais ou comuns ( 131º, 143º, 203º, 212º, 217º)


Quanto ao
agente

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Crimes específicos
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Próprios ou puros (136º, 284º, 370º)

Impróprios ou impuros (378º, 383º, 195º)

De mão própria

Praeter intencional
Quanto à
Crimes materiais De resultado cortado ou parcial
relação ou de resultado Agravado pelo resultado
entre a De omissão impura ou imprópria
conduta e o
resultado Crimes formais De mera actividade
ou de mera actividade
De omissão pura ou própria
Quanto à
Lesão efectiva ou dano
intensidade
de lesão do
bem jurídico Abstracto (292º/1)

Perigo Abstracto/concreto (292º/2)

Concreto (291º)

Quanto ao
Forma livre (131º)
Modo de
execução Forma vinculada (217º)

Quanto ao
Tipos básicos (131º)
Modo de
Qualificados (132º)
formação Tipos especiais
Crimes por acção Privilegiados (133º)
Têm a ver com a estrutura do comportamento do autor, sendo aqueles que são
praticados através de uma acção positiva.

Crimes por omissão


Têm também a ver com a estrutura do comportamento do autor, sendo aqueles
que consistem em não ter um certo comportamento que a ordem jurídica impõe
que se tenha num certo caso concreto.

Crimes de omissão pura


São aqueles crimes de omissão que consistem na violação directa de um
Comentário [filipe10]: O condutor que
comando legal Ex : art. 60° C. da Estrada causar um acidente é obrigado a socorrer a
vítima, sob pena de ,...

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Comentário [filipe11]: Artigo 375º


Crimes de omissão impura Peculato
São aqueles crimes de omissão em que já não se trata de uma violação directa de 1 - O funcionário que ilegitimamente se
apropriar, em proveito próprio ou de
um comando legal, mas sim o levar a cabo, por omissão, um resultado previsto outra pessoa, de dinheiro ou qualquer
coisa móvel, pública ou particular, que
num tipo legal desenhado em termos de acção. Ex : o pai que deixa que o filho se afogue lhe tenha sido entregue, esteja na sua
na praia sem o ajudar (art.131°) posse ou lhe seja acessível em razão
das suas funções, é punido com pena
de prisão de 1 a 8 anos, se pena mais
grave lhe não couber por força de outra
Crimes gerais ou comuns disposição legal.
Aqueles que podem ser cometidos por qualquer pessoa. Ex: art. 131° 2 - Se os valores ou objectos referidos
no número anterior forem de diminuto
valor, nos termos da alínea c) do artigo
202º, o agente é punido com pena de
Crimes específicos prisão até 3 anos ou com pena de
multa.
São aqueles que só podem ser cometidos por certas pessoas. O agente é 3 - Se o funcionário der de empréstimo,
definido fundamentalmente através da titularidade de uma certa situação empenhar ou, de qualquer forma,
onerar valores ou objectos referidos no
juridicamente definida, seja uma qualidade ou um dever especial que sobre ele nº 1, é punido com pena de prisão até 3
anos ou com pena de multa, se pena ... [1]
impende. Ex: crime de peculato (art. 375°), que só pode ser cometido por funcionário. Comentário [filipe12]: Do abuso de
autoridade
Artigo 378º
Crimes específicos próprios ou puros Violação de domícilio por
funcionário
As qualidades especiais do agente, ou o dever que sobre ele impende O funcionário que, abusando dos
fundamentam a sua responsabilidade. Ex: crime de prevaricação (art. 370°) que só pode poderes inerentes às suas funções,
praticar o crime previsto no nº 1 do
ser praticado por advogado ou solicitador. artigo 190º, ou violar o domicílio
profissional de quem, pela natureza da
sua actividade, estiver vinculado ao
Crimes específicos impróprios ou impuros dever de sigilo, é punido com pena de
prisão até 3 anos ou com pena de
A qualidade do agente, ou o dever que sobre ele impende não servem para multa. ... [2]
fundamentar a responsabilidade, mas únicamente para a agravar . Ex: O artigo 378° Comentário [filipe13]: Artigo 26º
prevê uma pena mais grave para o crime de violação de domicílio previsto no art. 190° quando cometido (Autoria)
É punível como autor quem executar o
por funcionário. facto, por si mesmo ou por intermédio
de outrem, ou tomar parte directa na
sua execução, por acordo ou
A distinção entre crimes próprios e crimes impróprios tem importância no que se refere à juntamente com outro ou outros, e
matéria da comparticipação (arts. 26° e 27°) eventualmente em matéria de erro, bem como ainda quem, dolosamente, determinar
outra pessoa à prática do facto, desde
de comunicabilidade entre participantes de certas qualidades ou relações especiais do que haja execução ou começo de
agente (art. 28°) execução.

Crimes específicos de mão própria Comentário [filipe14]: Artigo 27º


Aqueles em que o tipo legal abrange como autores apenas aquelas pessoas que (Cumplicidade)
1 - É punível como cúmplice quem,
levam a cabo a acção através da sua própria pessoa, e não através de outrém, dolosamente e por qualquer forma,
prestar auxílio material ou moral à
aqueles que são autores imediatos. prática por outrem de um facto doloso.
2 - É aplicável ao cúmplice a pena
fixada para o autor, especialmente
 Está excluída a possibilidade de co-autoria quanto aos comparticipantes atenuada.

que não tenham executado o crime pelas suas próprias mãos, não podendo Comentário [filipe15]: Artigo 28º
(Ilicitude na comparticipação)
verificar-se a comunicabilidade do art. 28°. Ex: nos artigos 165° e 166° diz-se 1 - Se a ilicitude ou o grau de ilicitude
do facto dependerem de certas
que só quem pratica por si mesmo o acto sexual incriminado pode ser considerado como autor. qualidades ou relações especiais do
agente, basta, para tornar aplicável a
todos os comparticipantes a pena
Crimes materiais ou de resultado respectiva, que essas qualidades ou
relações se verifiquem em qualquer
São aqueles que, segundo o tipo desenhado na lei, pressupõem a verificação de deles, excepto se outra for a intenção
certo resultado, ou seja, só se dá a consumação quando é produzido um da norma incriminadora.
2 - Sempre que, por efeito da regra
prevista no número anterior, resultar
para algum dos comparticipantes a... [3]

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resultado que seja espácio-temporalmente distinto da conduta. Ex: o art. 131°
pressupõe a verificação da morte de pessoa, como resultado. Comentário [Filipe16]: Artigo 145º
Agravação pelo resultado
1 - Quem ofender o corpo ou a saúde
de outra pessoa e vier a produzir-lhe a
 Crimes praeter intencionais (arts.145/2º) morte é punido:
Aqueles em que se produz um resultado para além da intenção do agente. a) Com pena de prisão de 1 a 5 anos
no caso do artigo 143º;
Exemplo: A dá um estalo a B ; este cai, bate com a cabeça e morre. b) Com pena de prisão de 3 a 12 anos
no caso do artigo 144º.
2 - Quem praticar as ofensas previstas
- Há uma conjugação entre um crime fundamental doloso com um no artigo 143º e vier a produzir as
ofensas previstas no artigo 144º é
resultado mais grave, por negligência. punido com pena de prisão de 6 meses
a 5 anos.

Neste crime há dois resultados da conduta do agente: Comentário [Filipe17]: Artigo 148º
Ofensa à integridade física por
negligência
- o 1° resultado é a ofensa corporal que a vítima sofre com a estalada. 1 - Quem, por negligência, ofender o
corpo ou a saúde de outra pessoa, é
punido com pena de prisão até 1 ano
- o 2° resultado é a própria morte. ou com pena de multa até 120 dias.
2 - No caso previsto no número
anterior, o tribunal pode dispensar de
pena quando:
Nos crimes praeter-intencionais há um misto de dolo + negligência a) O agente for médico no exercício da
sua profissão e do acto médico não ... [4]
Comentário [u18]: Artigo 18º
 Crimes agravados (ou qualificados) pelo resultado (art.148º°/3) (Agravação da pena pelo resultado)
Quando a pena aplicável a um facto for
Trata-se de um crime em que também há dois resultados da conduta do agente, agravada em função da produção de
um resultado, a agravação é sempre
mas em que o 2° resultado ( o mais grave) pode ser imputado ao agente, desde condicionada pela possibilidade de
que entre o 2° e o 1° resultado haja um nexo de causalidade; desde que em imputação desse resultado ao agente
pelo menos a título de negligência.
relação à morte da vítima, haja pelo menos negligência do agente, nos termos do
art. 18° CP. Comentário [Filipe19]: Pressupost
os da punição
Artigo 10º
Neste crimes há um misto de negligência + negligência. (Comissão por acção e por omissão)
 Crimes de resultado cortado ou parcial 2 - A comissão de um resultado por
São aqueles crimes em que os elementos subjectivos do tipo vão para além omissão só é punível quando sobre o
omitente recair um dever jurídico que
dos elementos objectivos. (Ex: o furto art. 296°- para, objectivamente, haver furto basta pessoalmente o obrigue a evitar esse
resultado.
que haja subtracção da coisa, mas, subjectivamente, exige-se algo mais, ou seja, que haja
intenção de apropriação)
Comentário [Filipe20]: Artigo 146º
Ofensa à integridade física
qualificada
 Crimes materiais de omissão impura ou imprópria 1 - Se as ofensas previstas nos artigos
é uma inacção que não evita a produção do evento típico. (Ex: crime de 143º, 144º ou 145º forem produzidas
em circunstâncias que revelem
homicídio por omissão art. 131° conjugado com o art. 10°/2 nadador-salvador que tem o dever especial censurabilidade ou
de intervir, deixa morrer o banhista.) perversidade do agente, este é punido
com a pena aplicável ao crime
respectivo agravada de um terço nos
seus limites mínimo e máximo. ... [5]
Crimes formais ou de mera actividade
Comentário [Filipe21]: Artigo 132º
São aqueles em que basta uma determinada actividade tipificada na lei Homicídio qualificado
independentemente de se alcançar um resultado. Ex: para haver crime de envenenamento, 1 - Se a morte for produzida em
circunstâncias que revelem especial
basta a actividade de ministrar a substância venenosa que pode conduzir à morte, não sendo necessário censurabilidade ou perversidade, o
que se verifique essa morte art. 146°/2 articulado com o 132°/2/h). agente é punido com pena de prisão de
12 a 25 anos.
2 - É susceptível de revelar a especial
censurabilidade ou perversidade a que
se refere o número anterior, entre
outras, a circunstância de o agente:
... [6]

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 Crimes formais de mera actividade : o tipo descreve meramente uma
conduta

 Crimes formais de omissão pura ou própria o tipo descreve


exclusivamente uma inactividade (art. 200°) Comentário [filipe22]: Artigo 200º
Omissão de auxílio
1 - Quem, em caso de grave
necessidade, nomeadamente
Crimes de dano ou de lesão efectiva provocada por desastre, acidente,
calamidade pública ou situação de
São aqueles cuja consumação depende da efectiva lesão do bem jurídico. (Ex: crime perigo comum, que ponha em perigo a
de homicídio art. 131°- para este crime se consumar é necessário que a vítima morra.) vida, a integridade física ou a liberdade
de outra pessoa, deixar de lhe prestar o
auxílio necessário ao afastamento do
Crimes de perigo perigo, seja por acção pessoal, seja
promovendo o socorro, é punido com
São aqueles em que basta que o bem jurídico seja colocado em perigo, para se pena de prisão até 1 ano ou com pena
de multa até 120 dias.
consumarem. (Ex: crime de exposição ou de abandono art. 138° - Para a consumação deste 2 - Se a situação referida no número
crime basta que o bem jurídico, vida, seja posto em perigo, não sendo necessário que a vítima morra.) anterior tiver sido criada por aquele que
omite o auxílio devido, o omitente é
punido com pena de prisão até 2 anos
ou com pena de multa até 240 dias.
A distinção entre os crimes materiais e formais atende à existência ou 3 - A omissão de auxílio não é punível
quando se verificar grave risco para a
inexistência de evento ou resultado típico. vida ou integridade física do omitente
ou quando, por outro motivo relevante,
o auxílio lhe não for exigível.
A distinção entre os crimes de perigo e de dano atende à existência ou não de
dano (pode haver resultado típico que não seja dano)

Noção de perigo - para haver perigo é necessário que haja, possibilidade ou


probabilidade de produção de um evento danoso.
Crimes de perigo abstracto
Comentário [u23]: Artigo 292º
São aqueles em que o perigo funciona como simples pressuposto ou motivo Condução de veículo em estado de
da incriminação. (ex: art. 292°) embriaguez
Quem, pelo menos por negligência,
conduzir veículo, com ou sem motor,
em via pública ou equiparada, com
 Nos casos de crimes de perigo abstracto basta que o agente tenha uma taxa de álcool no sangue igual ou
superior a 1,2 g/l, é punido com pena
praticado a acção prevista no tipo de crime sem que, casuísticamente, se de prisão até 1 ano ou com pena de
tenha de provar que houve perigo. multa até 120 dias, se pena mais grave
lhe não couber por força de outra
disposição legal.

 Crimes de perigo abstracto, são aqueles em que o legislador descreve certa Comentário [Filipe24]: Artigo 138º
Exposição ou abandono
conduta presumindo, inilidivelmente, que ela é perigosa. Há uma presunção 1 - Quem colocar em perigo a vida de
outra pessoa:
juris et de jure de perigo. a) Expondo-a em lugar que a sujeite a
uma situação de que ela, só por si, não
possa defender-se; ou
Crimes de perigo concreto b) Abandonando-a sem defesa, sempre
que ao agente coubesse o dever de a
São aqueles em que o perigo além de ser motivo ou fundamento de incriminação, guardar, vigiar ou assistir;
2 - Se o facto for praticado por
é também elemento do próprio tipo. Neles, o perigo surge como o próprio ascendente ou descendente, adoptante
ou adoptado da vítima, o agente é
resultado ou evento típico. (Ex: art. 138º) punido com pena de prisão de 2 a 5
anos.
3 - Se do facto resultar:
 Nos casos de crime de perigo concreto, não é suficiente que se prove que o a) Ofensa à integridade física grave, o
agente é punido com pena de prisão de
agente expôs a vítima, é necessário provar, para que o agente seja punido, 2 a 8 anos;
b) A morte, o agente é punido com
pena de prisão de 3 a 10 anos.

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que da sua acção resultou efectivamente um crime ou perigo para a vida
da vítima.(art.138º/1/a).) Comentário [Filipe25]: Artigo 138º
Exposição ou abandono
1 - Quem colocar em perigo a vida de
outra pessoa:
Crimes de perigo abstracto-concreto a) Expondo-a em lugar que a sujeite a
uma situação de que ela, só por si, não
São crimes em que por um lado, o fundamento é a actividade em si que coloca em possa defender-se;
perigo os bens jurídicos em geral, mas em que, por outro lado, revela-se perigo no
caso concreto.

 Constituem um meio termo entre os crimes de perigo concreto e de perigo


abstracto. Nestes crimes o perigo é referido no próprio tipo a propósito do
modo de ser da acção típica (art. 244º/2/2ªparte) Comentário [Filipe26]: Artigo 244º
Tortura e outros tratamentos crúeis,
degradantes ou desumanos graves
1 - Quem, nos termos e condições
 Por um lado, o perigo nestes crimes não é o resultado de um evento típico referidos no artigo anterior:
a) Produzir ofensa à integridade física
grave;
b) Empregar meios ou métodos de
 Por outro lado, também não se limita a um mero fundamento da tortura particularmente graves,
incriminação designadamente espancamentos,
electrochoques, simulacros de
execução ou substâncias alucinatórias;
ou
c) Praticar habitualmente actos
referidos no artigo anterior;
é punido com pena de prisão de 3 a 12
anos.
2 - Se dos factos descritos neste artigo
TEORIA GERAL DA INFRACÇÃO PENAL ou no artigo anterior resultar suicídio ou
morte da vítima, o agente é punido com
pena de prisão de 8 a 16 anos.

Categorias analíticas

- Acção
- Tipicidade
- Ilicitude
- Culpa
- Punibilidade

Acção
Segundo o Dr. Figueiredo Dias não faz sentido autonomizar a acção da tipicidade,
porque na tipicidade, um dos elementos objectivos do tipo é a conduta, a qual pode
ser por acção ou por omissão. Logo, se a acção não é dominada pela vontade, não
há conduta e por conseguinte, não havendo conduta, falta um dos elementos
objectivos do tipo e consequentemente não está preenchida a categoria analítica
da tipicidade.
O conceito de acção assume um papel secundário, tendo apenas uma função de
delimitação ou função negativa de excluir da tipicidade comportamentos jurídico-
penalmente irrelevantes.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José

Tipicidade
É a descrição da conduta que preenche o ilícito criminal. É o preenchimento de um
tipo de crime.
No tipo distingue-se entre a tipicidade objectiva, ou elementos objectivos do tipo
e a tipicidade subjectiva, ou elementos subjectivos do tipo.

- tipicidade objectiva
O preenchimento da tipicidade objectiva de um crime consiste no
estabelecimento do nexo de causalidade (ou de causalidade potencial) entre
a conduta e o resultado.

- tipicidade subjectiva
O preenchimento da tipicidade subjectiva consiste na imputação do
facto ao agente. Essa imputação é normalmente feita a título de dolo; A
actuação negligente também pode preencher a tipicidade subjectiva,
mas só nos casos especialmente previstos na lei.
Ilicitude
Qualidade do que é ilícito. Quando o tipo está preenchido, tanto do ponto de vista
objectivo como subjectivo, diz-se que está indiciada a Ilicitude. Quando a conduta
do agente é típica, a consequência que daí se tira é que a conduta é ilícita. O tipo
indicia a ilcitude.

Ilicitude formal (art.31°/1) Comentário [u27]: Artigo 31º


(Exclusão da ilicitude)
É a contrariedade à ordem jurídica. É a violação de deveres penalmente 1 - O facto não é punível quando a sua
ilicitude for excluída pela ordem jurídica
sancionáveis. Pode tratar-se da violação do dever de ter uma certa conduta considerada na sua totalidade.
2 - Nomeadamente, não é ilícito o facto
praticando um facto ou de violação do dever de não ter determinada conduta, praticado:
através da omissão de um comportamento devido. a) Em legítima defesa;
b) No exercício de um direito;
c) No cumprimento de um dever
imposto por lei ou por ordem legítima
Ilicitude material (escola neo-clássica) da autoridade; ou
d) Com o consentimento do titular do
Consiste na graduação da danosidade do facto ilícito praticado. Este conceito interesse jurídico lesado.
permite identificar as causas de exclusão da Ilicitude e graduar a pena consoante o
desvalor do acto que lesa o bem jurídico e a sua gravidade. Trata-se de um
conceito trazido pela escola neo-clássica.

conteúdo do ilícito
é composto pelo desvalor da acção e o desvalor do resultado (quando não há
desvalor do resultado estamos perante uma tentativa).

tipo de ilícito
é a reunião de todos os elementos que fundamentam o conteúdo material do ilícito.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
Culpa
No juízo de culpabilidade é apreciada a formação da vontade do agente e se ela
se deveu a uma atitude defeituosa diante do Direito.

 O juízo da ilicitude do facto deve preceder o juízo da culpabilidade, pois não


faz sentido falar em culpa relativamente a factos lícitos, mas já faz sentido
falar em actos ilícitos sem que haja culpa.

 O que está em causa na culpa é saber se numa dada situação concreta,


do ponto de vista de política criminal, é ou não necessário punir uma
pessoa. Se, num caso concreto, os fins de prevenção geral ou especial -
exigirem que uma pessoa seja punida, pode dizer-se que ela tem culpa.
Mas podem ocorrer ...

causas que excluem a culpa:

- inimputabilidade (em razão da idade ou de anomalia psíquica, arts.


19° e 20°/1)

- estado de necessidade desculpante, (art.35°)

- obediência indevida desculpante, (art.37°)

- excesso de legítima defesa por medo desculpável. (art. 33°/2)

 No caso de prática de um crime em comparticipação cada um dos agentes


é punido segundo a sua culpa (art. 29°) . Comentário [u28]: Artigo 29º
(Culpa na comparticipação)
Cada comparticipante é punido
segundo a sua culpa,
independentemente da punição ou do
!!!! A culpa é individual !!! grau de culpa dos outros
comparticipantes.

Punibilidade
É o conjunto de condições de que depende a punição do agente. Um facto só
será punível se for típico, ilícito e culposo. Mas, em certos casos, para que o facto
seja punível é ainda necessário que se verifiquem elementos exteriores ao tipo que
são os pressupostos de punibilidade.

Pressupostos gerais de punibilidade

Alguém só será punido se cometer um facto típico, ilícito e culposo

Em sentido amplo os pressupostos gerais de punibilidade são:

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António Filipe Garcez José

- a ilicitude

- a culpabilidade

Pressupostos especiais da punibilidade

De Dt°. Processual
Penal
- Excepções à punibilidade

Pressupostos Subjectivos
Especiais de - Causas pessoais de
levantamento da pena
punibilidade
De Dt° Penal
Material

Próprios
Objectivos
Impróprios

Pressupostos especiais de punibilidade de Dt° Penal material

Pressupostos subjectivos

- excepções pessoais à punibilidade ocorrem no momento da


prática do facto (ex: imunidade dos deputados)

- Causas pessoais de levantamento da pena são supervenientes


, ocorrem após a prática do facto (ex: a desistência voluntária)

Pressupostos objectivos
Trata-se de circunstâncias intimamente associadas ao facto típico, mas que são
extrínsecas ao tipo de ilícito e ao tipo de culpa

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António Filipe Garcez José
- Condições objectivas de punibilidade próprias estas
condições são extrínsecas ao facto típico, mas a punição do agente
depende da sua efectiva verificação (ex: art. 5° /1/c) II)

- Condições objectivas de punibilidade impróprias casos em a


responsabilidade do agente é agravada pela verificação de uma
certa circunstância em relação à qual não se exige nexo de
imputação subjectiva (ex: incitamento ou ajuda ao suicídio art. 135°)

TIPICIDADE

Tipicidade
É a descrição da conduta que preenche o ilícito criminal.

No tipo distingue-se entre os elementos objectivos e os elementos


subjectivos :

Elementos objectivos
Através destes elementos a questão é de saber se podemos imputar
objectivamente ao agente a prática de determinado crime.

Elementos escritos (fácticos e normativos)


Elementos que estão descritos no tipo de ilícito.

a. Elementos descritivos (de facto)


Aqueles para cuja determinação não é necessário fazer qualquer
valoração jurídica, não são conceitos jurídicos mas sim da linguagem
corrente.

- Agente
- Conduta
- Objecto da acção
- Resultado ( só nos crimes de resultado)

b. Elementos normativos (de direito)


São expressões que o CP utiliza e que traduzem elementos de direito
que vão ser concretizados por outras fontes. Estes elementos
pressupõem uma valoração que pode ser jurídica ou cultural (ex: honra,
alheio, documento, móvel )

Elementos não escritos


Bem jurídico

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António Filipe Garcez José
Nexo de causalidade (só no caso de crimes de resultado)

Elementos subjectivos

- Dolo
- Elementos subjectivos especiais
- Negligência

Imputação objectiva
Imputação
É o nexo que liga o crime ao seu autor. É a causa do crime.

Imputação objectiva
Consiste em estabelecer o nexo de causalidade entre a acção e o resultado.

 É a questão de determinar como é que se atribui à conduta do agente o


resultado de que depende a consumação do crime.

 É a possibilidade de atribuir a responsabilidade a alguém pelo evento,


através do estabelecimento de um nexo de relação entre o facto e o
resultado.

 Trata-se de um conceito mais amplo do que o de causalidade porque o


conceito de causalidade não explica as situações de omissão.

 Em direito penal o problema da imputação objectiva é distinto do problema


da causalidade , mas a causalidade tem de ser a base de qualquer
teoria da imputação objectiva.

Acerca da imputação objectiva é importante referir o seguinte...

1. O resultado há-de ter ocorrido, não sendo bastante que a causa seja
adequada a produzi-lo
.
2. Depois de se estabelecer o nexo de ligação entre a causa e o efeito é
preciso apurar se aquela causa geraria, possivelmente, aquele resultado.

3. É necessário fazer a imputação objectiva relativamente a todas as causas

4. Na tentativa não há lugar a imputação objectiva do resultado , porque aí


não há resultado.

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António Filipe Garcez José

Encontram-se na doutrina várias teorias para explicar a imputação objectiva,


designadamente :

- Teoria da conditio sine qua non


- Teoria da causalidade adequada
- A teoria da relevância
- Teoria do risco

Teoria da conditio sine qua non


(Teoria da equivalência das condições)

Teoria da conditio sine qua non


Para esta teoria a causa de um evento é qualquer condição, qualquer evento ou
circunstância, sem a qual o resultado não se produziria;

 Para se apurar se determinado comportamento foi ou não relevante utiliza-


se um processo de eliminação.

 A teoria da conditio sine qua non deverá ser formulada, tomando em


consideração as circunstâncias do caso concreto. Então a questão a
formular será a seguinte:

- Se aquele comportamento não tivesse tido lugar, nas mesmas


circunstâncias de tempo, lugar e modo, ter-se-ia verificado o
resultado?

Críticas a esta teoria

 Esta teoria pressupõe um número infinito de causas para cada


fenómeno.

Exemplo:
Se A mata B com um tiro, também é possível considerar uma condição da morte de B o facto de os pais
de A o terem concebido.

 Esta teoria permite a responsabilização objectiva em Direito penal,


designadamente no caso dos crimes agravados pelo resultado

Exemplo
A provoca um arranhão a B, que é hemofílico, provocando-lhe a morte.

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De acordo com esta teoria, se A não tivesse arranhado o B, este não teria morrido, logo a imputação
objectiva neste caso é fácil de estabelecer. Portanto A seria punido por um crime de homicídio,
consequência que seria particularmente grave na medida em que levaria ao reconhecimento da
existência da responsabilidade objectiva em Direito Penal, a qual é afastada , como já se sabe, pelo
princípio da culpa.

O art. 18° exige a existência de um nexo subjectivo entre o agente e o resultado mais grave

 Esta teoria nega a imputação subjectiva em situações de causalidade


hipotética ou de causalidade cumulativa

Em conclusão

A teoria da conditio sine qua non é criticada...

1. Porque permitindo sempre outras causas anteriores, permite o


encadeamento infinito.

2. Pressupõe que o nexo de causalidade está estabelecido, sem o definir

3. Pode gerar situações de responsabilidade objectiva.

4. não distingue entre causas relevantes e causas irrelevantes

5. Não explica os casos de causalidade hipotética , nem os de causalidade


cumulativa.

Teoria da adequação ou da causalidade adequada


 Esta teoria não rejeita a teoria da conditio sine qua non , só pretende
constituir um aperfeiçoamento desta.

 Esta teoria parte da teoria da conditio sine qua non , apontando um


critério para verificar que só a acção adequada seria relevante para efeitos
de Direito Penal.

 Para verificar se a causa é ou não adequada a produzir determinado


resultado penalmente desvalioso, utiliza-se um juizo de previsão feito a
posteriori mas reportado ao momento em que o agente actuou (teoria da
prognose objectiva póstuma)

Teoria da prognose objectiva póstuma

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António Filipe Garcez José
É um juizo de previsão (prognose) feito a posteriori (póstumo), mas
reportado ao momento ex ante , de que se serve a teoria da causalidade
adequada, para fazer a imputação objectiva do resultado.

Esta teoria decompõe-se em 2 elementos:

- juizo de prognose póstuma


O julgador coloca-se nas circunstâncias, em que se encontrava o
agente, que conduziram à actuação ou omissão e interroga-se se
naquelas circunstâncias seria ou não previsível que actuasse
daquela forma,, produzindo aquele resultado.

- juizo de prognose objectiva


A prognose é objectiva porque é feita atendendo ao padrão de
homem médio, mas tomando em consideração os conhecimentos
específicos e as capacidades do agente em causa.

Formula-se a seguinte questão:

- era ou não previsível para o homem médio, idealmente colocado no lugar do


agente e munido dos particulares conhecimentos deste, que se produzisse aquele
resultado?

- Se o homem médio podia prever aquele resultado, a causa é


adequada.

 A prognose é póstuma, porque é um juizo de previsão feito a


posteriori .

 A questão da causalidade adequada pode ser colocada através de 3


proposições :

Dolo
É o elemento subjectivo do tipo de crime que consiste no conhecimento dos
elementos objectivos essenciais desse tipo (elemento intelectual) e na vontade de
praticar um certo acto ou, nos crimes materiais, de atingir um certo resultado
(elemento volitivo)

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
- Elemento intelectual
Consiste, em o agente representar o facto que preenche um tipo de
crime, isto é, no conhecimento de todos os elementos da factualidade
típica.

- Elemento volitivo
É o querer, é a intenção de praticar o acto.

O Professor Figueiredo Dias acrescenta um terceiro elemento:

- Elemento emocional
Consiste na consciência da ilicitude
.
Elemento intelectual

Não há qualquer norma no CP que nos diga directamente que o dolo é o


conhecimento da realização do facto típico, no seu elemento intelectual. Mas há
preceitos que nos dizem isso pela negativa; aqueles que contêm o regime do erro,
em particular o art. 16°/1.

Artigo 16º

Erro sobre as circunstâncias do facto

1 - O erro sobre elementos de facto ou de direito de um tipo de crime, ou sobre


proibições cujo conhecimento for razoavelmente indispensável para que o agente
possa tomar consciência da ilicitude do facto, exclui o dolo.
2 - O preceituado no número anterior abrange o erro sobre um estado de coisas que, a existir, excluiria a
ilicitude do facto ou a culpa do agente.

3 - Fica ressalvada a punibilidade da negligência nos termos gerais.

Deste preceito concluímos que ...

 não há dolo quando não houver conhecimento dos elementos da


factualidade típica.

 Se houver erro o dolo é excluído. O agente apenas poderá ser punível a


título de negligência (art. 16°/3)

No artigo 16°/1 prevê-se outro tipo de erro que exclui o dolo ...

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José

 O erro sobre proibições cujo conhecimento seja razoavelmente indispensável para que
o agente possa tomar consciência da ilicitude do facto.

O regime para os dois tipos de erro não é o mesmo ...

 O erro de desconhecimento dos elementos essenciais da factualidade típica


exclui sempre o dolo.

 O erro sobre as proibições apenas exclui o dolo em alguns casos, isto é,


sobre algumas proibições.

Quais são essas proibições ?

 São aquelas que têm um carácter axiológicamente neutral, isto é,


aquelas proibições cujo conhecimento é razoavelmente indispensável para
o agente tomar consciência da ilicitude do facto.

Suponhamos que ...

... é proibido ter em casa dinheiro em moeda estrangeira.

 Ora esta proibição é axiológicamente neutral; é impossível ao agente, se


não souber dessa proibição, chegar a essa conclusão no plano ético, por
causa das suas valorações morais.

Ao contrário, suponhamos agora que ...

... o agente dispara um tiro contra a vítima para a matar, mas ignora que em
Portugal, por absurdo que seja, o homicídio é um crime

 A falta deste conhecimento de modo algum exclui que o agente seja punível
por um crime de homicídio doloso nos termos do art. 131°,

porque...

A proíbição do homicídio não é neutral no plano dos valores


Comentário [u29]: Artigo 17º
(Erro sobre a ilicitude)
O artigo 17°, sem qualquer exclusão do dolo, é que prevê a falta de 1 - Age sem culpa quem actuar sem
consciência da ilicitude nos casos em que não estão em causa, proibições consciência da ilicitude do facto, se o
erro lhe não for censurável.
axiológicamente neutrais. 2 - Se o erro lhe for censurável, o
agente é punido com a pena aplicável
ao crime doloso respectivo, a qual pode
ser especialmente atenuada.

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António Filipe Garcez José

Modalidades de dolo
Dolo directo(art. 14°/1) Comentário [u30]: Artigo 14º
(Dolo)
O dolo é directo quando o fim subjectivo do agente é o próprio facto tipicamente 1 - Age com dolo quem, representando
um facto que preenche um tipo de
ilícito; O facto representado é o facto querido e o agente actua com vontade de crime, actuar com intenção de o
realizar.
realizar esse mesmo facto. No dolo directo a vontade, a intenção de praticar o
acto prevalece sobre o seu conhecimento

 É através do elemento volitivo que se define esta modalidade de dolo.

 Basta que o agente queira, isto é, que tenha a intenção de realizar o facto
típico.

Exemplo:
O agente decide matar a vítima através de um tiro disparado a grande distância, sabendo que é provável
que não lhe acerte; ainda assim o agente actua em dolo directo
Comentário [u31]: Artigo 14º
(Dolo)
Dolo necessário (art. 14°/2) 1 - Age com dolo quem, representando
um facto que preenche um tipo de
Existe dolo necessário quando o facto tipicamente ilícito é consequência crime, actuar com intenção de o
realizar.
necessária da realização pelo agente do fim que se propõe, algo que é inevitável
em consequência da sua conduta. Comentário [u32]: Artigo 14º
O agente conhece o facto, sabe que vai realizar-se, sabe que vai acontecer (Dolo)

necessariamente, não o quer, mas actua. 2 - Age ainda com dolo quem
representar a realização de um facto
Para a realização do fim que se propõe, representa, como consequência que preenche um tipo de crime como
consequência necessária da sua
necessária da sua conduta, a perpetração de um facto tipicamente ilícito, mas essa conduta.
representação não o impede de agir.
 O elemento intelectual é que é decisivo para a sua caracterização.

 Do art. 14º/2 não se conclui que a previsão do agente seja correcta: o que é
indispensável é que a realização do facto seja inevitável na sua cabeça, de
acordo com a sua representação.

Exemplo: Se o agente dispara um tiro contra a cabeça da vítima sabendo que a


vai matar, não é necessário averiguar, autonomamente, se existe elemento volitivo
do dolo. É impossível que não exista porque o agente prevê a realização do facto
típico precisamente como consequência indispensável da sua conduta.

Qual a diferença entre dolo directo e dolo necessário ?


Comentário [u33]: Artigo 14º
A diferença reside especialmente no elemento volitivo, pois que a realização do (Dolo)
facto típico não é, no dolo necessário, o fim subjectivo que o agente se propõe, 3 - Quando a realização de um facto
mas a consequência necessária para a sua realização (Prof. Germano M. Silva) que preenche um tipo de crime for
representada como consequência
possível da conduta, há dolo se o
agente actuar conformando-se com
Dolo eventual (art. 14°/3) aquela realização.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
É a previsão da possibilidade de realização do facto típico e conformação com ela.
O agente aceita como possível a realização do facto que preenche o tipo e
conforma-se com essa realização. Com a sua conduta prevê o resultado nocivo,
não se importando se este se concretizará ou não. No dolo directo e no dolo
necessário há prevalência de um dos elementos, no dolo eventual há paridade.

 Trata-se da modalidade de dolo mais problemática e com maior alcance


prático:

- por um lado
é problemática na medida em que é definida paredes meias com a negligência
consciente a que se refere o art. 15º/a). Comentário [Filipe34]: Artigo 15º
(Negligência)
Age com negligência quem, por não
proceder com o cuidado a que,
- por outro lado segundo as circunstâncias, está
obrigado e de que é capaz:
as consequências práticas derivam do facto de se tratar de uma modalidade de a) Representar como possível a
dolo. realização de um facto que preenche
um tipo de crime mas actuar sem se
conformar com essa realização; ou
b) Não chegar sequer a representar a
 O elemento intelectual do dolo eventual e o da negligência consciente é possibilidade de realização do facto.
comum : a representação da realização do facto típico como consequência
possível do comportamento do agente

Mas, o elemento volitivo varia:

- no dolo eventual
o agente prevê a realização do facto típico como possível e conforma-
se com essa realização.

- Na negligência consciente
o agente prevê a realização do facto típico como possível, mas não se
conforma com essa realização.

Fórmula positiva de Franck


Trata-se de uma fórmula perfeitamente compatível com o critério de distinção
adoptado pelo legislador no art. 14º/3, o critério da conformação Comentário [Filipe35]: Artigo 14º
(Dolo)

3 - Quando a realização de um facto


 Se o agente, ao actuar, previu como possível a realização de um facto que preenche um tipo de crime for
representada como consequência
típico e pensar: aconteça o que acontecer, eu actuo. Então, se actuar, fá-lo- possível da conduta, há dolo se o
á com dolo eventual. agente actuar conformando-se com
aquela realização.

 Este critério do legislador exige a identificação no dolo eventual, de dois


elementos: o elemento intelectual e o elemento volitivo

Exemplo :

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António Filipe Garcez José
Um automobilista está a conduzir em excesso de velocidade, tem pressa de
chegar a casa e o piso está molhado

Atitude de dolo eventual


eu posso matar alguém, mas como tenho pressa de chegar a casa continuo a
conduzir deste modo (conforma-se com a realização do facto)

atitude de negligência consciente


eu posso matar alguém, mas como sou bom condutor consigo evitar essa morte
(não se conforma com a realização do facto)

Erro sobre a factualidade típica classificação


 Erro sobre o objecto
 Erro sobre o processo causal
 Erro sobre circunstâncias qualificadoras ou priviligiantes
 Erro sobre elementos descritivos e normativos do tipo

Erro sobre o objecto

Podemos distinguir 2 situações ...

 Quando os objectos são tipicamente idênticos

 Quando não há identidade típica dos objectos

Objectos tipicamente idênticos

Exemplo:
A quer matar B, mas confunde-o com C e este é que acaba por ser morto.

 Nestes casos, de acordo com a doutrina dominante, o erro é irrelevante,


pois o agente sabe que está a matar uma pessoa e quer de facto mata-la,
pelo que o agente é punido por um crime de homicídio doloso consumado.

Objectos tipicamente não idênticos

Exemplo 1 :
O agente A pensa que está a disparar para uma peça de caça e acerta numa
pessoa.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
 Aqui o agente não pode ser punido por um crime de homicídio doloso pois
actuou sem dolo, já que não pretendeu matar nenhuma pessoa. Logo só
será eventualmente punido por um crime de homicídio negligente

Exemplo 2 :
A pretende matar o cão do vizinho, mas acaba por matar o próprio vizinho, a quem
confunde com o cão.

 Neste caso o agente será punível em concurso por uma tentativa e por
um crime negligente consumado.

 Aqui há um erro sobre a factualidade típica do disposto no art. 16°/1 : o


agente não conhece nem quer a morte de um ser humano apenas
pretende matar o cão do vizinho

 Será punível por tentativa, se a tentativa for punível. Ao tentar


abater o cão o agente estaria a praticar um crime de dano tentado.
Simplesmente o dano é punível com prisão até 3 anos e a tentativa só é
punível quando ao crime consumado corresponder uma pena superior a 3
anos (art. 23°/1) , logo, nesta situação o agente não é punido pela tentativa Comentário [u36]: Artigo 23º
(Punibilidade da tentativa)
de dano, mas apenas por crime de homicídio negligente consumado. 1 - Salvo disposição em contrário, a
tentativa só é punível se ao crime
consumado respectivo corresponder
pena superior a 3 anos de prisão.
 Será punível por crime negligente se houver negligência.
O agente pode ter atingido um objecto que tipicamente não é idêntico, sem
ter actuado com negligência.

Exemplo: O agente dispara, para matar um cão, contra a casota desse cão.
Extravagantemente quem está lá dentro da casota .é o dono do cão que morre.

 Neste caso, e atendendo só aos dados da hipótese, dever-se-ia


concluir que o agente não seria punível por um crime de homicídio
negligente consumado, pois não era previsível que o agente fora atingir
uma pessoa dentro da casota do cão.

Articulação com os tipos qualificados e privilegiados

 Quando se está em face de um dos tipos qualificados ou privilegiados não


se pode dizer que o objecto seja tipicamente idêntico.

Com tipos qualificados

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António Filipe Garcez José
Exemplo 1: O agente pretende matar o seu pai, mas confunde-o, no escuro, com
uma outra pessoa sendo esta que é morta.

 A solução aqui é a de concurso em que o agente é punível por um crime de


homicídio qualificado tentado (art. 132°/2), com pena especialmente
atenuada (art. 72°) e por homicídio negligente consumado (art. 137°)

Exemplo 2 : o agente pretende matar uma pessoa qualquer e mata o pai.


 só é punível por um crime de homicídio doloso consumado, porque o
objecto é tipicamente o mesmo, uma pessoa.
Com tipos privilegiados

Exemplo 1 : O agente a pedido instante, consciente, livre e expresso da vítima,


decide matá-la, mas engana-se, pois supõe que é a vítima que está num sítio de
pouca visibilidade e mata outra pessoa.

 O crime de homicídio a pedido da vítima, é um crime de homicídio


privilegiado previsto no art. 134°.

 Neste caso também o agente deve ser punível pela prática de um crime de
homicídio tentado a pedido da vítima, pela conjugação dos arts. 134° e
72°em concurso com o crime de homicídio negligente consumado, nos
termos do art. 137°.

Exemplo 2: O agente do crime é surdo. A vítima pede instante, livre, consciente e


expressamente que a matem, mas não lhe vale de nada pois o agente não ouve o
pedido. O surdo ignora que existe esse pedido mas, mesmo assim, mata-a.

 Numa situação destas o Dr. Rui Pereira defende que o agente seria punível
nos termos do art. 131°. É certo que ele ignorava o pedido da vítima, mas a
sua responsabilidade seria atenuada, pois, na determinação da medida da
pena deveria ser tido em conta que existia um pedido da vítima que a
matassem, embora o agente do crime o tenha ignorado.

ABERRATIO ICTUS
Exemplo: A quer matar B. Dispara contra ele mas, por falta de pontaria, acaba
por matar C que se encontrava próximo de B.

 Não estamos perante uma situação de erro, mas de execução defeituosa: A


não está em erro sobre coisa alguma, mas quer matar B, reconhece-o,
identifica-o correctamente, só que a execução é defeituosa.

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António Filipe Garcez José

 Aqui, quer haja identidade ou não de objectos, a solução é sempre


invariável: O agente do crime será punível pelo concurso entre um crime
doloso de homicídio na forma tentada (contra B) e um crime de homicídio
negligente na forma consumada. (contra C)
Erro sobre o processo causal
Desvio essencial no processo causal

 Dá-se este desvio quando a consumação do crime não é a concretização


da perigosidade trazida pela acção do agente.

 Só nestes casos é que é relevante o erro sobre o processo causal.

Exemplo:
O agente esfaqueia a vítima sucessivamente deixando-a prostrada no chão. No
entanto, antes de a vítima morrer, cai-lhe um raio e a vítima vem a morrer em
consequência disso.

 Nesta situação, o desvio do processo causal é essencial e relevante, e o


agente só é punível por crime de homicídio doloso tentado, mesmo que se
prove que a vítima morria de qualquer maneira.

 A causa virtual ou hipotética não é relevante em Direito Penal.

Desvio não essencial no processo causal

 Quando o desvio não é essencial, o agente é punível só por um crime


doloso consumado.

Exemplo:
O agente lança a vítima de uma ponte abaixo com o intuito de a matar por
afogamento. Simplesmente a vítima bate com a cabeça na estrutura da ponte e
morre.

 Este desvio do processo causal é irrelevante. A morte da vítima traduziu-se


na concretização da perigosidade que a acção do agente encerrava.

 Como há condições para atribuir ao agente objectiva e subjectivamente a


morte da vítima, este é punível pelo crime de homicídio doloso consumado.
Dolus generalis

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José

 Trata-se também de um desvio irrelevante do processo causal.

 São exemplos paradigmáticos destas situações as de encobrimento


posterior à suposta prática do crime consumado.

Exemplo:
O agente do crime esfaqueia sucessivamente a vítima e pensa tê-la matado. A
seguir atira-a da ponte abaixo para se desfazer do cadáver. Mas a vítima não tinha
morrido, acabando por morrer por ter sido atirada da ponte abaixo.

 Nesta situação o agente deve ser punível por um só crime de homicídio


doloso consumado.

 Trata-se de uma situação de dolo geral, dolo genérico que abarca todo o
processo causal, não havendo qualquer desvio desse processo causal.

Erro sobre circunstâncias qualificadoras


ou privilegiantes típicas
exemplo
O agente dispara contra B, sabendo que é ele, mas ignorando que B é o seu pai.

 Não podemos dizer que houve dolo de homicídio qualificado no sentido do


art. 132°, porque o agente ignorava que a pessoa que estava a matar era o
seu pai.

 Neste caso o dolo é excluído ao abrigo do art. 16°/1, e o agente só pode


ser punível pelo crime simples (art. 131°)

Elementos subjectivos especiais


São factos subjectivos que interessam à valoração objectiva do tipo.
Especial intenção que se autonomiza do dolo. Estes elementos constituem uma
especial atitude interna do agente.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
Nos crimes de intenção

 Nestes crimes para além do dolo é necessário que haja uma certa intenção.

crimes de resultado cortado ou parcial


Aqueles em que o tipo subjectivo ultrapassa, em extensão, o tipo objectivo.

 São exemplos de crimes de resultado cortado ou parcial:

- o furto (art.203°)

- a burla (art.217°°)

Artigo 203º
Objecto do crime
Furto agente
conduta Elemento subjectivo especial
1 - Quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa,
subtrair coisa móvel alheia, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena
de multa.
2 - A tentativa é punível.

3 - O procedimento criminal depende de queixa.


Comentário [u37]: Artigo 217º
 Objectivamente não é necessário haver apropriação para se consumar um Burla
1 - Quem, com intenção de obter para
crime de furto, mas, subjectivamente, exige-se algo mais que ultrapassa o si ou para terceiro enriquecimento
ilegítimo, por meio de erro ou engano
tipo objectivo: a intenção de apropriação. sobre factos que astuciosamente
provocou, determinar outrem à prática
de actos que lhe causem, ou causem a
 No crime de burla (art. 217°) o elemento subjectivo especial é a intenção outra pessoa, prejuízo patrimonial é
punido com pena de prisão até 3 anos
de enriquecimento. ou com pena de multa.
2 - A tentativa é punível.
3 - O procedimento criminal depende
de queixa.
4 - É correspondentemente aplicável o
disposto no artigo 206º e na alínea a)
do artigo 207º.
Nos crimes de tendência
Comentário [u38]: Artigo 181º
Injúria
São crimes em que a acção típica tem que ser dominada por uma certa direcção 1 - Quem injuriar outra pessoa,
imputando-lhe factos, mesmo sob a
da vontade do agente. forma de suspeita, ou dirigindo-lhe
palavras, ofensivos da sua honra ou
consideração, é punido com pena de
Exemplos: prisão até 3 meses ou com pena de
multa até 120 dias.
2 - Tratando-se da imputação de
- o crime de injúria (art. 181°) factos, é correspondentemente
aplicável o disposto nos nºs 2, 3 e 4 do
artigo anterior.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
- O crime de difamação (art. 180°) Comentário [u39]: Artigo 180º
Difamação
1 - Quem, dirigindo-se a terceiro,
imputar a outra pessoa, mesmo sob a
 Nestes crimes, para além de ser requerido o dolo, é também requerido a forma de suspeita, um facto, ou
formular sobre ela um juízo, ofensivos
intenção de injuriar ou difamar da sua honra ou consideração, ou
reproduzir uma tal imputação ou juízo,
é punido com pena de prisão até 6
Nos crimes sexuais meses ou com pena de multa até 240
dias.
2 - A conduta não é punível quando:
a) A imputação for feita para realizar
 Nestes crimes para além do dolo é comum a doutrina exigir como elemento interesses legítimos; e
b) O agente provar a verdade da
subjectivo especial do tipo ou da ilicitude o animus lubricus mesma imputação ou tiver tido
fundamento sério para, em boa fé, a
reputar verdadeira.
3 - Sem prejuízo do disposto nas
alíneas b), c) e d) do nº 2 do artigo 31º,
o disposto no número anterior não se
aplica quando se tratar da imputação
de facto relativo à intimidade da vida
privada e familiar.
4 - A boa fé referida na alínea b) do nº
2 exclui-se quando o agente não tiver
cumprido o dever de informação, que
as circunstâncias do caso impunham,
sobre a verdade da imputação.
5 - Quando a imputação for de facto
que constitua crime, é também
admissível a prova da verdade da
imputação, mas limitada à resultante de
condenação por sentença transitada
em julgado.

ILICITUDE

Causas de exclusão da ilicitude


Normas proibitivas
O tipo pressupõe uma norma proibitiva e, como tal indicia a existência da ilicitude,
quanto ao comportamento que violar tal norma. Estas normas são a regra.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
Normas permissivas
São aquelas que prevêem as causas de justificação ou de exclusão da ilicitude.
Estas normas são a excepção.

 Tal significa que nem todos os factos típicos são ilícitos.

Exemplo:
Se A dispara um tiro contra a cabeça de B porque este o quer matar, então A está
a actuar em legítima defesa.

 O facto de A é típico, isto é, subsumível no art. 131°, mas não é ilícito.

O artigo 31° e as causas de exclusão de ilicitude


Artigo 31º

Exclusão da ilicitude

1 - O facto não é punível quando a sua ilicitude for excluída pela ordem jurídica
considerada na sua totalidade.

2 - Nomeadamente, não é ilícito o facto praticado:

a) Em legítima defesa;

b) No exercício de um direito;

c) No cumprimento de um dever imposto por lei ou por ordem legítima da


autoridade; ou

d) Com o consentimento do titular do interesse jurídico lesado.


Comentário [u40]: ARTIGO 336º
(Acção directa)
Art. 31°/1 1. É lícito o recurso à força com o fim
de realizar ou assegurar o próprio
direito, quando a acção directa for
indispensável, pela impossibilidade de
 Consagra-se neste preceito o princípio de que o ordenamento jurídico deve recorrer em tempo útil aos meios
coercivos normais, para evitar a
ser encarado no seu conjunto, de modo que as normas de outros ramos inutilização prática desse direito,
que estabelecem a licitude de uma conduta têm reflexo no direito penal. contanto que o agente não exceda o
que for necessário para evitar o
prejuízo.
2. A acção directa pode consistir na
Exemplo: artigo 336° C. Civil apropriação, destruição ou deterioração
de uma coisa,na eliminação da
resistência irregularmente oposta ao
Art.31°/2 exercício do direito, ou noutro acto
análogo.
3. A acção directa não é lícita, quando
sacrifique interesses superiores aos
 Esta enumeração não é taxativa, mas meramente exemplificativa. que o agente visa realizar ou
assegurar.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
 Há causas de exclusão supra-legais, não previstas em qualquer norma,
mas que são de admitir tendo em conta os princípios justificadores.

A LEGÍTIMA DEFESA
Artigo 32º
2° requisito animus defendendi”
Legítima defesa 1° requisito

Constitui legítima defesa o facto praticado como meio necessário para repelir a
agressão actual e ilícita de interesses juridicamente protegidos do agente ou
de terceiro.
1° pressuposto 2° pressuposto

 Não há coincidência com a legítima defesa prevista no Código Civil, pois,


no Código Penal repudia-se a ponderação de interesses, ao contrário do
que acontece no Código civil;

Pressupostos
Circunstâncias de facto que revelem uma situação de legítima defesa, por outras
palavras, são os elementos extrínsecos à causa de justificação e sem a
verificação dos quais não é admissível a legítima defesa.

Requisitos
Elementos intrínsecos à causa de justificação sem cuja verificação o exercício da
defesa não é legítimo, embora seja possível.
Pressupostos

A existência de interesses juridicamente protegidos

 A titularidade desses interesses pode ser do agente que age em legítima


defesa, ou de terceiro.

 O bem jurídico a proteger deve possuir um carácter perfeitamente


individualizado.

 Não é possível a legítima defesa dos bens jurídicos do Estado quando a


agressão põe em causa a ordem jurídica no seu conjunto (ex: manifestação não
autorizada)

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
 Tratando-se de um crime dirigido à colectividade como um todo, se a
agressão afectar imediatamente um particular, é admissível a legítima
defesa. ( crime de exibicionismo art. 171°)

A existência de uma agressão actual e ilícita

 Para que haja uma agressão, é necessário que haja acção, no sentido do
Direito Penal, isto é, uma acção definível como comportamento dominado
ou dominável pela vontade.

 A agressão não tem que ser dolosa ou culposa

 É permitida a legítima defesa em relação a uma acção negligente.

 É permitida a legítima defesa em relação a um comportamento desculpável


(acção praticada por um louco ou por uma criança)

 A agressão tem de ser actual, o que significa estar já em execução, ou


ser iminente, prestes a ser desencadeada.

 Por isso não é admissível a legítima defesa contra a agressão já


consumada ou contra a agressão futura ainda não iminente.

 Além de actual, a agressão deve ser ilícita, isto é, objectivamente


contrária ao Direito.
Requisitos
São os elementos intrínsecos à causa de justificação e sem cuja verificação o
exercício da defesa não é legítimo, embora seja possível.

Necessidade de defesa

 Que não seja possível recorrer à força pública.

 Que o agente utilize o meio necessário de defesa que implique as


consequências menos gravosas para o agressor, de entre aqueles meios
que tiver à sua disposição.

 A necessidade do meio não obriga a que, aquele que suporta a agressão,


tenha de fugir

Animus defendendi

 É o elemento subjectivo da legítima defesa.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José

 Quem actuar numa situação objectiva de defesa, mas sem o elemento


subjectivo, deve ser punido por crime consumado e não se deve aplicar o
art. 38°/4.

 Não há legítima defesa nos casos de provocação pré-ordenada.

O animus defendendi tem duas componentes :

- Intelectual
É necessário conhecer-se a agressão que é pressuposto do
exercício da legítima defesa.

- volitivo
Ter vontade de repelir a agressão.

EXCESSO DE LEGÍTIMA DEFESA

Artigo 33º

Excesso de legítima defesa

1 - Se houver excesso dos meios empregados em legítima defesa, o facto é ilícito


mas a pena pode ser especialmente atenuada.

2 - O agente não é punido se o excesso resultar de perturbação, medo ou susto,


não censuráveis.

No preceito n°1
deste artigo prevê-se uma situação em que o agente utiliza como meio de repelir a
agressão, um meio mais grave que outro menos grave que tinha à sua disposição.

Exemplo:
O agente que para repelir a agressão de quem lhe vai dar uma bofetada, dá um
tiro no agressor, quando podia ter repelido a agressão com um murro.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
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 Aqui não há legítima defesa. Se do tiro resultou a morte do agressor, o


gente será punível pelo crime de homicídio, podendo a pena ser
especialmente atenuada.

No preceito n°2
Trata-se do excesso resultante de medo, perturbação ou susto não censuráveis.

 Nestes casos o agente não será punido

O DIREITO DE NECESSIDADE
( objectivo ou justificando)

Artigo 34º

Direito de necessidade

Não é ilícito o facto praticado como meio adequado para afastar um perigo actual
que ameace interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiro, quando
se verificarem os seguintes requisitos:

a) Não ter sido voluntariamente criada pelo agente a situação de perigo, salvo
tratando-se de proteger o interesse de terceiro;

b) Haver sensível superioridade do interesse a salvaguardar relativamente ao


interesse sacrificado; e

c) Ser razoável impor ao lesado o sacrifício do seu interesse em atenção à


natureza ou ao valor do interesse ameaçado.

Pressupostos do direito de necessidade

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
1. existência de interesses juridicamente protegidos do agente ou de
terceiro.

2. Existência de um perigo actual que ameace esses interesses

3. Que a situação de perigo não tenha sido criada pelo próprio agente.

4. Existência de uma sensível superioridade do interesse a salvaguardar,


relativamente ao interesse sacrificado.

Exemplo:
O agente está confrontado com um incêndio e a sua vida está em perigo. Para se
salvar do incêndio tem de arrombar a porta da casa do vizinho.

 Nessa situação ele está a defender um bem jurídico - a vida


consideravelmente superior à coisa alheia que é propriedade do vizinho em
relação à qual comete tipicamente um crime de dano que é justificável pelo
exercício do dt° de necessidade.
Requisitos do direito de necessidade
1. A razoabilidade da imposição do sacrifício que resulta do exercício do dt°
de necessidade. (porque estamos perante bens jurídicos essenciais, conexos com o
princípio da dignidade humana)

2. A necessidade ou adequação do meio utilizado pelo agente que actua em


estado de necessidade.

3. o conhecimento da situação de perigo para o interesse juridicamente


protegido (elemento subjectivo)

Razoabilidade da imposição do sacrifício

 O princípio justificador do direito de necessidade é o princípio da


ponderação dos interesses ou bens jurídicos que se encontram
numa situação de conflito

Requisito da adequação

 A acção praticada no exercício do direito de necessidade só será lícita se


for adequada a afastar o perigo.

 Tem de haver uma relação causal entre essa acção e o afastamento do


perigo.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
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 Que o agente deve utilizar o meio menos gravoso que tenha ao seu alcance
para repelir a situação de perigo.

Elemento subjectivo

 Este elemento subjectivo tem um carácter exclusivamente intelectual,


não se exige qualquer postura volitiva do agente.

 Porque o elemento subjectivo é de carácter estritamente intelectual, na sua


ausência devemos aqui aplicar analogicamente o art. 38°/4 e o agente será
punido apenas por tentativa.

Exemplo:
Se o agente arrombar a porta do vizinho ignorando que existe um incêndio, salvará
a sua vida mas deverá ser punível por tentativa de dano e não por crime de dano
consumado.
CAUSAS DE EXCLUSÃO SUPRA-LEGAIS
Legítima defesa preventiva

Exemplo:
Uma senhora encontra-se retida num quarto, à janela, e sem a menor hipótese de
se deslocar porque é paralítica dos membros inferiores .Não tem acesso ao
telefone e não pode pedir socorro a ninguém. Ela sabe de ciência certa que um
homem que esta na rua a vai matar dentro de meia hora. Ela tem junto de si uma
arma e mata-o visando-o na rua.

 Na legítima defesa preventiva exigem-se todos os requisitos e


pressupostos da legítima defesa excepto a actualidade da agressão.

Estado de necessidade defensiva


Exemplo:
Durante uma das suas crises um sonâmbulo coloca em perigo a vida de alguém,
sem que exista uma agressão no sentido requerido pela legítima defesa.

 Trata-se de um estado de necessidade que num plano estritamente


objectivo, é constituído por algo que é uma agressão.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
 No estado de necessidade defensiva é de exigir a verificação de todos os
pressupostos e requisitos do estado de necessidade justificante (direito de
necessidade - art. 34°) com excepção da existência da própria agressão.

 Nestas situações, de legítima defesa preventiva e de estado de


necessidade defensivo, será lícito ao agente danificar bens jurídicos de
valor pelo menos igual àqueles que ele pretende salvaguardar.

 Trata-se de criar uma situação intermédia entre a legítima defesa e o


estado de necessidade justificante.

 Em ambos os casos é de exigir, nos termos gerais, a presença de


elementos subjectivos, simultaneamente, de carácter intelectual e volitivo.

 Faltando os elementos subjectivos, e porque têm aquele duplo carácter


intelectual e volitivo, não haverá lugar à aplicação analógica do art. 38°/4,
pelo que o agente do crime deverá ser punível por crime consumado e não
apenas por tentativa.

ERRO SOBRE OS PRESSUPOSTOS DE FACTO

DE UMA CAUSA DE EXCLUSÃO DA ILICITUDE


Legítima defesa putativa
A situação de erro neste caso, é aquela em que existem os elementos subjectivos
de uma causa de justificação, mas ... faltam os seus elementos objectivos

Exemplo:
B aproxima-se de A
A pensa que B o vai agredir
A defende-se de B

 Nesta hipótese não existe o pressuposto objectivo da legítima defesa: a


agressão ilícita e actual,

 mas existe o elemento subjectivo: o animus defendendi

 A actua em erro sobre os pressupostos de facto de uma causa de


justificação (legítima defesa) e actua convencido que esse pressuposto se
verifica.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
Consentimento do ofendido putativo
O agente pensa que a vítima consentiu num crime de ofensas corporais simples.

 O agente está em erro sobre os pressupostos de facto desta causa de


justificação.

Posição do Código Penal (art. 16°/2)


Artigo 16º - Erro sobre as circunstâncias do facto
1 - O erro sobre elementos de facto ou de direito de um tipo de crime, ou sobre proibições cujo
conhecimento for razoavelmente indispensável para que o agente possa tomar consciência da ilicitude do
facto, exclui o dolo.

2 - O preceituado no número anterior abrange o erro sobre um estado de coisas


que, a existir, excluiria a ilicitude do facto ou a culpa do agente.
3 - Fica ressalvada a punibilidade da negligência nos termos gerais.

 Este artigo é incompatível com a teoria rigorosa da culpa.

 Em situação de erro sobre os pressupostos de facto de causa de


justificação, o agente não é punível pelo crime doloso, mas apenas pelo
crime negligente (art. 16°/3)

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António Filipe Garcez José

ERRO SOBRE A EXISTËNCIA OU LIMITES DAS

CAUSAS DE EXCLUSÃO DA ILICITUDE


 Trata- se agora de um erro distinto do erro sobre os pressupostos de facto
de uma causa de justificação (art.16°/2

Este erro está previsto no art. 17°

Artigo 17º

Erro sobre a ilicitude

1 - Age sem culpa quem actuar sem consciência da ilicitude do facto, se o erro lhe
não for censurável.

2 - Se o erro lhe for censurável, o agente é punido com a pena aplicável ao crime
doloso respectivo, a qual pode ser especialmente atenuada.

Exemplo:
Suponhamos que na Suécia existe uma causa de justificação do aborto que se
refere às condições sociais em que vive a mulher que o pratica, isto é, o aborto
será justificado quando a mulher não tiver condições materiais ou sociais para
sustentar ou criar um filho.
Ora em Portugal tal situação não é causa de justificação.
Suponhamos ainda que uma cidadã sueca vive em Portugal e realiza um aborto
por não ter condições para criar o filho. Ao mesmo tempo está convencida que a
legislação portuguesa, tal como a sueca, prevê uma causa de justificação.

 Esta cidadão sueca estará em erro sobre a existência de uma causa de


justificação.
 A relevância deste erro deve ser julgado mediante a avaliação do carácter
censurável ou não do erro, conforme o regime distinto previsto no art.
17°/1/2.

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António Filipe Garcez José

CULPA

 O princípio da culpa é um princípio implícito do sistema jurídico-


constitucional, pois deriva do princípio da essencial dignidade da pessoa
humana, consagrado no art. 1° da CRP.

Princípio da culpa
O princípio da culpa significa, por um lado, que uma pessoa só pode ser
responsabilizada criminalmente se tiver agido com dolo ou negligência; por outro,
que a pessoa que praticou um acto ilícito há-de ser imputável, isto é, há-de ter
liberdade de entendimento e de decisão para que lhe possa ser atribuída
responsabilidade.

Deste princípio resulta ...

- o afastamento da responsabilidade objectiva em direito penal.

- que não pode haver pena sem culpa

- Que a medida da pena não pode em caso algum ultrapassar a


medida da culpa. (art. 40°/2)

 O princípio da culpa tem uma génese retributiva, baseada nas teorias


absolutas

Para estas teorias ...

 A essência da pena criminal reside na retribuição, expiação, reparação ou


compensação do mal do crime.

 Para estas teorias a essência da pena criminal é ...

- função exclusiva do facto que se cometeu


- a justa paga do mal que com o crime se realizou
- o justo equivalente do dano do facto
- o justo equivalente da culpa do agente

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 Pune-se porque se pecou; punitur quia peccatum est (já lá dizia o velho Platão)
 A pena é vista como um castigo e uma expiação do mal do crime.
Qual o mérito das doutrinas absolutas ?

- O mérito irrecusável de terem erigido o princípio da culpa em princípio absoluto


de toda a aplicação da pena.

O direito penal é um direito penal da culpa

Culpa
O termo culpa é usado com diferentes sentidos:

a) Como imputação dos factos ao agente, com exclusão da


responsabilidade objectiva.

b) Como limite da pena, significado que se encontra na afirmação que a


pena deve ser proporcional à gravidade do facto e à culpa do agente.

c) Como categoria analítica, a culpa como juízo penal de tipicidade e


ilicitude.

Evolução da noção de culpa

Teoria clássica do crime (Beling e Van Lizst)

Para os clássicos, pelo conceito psicológico da culpa, esta era...

- a ligação psicológica entre o agente e o facto, que poderia ser de


dolo ou de negligência;

- o conjunto de fenómenos psicológicos que se desenrolavam no


interior do agente;

daí que ...

- a imputabilidade, seria pressuposto de culpa.

- o dolo e a negligência, seriam formas de culpa.

- O estado de necessidade, seria causa de exclusão da culpa.

- A consciência da ilicitude, seria um elemento da culpa

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António Filipe Garcez José
Teoria neo-clássica do crime (Frank)

A escola Neo-Clássica, através de Frank propôs um conceito normativo da


culpa. Para o conceito normativo de culpa, esta era definida externamente através
da ideia de censurabilidade.

A culpa é a censurabilidade, da qual fazem parte:

- a constituição psíquica normal do agente

- o dolo ou a negligência

- as circunstâncias em que o agente actuou

Teoria finalista do crime (Welzel)


Welzel elaborou o conceito de acção final, tomando por base uma perspectiva
ontológica.

 Só a acção humana representa um curso causal evidente, isto é, o homem


é o único ser capaz de antecipar mentalmente fins, de escolher os meios de
acção necessários para os atingir.

 Welzel identificou a finalidade como dolo e integrou-o no tipo de ilícito,


separando-o da culpa.

 O Dolo e a negligência, constituem o elemento subjectivo do tipo

 A consciência da ilicitude é vista como um problema de culpa

 Para Welzel no que toca ao erro sobre os pressupostos de facto de causas


de justificação, devíamos distinguir duas situações:

- se o erro fosse inevitável, excluiria a culpa

- Se o erro fosse evitável, não excluiria a culpa e o agente seria


punido pelo crime doloso de homicídio, embora a pena pudesse ser
atenuada.

Esta teoria de Welzel, é chamada a teoria rigorosa da culpa


A Teoria rigorosa da culpa de Welzel não mereceu consagração legislativa no
nosso Código Penal, como resulta do art. 16°

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
Culpa em sentido formal
Abarca o conjunto de elementos psíquicos do facto e que, num determinado
ordenamento jurídico, constituem os pressupostos de imputação subjectiva.

Culpa em sentido material


Tem a ver com as condições que importa reunir para fundar a imputação subjectiva
com base num determinado comportamento psíquico.

Culpa pelo facto


É a culpa que se manifesta estritamente no facto praticado pelo agente

Só o direito penal que acolhe a culpa do facto é compatível com o


princípio da necessidade da pena ! !

Objecto do juízo de culpa


É o facto ilícito, visto na perspectiva da atitude interna do agente

Qual o critério do juízo de culpa ?

- o critério a adoptar deverá colocar-se na resposta à seguinte questão...

- Se uma outra pessoa, colocada no lugar do agente, poderia ter


ou não actuado de outro modo?

 Trata-se de um critério decisivo ao qual se faz apelo para saber se há


exclusão da culpa na situação de excesso de defesa ou se há estado de
necessidade desculpante.

Elementos da culpa

a) Imputabilidade

b) Consciência da ilicitude

IMPUTABILIDADE

a) Inimputabilidade em razão da idade (art. 19°)

b) Inimputabilidade em razão de anomalia psíquica (art. 20°)

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José
FALTA DE CONSCIËNCIA DA ILICITUDE

Esta matéria está tratada nos arts. 16°/1 e 17°

CAUSAS DE EXCLUSÃO DA CULPA

1. Estado de necessidade desculpante (art. 35°/1) refere-se


exclusivamente à defesa do conjunto limitado de bens jurídicos
mencionados na norma :

- a vida
- a integridade física
- a honra
- a liberdade

2. Excesso de legítima defesa (art. 33°)

3. Obediência indevida desculpante

4. conflito de deveres (art. 36°)

A COMPARTICIPAÇÃO
Comparticipação
Consiste no envolvimento de vários agentes na prática do facto jurídico ilícito-
criminal

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comparticipantes
APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José

Autor material
Autores Autor mediato
Co-autores

Instigador
Participantes
Material
cúmplice
moral

AUTORIA
Autor (teoria do domínio do facto Klaus Roxin, Welzer )
Aquele que tem o domínio do facto. Quem tem o poder de conduzir o processo
até ao fim e de o fazer parar a qualquer momento. Quem tem em seu poder o
sucesso da acção ilícita.

 O autor tem o domínio do processo causal, quer positivo, porque é dele que
depende a prática de actos de execução, quer negativo, porque pode fazer
parar a execução do crime.

Autor material ou imediato (art. 26°, 1ª parte)


Aquele que pratica actos de execução do crime por si mesmo. Tem o domínio
positivo do facto, tem o domínio da acção.

Autor mediato (art. 26°, 2ª parte)


Aquele que pratica o crime através de outrem, Aquele que determina directamente
a realização de um crime utilizando, ou fazendo actuar, outro por si. Têm o domínio
do facto, pois têm o domínio da vontade do autor material, aquele que vai
executar o crime.

 A determinação pode ser por conselho, ameaça, violência, ordem pedido


etc.

 A responsabilidade do autor mediato não é afastada pelo facto do


executante ser inimputável.
Situações em que há autoria mediata

1. Sempre que é o autor mediato que tem o domínio da acção

2. Quando o autor imediato actua sem dolo

3. Quando o autor imediato é mero instrumento do crime.

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APONTAMENTOS SEM FRONTEIRAS
António Filipe Garcez José

Situações típicas de domínio da vontade (K. Roxin)

4. Indução em erro relevante (arts. 16°/1, 16°/2 e 17°)

5. Domínio de vontades débeis (art. 19°)

6. domínio de um aparelho organizado de poder a alto nível

7. coacção psicológica irresistível (art.35°)

Coautor (art.26°, 3ª parte)


É co-autor aquele que conheceu da actividade dos outros e colaborou
conscientemente nela, executando parcialmente o crime e por isso é responsável
por toda a actividade.

 Na co-autoria, basta provar a adesão de vontades de cada um à execução


do crime.

 Co-autores são os agentes do crime que têm o domínio do facto e cuja


actuação pode, a todo o momento, evitar que o facto seja praticado.

Para haver co-autoria exige-se que haja...

1. uma decisão conjunta

ou no mínimo ...

2. uma acção concertada

PARTICIPAÇÃO
Comparticipação
Consiste no envolvimento de vários agentes na prática do facto jurídico ilícito-
criminal.

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 a expressão comparticipantes abrange os participantes , ou seja, os
instigadores e cúmplices.

Instigação
O instigador cria dolosamente no autor uma vontade ex novo , convence outra
pessoa a praticar o crime.

Cumplicidade
É uma forma de participação criminosa que consiste em prestar auxílio ao autor do
crime; a participação do cúmplice não é determinante para gerar a resolução
criminosa.

Cumplicidade material
É a prestação de uma ajuda material para a execução do crime; o cúmplice
material ajuda materialmente na prática do facto típico e ilícito, fornecendo os
meios para a execução do crime.

Cumplicidade moral
É o auxílio moral à prática por outrém de um facto doloso (art. 27°/1). Trata-se de Comentário [Filipe41]: Artigo 27º
(Cumplicidade)
um conselho, um acto não determinante da prática do facto criminoso (se for 1 - É punível como cúmplice quem,
dolosamente e por qualquer forma,
determinante é autoria). prestar auxílio material ou moral à
prática por outrem de um facto doloso.
2 - É aplicável ao cúmplice a pena
fixada para o autor, especialmente
atenuada.

Não estejam tão tristes,


porque p ró ano há mais !
... e com mais sangue .
Ciao ! Boas férias !
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Tonybrussel

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Página 7: [1] Comentário [filipe11] tonybrussel 01/01/1900 00:00:00

Artigo 375º
Peculato

1 - O funcionário que ilegitimamente se apropriar, em proveito


próprio ou de outra pessoa, de dinheiro ou qualquer coisa móvel,
pública ou particular, que lhe tenha sido entregue, esteja na sua
posse ou lhe seja acessível em razão das suas funções, é punido
com pena de prisão de 1 a 8 anos, se pena mais grave lhe não
couber por força de outra disposição legal.

2 - Se os valores ou objectos referidos no número anterior forem de


diminuto valor, nos termos da alínea c) do artigo 202º, o agente é
punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.

3 - Se o funcionário der de empréstimo, empenhar ou, de qualquer


forma, onerar valores ou objectos referidos no nº 1, é punido com
pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, se pena mais
grave lhe não couber por força de outra disposição legal.

Página 7: [2] Comentário [filipe12] tonybrussel 01/01/1900 00:00:00

Do abuso de autoridade

Artigo 378º
Violação de domícilio por funcionário

O funcionário que, abusando dos poderes inerentes às suas


funções, praticar o crime previsto no nº 1 do artigo 190º, ou violar o
domicílio profissional de quem, pela natureza da sua actividade,
estiver vinculado ao dever de sigilo, é punido com pena de prisão
até 3 anos ou com pena de multa.

Página 7: [3] Comentário [filipe15] tonybrussel 01/01/1900 00:00:00

Artigo 28º
(Ilicitude na comparticipação)

1 - Se a ilicitude ou o grau de ilicitude do facto dependerem de


certas qualidades ou relações especiais do agente, basta, para
tornar aplicável a todos os comparticipantes a pena respectiva, que
essas qualidades ou relações se verifiquem em qualquer deles,
excepto se outra for a intenção da norma incriminadora.

2 - Sempre que, por efeito da regra prevista no número anterior,


resultar para algum dos comparticipantes a aplicação de pena mais
grave, pode esta, consideradas as circunstâncias do caso, ser
substituída por aquela que teria lugar se tal regra não interviesse.

Página 8: [4] Comentário [Filipe17] tonybrussel 01/01/1900 00:00:00

Artigo 148º
Ofensa à integridade física por negligência

1 - Quem, por negligência, ofender o corpo ou a saúde de outra


pessoa, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de
multa até 120 dias.

2 - No caso previsto no número anterior, o tribunal pode dispensar


de pena quando:

a) O agente for médico no exercício da sua profissão e do acto


médico não resultar doença ou incapacidade para o trabalho por
mais de 8 dias; ou

b) Da ofensa não resultar doença ou incapacidade para o trabalho


por mais de 3 dias.

3 - Se do facto resultar ofensa à integridade física grave, o agente é


punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até
240 dias.

4 - O procedimento criminal depende de queixa.

Página 8: [5] Comentário [Filipe20] tonybrussel 01/01/1900 00:00:00

Artigo 146º
Ofensa à integridade física qualificada

1 - Se as ofensas previstas nos artigos 143º, 144º ou 145º forem


produzidas em circunstâncias que revelem especial censurabilidade
ou perversidade do agente, este é punido com a pena aplicável ao
crime respectivo agravada de um terço nos seus limites mínimo e
máximo.
2 - São susceptíveis de revelar a especial censurabilidade ou
perversidade do agente, entre outras, as circunstâncias previstas no
nº 2 do artigo 132º.
Página 8: [6] Comentário [Filipe21] tonybrussel 01/01/1900 00:00:00

Artigo 132º
Homicídio qualificado

1 - Se a morte for produzida em circunstâncias que revelem


especial censurabilidade ou perversidade, o agente é punido com
pena de prisão de 12 a 25 anos.

2 - É susceptível de revelar a especial censurabilidade ou


perversidade a que se refere o número anterior, entre outras, a
circunstância de o agente:

h) Utilizar veneno ou qualquer outro meio insidioso;

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