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Seção VII

A díade terapeuta-
clíente: a interação
enquanto base para
a mudança
Capítulo 25

A interação terapeuta-cliente: uma


investigação com base na queixa clínica
loeehiine Martins d,i Silveira - UtL
R,uhei Rodrigues Kerlhiuy1- Instituto de Psicologu d,i L/niversidüde de Silo Pdulo

A última dócada tem sido criativa no desenvolvimento metodológico e na sofis­


ticação estatística para o estudo da Psicoterapia. Os resultados de muitos estudos têm
indicado:
1) a complexidade do relacionamento terapêutico,
2) a possibilidade de examiná-lo objetivamente e
3) de utilizá-lo na predição dos resultados da terapia (Hentschel & Bijleveld, 1995; Schindler,
Hohenberger-Sieber e Hahweg, 1989; Gardner, 1993; Czogalik e Russell, 1995 e
Canfield, Walker e Brown, 1991; Follette e Callaghan, 1995)

1. Pressupostos tradicionais no estudo da Psicoterapia

Freqüentemente, a Psicoterapia é analisada de maneira unidirecional por pesqui­


sadores, os quais dão ênfase à investigação da eficácia de técnicas e pacotes terapêuticos

' Bolsista CNPq.

Sobre comportamento e cogniç<lo 213


para o tratamento de patologias específicas. De acordo com essa tradição, a Psicoterapia
é interpretada como um conjunto deliberado de intervenções do terapeuta.
O pressuposto, segundo o qual o resultado da terapia depende exclusivamente da
aplicação de técnicas apropriadas, aplicadas pelo terapeuta, levou terapeutas
comportamentais a referirem-se a si próprios com expressões do tipo “engenheiros
comportamentais" ou “máquinas de reforçamento social" (Follete e Callaghan, 1995). Tais
expressões revelam uma visão do terapeuta como alguém cujo principal papel ó o de
modificar o comportamento do cliente, valendo-se de uma tecnologia do condicionamento
operante (Wilson e Evans, 1977). Krasner (1962, 1963) e Ferster (1979) chegaram a
reconhecer a importância do reforçamento social provido pelo terapeuta, entretanto, o
sucesso da terapia permaneceu sendo atribuído a uma tecnologia do condicionamento
operante (Sweet, 1984), em oposição a fatores específicos do relacionamento terapêutico.
Mais tarde, Kohlenberg e Tsai (1987,1991) e Rosenfarb (1992) propuseram a análise
desses fatores para instrumentalizar a própria intervenção terapêutica.
A pesquisa em Psicoterapia, durante algum tempo, dividiu o contexto clínico em
dois segmentos quanto aos fatores que contribuiriam para a obtenção dos resultados
terapêuticos: os chamados “fatores específicos", definidos como ações intencionais do
terapeuta (Gavino, 1996) e os “inespecíficos”, referentes a qualidades inerentes a uma
relação humana satisfatória, tais como empatia, aceitação incondicional. Em 1977, Wil­
son e Evans consideraram inapropriada a expressão “fatores não específicos" e propu­
seram sua substituição por "variáveis não especificadas". Esta segundo os autores, evita­
ria o carácter definitivo sugerido pela primeira. Dizer que algumas variáveis não são
especificadas ó diferente de considerá-las "não especificáveis". Portanto, há mais de
duas décadas, encontram-se na literatura críticas às formas tradicionais de interpretação
e análise do contexto clínico quanto à seleção das variáveis a ser estudadas.
Essa crítica parece ter se fortalecido com o tempo, de modo que, mais recentemen­
te, vários estudiosos têm chamado a atenção para o estudo de variáveis usualmente
ignoradas no contexto clínico. Beutler (1997) e Garfield (1997) destacaram a necessida­
de de se observar, ao se estudar a Psicoterapia, aquele a quem denominaram "variável
negligenciada": o terapeuta.

2. Haveria relações significativas entre o comportamento do tera­


peuta e o resultado da terapia?

Alguns estudos sugeriram que não (Sloane e cols., 1975; Kilman e Hoerll, 1974,
Marziali e Sullivan, 1980 apud Gavino, 1996). Marziali, Marmar e Krupnick (1981) apud
Gavino (1996) não encontraram relação entre os resultados da terapia e o comportamen­
to interpessoal do terapeuta.
Boa parte dos estudos que avaliam características ou habilidades do terapeuta ado­
tam entretanto, dimensões simples do comportamentos desses, permitindo que variáveis
relevantes permaneçam ignoradas. Contrariamente, Gold e Dole (1989) examinaram
dimensões globais da atuação de terapeutas treinados. As pessoas atendidas foram
solicitadas a avaliar quais profissionais lhes ofereceram maior ajuda, entre treinados e
não treinados. O estudo revelou que terapeutas treinados ajudam significativamente mais
do que profissionais não treinados. Stein e Lambert (1995) realizaram uma revisão da literatu

2 1 4 locclainc Martins da Silveira c Rachel Rodrigues Kerbauy


ra, examinando relações entre a experiência e treino de terapeutas e o resultado da tera­
pia. Com base nos estudos revisados, os autores afirmaram que terapeutas mais experi­
entes tendem a sofrer uma freqüência menor de abandono de terapia por parte de seus
clientes, se comparados a terapeutas mais treinados.
Admitindo que o comportamento do terapeuta tenha relevância na predição dos
resultados da terapia, tornam-se importantes as questões: O que controla o comporta­
mento do terapeuta? E quais variáveis estariam controlando seu comportamento durante
sessões de terapia?
Wielenska (1989) propôs o estudo do relato verbal para identificar relações funcio­
nais errtre comportamentos de uma terapeuta com suas clientes, usando sessões de
supervisão para a coleta de dados. Wielenska verificou que o comportamento da terapeuta
não havia sido controlado unicamente pelo comportamento das clientes. Fatores não
observáveis diretamente nas sessões também parecem ter exercido controle sobre o com­
portamento da terapeuta.
Há, contudo, a dificuldade de se selecionar metodologias de estudo que interfiram
pouco no curso natural da sessão ou do tratamento. Kerbauy (1996) considera que boa
parte das metodologias empregadas para se estudar a psicoterapia interferem no proces­
so terapêutico. Esse inconveniente parece contribuir com a manutenção de uma indesejá­
vel autonomia entre a prática de clínicos e pesquisadores. Por essa razão, há esforços
(Kerbauy, 1993, 1996) para se estudar os eventos que ocorrem na terapia por meio de
metodologias que concorram minimamente com o curso do tratamento.

3. Um relato de estudo da interação terapeuta-cliente com base


nas verbalizações da queixa clínica

A seguir, será descrito sumariamente um estudo de Silveira (1997)2que analisou a


interação de uma terapeuta com sua cliente, com base na queixa clínica. Considerando a
queixa um ponto estratégico para o exame da interação terapeuta-cliente, o estudo pro­
pôs-se a: analisar uma seqüência de verbalizações de um terapeuta e seu cliente com o
objetivo de identificar: a) o padrão de interação do terapeuta e do cliente em relação à
apresentação de queixa; b) variáveis controladoras do comportamento do terapeuta e do
cliente em relação à apresentação de queixas, identificando classes de verbalizações do
terapeuta em relação às queixas.
As participantes foram uma terapeuta (S1) e sua cliente (S2). S1, com formação em
análise do comportamento, 25 anos de idade e com três anos de experiência clínica,
durante os quais 30 casos clínicos foram atendidos e uma média de 10 casos, concluídos.
S1 atua em clínica particular e clínica-escola (pública) na cidade de Londrina, PR. A
terapeuta recebeu supervisões subseqüentes aos atendimentos. A cliente (S2), com 21
anos de idade, é estudante universitária. S2 procurou atendimento no Laboratório de
Comportamento e Saúde do Instituto de Psicologia da USP, por indicação da mãe que a
considerava abaixo do peso normal por apresentar problemas para se alimentar. S1 e S2
são primogênitas. Ambas são casadas e S2 tem uma filha.
Para coletar os dados, a terapeuta foi orientada a prestar atendimento
psicoterápico e teve as sessões supervisionadas por uma terapeuta com mais de vinte

1Estudo realizado sob orientação da Prola. Doutora Rachel Rodrigues Kerbauy, no Laboratório de Comporta­
mento e Saúde da Universidade de Sâo Paulo - SP.

Sobre comportamento c cognifAo 215


anos de experiência cl/nica. A delimitação do aspecto da interação terapeuta-cJiente a ser
estudado foi feita em uma etapa posterior, a fim de que se restringisse a interferência de
variáveis alheias à prática do terapeuta em situação natural. Na primeira entrevista, a
cliente assinou autorização, também assinada por S1, para utilização das sessões para
pesquisa e de se procederem gravações. Portanto, nessa entrevista, a terapeuta fez
anotações e informou a cliente sobre a rotina do Laboratório. Uma vez autorizado o regis­
tro para posterior análise das sessões, iniciou-se, na sessão seguinte, a coleta de dados.
As sessões foram gravadas em vídeo e gravador e a duração média das sessões foi de 60
minutos. As fitas foram transcritas com a identificação dos participantes e de suas
verbalizações na seqüência em que ocorreram. Durante os atendimentos, os equipamen­
tos para registro da sessão foram mantidos próximos da cliente e da terapeuta, podendo
ser vistos por elas.
Para tratar os dados, selecionaram-se as três sessões iniciais gravadas,
considerando que permitiam observar a seqüência das verbalizações registradas. Dividiu-
se as verbalizações, segmentando-se os registros em: verbalizações de queixa e
verbalizações da cliente sem apresentação de queixa.
Após a transcrição das fitas, enumeraram-se todas as verbalizações, identificando
o emissor (terapeuta ou cliente) e cada uma das queixas. Sendo elas: A (problemas con­
jugais); B (estados fisiológicos ou dificuldades para ingerir alimentos); C (dificuldades na
resolução de problemas do cotidiano tais, como fazer prova na faculdade); D (dificulda­
des no relacionamento com o irmão); E (dificuldades no relacionamento com a mãe); F
(dificuldades para tomar decisões); G (medo de enlouquecer e/ou perder o controle sobre
si mesma) e H (dificuldade em parar de fumar). A enumeração e identificação das
verbalizações permitiram verificar a freqüência com que foram apresentadas em cada
sessáo.
Dois temas de queixas foram selecionados para análise da interação terapeuta-
cliente: dificuldades para resolução de problemas do cotidiano (Queixa C) e medo de
enlouquecer ou adoecer e/ou perder o controle (Queixa G). O critério para seleção dessas
queixas foi a regularidade ao longo das sessões e o aumento da freqüência de apresen­
tação na terceira sessão em relação à primeira.
Foram delimitadas seqüências de verbalizações em cada sessão que se iniciaram
com uma verbalização de queixa e se encerraram com uma mudança temática ou com a
apresentação de uma nova queixa de tipo C ou G. Dessa forma, uma seqüência pôde ter
um número variável de verbalizações, como ilustra o exemplo seguinte: C-T-C-T-C ou C-
T-C-T-C-T-C-T (onde T corresponde a uma verbalização do terapeuta e C corresponde a
uma verbalização do cliente).
Uma unidade de análise, por sua vez, foi constituída por um conjunto de seqüênci­
as de verbalizações mencionadas acima. Assim, cada unidade de análise foi composta
por um conjunto de seqüências de verbalizações, tal como: C-T-C-T-C + C-T-C + C-T-C-
T-C-T, por exemplo. As seqüências foram agrupadas para constituírem uma unidade de
análise, conforme a continuidade temática das mesmas ao longo das três sessões. Con­
forme se verifica na Tabela 1, foram estabelecidas as unidades de análise I, II e III, com
base na continuidade temática referente à queixa C. As unidades de análise IV, V e VI são
oriundas das verbalizações relacionadas à queixa G. A Tabela 1 apresenta também a
organização das verbalizações que compuseram cada unidade de análise. Os intervalos
separados por pontos correspondem às seqüências de verbalizações delimitadas por
mudança temática ou pela apresentação de uma nova queixa de tipo C ou G.

216 locclainc Martins da Silveira e Rachel Rodrigues Kerbtiuy


Tabela 1 - Número e ordenação das verbalizações que compuseram cada unidade de
análise.

I 42-47. 152-155
II 58-61. 166-173
III 339-358. 377- 488. 505-506
IV 156-160. 248-253.277-450. 455- 458.
V 254-258. 283-289. 331-333. 421- 425.
VI 273-276. 309-317.

Foram registradas 515 verbalizações, distribuídas ao longo das três sessões


selecionadas para análise. Na sessão 1, dentre as 82 verbalizações da cliente, identifica­
ram-se 22 verbalizações de queixa. A sessão 2 foi composta de 53 verbalizações da
cliente, das quais 16 foram verbalizações de queixa. Durante a sessão 3, a cliente emitiu
122 verbalizações, das quais 28 foram verbalizações de queixa.
Verificou-se que as queixas C e G apresentaram um aumento de freqüência, en­
quanto que as demais queixas tiveram suas freqüências diminuídas na terceira sessão
em relação à primeira. Esse fato sugere a prioridade dos temas abordados nas queixas. A
Tabela 2 indica a freqüência de apresentação das queixas em cada sessão.

Tabela 2 - Freqüência de apresentação de queixas em cada sessão.

Queixas Sessão Um Sessão Dois Sessão Três

A 5 0 0
B 2 3 3
C 4 3 3
D 2 0 0
E 4 8 8
F 2 0 0
G 2 2 2
H 1 0 0

A Tabela 3 apresenta as classes correspondentes às intervenções da terapeuta em


resposta às queixas. O padrão de interação da cliente em relação às intervenções é tam­
bém apresentado no quadro. A Tabela 3 resume os padrões comportamentais de S1 e S2
identificados ao longo das três sessões.

Sobre lomporliimento c coflniç«lo 217


Tabela 3 - Padrão da interação terapeuta-cliente em relação à queixa clínica.

Terapeuta Cliente
Faz perguntas sobre o Descreve detalhes da queixa.
problema do qual a cliente
se queixa.

Provô atenção seletiva, Reapresenta queixa ou


fazendo perguntas somente apresenta queixa com
sobre aspectos incompatíveis outro tema.
com o problema.

Faz perguntas e/ou Descreve história de vida e


provocações, sugerindo história de aprendizagem de
condições sobre as quais a comportamentos-problema.
cliente não tem controle direto. (Portanto, apresenta
verbalizações que não
pertencem à categoria
“queixa”.)

3.1. Descrição resumida dos padrões comportamentais de S1 e S2 obser­


vados ao longo das três sessões

Comparando o padrão de interação da terapeuta e da cliente nas seis unidades de


análise, observa-se que alguns comportamentos estiveram recorrentemente relaciona­
dos. Inicialmente, em cada unidade, o comportamento da terapeuta esteve controlado,
predominantemente pela descrição de comportamentos ou situações-problema. Nessa
fase, fez perguntas que requeriam uma descrição da queixa em pormenores. Verificou-se
que a cliente reapresentou queixas e as descreveu em detalhes, em resposta a essas
verbalizações. Subseqüentemente, no curso da interação, a terapeuta enfatizou compor­
tamentos incompatíveis com a queixa, em detrimento de destacar partes das verbalizações
relativas a áreas não efetivas do comportamento da cliente. Não se verificou diminuição
da apresentação de queixas. Estas pareceram ser suprimidas somente quando a cliente
respondeu discriminativamente ao seu próprio comportamento, passando, então, a des­
crever a história de aprendizagem dos comportamentos-problema. Essa alteração ocor­
reu após a terapeuta ter empregado uma metáfora referente ao comportamento da clien­
te e à situação em que ocorria.

3.2. O que pareceu controlar o comportamento da terapeuta?

O controle do comportamento da terapeuta pareceu ser exercido inicialmente pela


descrição da queixa, o que se alterou durante as interações. Fatores somente observáveis
após análise da sessão, como a orientação teórica da terapeuta, pareceram exercer con­
trole sobre seu comportamento, no decorrer das interações. Esses dados estão de acordo
com os resultados do estudo de Wielenska (1989), os quais sugerem que o controle do

218 locelainc Martins da Silveira eRachel Rodrigues Kerbauy


comportamento de uma terapeuta com suas clientes pareceu ser exercido tanto pelo
próprio cliente quanto por fatores não observáveis diretamente na sessão.

3.3. Há um padrão de respostas da terapeuta

Observou-se um padrão de respostas da terapeuta às queixas nas unidades de


análise (baseadas em temas distintos). Isto sugere que o padrão de interação da terapeuta
seja invariável em relação ao tema da queixa, sendo o mesmo sempre que a cliente
apresentou verbalizações de queixa. O que é interessante para a pesquisa em psicoterapia,
uma vez que esse dado parece indicar a existência de regularidade na intervenção de
terapeutas. Pesquisas são necessárias para identificar a possibilidade de terapeutas des­
creverem a regularidade de seu próprio comportamento e o quão vantajoso isso seria
para o processo terapêutico e para a formação de novos terapeutas.
O procedimento adotado nesse estudo mostrou-se útil para o exame da interação
terapeuta-cliente e para a obtenção de dados referentes às variáveis controladoras do
comportamento de ambos os participantes durante a interação. O detalhamento que o
procedimento permite pode auxiliar na descrição de aspectos da interação usualmente
denominados "não-específicos", podendo ser considerado promissor para a análise do
comportamento de terapeutas proficientes e de terapeutas em formação.

4. Questões que esperam por respostas

O estudo relatado iniciou análises sobre a influência do conteúdo das verbalizações


do terapeuta na recorrência das verbalizações de queixa. Outras questões podem ser
acrescentadas. Como as intervenções diretivas e o emprego de metáforas interferem no
comportamento do cliente? Quais intervenções do terapeuta estariam relacionadas a com­
portamentos de esquiva do cliente? Haveria diferenças na recorrência da apresentação
de queixas, com terapeutas de orientações teóricas distintas? Finalmente, parece rele­
vante a comparação do padrão comportamental de terapeutas iniciantes com o apresen­
tado por terapeutas mais experientes, uma vez que estes últimos, presumivelmente, tive­
ram seu comportamento modelado na interação com seus clientes.

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Sobre comportamento e cogniçdo m


Capítulo 26

Os sentimentos na interação terapeuta-


cliente como recurso para Análise Clinica'
Mtirm Zihih d<i SHv,i /fhindJo

cliente recorre à psicoterapia, porque quer livrar-se de sentimentos doloro­


sos, conhecer-se melhor e ser mais feliz. O terapeuta, que depara com essas expectati­
vas, deveria, no mínimo, questionar-se sobre a possibilidade de ajudar o cliente. Para isso
se perguntaria: É possível conhecer eventos privados? Se a resposta for positiva, qual o
método apropriado? Uma vez conhecidos, ó possível mudá-los? De que forma a
psicoterapia poderia propiciar essas mudanças?
As respostas a essas questões náo devem ser apenas baseadas nas mudanças
observadas no comportamento dos clientes no decorrer da psicoterapia. O terapeuta
analista do comportamento deve conhecer os pressupostos teórico-filosóficos da abor­
dagem que fornece subsídios para sua análise e dá significado às suas intervenções
clínicas. Abib, 1994, no seu livro Teorias do Comportamento e Subjetividade, estuda o
pensamento de Skinner sobre eventos privados. O autor procura apontar e analisar as
respostas negativa e positiva de Skinner sobre a possibilidade de conhecer os eventos
privados. Abib assinala que Skinner, no decorrer de suas obras, abandona a idéia de

1 Trabalho apresentado no VI Latlnl Dies - II Congresso Brasileiro de Pslcoterapias Cognitivas - Rio de


Janeiro, março de 1999.

M.irid Zil.il) dü Silvd Rtiindilo


conhecer diretamente os eventos privados por meio do método experimental e convence-
se que todo o conhecimento de eventos subjetivos ó indireto e inferencial. “Epara realizar
esta tarefa, Skinner ofereceu instrumentos conceituais interessantes, como a teoria do
comportamento verbal, a teoria funcional do significado e a retomada de sua idéia inicial
de que eventos e respostas colaterais públicas de eventos privados sào importantes para
o conhecimento desses eventos - quando reafirma que o conhecimento do significado
passa pela interpretação da relação entre o comportamento e a situação." (Abib, 1994,)
Assim, a análise do comportamento encoberto além de possível, ó condição im­
prescindível para que o processo psicoterápico se desenvolva. Os comportamentos enco­
bertos do cliente são acessíveis ao terapeuta, principalmente por meio do seu relato ver­
bal ao descrever uma situação vivenciada. Ele fala de algo que lhe aconteceu, de seus
sentimentos, pensamentos e crenças. Ele dá ao terapeuta indícios de sua interação com
o meio e das contingências que estiveram presentes naquele momento. Porém, como
sinalizou Abib, 1994, não é possível decidir "se esses eventos como eram foram realmen­
te como hoje ele diz que aconteceram. (...) Mas isso passou, e sem dúvida, se não finge,
descreve o que sentia como se fora assim, sem consciência plena de que interpreta. É
com base em interpretações desse tipo que o pesquisador infere e conhece eventos priva­
dos". Isso eqüivale a dizer que o conhecimento dos eventos privados do cliente pelo
terapeuta ó sempre um processo inferencial. Essas dificuldades não devem desanimar o
psicoterapeuta, mas conscientizá-lo da natureza dos dados que são o objeto de sua aná­
lise clínica.
Segundo Kohlenberg, 1991, "De maior relevância para a psicoterapia do que a
atividade de sentir è o processo pelo qual nós aprendemos o que são nossos sentimentos.
Nós não nascemos conhecendo o que são as emoções mais do que nascemos sabendo
o que são árvores." Dessa forma, as dificuldades em conhecer os eventos privados do
cliente devem-se em parte, porque a expressão de sentimentos é decorrente de uma
aprendizagem social e pode surgir sob o controle de eventos públicos em detrimento das
experiências internas. Assim, esse mesmo autor afirma que a “sensibilidade do compor­
tamento verbal às contingências sociais pode facilmente resultar em dizer o que é racio­
nalmente apropriado, ao invés do que ê realmente sentido."
De fato, nem sempre o cliente tem consciência dos controles aos quais seu com­
portamento verbal está exposto. A consciência é desenvolvida a partir de contingências
estabelecidas por alguns segmentos da comunidade sócio-verbal, especialmente por pro­
cessos de autoconhecimento, como acontece na psicoterapia. Como disse Hayes, 1987,
para o homem é difícil identificar os controles da comunidade sócio-verbal, assim como ó
difícil para o peixe ver a água que o rodeia.
Sentindo a fragilidade de se trabalhar somente com o relato verbal como forma de
revelar os comportamentos encobertos do cliente, o terapeuta vai a busca de observar
respostas colaterais públicas que denotem estados emocionais e que possam aumentar a
fidedignidade do que ó relatado verbalmente.
Kohlenberg, 1991, ao falar sobre expressão de sentimentos, refere-se a um conti­
nuo de comportamento. Um ponto do continuo ó conhecido como falar de sentimentos.
Estes são operantes verbais cuja proposta é informar o ouvinte sobre os sentimentos do
falante. No outro ponto do continuo, estão as demonstrações de sentimentos ou reações
emocionais do falante (comportamentos respondentes não-verbais que são automatica­
mente eliciados). Localizados em diferentes pontos do continuo estão respostas que são

Sobro comport.imcnto c cogniç.lo 223


parcialmente respondentes, mas que também sâo modeladas pelas contingências.
A expressão de sentimentos pela comunicação, segundo Kohlenberg, é mais fácil
de discriminar, mas restringe muito o que a pessoa está sentindo. Falar do sentimento
também pode ser altamente idiossincrático, devido à ambigüidade do controle de estímu­
lo.
Demostrar sentimentos é mais vantajoso quando comparado a falar de sentimen­
tos porque está menos sujeito a contingências sociais e, então, parece ser mais espontâ­
neo e menos enganoso. Por exemplo, embora seja possível ao cliente dizer que não
sente raiva do terapeuta numa situação de frustração, é difícil para ele controlar as de­
monstrações corporais da raiva nesse momento.
É por essa razão que a Psicoterapia Analítico Funcional - FAP - (Kohlenberg e
Tsai, 1987) considera que demonstrar sentimentos ou reagir emocionalmente nas ses­
sões de psicoterapia é particularmente necessário e mais fidedigno como indicativo de
contato com variáveis importantes.
Além de verdadeiras, as reações emocionais na sessão são essenciais ao diag­
nóstico e tratamento psicológicos. Elas de fato caracterizam o processo psicoterápico e
tornam possível a modificação dos comportamentos do cliente. Não se contrapõem, mas
complementam a expressão verbal dos sentimentos.
Como as queixas psicológicas (geralmente comportamentos encobertos, como an­
siedade e sofrimento) são de origem interpessoal, a psicoterapia é um local que pode
trazer esses comportamentos à tona. Teoricamente falando, é importante que os compor­
tamentos clinicamente relevantes (Kohlenberg e Tsai, 1998) ocorram na relação terapêu­
tica. Tais ocorrências possibilitam ao terapeuta os procedimentos de observação e de
modelagem direta do comportamento na sessão, onde eles estão mais próximos em tem­
po e espaço do reforçamento.
Outra questão é a possibilidade de reforçamento natural, uma vez que os compor­
tamentos ocorrem na interação com o terapeuta. A questão das vantagens do reforçamento
natural na psicoterapia foi amplamente estudada e sua eficácia em estabelecer e manter
comportamentos é indiscutível.
É importante que se considere a psicoterapia como um ambiente natural, que des­
perte as aproximações e esquivas que são comuns no dia-a-dia do cliente. Assim, a rela­
ção terapêutica pode promover comportamentos operantes e respondentes, coerentes ou
opostos entre si, como, por exemplo, o cliente pode sentir afeto pelo terapeuta e afastar-
se dele.
Assim, embora possível, nem sempre é fácií e agradável para terapeutas e clientes
deixar que as reações emocionais venham à tona nas sessões. As emoções que são
evocadas pela psicoterapia podem ser dolorosas e tendem a ser evitadas por ambas as
partes. A esquiva emocional é geralmente o "problema" do cliente. Cabe ao terapeuta,
perante a ocorrência do comportamento, bloquear a esquiva do cliente, manter a situação
que causa a reação emocional até que essas respostas diminuam em intensidade. Se o
cliente “tolerar" bem suas reações emocionais, é possível conseguir uma redução na an­
siedade e promover o desenvolvimento de outros repertórios pela possibilidade de ter
contato com reforçadores distanciados até então pela fuga. Kohlenberg e Cordova, 1991,
descreveram o processo de tolerância emocional, mostrando em detalhes como se dá e
as conseqüências do processo de aceitação emocional. Brandão (1997), exemplifica esse
processo na Psicoterapia.
Uma outra razão de se trabalhar com reações emocionais ao invés do relato verbal

224 Maria Zilah da Silva llranitòo


dos sentimentos é porque pretende-se na psicoterapia, evitar o abuso do controle por
regras sobre o comportamento humano. Sabe-se que para o Behaviorismo Radical todos
os comportamentos (inclusive os encobertos) são em última instância modelados por con­
tingências e que o controle instrucional nem sempre é eficaz para mudanças emocionais.
É desejável que a aprendizagem de novos comportamentos na clínica passem por pro­
cessos de modelagem direta, permitindo aos clientes formular regras a partir das contin­
gências presentes na relação terapêutica.
Uma outra forma de mudar os encobertos seria a estratégia de Hayes (1987, inspi­
rada em Skinner, 1957), chamada d e "separar o eu observador do eu como conteúdo. "
Se a pessoa se vê como observador de seus sentimentos e não como os seus próprios
encobertos, ela poderá aceitá-los melhor porque não precisa se defender ou culpar-se por
"sentir seus sentimentos". "Eles são meus, mas não são ‘eu’."
Resumindo, a ocorrência dos comportamentos encobertos na sessão pode propici­
ar ao terapeuta as condições para efetuar as mudanças emocionais no sentido desejado,
de algumas formas. Por exemplo:
1. Evitando o excessivo controle instrucional ou por regras na psicoterapia.
2. Estabelecendo contingências, no próprio ambiente terapêutico, para a ocorrência
tanto dos seus comportamentos encobertos que indicam problemas como dos que
indicam melhoras clínicas.
3. Criando um ambiente especial como pano de fundo para a relação terapêutica. Um
contexto sócio verbal que permita ao cliente a recontextualização de suas queixas e
a observação de si mesmo de uma outra perspectiva.
4. Promovendo a compreensão do cliente de que é disfuncional e problemático tentar
fugir dos sentimentos.
5. Promovendo a aceitação emocional.
Muitas outras estratégias não citadas também são usadas com sucesso por terapeutas
no ‘tratamento’ de seus clientes.
Vivenciar ou fugir das emoções é um sonho ou pesadelo da humanidade, depen­
dendo do sentimento e do ponto de vista. Porém, evitar esses encobertos é impossível,
até o momento, para o ser humano. Isso acontece pela funcionalidade desses compor­
tamentos para evolução filogenética e cultural da nossa espécie. É difícil aceitar essa
condição humana. O comportamento verbal nos deu a esperança de que podemos nos
livrar sempre do que nos incomoda. É uma esperança provocada pelo contexto de
literalidade (Hayes, 1987): aceitamos o que dizemos e o que nos dizem como fatos e
nâo como comportamento verbal sobre o fato. No entanto, fugir dos encobertos (da
alegria ao sofrimento) é impossível, no sentido literal do termo.
O papel do terapeuta é fazer o cliente sentir-se forte na sua condição de ser
humano: sentir, pensar, agir e saber que todas estas instâncias comportamentais são
imprescindíveis.
Aumentar a tolerância emocional torna nossos clientes mais fortes (seu limiar
para o sofrimento aumenta), mais corajosos (seu comportamento de enfrentamento em
várias situações é mais provável), mais rico (vivência muitas situações que anterior­
mente evitava e aprende novos repertórios) e mais sábios (aprende a fazer análise das
contingências que afetam seu comportamento).
Desenvolver o "eu observador" amplia os horizontes do cliente que perde o medo
de se conhecer, admite mudar e fazer escolhas.
Como vimos, embora muitas questões não levem a respostas completas, ser

Sobrr romportiimcnto e cofiniçáo 225


psicoterapeuta ó um exercício diário de crescer e fazer crescer, fazendo perguntas e le­
vantando respostas na relação terapêutica e no referencial teórico da abordagem.
A seguir veremos um caso clínico que poderá exemplificar várias das questões
levantadas ató aqui.

Cliente: mulher, 38 anos, casada pela segunda vez há 8 anos, módica, nível socio
econômico médio-alto, terceira de quatro filhas mulheres de uma mãe viúva e de um
homem que foi “pai e marido ausente e inexpressivo" (sic).

Queixa: está tensa, ansiosa, angustiada, com medo de ter outra depressão (a primeira
foi há 9 anos, na época da separação do primeiro marido). Tem medo "um medo bobo"
de que o casamento acabe e venha a ficar sozinha por muito tempo e ató para sempre.

Dados sobre a Queixa:


Foram coletados a partir das seguintes fontes:
1) Relato verbal da cliente:
a) sobre seus sentimentos: Ex: Está com medo de ficar sozinha ou está sempre com
"nó na garganta" ou o "peito apertado"; sente amor pelo marido.
b) sobre seus pensamentos, suas análises, suas opiniões: Ex: acha que o marido
“ató que ó legal", o problema ó dela, que não sabe conduzir um relacionamento,
que ó muito perfeccionista e assim por diante. Desculpa o marido quando há uma
briga, alegando que ó "gênio" dele e que não ó de propósito que ele age assim.
2) Demonstração corporal de sentimentos e sensações:
A cliente fala baixo e lentamente, “chora", tem falta de ar e suspira ao falar das brigas
com o marido: evita e corta as verbalizações da terapeuta que façam referências a
algum comportamento inapropriado do marido.
3) Visão ou compreensão da terapeuta a partir da história de vida e do comportamento
atual da cliente:
A cliente ó passiva no relacionamento com o marido e raramente tem comportamen­
tos assertivos ou agressivos. Faz tudo para acertar as brigas e desfazer a “cara feia"
do marido, consegue isso depois de algumas tentativas, mas logo acontece outra
coisa que o deixa novamente insatisfeito. O marido muitas vezes se comporta de
modo agressivo, distante e frio com a cliente.
4) Comportamentos na relação terapêutica:
Cliente sensata, honesta, inteligente, assertiva, cheia de valores com relação a liber­
dade e igualdade dos seres humanos. Mostra ansiedade e medo de que seu mundo
vá ruir. Quer que a terapeuta dê força para ela enfrentar o problema e que, ao mes­
mo tempo, diga que o problema não existe.

Procedimento Terapêutico: Perante esses dados a terapeuta tem um dilema, isto 6,


precisa decidir entre duas análises aparentemente contraditórias, que levarão a enfoques
terapêuticos bem diferentes:
1) Cliente sente-se ansiosa e com medo porque sofre os efeitos da punição ou extinção
propiciada pelos comportamentos do marido. Embora a cliente não reconheça essas
contingências, suas reações corporais e sentimentos são obviamente oriundos de
esquemas aversivos.

226 Mdrid Zilah da Sllv«i Brandão


2) Os comportamentos de ansiedade da cliente estão sob controle de eventos aversivos
do passado: família e primeiro casamento. Com relação a família, os pais não ofere­
ciam segurança e apoio emocional, e no primeiro casamento o marido pediu a sepa­
ração por ter se apaixonado por outra mulher.
A terapeuta opta por agir em função da primeira alternativa e ó punida pela clien­
te. Sente-se como estivesse “fazendo a cabeça" da cliente contra o marido. Há resistên­
cia da cliente para ver os comportamentos inadequados do marido. Levada por essas
contingências, a terapeuta começa a trabalhar com a segunda hipótese e valoriza as
mudanças no comportamento da cliente, que vão de encontro ao que o marido, supos­
tamente, deseja. Esse processo dura seis meses e mesmo sem mudança no comporta­
mento do marido a cliente não reconhece seu fracasso em alterar as relações conjugais.
A terapeuta observa que a cliente, em casa, continua resistindo a ver os comporta­
mentos desprovidos de afetividade do marido. Nota que esse comportamento também
está ocorrendo na relação terapêutica. A cliente não quer ouvir as revelações da terapeuta
e do marido sobre a crise conjugal. É o momento de fazer a análise da relação terapêutica.
Nessa análise, a terapeuta descreve o que está vendo acontecer com o marido,
descreve como se sente na relação terapêutica e aponta que a cliente não está querendo
"entender" as dicas ambientais óbvias de que o marido está desinteressado na relação.
A cliente tenta se justificar, a terapeuta repete sua análise; a cliente chora, fala de
seus sentimentos de raiva, tristeza e desamparo. A terapeuta permanece com a exposi­
ção verbal aversiva até que a cliente pare de chorar, concorde com a análise e aceite
seus sentimentos.
A cliente vai para casa, conversa com o marido. Ele leva-a a dizer que o casa­
mento não está bom, concorda e pede a separação. Trinta dias após sair de casa
aparece publicamente com outra mulher. Depois de sessenta dias, a cliente está mui­
to bem, sente-se aliviada (redução dos estímulos aversivos) e até feliz (produto de
contingências agradáveis).
Conclusão: os sentimentos estavam certos, as verbalizações, argumentações e regras
da cliente eram enganosas, talvez fugas - esquivas da cliente para evitar a separação.
Fazer tudo o que ele queria e não produzir mudanças a fez se confrontar novamente
com seus sentimentos e tentar uma outra hipótese com a ajuda da terapia: será que ele
não me ama?
As "racionalizações" (as regras do T. e da cliente) muitas vezes encobrem a iden­
tificação e análise das contingências que de fato estão no controle do comportamento
humano. A desconsideração dos sentimentos da cliente e a incompreensão dos CRBS
podem ser consideradas falhas da terapia que prolongaram o processo. Por outro lado,
o caminho promovido permitiu o "teste da realidade" e um processo natural de amadure­
cimento da cliente. Ir muito rápido poderia levar à desistência, a cliente teria se sentido
agredida, no sentido de ter sua privacidade invadida.

Bibliografia

ABIB, J. A. Damásio. Teorias do comportamento e subjetividade na psicologia. São


Carlos: Editora da UFSCar, 1995.
BRANDÃO, M.Z.S. Terapia Comportamental e Análise da Relaçào Terapêutica: Estra

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CORDOVA, J. V.; KOHLENBERG, R. J. Acceptance and the Therapeutic Relationship.


In Jacobso, N. S.; Follette, M. V.; Dougher, M. . Acceptance and change: Content and
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HAYES, S. C. A contextual aproach to therapeutic change. In: JACOBSON, N. S. (Ed.),
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Guilford Press, 1987.
KOHLENBERG, R. J.; TSAI, M. A contextual approach to terapeutic change. In:
JACOBSON, N. S. (Ed.), Psychotherapists in clinicai practice: cognitive and behavioral
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.... Functional Analytic Psychotherapy: Creating intense and curative therapeutic
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SKINNER, B. F. Comportamento Verbal. São Paulo: Editora Cultrix, 1978.

228 M<ihii /il.ili d.i Silva Br.ind.lo


Capítulo 27

Relação terapêutica: o que


sabemos sobre ela?
/ iclcnc Shinofhmi
ruc'K:/

A psicoterapia é um processo complexo que acontece em um contexto


interpessoal, no qual terapeuta e cliente interagem-se num trabalho que visa aquisição
de autoconhecimento e mudanças.
A grande maioria dos terapeutas, hoje em dia, considera aceitável a idéia de que
a qualidade da relação terapêutica determina fortemente o processo psicoterápico.
O deslumbramento com um novo arsenal de técnicas bastante eficazes levou
muitos terapeutas a se tornarem meros aplicadores delas e se esquecerem do contexto
em que eram aplicadas. A relação não era importante, mas sim, a técnica. As qualida­
des pessoais teriam menos impacto sobre o processo terapêutico quão mais precisas
fossem as técnicas. Afirmações como essas eram freqüentes ató alguns anos atrás.
Houve também um tempo em que se acreditava na isenção de valores do terapeuta.
Uma revisão da literatura cognitivo-comportamental, sobre a importância da rela­
ção terapêutica, mostra-nos uma evolução desde uma não-ênfase nesse aspecto, ató
um fator relevante percebido como crucial pelos clientes e terapeutas. A relação tera­
pêutica dentro das abordagens cognitivo-comportamentais tem se tornado assunto de
maior interesse e discussão em publicações e congressos recentes.
Outras abordagens, no entanto, desde há muito, dedicaram-se ao estudo da rela­
ção terapêutica como variável determinante do trabalho terapêutico. Pesquisas de Sloane,

Sobre comportamento c coflniç.lo m


em 1975, citadas em Safran & Segai (1990), já demonstravam que clientes que tiveram
sucesso terapêutico reportavam como parte mais significativa do tratamento a relação
estabelecida com o terapeuta.
Mais recentemente, esse aspecto passou a ser foco de atenção para todas as
abordagens.
A análise de estudos nessa área fornece informações sobre a influência dessa
variável no processo de mudança e no sucesso terapêutico. A eficácia da terapia parece
estar diretamente relacionada não somente à adequada avaliação, análise e procedi­
mentos, mas aos aspectos interpessoais do contexto terapêutico ( Abreu & Shinohara,
1998).
Os estudos sobre fatores específicos ( conjunto de técnicas específico àquela for­
ma de terapia) e os não específicos (fatores comuns a todas as terapias) realizados por
Lambert, Shapiro e Bergin (1986, citados em Safran e Segai, 1990) concluíram que ape­
nas 15% das mudanças podiam ser atribuídas aos específicos e 45%, aos inespecíficos.
Pretendemos, portanto, discutir o papel dos processos inter-racionais na Terapia
Cognitiva, procurando ressaltá-los como recursos valiosos para uma rica formulação de
caso e adequado planejamento estratégico da terapia. Analisaremos, especificamente,
três aspectos: o objetivo da relação terapêutica, as características do terapeuta e o
processo de mudança.
Esses aspectos vêm sendo reformulados ao longo dos anos (Shinohara, 1997).
Podemos falar das décadas de 60 e 70 da Terapia Cognitiva de Beck em comparação
com as de 80 e 90, quando novos temas foram sendo incorporados e modelos mais
abrangentes, desenvolvidos.

1. O objetivo da relação terapêutica

Beck (1995) enfatizou a importância da natureza colaborativa da relação terapeuta-


cliente, já que esse contexto seria o mais propício a uma efetiva aplicação das técnicas.
Uma atmosfera de negociação amigável tornaria possível para o cliente fornecer
dados a serem investigados por ele, com a orientação do terapeuta.
Portanto, a interação terapêutica que se estabelece num clima de confiança per­
mite um acordo harmonioso que, por sua vez, facilitará o trabalho colaborativo e o
atingimento de metas.
Não podemos esquecer também do papel de modelo que o terapeuta acaba de­
sempenhando para o clientes, tanto para aprendizagem de habilidades específicas como,
vicariamente, para uma atitude perante à vida.
Mais recentemente, existe uma tendência para se utilizar a própria relação tera­
pêutica como instrumento terapêutico em si.
A relação terapêutica passa a ser vista como veículo central para revelação dos
esquemas interpessoais disfuncionais do cliente. É ali que a história do cliente é desco­
berta e assuntos como confiança, valia, dependência, etc. poderão ser conhecidos.
Os padrões interpessoais manifestados na relação terapêutica propiciam traba­
lhar, por exemplo, com os padrões de apego estabelecidos remotamente e com o signi­
ficado deles para o cliente.
Então, a relação terapêutica estabelece o terreno para se treinar o desenvolvi­
mento de relações interpessoais mais saudáveis e não somente para garantir o sucesso
das técnicas.

230 I Iclenc Shinohdrd


2. Características do terapeuta

Vários estudos procuram caracterizar habilidades ou atitudes desejáveis do


terapeuta. Beck, já em seus primeiros textos, sugere que calor humano, empatia acurada
e autenticidade sào características importantes.
Outros autores como Dobson & Block (1988), Blackburn (1996) e Kleine (1994,
citado em Rangé, 1995) ressaltam que o terapeuta deve:
- Ter habilidade para instruir, desafiar e reforçar os esforços do cliente de uma forma
não superior, mas de reciprocidade.
- Ter habilidade para ouvir e observar de uma forma objetiva, porém, empática.
- Ser diretivo, inquisidor e didático.
- Saber lazer perguntas que facilitarão a descoberta.
- Fazer uso criterioso do humor.
- Dar feedback apropriado, sumarizando o significado explícito e implícito do que foi
falado pelo cliente.
- Ter uma atitude criativa tanto para adaptar o tratamento para aquele indivíduo, quan­
to para usar e decodificar analogias, estórias, vinhetas e metáforas.
A essas habilidades ou qualidades acrescenta-se outras mais, na medida em que
as mudanças de estratégias váo ocorrendo e sendo necessárias.
Se o terapeuta vai trabalhar também com a própria relação terapêutica, autores
como Padesky (1993, citada em Blackburn & Twaddle, 1996), Mahoney (1997) e Guidano
& Liotti (1983) enfatizam que ele deverá ser capaz de:
- Fornecer uma base segura para exploração.
- Estar sintonizado com suas respostas, durante a sessão, assim como com as do
cliente.
- Escutar além das respostas para questões específicas e estar aberto para descobrir
o inesperado.
- Ajudar o cliente a integrar aspectos contraditórios e tolerar ambigüidade.
- Não se esquecer de relativizar as experiências. “Saber que o que é bom ou mau,
certo ou errado, sagrado ou profano, está sempre atrelado aos contextos individual,
social e histórico."
- Não permanecer seguro de que verdadeiramente saiba o que está errado ou o que
seria melhor para determinado cliente.
- Considerar sua presença emocional um fator facilitador poderoso e, portanto, dis­
pensar-se autocuidados.

3. O processo de mudança

3.1. O fenômeno da resistência

A princípio, a resistência foi considerada fenômeno não desejável, que deveria


ser trabalhado em termos de solução de problemas, para que não atrapalhasse o de­
senrolar da terapia.
Esta não-cooperação apareceria tanto devido a fatores relacionados ao cliente
(pessimismo, medo da mudança, incapacidade para assumir responsabilidade, falta de

Sobre comportamento e cognitfo 231


motivação, limitações biológicas, etc.) quanto relacionados ao terapeuta (erro na aplica­
ção das técnicas, avaliação inadequada das prioridades, inflexibilidade, etc.), e ainda
relacionados à relação (colisào das características pessoais de ambos, principalmente).
Atualmente, podemos observar novas compreensões da resistência como impor­
tante fonte de informação sobre a natureza das crenças, expectativas e comportamento
do cliente. As velhas estruturas cognitivas tendem a se preservarem, visando a manu­
tenção da estabilidade conhecida. A resistência tem, portanto, uma função autoprotetora
saudável, resguardando as estruturas de mudanças muito rápidas ou impactantes.

3.2. Ênfase da mudança

Observa-se inicialmente uma ênfase no desenvolvimento de estratégias de solu­


ção de problemas e alívio de sintomas. Terapeutas e clientes trabalham conjuntamente
para que sejam aprendidas habilidades de questionamento dos pensamentos automáti­
cos e de geração de alternativas para as crenças.
Com a extensão dos atendimentos em Terapia Cognitiva de transtornos do eixo
I para os transtornos de personalidade, novos focos de mudança precisaram ser atin­
gidos e mais atenção dispensada aos esquemas centrais. Temas relacionados à his­
tória de desenvolvimento destas crenças e ao processo de formação delas passaram
a receber ênfase na terapia. Compreender o funcionamento cognitivo do indivíduo,
das estruturas mais superficiais às mais centrais, facilita uma reestruturação cognitiva
significativa e revolucionária.
O tipo de perguntas feitas pelo terapeuta evidencia que ênfase está sendo dada e
quais estruturas cognitivas, atingidas.
Se, por exemplo, o pensamento: “As pessoas não me compreendem" estiver sen­
do discutido, o terapeuta poderá perguntar:
- Onde estão as evidências que o levam a pensar assim?
- Você poderia me dar alguns exemplos?
- Como você poderia testar essas hipóteses?
Ou ir além, buscando entender a extensão e utilidade da crença e trabalhá-la na
própria relação, perguntando:
- Que impacto esse pensamento tem sobre você?
- Como esse modo de pensar te ajuda?
- Você se sente incompreendido por mim?
Concluindo, se a qualidade da relação terapêutica interfere significativamente
nos resultados da terapia, se o terapeuta deve desempenhar um papel mais interativo
do que técnico com o cliente, se as mudanças pretendem ser mais significativas e
duradouras, ó imprescindível que estudos criteriosos sejam desenvolvidos para siste-
matização de todos esses fatores, que os novos terapeutas possam receber treina­
mento específico para esse novo papel e não simplesmente assumir que os aprende­
rão durante a supervisão e algumas leituras e que os terapeutas experientes se abram
para discussões a esse respeito, mesmo que elas produzam mais “agonias e incerte­
zas" do que "prescrições e manuais".
Voltando à pergunta inicial, infelizmente e, ainda, não sabemos muito sobre ela,

232 I lelene Shinoh«iw


não sabemos exatamente o caminho das pedras!
Bibliografia

ABREU, C. N. e SHINOHARA, H. Cognitivismo e Construtivismo: Uma Fértil Interface.


In: FERREIRA, R. F. e ABREU, C. N. (Org.) Psicoterapia e Construtivismo. Porto
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Company, 1995.
BECK, A.T., RUSH, A.J., SHAW, B.F. & EMERY, G. Cognitive Therapy of Depression.
New York: The Guilford Press, 1979.
BLACKBURN, I. M. e TWADDLE, V. Cognitive Therapy in Action. London: Souvenir
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GUIDANO, V. F. e LIOTTI, G. Cognitive Processes and Emotionai Disorders. New York:
The Guilford Press, 1983.
LEAHY, R.L. Reflections in Cognitive Therapy. In: Leahy, R. (Ed.) Practicing Cognitive
Therapy. London: Jason Aronson Inc., 1997.
MAHONEY, M. J. As Exigências Psicológicas quando se é um Psicoterapeuta
Construtivista. In: NEIMEYER, R. A. e Mahoney, M. J. Construtivismo em
Psicoterapia. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
RANGÉ, B. P. Relação Terapêutica. In: RANGÉ, B. (Org.) Psicoterapia Comportamental
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SAFRAN, J. D. e SEGAL, Z. V. Interpersonai Process in Cognitive Therapy. New York:
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SHINOHARA, H. Cognitivismo ou Construtivismo? In: Banaco, R. A. (Org.) Sobre Com­
portamento e Cogniçào. São Paulo: ARBytes, 1997.

Sobre comporlamcnlo c coftnlçJo 233


Capítulo 28

O caso clínico e a pessoa do terapeuta:


desafios a serem enfrentados'
Pen/s Roberto Ztimi$n,mi *
ruesr
"...muitas vozes é exigido do terapeuta que ele seja
uma pessoa isenta de sentimentos e preconceitos em relaçáo
aos clientes, aberta a qualquer problema que se lhe apresente.
Afinal, ele deve 'entender' tudo, em todos os significados
que a palavra 'entender' tem na língua portuguesa.
Mas ele também é uma pessoa que tem sua história de
reforçamento e, se quisermos analisar funcionalmente
seu desempenho profissional, devemos também
levar em conta seus sentimentos e pensamentos. “
(Banaco, 1993)

A análise do comportamento tem como seu objeto de estudo o comportamen­


to - relações entre um indivíduo que se comporta e o ambiente no qual ele está inserido.
A terapia derivada desta abordagem busca a explicação para a origem e manutenção
dos problemas comportamentais, assim como as condições para alterá-los, nestas rela­
ções (Banaco, 1997a). Se todo comportamento ó considerado como selecionado e
mantido peías reíações que o indivíduo estabeíece com o ambiente, não há porque
considerar um comportamento como patológico, já que a resposta do indivíduo ó sem­
pre adaptativa(Banaco, 1997). Pela mesma razão, é considerada incompatível com uma
análise behaviorista radical a atribuição de culpa ou julgamento de valor, já que não está
dentro do indivíduo a causa de seu comportamento.

' Trabalho apresentado na atividade "primeiros passos" durante o VIII Encontro Brasileiro de Psicoterapia e
Medicina Comportamental. Sâo Paulo, setembro de 1999.
3 Pontifícia Universidade Católica de Sâo Paulo. Perspectiva - Núcleo de Estudos em Análise do Comporta­
mento. Consultório; Rua Itapeva, 490 - cj. 56 - Sâo Paulo - SP. E-mail; d/am ig®lbm .net

234 l>eni* Roberto /«imiRnani


Em geral, a queixa apresentada pelo cliente na terapia ó resultado de controle
aversivo. Skinner, em Ciência e Comportamento Humano (1953), enumera uma série
de subprodutos de controle aversivo exercido pelo grupo social ou por agências religio­
sas, governamentais, familiares, etc. Entre estes subprodutos do controle estariam res­
postas abertas de fuga, revolta, resistência, assim como efeitos emocionais tais como,
medo, ansiedade, ira, raiva, depressão e outros padrões emocionais que constituem
parte do campo de trabalho do terapeuta (Skinner, 1953).
Parte do trabalho realizado pelo terapeuta analista do comportamento ó baseado
em relatos trazidos pelo cliente sobre as relações por ele vividas. O terapeuta procura
analisar os eventos relatados e, em alguns casos, sugerir formas de alterar as relações
estabelecidas. Uma outra parte importante deste trabalho ó desenvolvida a partir da
própria relação terapêutica. O terapeuta, como parte do ambiente do cliente, tem condi­
ções de observar o seu comportamento e contingenciá-lo de forma a desenvolver um
repertório que proporcione ao cliente desenvolver em seu dia-a-dia interações menos
aversivas que aquelas preexistentes.
O terapeuta, nesta relação, também é um indivíduo se comportando, e assim
como ele ó o ambiente imediato do cliente durante a sessão, o cliente é seu ambiente
que seleciona e mantém parte do seu repertório. No entanto, a relação de ajuda que se
estabelece será necessariamente desigual, já que o terapeuta é quem deve possuir
conhecimento necessário para a solução da queixa apresentada pelo cliente.
Para que a relação terapêutica estabelecida leve a mudanças efetivas no com­
portamento do cliente, as reações do terapeuta às respostas do cliente (sejam elas
“agradáveis" ou “desagradáveis”) não deve ser as mesmas disponíveis no ambiente
natural daquele, já que reações semelhantes tenderiam a manter o problema tal e qual
ele se apresenta. É preciso que a relação terapêutica seja um tipo de relação diferenci­
ada, na qual novas respostas possam ser aprendidas e experimentadas pelo cliente.
Uma das principais características da relação terapêutica que a diferencia das
relações estabelecidas fora do consultório foi descrita por Skinner (1953) como “audiên­
cia não punitiva". O terapeuta, enquanto procura entender qualquer padrão de respos­
tas apresentado pelo cliente sem qualquer julgamento ou atribuição de culpa, torna-se
um agente reforçador (Skinner, 1953). Para que isto ocorra, um dos pré-requisitos é que
o terapeuta seja desprovido de preconceito com relação a qualquer tema. Por outro
lado, outros requisitos serão necessários para que as conseqüências providas pelo
terapeuta levem à mudança do comportamento do cliente na direção desejada.
A literatura apresenta uma ampla gama de habilidades a serem desenvolvidas pelo
terapeuta iniciante. A grande maioria destas habilidades descritas diz respeito a técnicas
terapêuticas, habilidades de entrevista e outros temas relacionados principalmente ao
problema apresentado pelo cliente. Apenas mais recentemente, a comunidade científica
passou a discutir o papel da pessoa do terapeuta na relação terapêutica (Banaco, 1993).
Dentro do processo terapêutico, com base na análise do comportamento, o terapeuta
não é visto como um agente neutro. Ele possui, em primeira mão, uma teoria que sustenta
a sua análise, assim como todo um repertório profissional e pessoal que constróem a sua
forma de atuação clinica. As variáveis que controlam o comportamento do terapeuta,
portanto, não necessariamente limitam-se àquelas referentes à relação estabelecida com
o cliente e sua queixa. Muitas vezes, aspectos de sua história de vida podem levá-lo a
responder ao comportamento do cliente de forma diferente daquela esperada como pro­
fissional. O terapeuta pode responder, de forma “inconsciente" ao comportamento do clien­

*>obre comportamento e co^m ^o 235


te, no sentido de não saber descrever aspectos que controlam seu próprio comporta­
mento. Ele pode ignorar a respeito de si próprio os seguintes aspectos (Rose, 1997):
a) A pessoa pode não saber que fez alguma coisa. Este aspecto exige que o com­
portamento ocorra concomitantemente a um comportamento de auto-observação, o
que pode não ter ocorrido. Pode ocorrer também de o comportamento ter sido acom­
panhado do repertório de auto-observação, mas o controle de estímulos ter agido de
forma imprecisa sobre o comportamento descritivo.
b) A pessoa pode não saber que está fazendo alguma coisa. Por não estar acompa­
nhado do comportamento de auto-observação, o comportamento pode ocorrer de
forma totalmente inconsciente.
c) A pessoa pode nào saber que tende a, ou vai fazer algo. Este repertório descritivo
depende de que a pessoa tenha observado, ao longo do tempo, sob que variáveis
determinadas respostas teriam maior ou menor probabilidade de serem emitidas.
Conforme vimos, o repertório de auto-observação pode não ter acompanhado o com­
portamento no passado.
d) A pessoa pode náo conhecer as variáveis que controlam seu comportamento.
Da mesma forma que a auto-observação pode ser deficiente, as variáveis ambientais
responsáveis pela emissão de determinadas respostas podem ter exercido um con­
trole discriminativo fraco sobre o comportamento descritivo.

1. Terapia Comportamental e a pessoa do Terapeuta

As primeiras aplicações da análise do comportamento ao contexto clínico enfati­


zavam principalmente as técnicas como único fator de mudança. Chegava-se a idealizar
procedimentos terapêuticos nos quais a figura do terapeuta seria dispensável (Rangé, 1995).
A experiência, no entanto, mostrou a ineficácia deste tipo de proposta de intervenção.
Meyer e Turkat afirmavam, já em 1987, que, a menos que o clínico comportamental
pudesse dar conta da relaçào estabelecida entre ele e seu cliente, a tecnologia da terapia
do comportamento seria relativamente impotente.
O reconhecimento da importância da relação terapêutica no resultado da terapia
trouxe a necessidade de se compreender uma outra variável no andamento da sessão: os
sentimentos e emoções do terapeuta durante a sessão (Zamignani, 1996; Kovac, 1995;
Banaco, Zamignani e Kovac, 1997). Sendo a relação terapêutica uma contingência de
determinação recíproca, a atenção do terapeuta deverá também estar dirigida aos senti­
mentos que o cliente provoca em si próprio, além de estar atento aos comportamentos
abertos seus e do cliente (Meyer e Turkat, 1987).

2. As pesquisas sobre a relação terapêutica

A progressiva aceitação da terapia comportamental pela sociedade e o conse­


qüente envolvimento dos terapeutas comportamentais em casos clínicos mais comple­
xos afastou a pesquisa clínica do modelo rigoroso de pesquisa que vigora no mundo
acadêmico. Esse afastamento, além de propiciar uma mudança de postura diante da
aplicação clínica da teoria behaviorista, teria permitido o desenvolvimento de uma nova
área de pesquisa experimental sobre a importância da relação terapêutica no proces­
so terapêutico (Guilhardi, 1987).

236 Penis Roberto ZtimiRntini


Em busca de compreender quais as variáveis que poderiam determinar o compor­
tamento do terapeuta, algumas pesquisas procuraram investigar aspectos do comporta­
mento do cliente e seu efeito sobre o comportamento do terapeuta, utilizando o método de
dependência seqüencial (por ex: Bischoff & Tracey, 1995; Wiseman & Rice, 1989). Outros
pesquisadores têm buscado na análise da sessão terapêutica ou no estudo dos eventos
privados (sentimentos, emoções, pensamentos) do terapeuta a possibilidade de compre­
ensão das variáveis envolvidas na sua tomada de decisão durante a sessão (Banaco,
Zamignani e Kovac, 1997; Margotto, 1998). Esse interesse atual reflete uma mudança na
maneira com a qual os behavioristas, que se voltam para atividades aplicadas, lidam com
o seu objeto de estudo. A análise do comportamento, como uma ciência em desenvolvi­
mento, à medida que avança na sua compreensão sobre o comportamento humano per­
mite a elaboração de análises mais amplas e complexas sobre esse comportamento e,
conseqüentemente, sobre o processo terapêutico.

3. Sentimentos, Emoções do Terapeuta e Comportamentos Clini­


camente Relevantes.

Kohlenberg e Tsai (1987) desenvolveram uma técnica terapêutica enfocada basi­


camente na relação terapeuta-cliente, a Psicoterapia Funcional Analítica. Nessa técnica,
propõe-se que os comportamentos clinicamente relevantes (CCRs) sejam manejados quan­
do emitidos na própria situação terapêutica. Nesta situação, uma das estratégias para o
acesso a estes CCRs é a discriminação por parte do terapeuta de seus próprios sentimen­
tos e emoções evocados pelo comportamento do cliente.
Banaco(1993), discutindo a questão do manejo dos sentimentos do terapeuta na
sessão terapêutica, afirma que eles vão dar “pistas" para se compreender as contin­
gências estabelecidas naquela situação. Sendo as emoções do terapeuta importantes
estímulos discriminativos para o entendimento das contingências em vigor na sessão,
torna-se importante para a formação do terapeuta a instalação de um repertório
discriminativo de seus próprios sentimentos e emoções.
Uma seqüência retirada de entrevista realizada com um terapeuta inexperiente, em
uma pesquisa realizada sobre comportamentos encobertos do terapeuta durante a ses­
são (Zamignani, 1996a) ilustra a possível ocorrência de comportamentos encobertos como
precursores de outros comportamentos abertos e encobertos num episódio ocorrido na
sessão terapêutica:

"... Então perai, eu fico até meio brava (...) ela fica se esquivando, se esquivando,
isso vai me dando uma coisa de'p... se expõe mulher", entendeu? Então acho que
foi meio pra isso que eu fiz essa intervenção..." (Zamignani, 1996a)

Dados como este levantam a hipótese de que eventos internos como pensamen­
tos, sentimentos, e o processo de discriminação de sentimentos e emoções poderiam
estar participando de uma cadeia de determinação de comportamentos abertos ou en­
cobertos do terapeuta. A investigação desse processo comportamental seria necessá­
ria, principalmente para a compreensão das variáveis envolvidas na tomada de decisão
do terapeuta durante a sessão.
Banaco (1993) discute a dificuldade do manejo de questões que envolvem senti­

Sobrc lomporlcimcnlo c toRniviko 237


mentos e emoções pelo terapeuta iniciante. Esse autor comenta que alguns dos compor­
tamentos a serem emitidos pelo terapeuta são do tipo aberto e podem ser facilmente
treinados, através do seguimento de regras, ou modelados através de role-playing , ou
mesmo por modelação. Já o manejo de eventos do tipo encoberto, como pensamentos e
emoções sentidas pelo terapeuta durante a sessão, apresentam uma maior dificuldade
para o seu treinamento. Além disso, são dificilmente discriminados, principalmente pelo
terapeuta iniciante.

4. A supervisão clínica na formação do terapeuta

O trecho abaixo ilustra algumas das contingências presentes nos primeiros aten­
dimentos do terapeuta iniciante:

“1. O Comportamento de 'atender’ do terapeuta iniciante ainda não havia sido


exposto às contingências de reforçamento contidas na sessão e estava sendo
modelado, tendo, dessa forma, uma baixa probabilidade de ocorrência; pelo mes­
mo motivo, esse comportamento é inconsistente (hora aparece, hora não);
2. O terapeuta estava sob uma contingência aversiva de supressão condiciona­
da, onde a exposição do problema pelo cliente, associada à necessidade de um
bom desempenho profissional, sinalizam uma possível punição. Essa punição
poderia ser a perda do cliente devida à falta de repertório do terapeuta iniciante
para o comportamento de atender. No entanto, este terapeuta tem que emitir
algum comportamento, também para manter o cliente. Por esses motivos, seu
desempenho nesse atendimento pode ser caracterizado como exposto a um con­
flito esquiva-esquiva, já que o terapeuta age tentando evitar que a punição ocor­
ra. (Banaco, 1993, p. 72)"

A experiência do terapeuta acima descrito, provavelmente, não é muito diferente


daquela vivida por muitos de nós em nossos primeiros atendimentos. O fato é que, assim
como qualquer comportamento, o comportamento de atender precisa ser modelado, ou
seja, precisa ser exposto às contingências para que a seleção ocorra. No entanto, algu­
mas contingências extra-sessão podem minimizar as perdas envolvidas ou mesmo evitar
que a classe de respostas “atender" como um todo entre num processo de extinção.
A supervisão clínica é a forma mais usual de treinamento formal de terapeutas. O
contexto de supervisão clínica permite o entendimento e reavaliação do processo de
tomada de decisão do terapeuta, já que nessa situação algumas variáveis de controle
do seu comportamento são explicitadas. Um dos papéis importantes dessa atividade é
auxiliar na discriminação do terapeuta entre aqueles aspectos de sua atuação que di­
zem respeito ao comportamento do cliente e seu processo terapêutico e aqueles que
dizem respeito ao conhecimento do terapeuta com relação ao tema ou ainda entre aqueles
que são devidos a contingências passadas ou presentes da sua própria história de vida,
não relacionados à sua relação com o cliente.
Numa pesquisa realizada em 1996 (Zamignani; 1996b) foi estudado o processo de
supervisão clínica através da análise de três sessões terapêuticas em seqüência e duas
sessões de supervisão ocorridas entre elas. As sessões foram gravadas e transcritas e, a

238 Denis Roberto /amiftn<ini


partir delas, foram analisadas seqüências de relato verbal. Numa das sessões de supervi­
são analisadas, o terapeuta relatou ao supervisor sentimentos de impotência ocorridos na
sessão.

SA82. "T1. A sensação que eu tive ô assim: a gente tava fazendo um monte de
perguntas, parece que eu e o T2., a gente tava assim, dois Sherloques, a gente
tentando saber: e aí, você sente o quê ? Quando ó assim, você pensa o quê,
você faz o quê? A gente tava fazendo aquela investigação, colocando isso tudo,
e a gente não respondeu nada pra ela... e a í eu precisei de um tempo pra falar
assim: eu não preciso responder nada pra ela(...) E no final da sessão, sabe
quando vocô fica presa? Eu sentia um aperto no peito. Fiquei muito chateadaf...)
De achar que eu não posso fazer nada. De achar que realmente... coitada., ela
sente isso há onze anos, a outra também, ter que sobreviver com cento e cin­
qüenta reais, que coisa horrível, ela nào consegue fazer. De achar que... elas
duas falando aquele monte de coisas pra mim, que é super sério, é a vida delas
(...) e pensar assim: o que que eu vou fazer com isso?"

Com a entrevista a respeito deles, o supervisor foi capaz de tornar a contingência,


na qual o terapeuta esteve envolvido durante a sessão, mais clara. No episódio em
questão, esse sentimento era resultado de contingências nas quais o cliente continua­
mente rejeitava as interpretações e sugestões apresentadas pelo terapeuta durante a
sessão. O terapeuta tinha seu comportamento de “responder às perguntas do cliente"
exposto a um processo de extinção - a emoção resultante (impotência) correspondia
então a esta contingência aversiva. A análise realizada na supervisão sobre essa con­
tingência permitiu que o terapeuta respondesse de modo diferenciado na sessão se­
guinte. Nela, quando a cliente comparece e responde novamente de forma semelhante
à sessão anterior, a resposta aberta emitida pelo terapeuta ó outra...

“C1... tá sendo assim meio complicado, sabe? Porque aconteceu uma coisa inte­
ressante que tá me dando uma, assim, empolgação, mas não sei se pode ser
uma grande besteira. Uma grande, assim, ... há ... como se diz ... entrar pelo
cano. Sabe assim ter ... assim uma coisa assim ... mas pelo menos está me
levantando o astral, né? Na semana passada ...eu, nào ...No dia das mães meu
pai falou : - Ah, vou te dar uma ajuda, no negócio da Natura. Vou colocar na
Folha, na Revista da Folha, sabe?, um anúncio para vocô.' E ele colocou tudo.
Teve muito pouco retorno. Tinha gente que me ligava, pedia as coisas e não vinha
buscar. Tá bom. Ai passou ...Na semana passada, ligou um moço. Ele falou:
Eu estou interessado em uns produtos da Natura, nó?’ A i eu falei: - Ah, então...
tudo bem!', mas eu fiquei com medo, sabe quando a gente fica meio assim, nó?
Eu falei com minha máe, n ó ...
T1. Medo do quê?
C l. Hoje ele me ligou novamente. A i ele falou: - Olha ... eu ... tô gostando de
vocô. De conversar com vocô. Eu acho sua voz é muito sensual ...'E u falei: -
Parece... sabe que eu tô precisando de um amigo?', falei pra ele, nó? E ...só que
aquilo...?... e eu fui e pá, e tal. - Cê tá louca. Cê tá pondo coisa na sua cabeça.'
Mas pelo menos hoje... hoje eu fico em casa. Hoje eu nào vou...?...
T1. Hoje não va i...

Sobre comportamento e coftnlfJo 239


C1. Ele falou assim: - Ah, faz assim ... vai lá embaixo. Fica lá embaixo no
prédio, me espera lá embaixo. Eu nào tenho revólver.' Eu pensava: - Ele não
tem. Ah, eu tenho dois filhos, heim I Né?' É só uma brincadeirinha, sabe? Mas
aquilo tá me levantando, sabe? Sabe quando é uma coisa assim ... que eu tô...
eu nem sei como ele ó, como vai ser, como não s e i... mas pelo menos ... e u ...
isso... encontrei um amigo, sei lá. Se é uma papagaiada total. Se ele tá a fim de
rir da minha cara. Eu não sei, cê entendeu?
T1. Só vendo, né? "
Em outro episódio da mesma sessão...
TC1. “C1. Ah, você fica assim, sem ... é como eu falei, eu tenho uma familia
e nào tenho. Por exemplo, você nào tem uma família, você entendeu? Eu tô
dizendo, você não criou uma .... você não casou, né? Você não casou, nào tem
filhos, é isso que eu tô falando. Você tem pai, mãe, tem uma família e tal. Eu
construí uma familia, nó? Tão entendendo o que eu tô dizendo?
TC2. T1. Ainda não, mas continua.
TC3. C l. Ah é, não tão entendendo. Eu saí da minha casa, construí uma
família e tenho um pedaço dela. Que tá lá, né? Tem os dois filhos, só que eu não
tenho o complemento daquilo.
TC4. T1. Ah, isso eu entendi."

Nesses episódios, ocorridos na sessão seguinte, a terapeuta não responde aos


pedidos da cliente, mas ao contrário, pede mais dados sobre o tema trazido, modificando
a contingência. Provavelmente, os sentimentos do terapeuta nessa sessão, se investiga­
dos, seriam diferentes.
Esse exemplo permite algumas conclusões sobre a importância do treino
discriminativo oferecido pela supervisão clínica. O terapeuta respondia não apenas às
contingências da sessão ou da história de vida do cliente, mas à estimulação aversiva
gerada na sessão devido à sua exposição a contingências semelhantes no passado. 0
trabalho desenvolvido pelo supervisor permitiu o desenvolvimento de um repertório alter­
nativo àquele apresentado anteriormente. Através da supervisão, portanto, além de de­
senvolver as habilidades no manejo da teoria e de técnicas terapêuticas, o terapeuta
aprendeu a responder de forma adequada a aspectos de sua história de vida que são
trazidos pelo responder do cliente.

5. Conclusão

O terapeuta comportamental é, antes de mais nada, um indivíduo em interação


com seu meio ambiente. Como tal, tem sua história de vida, seu treino específico, etc. e
está sujeito a todo um conjunto de variáveis ambientais que controlam o seu comporta­
mento. Entender como cada uma dessas variáveis agem na determinação do comporta­
mento do terapeuta, não só durante a sessão terapêutica mas também na análise que ele
realiza sobre os dados do cliente fora da sessão, é uma tarefa fundamental. A descoberta
dessas variáveis pode permitir o desenvolvimento de novas tecnologias de treinamento
profissional, em busca de uma atuação mais efetiva.
É sabido que a validação da aplicação da análise funcional em contexto clínico ó
ainda bastante controvertida (Sturmey, 1996). Da mesma forma, os procedimentos dela

240 Denis Roberto /.imifin.ini


derivados precisam de muitos estudos para que sua eficácia seja mais garantida. Mes­
mo aqueles de comprovada validação apresentam uma enorme variedade de aspectos
ainda por serem avaliados e discutidos.
No entanto, a análise do comportamento aplicada ao contexto clínico obteve avan­
ços importantes ao olhar para a interação entre os dois componentes da relação terapêu­
tica, ao invés de atentar unicamente para as variáveis do cliente (Guilhardi e Queirós,
1997; Delitti, 1997; Meyer, 1997). Deixamos de olhar para o cliente como um conjunto de
respostas, e olhamos para o comportamento como um todo. Da mesma forma, deixamos
de olhar para o terapeuta como um liberador de reforços ou um aplicador de procedimen­
tos. Vale lembrar que grande parte das contingências presentes no atendimento clínico
são verbais. Skinner, a respeito do comportamento verbal, lembra que o seu entendimento
deve ser voltado para o episódio verbal total, ou seja, a interação entre o comportamento
do falante e o ouvinte, e não qualquer um deles isolados (Skinner, 1957).
Ainda estamos distantes de uma compreensão acurada do processo terapêutico
em todas as suas dimensões, o que inevitavelmente exige pesquisa. Exige respostas a
perguntas como: Que tipo de repertório deve apresentar o terapeuta para tornar-se uma
audiência não-punitiva? Se, quando, e como utilizar técnicas aversivas, e que tipo de
interação terapêutica proporciona a efetividade deste tipo de recurso terapêutico? Que
tipo de repertório pessoal deve apresentar o terapeuta de modo a levar o cliente a aderir às
suas propostas terapêuticas? Que bases teóricas seriam fundamentais para o atendi­
mento clínico? Estas e outras questões são desafios colocados ao analista do comporta­
mento. Permanecem sem uma resposta precisa e são intimamente ligadas a uma melhor
compreensão da pessoa do terapeuta na relação terapêutica.
O crescimento desta abordagem depende que a integração entre a teoria, a prática
e a pesquisa seja uma meta constante. O resultado deste movimento, em última análise,
levará a uma teoria mais coerente com o fenômeno estudado, assim como a uma prática
mais efetiva.

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