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4.1.
C
questões que transcendem o
onsequentemente, embora
‘aqui e agora’, do momento de desejavelmente excedam
leitura destas páginas, ou seja, o âmbito da sua aplicação
aplicam-se a qualquer programa de restrita ao referido programa, as
reflexões das páginas que se seguem devem
Português para o Ensino Secundário;
ler-se como tomando em conta as referidas
e uma perspectiva que apresenta “opções fundamentais” do Programa; da
propostas de interesse imediato mesma forma, as sugestões de exploração
para a docência de um Programa pedagógica que finalizam este texto incidem
quase em exclusividade no domínio da
específico, o Programa e Metas
“educação Literária”, de forma a acompanhar a
Curriculares de Português – Ensino “valorização do texto complexo” e “valorização
Secundário, da autoria de Helena C. do literário” em que o Programa assenta.
1 Cita-se a introdução do referido Programa e Metas Curriculares de Português – Ensino Secundário, Janeiro de 2014 (atuali-
zado), da autoria de helena C. Buescu, Luís C. maia, maria graciete silva e maria regina rocha, p. 5. note-se desde já que
no âmbito deste capítulo do guião todas as referências / citações ao Programa de Português devem aplicar-se ao referido
documento.
4.2.
Considerações prévias e
conceitos fundamentais
E
ste capítulo procura comentar a As e os estudantes do ensino secundário
partir da Teoria Literária Feminista poderão, dentro do quadro da reflexão
conceitos estruturantes do sobre os usos de língua que é transversal
atual programa – a noção de aos domínios da Oralidade, Leitura e Escrita
género/genre e o texto complexo (aqui, trabalhar tópicos focados no capítulo
o literário) e apresentar uma reflexão sobre o ensino da Filosofia, como as da
de nível necessariamente introdutório emergência da linguagem inclusiva, a
sobre as questões do cânone. retórica do insulto sexuado ou a pretensa
neutralidade do emprego do masculino...
A última parte, necessariamente uma Remetemos para o texto de Graça Abranches
simplificação, destina-se a exemplificar e Eduarda Carvalho atrás citado para a
como a aplicação da reflexão sobre o explicitação destas e doutras formas de
cânone contribui para uma visão mais exploração da relação entre a linguagem e
complexa, mais ‘ampla’, da história da as desigualdades de poder genderizadas.
literatura portuguesa. Evidentemente,
muito mais haveria a apontar noutras áreas.
0122
122 CIG
ConheCimento e intervenção eduCativa: sugestões prátiCas ll
Cânone Literário e igualdade entre mulheres e homens l
4.2.1.
Género /Genre
U
.
m dos conceitos fundamentais Programa também usa na acepção
deste programa é o de de “género discursivo”), em língua
“género”. antes de mais, e
inglesa corresponde à palavra
para evitar confusões, há que
sublinhar que o conceito de “género” utilizado
genre. neste Programa e nos programas de
português em geral (assim como na maioria
frequentemente neste Guião é completamente
dos textos de Linguística e de estudos
distinto do conceito de “género” que, como
Literários) é uma unidade classificatória: um
vimos pelo excerto do programa já referido
género textual é um conjunto de textos que
(ver texto em caixa), integra as “opções
têm as mesmas marcas de organização
fundamentais” deste programa de português.
textual ou de situação de produção. grosso
modo, quando se fala do género/genre X (a
são dois conceitos totalmente distintos que na
anedota) isso significa que se considera que
língua portuguesa recebem a mesma designação:
existe um conjunto de textos orais e escritos
1. O conceito de “género” que X (o conjunto das anedotas) que se diferencia
ocorre noutros capítulos do Guião dos conjuntos de textos orais e escritos Y
(os convites de casamento) ou Z (as receitas
(conceito que em língua inglesa
de cozinha) pelo facto de todos os textos
corresponde à palavra gender) do conjunto X, as anedotas, manifestarem
– corresponde, como neles já foi repetidamente determinadas marcas de organização
explicitado, à específica dimensão identitária textual e/ou de situação de produção que
que consubstancia o impacto das expetativas não estão presentes nos textos Y ou Z.
(histórico-ideologicamente diferenciadas em temos assim que a situação discursiva X
função do sexo) aplicadas pela sociedade (ou: a situação de produção de textos X)
em que cada indivíduo vive a qualquer origina a forma de funcionamento da língua
indivíduo sexuado. estas expetativas sociais, correspondente, que por sua vez marca todos
que se articulam com outras expetativas os textos (X1, X2, X3, Xn) produzidos no
relativas a outras dimensões identitárias contexto da situação discursiva X – o género/
contextualmente relevantes (a idade, a genre X agrupa os textos X1, X2, X3, Xn.
etnicidade, a cor, a classe…) são constituintes
do eu pessoal e social de cada qual.
Ver a este propósito, o capítulo
2. Quanto ao conceito de “género” “Género e Cidadania” deste Guião.
4.2.2.
U
m dos contributos que a
disciplina que, como veremos Ressalve-se que, apesar de
adiante, se chama agora as empregarmos aqui para
Teoria Literária Feminista deu facilidade de exposição, não
para a Linguística e para as Ciências da é nem produtivo nem factual
Literatura foi possibilitar a investigação considerar como homogéneas as
da articulação entre a utilização da categorias “mulher” e “homem”,
comunicação de textos de vários géneros como se verá adiante.
(literários e textuais-discursivos)/genres
e a promoção, manutenção ou declínio
de contextos relacionais de género/ os códigos mais igualitários ou mais
gender marcados pela igualdade ou
sexistas que determinam o que se
desigualdade de oportunidades.
espera de homens e de mulheres
Conseguiu isso demonstrando que
moldam as situações de produção
tanto os textos complexos como
de textos e consequentemente
os não complexos, tanto os textos
também essas situações de
literários como os não literários,
produção genderizam (marcam
transportam com eles as marcas
quanto à igualdade ou desigualdade
das suas circunstâncias de
de género) os diferentes géneros/
produção, ou seja, não são textos
genres que lhes estão associados.
produzidos em vazio social. Para além disto há que considerar que,
Sendo cada sociedade uma realidade numa sociedade desigualitária em que tudo
atravessada ou determinada por relações é ‘para homens’ ou ‘para mulheres’, os
que são, entre outras, relações de género/ próprios géneros como genre são facilmente
gender promotoras de igualdade de genderizados, isto é, relacionados com o
oportunidades ou pelo contrário sexistas masculino ou com o feminino – por exemplo,
em diversos graus, os textos expressam as numa sociedade declaradamente sexista,
relações de poder entre homens e mulheres a canção amorosa é um genre feminino e
existentes; de facto, é um truísmo escrever o discurso político um genre masculino;
que a posição de qualquer texto sobre as consequentemente, tanto os cantores
relações de género reenvia para a sociedade românticos como as ativistas políticas são nessa
que o produziu. Esse reenvio existe porque sociedade julgados, quanto à observância dos
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CONHECIMENTO E INTERVENÇÃO EDUCATIVA: SUGESTÕES PRáTICAS ll
Cânone Literário e Igualdade entre Mulheres e Homens l