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José Antoniel Campos Feitosa é engenheiro civil e Analista em Infraestrutura de Transportes (DNIT).
Possui especialização em Gestão Pública e MBA em Infraestrutura de Transportes e Rodovias e em
Avaliações e Perícias de Engenharia. É certificado em Lean Six-Sigma (Green Belt).
antonielcampos@uol.com.br
2
Critão, extraído do livro Diálogos, de Platão (séc. IV a.C.)
Art. 37. A administração pública direta e indireta de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência.
Ensinam Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo3 que esse princípio costuma ser
tratado pela doutrina sob duas vertentes: i) como determinante da finalidade de toda
atuação administrativa e ii) como vedação a que o agente público se promova às custas
das realizações da administração pública. Na primeira acepção, vincula-se o princípio à
finalidade que deve ser buscada por todo e qualquer ato da administração. Visa-se o fim,
e o fim deve ser sempre o interesse público, sendo, por isso, o seu viés mais característico.
Desviando-se desse farol, incide em desvio de finalidade, vício que o anula. No segundo
olhar, é vacina das mais eficazes contra a promoção ou acomodação de interesses de
agentes públicos ou de terceiros àqueles jungidos.
É idêntica, nesse sentido, a lição de Hely Lopes Meirelles4, para quem o princípio
da impessoalidade
impõe ao administrador público que só pratique o ato para
o seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a
norma de Direito indica expressa ou virtualmente como
objetivo do ato, de forma impessoal.
Esse princípio também deve ser entendido para excluir a
promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos
sobre suas realizações administrativas (CF, art. 37, § 12)
3
Resumo de Direito Administrativo Descomplicado. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 12
4
Direito Administrativo Brasileiro. 42. ed. São Paulo: Malheiros, 2016, p. 97
5
Curso de Direito Administrativo, 32 ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 117
Não é, no entanto, o que se observa.
No fundo da bateia, fundidos no cadinho das contribuições genealógicas de nossa
formação, emerge o administrador mediano, misto de homem cordial — debalde o alerta
de Sérgio Buarque de Holanda6: “Estado não é ampliação do círculo familiar (...). Não
existe, entre o círculo familiar e o Estado, uma gradação, mas antes uma descontinuidade
e até uma oposição.” — e senhor da casa grande — o senhor de engenho na expressão de
Gilberto Freyre7 —, o suserano em sua “vida de rede. Rede parada, com o senhor
descansando, dormindo, cochilando. Rede andando, com o senhor em viagem ou a
passeio debaixo de tapetes ou cortinas”. Paternal para uns e carrasco para outros, tem
nessa bipolaridade a sua principal ferramenta de gestão. Imagina sobre si certa aura
messiânica, que a qualquer tempo virá em seu socorro quando a tomada de decisão se lhe
vier cobrar posicionamentos. Amalgamando interesses privados com interesses públicos
por desconhecer-lhes os limites ou, conhecendo-os, tomá-los por irrelevantes, atrai para
seu entorno aqueles de sua afeição ou de fácil obediência. Despiciendo é o arcabouço
técnico desses, porque mais vale as suas inclinações à subserviência. Sem traquejo com
o contraditório, com o choque de opiniões e a diversidade de pensamentos, busca naqueles
a concordância silente que oblitera a criatividade, mãe das soluções.
O princípio da impessoalidade, em cenário tal, há muito que agoniza.
É contundente o impacto na engrenagem que movimenta a Administração Pública:
Inexistem processos. Métricas são negligenciadas. Transparência somente para poucos.
A insegurança jurídica campeia e o que se tem, ao fim, é uma nau à deriva, ao talante do
administrador-navegante que sequer percebe o mar revolto em que navega.
Instala-se, por fim, o “modelo de administração por susto”, no dizer de Antônio
Carlos Orofino8.
É alto o preço que paga a Administração Pública em cenário tão pantagruélico e
ao mesmo tempo tão esquálido: é que o recurso, cuja escassez é caractere próprio9, uma
vez mal gerenciado, resta desperdiçado. Não há recebimento do objeto contratado, pois
não há execução de objeto. A impessoalidade afasta o capaz e banca o néscio. E esse, que
decerto desconhece o altruísmo socrático daquela madrugada histórica, tem em seus pares
meros critãos que, antevendo a responsabilização final por seus atos temerários, ajustam
entre si a fuga em massa por absoluto instinto de sobrevivência.
6
Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, p. 141
7
Casa Grande & Senzala. 48 ed. São Paulo: Global, 2003, p. 275
8
Processos com Resultados. Rio de Janeiro: LTC, 2014, p. 4
9
Rodrigo Luís Kanayama, in Orçamento público brasileiro, democracia e accountability, Revista dos
Tribunais, 2014, p.140.