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CONRADO HÜBNER
05/03/2018 - 08h00 - Atualizado 05/03/2018 12h43
Misturam-se na discussão três tipos de argumento: (i) o institucional, que examina qual
é a política salarial adequada para um Judiciário competente e independente, ou seja,
que atraia gente preparada, vocacionada e que não se renda às tentações materiais da
corrupção; (ii) o moral, que determina o que é um salário justo no contexto da
desigualdade brasileira, não em abstrato; e (iii) o jurídico, que olha a lei e verifica quem
tem direito a qual remuneração.
Para que o benefício seja legítimo, juízes precisariam ganhar o duelo de razões em pelo
menos uma das três frentes. No debate institucional, devem nos convencer de que não
podem atrair candidatos capazes e incorruptíveis se não oferecerem, como fazem hoje,
renda superior à dos juízes das maiores economias do mundo (como Estados Unidos,
Alemanha e Inglaterra). No debate moral, devem lidar com o fato de que mais de 99%
dos brasileiros têm renda menor que magistrados e mais de 90% têm renda menor que
essa “ajuda de custo”. Se está defasado, está em relação a quem e a quê?
Há quem evite esses dois debates, mas ainda persista no terceiro. O auxílio seria
“imoral, mas legal”. Será? No plano jurídico, o Judiciário precisa sustentar que o
pagamento indiscriminado e universal do benefício corresponde a uma interpretação
aceitável do Artigo 65, ii, da Lei Orgânica da Magistratura, que originalmente criou o
benefício para custear a moradia daqueles juízes alocados em comarcas remotas. Deve
também nos persuadir de que “disfarçar reajuste” por via torta é opção legal. Ainda,
deve explicar como deixar de pé um benefício que, por ser “indenizatório”, dribla o
teto constitucional e o Imposto de Renda numa mesma tacada. Um truque bem melhor
que simples reajuste, portanto.