Este artigo discutirá a respeito das relações de trabalho modernas que
mantêm/herdam princípios coloniais de trabalho forçado. A escravidão é uma condição subumana imposta a um indivíduo, a qual lhe retira a liberdade e o transforma em uma coisa. É a coisificação das pessoas. A transformação delas em propriedade de outra pessoa. As pessoas submetidas a essa condição são tratadas como um meio ou objeto a ser arbitrariamente usado para este ou aquele propósito (usada para o desenvolvimento econômico de uma região ou país) e não, como um fim em si mesmo. A liberdade e a dignidade humana são usurpadas das pessoas submetidas à escravidão. O trabalho escravo se manifesta quando direitos fundamentais da pessoa humana são violados, como o direito a condições justas de um trabalho que seja livre na sua escolha e aceitação, mostrando-se assim como a negação absoluta do valor da dignidade humana, da autonomia e liberdade do trabalhador, transformado em coisas e objetos. Entende-se que os tratados internacionais e o art. 149 do Código Penal Brasileiro dão os contornos ao conceito de trabalho em condição análoga à de escravo. Como o trabalho escravo está, ao menos em tese, proibido no Brasil desde a Lei 3.353, de 13 de maio de 1888 (Lei Áurea), essa nomenclatura não se mostra a mais adequada para os dias atuais, dando lugar a diversas outras, tais como “trabalho escravo contemporâneo”, “escravidão por dívida”, “trabalho forçado”, “trabalho em condição análoga à de escravo”. A Instrução Normativa 91, editada pela Secretaria de Inspeção do Trabalho em 05 de outubro de 2011 e que dispõe sobre a fiscalização para a erradicação do trabalho em condição análoga à de escravo, define condições degradantes de trabalho como “todas as formas de desrespeito à dignidade humana pelo descumprimento aos direitos fundamentais da pessoa do trabalhador, notadamente em matéria de segurança e saúde e que, em virtude do trabalho, venha a ser tratada pelo empregador, por preposto ou mesmo por terceiros, como coisa e não como pessoa”. Essa Instrução Normativa dá ênfase à violação das normas de segurança e saúde laboral para o enquadramento de trabalho em condição degradante. Assim, trabalho degradante pode ser entendido como aquele em que se podem identificar péssimas condições de trabalho e de remuneração, ou seja, falta de garantia mínima de saúde, segurança, moradia, higiene e alimentação. Por exemplo, submeter trabalhadores a dormir em barracas de lona, sem banheiro, com alimentação escassa e precária, servindo-se de água imprópria para suas atividades normais, como beber e tomar banho pode ser entendido como condição degradante de trabalho. Ainda, submetê-lo à jornada diária exaustiva de trabalho, sem garantia de descanso semanal, pode ser entendida como trabalho degradante. Entende-se que todo trabalho forçado se enquadra como condição análoga à de escravo. Ademais, entende-se também que todo trabalho em condição análoga à de escravo é degradante. Porém, nem sempre todo trabalho tido como degradante é trabalho em condição análoga de escravo. Entende-se, então, que o trabalho em condição análogo à de escravo se materializará quando houver violação simultânea a dois princípios constitucionais: princípio da dignidade da pessoa humana e princípio da liberdade. Ausente à violação ao princípio da liberdade, o enquadramento como tal não será possível, muito embora esteja o empregador sujeito às autuações e penalidades cabíveis pela violação à norma trabalhista.