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Im prim ir ()

29/11/2017 - 05:00

O DNA libertário do herdeiro do capitalismo liberal


Por Marcos de Moura e Souza

A polícia precisa ser uma força do Estado?


Precisamos mesmo proibir o uso de toda e qualquer
droga? A Justiça não poderia ser uma ativ idade
priv ada? Por que deix ar que gov ernos se
encarreguem do sistema educacional? Para um
defensor radical do liberalismo como o americano
Dav id Friedman essas perguntas podem ser
respondidas de uma única forma: nenhuma O professor americano David Friedman: "No meu ponto de vista, nada deveria ficar sob responsab ilidade do Estado"
ativ idade precisaria ficar nas mãos do Estado.

Friedman é um acadêmico v eterano nos EUA cuja carreira tem sido marcada por posições que nem os liberais dos EUA acham fáceis de engolir. No Partido Republicano, por ex emplo, do presidente
Donald Trump, apenas um pequeno grupo gosta do que Friedman propõe, segundo ele mesmo diz.

Alguns o definem como anarcocapitalista. Ele gosta do rótulo de libertário. Filho do Nobel de Economia Milton Friedman, Dav id, hoje com 7 2 anos, passou quase duas semanas fazendo palestras pelo
Brasil. Seu "tour" foi bancado pela Students for Liberty , uma entidade que prega globalmente a autonomia da v ontade dos indiv íduos em v ez de um sistema de regras estatais. Outras entidades
também ajudaram no giro de Friedman por cidades brasileiras e um partido, o Nov o, organizou uma palestra a portas fechadas para seus filiados em Belo Horizonte. Na capital mineira ele também fez
palestra no Ibmec no período em que estev e no país, de 8 a 21 de nov embro.

Friedman está acostumado a polêmicas e as espalha por seus liv ros, palestras e aulas em univ ersidades americanas. Ele é professor emérito da Univ ersidade de Santa Clara, uma instituição jesuíta no
Vale do Silício, na Califórnia.

O professor parte de um ponto que, para liberais de modo geral, é questão número um: a iniciativ a priv ada dev eria ter mais liberdade de atuação e sofrer menos interferência estatal. Mas Friedman
v ai muito além. "No meu ponto de v ista, nada dev eria ficar sob responsabilidade do Estado", disse ele, em entrev ista por Sky pe, ao Valor.

Ele começa dando ex emplo do ensino. "Nos EUA, pelo menos, e talv ez no Brasil, se alguém propusesse que o gov erno produzisse todos os jornais e liv ros obv iamente seria uma má ideia, porque o
gov erno estaria controlando as informações para os adultos". Então, continua ele, o que pensar quando se tem o gov erno controlando as informações que são dadas para crianças e jov ens nas escolas
públicas. "A educação é uma área em que, particularmente, os gov ernos dev eriam estar fora."

Outro ex emplo é o dinheiro. "Não há uma boa razão para o gov erno controlar o dinheiro de seu país", diz Friedman, tax ativ o. "Um país poderia simplesmente decidir usar o dinheiro de outro país."

Friedman defende rev isões em longa lista de assuntos em que hoje o Estado decide - com mais ou menos ênfase, dependendo do país. As mais difíceis de implementar, av alia, seriam transferir polícia,
justiça e defesa nacional para a esfera priv ada.

A ideia foi defendida em seu primeiro liv ro, "The Machinery of Freedom, Guide to a Radical Capitalism", de 1 97 3. Cidadãos contratariam empresas que fariam serv iço de polícia; hav eria disputas de
mercado, o que lev aria à redução de preço e a serv iços melhores do que os de hoje; as empresas (e também os cidadãos) teriam interesse em ev itar que seus clientes entrassem em confronto, porque
lidar com v iolência seria sempre mais caro; mas se uma agência priv ada de policiamento não conseguisse se entender com outra, a questão seria resolv ida em uma corte, também, priv ada; que
poderia usar um código legal adquirido de outra empresa especializada por aquela comunidade.

"Não hav eria uma lei nacional. Seria um sistema polilegal, como os que ex istiram no passado", ex plicou Friedman.

O ideário libertário do qual o acadêmico é um dos porta-v ozes se baseia na liv re iniciativ a, no campo aberto para empresas priv adas se ex pandirem sem a burocracia e as amarras estatais. Seria
então de se supor que grandes conglomerados empresariais fossem fãs ardorosos de pessoas como Dav id Friedman.

"Por que seria de se esperar isso? Grandes empresas contam com a interferência de gov ernos a seu fav or", rebate o professor. A depender de seus interesses, algumas podem ser fav oráv eis a essas
ideias, diz. Mas Friedman pensa que propósitos libertários tendem a não fazer sucesso no "big business".

No modelo de priv atização pregado por libertários como ele, a defesa nacional também seria assunto regulado pelas leis de mercado. Uma condição básica - e uma dificuldade - dessas considerações
liberais seria a ex istência de muitas empresas disputando contratos. Seria o antídoto para cartelizações, diz Friedman.

"Essas coisas prov av elmente não acontecerão nas próx imas décadas no mundo físico. Mas isso pode estar já ocorrendo no mundo on-line. Há uma v ariedade de razões na tecnologia on-line que
tornam mais difícil que o gov erno controle as coisas", afirma. "Acho que estamos construindo um mundo em que os gov ernos não importarão muito, um mundo controlado por acordos priv ados."

Como encaix ar nessa idealização de sociedade famílias que hoje dependem de políticas de Estado de bem-estar social? A fatia mais pobre de um país como o Brasil seria beneficiada por esse modelo?

"Sim, claro. Cito um ex emplo: entendo que o Brasil tem um salário mínimo alto, o que significa que muitas pessoas mais pobres não conseguem emprego com carteira assinada e precisam ir para o
mercado informal. Se v ocê muda isso, os mais pobres se beneficiam." Outro ex emplo é o dos impostos sobre o consumo, que pesam mais sobre os mais pobres. "Uma redução sev era dos impostos iria
beneficiar pessoas pobres."

Friedman diz que não está familiarizado com a realidade brasileira, mas rebate o argumento de que redução de impostos e de arrecadação seria em si danosa, porque inv iabilizaria a continuidade de
prestação de serv iços públicos.

"A ideia generalizada que gov ernos são grandes para ajudar os pobres é em grande parte falsa. É em grande parte propaganda. Um ex emplo do próprio Brasil é sistema público univ ersitário, que tem
sido para serv ir a pessoas ricas."

Ele está longe de ter o mesmo prestígio no meio acadêmico que seu pai tev e. Milton Friedman, então professor da Univ ersidade de Chicago, foi laureado com o Nobel em 1 97 6 e foi um dos maiores
ex poentes do capitalismo liberal (ver Milton Friedman, defensor ferrenho do livre mercado). Dav id Friedman, que já lecionou em Chicago, Columbia, Cornell e outras, está na faculdade de direito de
Santa Clara desde 2005.

"Eu defendo algumas posições que meu pai defendia. Ele certamente me influenciou. Muitas das minhas v isões de mundo v ieram dele", disse. Ele cita uma questão, a da liberação das drogas, do qual é
um defensor. "No começo, quando eu era garoto, ele não era a fav or da legalização da maconha, mas depois ele mudou sua v isão sobre isso", conta Friedman. "Sobre uma sociedade totalmente
priv ada sua v isão era que talv ez funcionasse, mas prov av elmente não; e minha v isão era que talv ez não funcionasse, mas prov av elmente sim."

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