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MÓDULO V

RESPONSABILIDADE CIVIL NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

5.1. Distinção entre vício e defeito

* O CDC contempla duas modalidades de responsabilidade civil do fornecedor, quais


sejam, o vicio e o defeito do produto e do serviço.

* Entretanto, existem diferenças consideráveis entre as duas modalidades de


responsabilidade do fornecedor, sendo necessário delimitar o alcance de cada uma no
caso de haver o dever de indenizar.

* A responsabilidade civil nas relações de consumo divide-se em responsabilidade por


defeito e por vício. Será considerada responsabilidade por defeito se houver problemas
referentes à insegurança (art. 6º, I, do CDC) e responsabilidade pelo vício, se o dano
for ao patrimônio (art. 6º, VI, do CDC).

* Vício:

 São considerados vícios as características de qualidade ou quantidade que


tornem os produtos ou serviços impróprios ou inadequados ao consumo a que se
destinam e também diminuam o valor.
 O vício está diretamente relacionado com a proteção do patrimônio do
consumidor
 Os vícios são problemas que por exemplo: - fazem com que o produto não
funcione adequadamente, como um liquidificador que não gira; - fazem com que
o produto funcione mal, como a televisão sem som, o automóvel que “morre”
toda hora
* Defeito:
 O defeito pressupõe o vício. Há vício sem defeito, mas não há defeito sem vício.
O vício é uma característica inerente, intrinseca do produto.
 O defeito é o vício acrescido de um problema extra que causa um dano maior
que simplesmente o mau funcionamento, o não funcionamento, a informação
inadequada.
 O defeito causa além desse dano do vício outros danos que podem ser material,
moral estético.
 O defeito está diretamente ligado à proteção da vida, saúde e segurança do
consumidor.

* Exemplo prático: Dois consumidores vão à concessionária receber seu automóvel


zero-quilometro. Ambos saem dirigindo seu veículo alegremente. Os consumidores não
sabem, mas o sistema de freios veio com problema de fábrica. Aquele que sai na frente
passa a primeira esquina e segue viagem. No meio do quarteirão seguinte, pisa no
“breque” e este não funciona. Vai, então, reduzindo as marchas e com sorte consegue
parar o carro encostando-o numa guia. O segundo, com menos sorte, ao atingir a
primeira esquina, depara com o semáforo vermelho. Pisa no breque, mas este não
funciona. O carro pasas e se choca com outro veículo, causando danos em ambos os
casos.
O primeiro carro, como o problema está só no freio do veículo, é de vício. No segundo,
como foi além do freio do veículo, causando danos não só em outras áreas do próprio
automóvel como no veículo de terceiros, trata-se de defeito. (RIZZATO NUNES)

5.2. Responsabilidade civil pelo vício do produto ou serviço

* O fundamento geral da responsabilidade no Código de Defesa do Consumidor é o


risco da empresa. Para fins didáticos, a abordagem será dividida em duas partes, sendo
esta aula dedicada somente às normas referentes ao vício dos produtos e serviços. A
aula seguinte será dedicada à responsabilidade em relação aos danos causados à saúde,
à vida e à segurança, ou seja, aos acidentes de consumo ( Fato do produto ou
serviço).

A) Responsável

* O caput do art. 18 diz: “Os fornecedores”. Conforme já explicado em aula anterior o


termo fornecedor é gênero. Desta feita, toda vez que o CDC refere-se a fornecedor está
envolvendo todos os participantes que desenvolvem atividades, sem qualquer distinção.

* Assim, todos os partícipes do ciclo de produção são responsáveis diretos pelo vício. O
consumidor poderá escolher e acionar diretamente qualquer dos envolvidos.

B) Vício

* O fundamento para esta exigência é a teoria da qualidade, que neste particular


refere-se ao bom desempenho dos produtos e serviços, ou seja, ao cumprimento de suas
finalidades de acordo com as legítimas expectativas do consumidor. O vício manifesta-
se sempre que a esfera patrimonial do consumidor for atingida, acarretando a
perda da utilidade e/ou valor do produto ou serviço.

* O vício pode ser: Produto ou Serviço; Qualidade ou Quantidade.

Parte I – Vício do Produto

b.1) Vício de Qualidade

* O art. 18, caput, define como vício de qualidade aqueles que tornem os produtos
“impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor,
assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do
recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária”.

* Abaixo segue esquematizado os tipos de vícios de qualidade:

 Torne o produto impróprio ao consumo. Ex: enlatados cujo conteúdo esteja


deteriorado – embolorado, com cheiro de podre etc.
 Torne o produto inadequado ao consumo. Ex: veículos com problema elétrico.
 Diminua o valor do produto. Ex: automóvel com amassados na lataria, estofado
furado, teto rasgado.
 Esteja em desacordo com o contido: - no recipiente, - na embalagem, - no rótulo,
- na mensagem publicitária.

* Impropriedade:

Consideram-se impróprios ao uso e consumo os produtos (art. 18, § 6º, I, II e III do


CDC), com as seguintes características:

 Prazo de validade vencido


 Deteriorados, alterados; adulterados, avariados, falsificados, fraudados, nocivos
à saúde, perigosos bem como aqueles que estejam em desacordo com normas
regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação
 Produtos que por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim que se
destinam.

b.1.1) Variações decorrentes da natureza do produto

* O caput do art. 18 na sua parte final dispõe: “respeitadas as variações decorrentes de


sua natureza..”

* A norma resguarda certas alterações e até deteriorações que não cheguem a se


tornar impropriedades. Ex: tinta colocada na parede que escurece ou clareia; as
folhas de alface que perdem o seu frescor.

b.1.2) Alternativas ao Consumidor

1) Reclamação ao fornecedor – Obrigatoriedade de sanar o vicio em 30 dias

* O fornecedor tem o prazo de 30 (trinta) dias para sanar o vicio do produto. Porém,
superado o prazo sem que o vício tenha sido sanado, o consumidor tem a prerrogativa
de utilizar as benesses do § 1º do art. 18, quais sejam: substituição do produto;
Restituição da quantia paga mais perdas e danos; Abatimento proporcional do preço.

* Forma da contagem do prazo: O prazo de trinta dias é um limite máximo que


pode ser atingido pela soma dos períodos mais curtos utilizados. Ex: se o produto
foi devolvido a primeira vez no décimo dia, depois retornou com o mesmo vício e se
gastaram nessa segunda tentativa de conserto mais 15 dias, na terceira vez em que
o produto voltar o fornecedor somente terá mais 5 dias para solucionar
definitivamente o problema, pois anteriormente despendeu 25 dias sem resolver o
problema.

2) Substituição do produto ( Art. 18, § 1º, I)

* A primeira alternativa a disposição do consumidor é a substituição do produto por


outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso.
* O correto seria dizer: “...mesma espécie, marca e modelo”
* Pode acontecer de o consumidor exigir a troca do produto por outro da mesma
espécie, marca e modelo e o fornecedor não tê-lo para entregar. O que acontece então?
A resposta está no § 4º do mesmo artigo. Obviamente o consumidor poderá optar pela
restituição da quantia paga antes de optar pela complementação de valores em caso de
produto de outra marca, espécie e modelo.

* Medida Judicial: O que acontece se o fornecedor se negar a substituir o produto? Qual


o remédio processual?

 Ação de obrigação de fazer em desfavor do fornecedor ( Art. 84, caput)


 Possibilidade de Tutela Antecipada ( Art. 84, § 3º)
 Possibilidade do juiz impor multa diária ao fornecedor ( Art. 84, § 4º)
 Possibilidade do juiz determinar busca e apreensão ( Art. 84, § 5º)

3) Restituição da quantia paga mais perdas e danos ( Art. 18, § 1º, II)

* O consumidor pode fazer uso da opção de ser restituído da quantia paga mais perdas e
danos.

* Assim a opção pelo inc. II dá ao consumidor o direito de pleitear também indenização


pelos danos sofridos em função da espera de 30 dias sem o saneamento do vício.

* Considerando que a responsabilidade do fornecedor é objetiva, para carcterizar o dano


é necessário o seguinte:

 Nexo de causalidade
 Dano

* Porém, neste caso tem que existir mais dois fatores:

 Serviço incompleto ou não realizado e que manteve o produto viciado


 Extinção do prazo de 30 dias para o saneamento do vício

4) Abatimento proporcional do preço ( art. 18, § 1º, III)

* O consumidor pode exigir o abatimento proporcional do preço, ou seja, requerer a


devolução da parte do valor já pago ou que deixe de pagar parte ou toda a quantia ainda
faltante (caso o pagamento seja feito a prazo), na exata medida do vício existente e não
solucionado no prazo de 30 dias.

* OBS: é uma alternativa dificil de se negociar com o fornecedor, pois nem sempre é
fácil se chegar a um número exato. Caso seja feito essa opção judicialmente terá que ser
feito uma perícia. Melhor será o consumidor optar pelas outras duas opções.
5) Cumulação de pedidos

* Se o consumidor requerer a substituição do produto (inc. I) tem também direito ao


pleito de indenização por danos materiais e/ou morais?

* Sim. Apesar de não ter previsão legal para tal saída, não há muita diferença prática
entre requerer a troca do produto por outro da mesma espécie, marca e modelo e pedir
restituição da quantia paga. ( RIZZATO NUNES)

b.1.3) Uso imediato das prerrogativas ( Art. 18, § 3º)

* Conforme redação do art. 18, § 3º o consumidor pode fazer uso imediato das
alternativas dos incisos I ( substituição do produto), II ( restituição da quantia paga +
indenização) e III ( abatimento proporcional ao preço).

* Hipóteses para fazer uso imediato desse prerrogativa:

 Em razão da extensão do vício, a substituição das partes viciadas:

1 Pode comprometer a qualidade do produto. Ex: A queima de um circuito


eletronico de um microcomputador;
2 Pode comprometer as características do produto. Ex: Automóvel
importado, com rodas originais que se partiram, não havendo peças de
reposição;
3 Diminua o valor do produto. Ex: Automóvel que o motor fundiu.
 Quando se tratar de produto essencial. Ex: remédios e alimentos com prazo de
validade vencido. OBS: produto essencial está diretamente relacionado com
a saúde, higiene pessoal, limpeza e segurança do consumidor, tais como
alimentos, medicamentos, produtos de limpeza em geral.

b.1.4) Substituição do produto por outro de espécie, marca e modelo diverso ( art.
18, § 4º)

* O consumidor após a espera de 30 dias se não tiver o vício sanado poderá requerer a
substituição do produto por outro da mesma espécie, marca e modelo ( inc. I, § 1º, art.
18). Contudo pode ocorrer que o fornecedor não tenha esse outro produto para entregar
ao consumidor. O que o consumidor nessa hipótese pode pleitear então?

* A resposta está no art. 18 ,§ 4º: “ não sendo possível a substituição do bem, poderá
haver substituição por outro de espécie, marca ou modelo diversos, mediante
complementação ou restituição de eventual diferença de preço”.

* Assim, não sendo possível a troca, surgem duas possibilidades:

 Efetuar a troca por outro produto de espécie, marca ou modelo diferentes, que
tenha preço mais barato do que o que foi pago pelo produto viciado;
 Efetuar a troca por outro produto de espécie, marca ou modelo diferentes, que
tenha preço superior áquele que foi pago pelo produto viciado

1 - Pagamento a prazo?

* Se o pagamento do preço do produto estiver sendo pago a prazo o consumidor poderá:

 Produto com preço mais barato (restituição): subtrair a diferença a seu favor do
valor a ser pago relativo às parcelas vincendas;
 Produto com preço mais caro (complementação): complementar a diferença,
incluindo-a parceladamente em cada prestação faltante. OBS: Claro que se o
consumidor quiser pagar a diferença à vista poderá ser feito.

2 - Medida judicial em caso de recusa?

* Qual a medida judicial a disposição do consumidor caso o fornecedor se negue a


efetuar a troca prevista no § 4º?

* Em caso de recusa o consumidor deverá ajuizar ação de obrigação de fazer contra o


fornecedor, com possibilidade de antecipação de tutela, com inclusive busca e
apreensão do produto requerido ( art. 84, caput, §§ 3º a 5º).

b.1.5) Produtos “in natura” ( Art. 18, § 5º)

* O § 5º do art. 18 regula a responsabilidade no caso de fornecimento de produtos in


natura, estabelecendo que “será responsável perante o consumidor o fornecedor
imediato, exceto quando identificado claramente seu produtor”.

* Assim, a hipótese do § 5º é complementar ao estabelecido no § 3º: ele está dizendo


que, quando se tratar de produtos in natura, as prerrogativas previstas no § 1º têm de ser
exercidas perante o fornecedor imediato. Normalmente este é o comerciante: o lojista, o
dono de supermercado, o feirante, o dono de padaria, de empório etc.

b.2) Os vícios de quantidade

* Conceito: Vício de quantidade se dá, toda vez que ocorra diferença a menor de
qualquer tipo de medida da porção efetivamente adquirida e paga pelo consumidor. E
isso por uma simples questão de pagamento do preço. A constatação dessa diferença
prejudicial ao consumidor pode ser aferida mediante a verificação da diferença a menor
entre a quantidade que o consumidor recebeu e aquela existente:

 No recipiente e na embalagem
 Na rotulagem
 Na mensagem publicitária
 Na apresentação
 Na oferta e informação em geral
 No contrato;
* Em confronto ao § 1º do art. 18, o art. 19 somente acrescentou a possibilidade do
consumidor exigir a complementação do peso ou medida do produto viciado.

* Art. 19, § 1º: Caso o consumidor opte pela substituição do produto, e não seja
possível, poderá haver substituição por outro de espécie, marca ou modelo diversos,
mediante complementação ou restituição de eventual diferença de preço, uma vez que §
1º autoriza a aplicação do § 4º do art. 18.

* Art. 19, § 2º: responsabilidade exclusiva do fornecedor imediato ou comerciante


quando fizer a pesagem ou a medição do produto e o instrumento utilizado não estiver
aferido segundo os padrões oficiais.

Parte II – Vício do Serviço

b.3) Responsabilidade Objetiva: Aqui não há exceção quanto à responsabilidade


objetiva para os profissionais liberais nos moldes do art. 14, § 4º. A exceção, então,
somente se verifica para a responsabilidade por fato do serviço (art. 14) e não para a
responsabilidade por vicio do serviço (art. 20).

b.4) Art. 20, I, II e III: As opções dos inscs. I, II e III são de escolha do consumidor e
não do fornecedor.

b.4) Art. 20, § 1º: A reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros por conta e
risco do fornecedor.

b.5) STJ – Informativo importante

INFORMATIVO 416. CDC. PASSAGEM AÉREA. VISTO DE INFORMAÇÃO. A


filha presenteou sua mãe com uma viagem de ambas à Europa. Para tanto adquiriru
junto à compania aérea recorrida as passagens com destino a Londres e, de lá, a Paris.
Ambas compareceram, na data aprazada, ao guichê da recorrida, no Aerooporto
Internacional de São Paulo, e realizaram os procedimentos de Check-in sem
contratempo. Já em solo inglês, foram surpreendidas com a informação de que a mãe
não poderia embarcar rumo à França, pois, por ser boliviana, faltava-lhe necessário
visto para território francês, o que a forçou a retornar sozinha ao Brasil, pois a filha
rumou a Paris por força de compromissos profissionais, daí a ação de indenização por
danos morais e materiais. É impróprio o serviço (art. 20, § 2º, do CDC) que se mostra
inadequado ao fim que razoavelmente dele se espera. Essa razoabilidade está
intimamente ligada ao direito de informação do consumidor ( art. 6º, III do CDC).
Além de clara e precisa, a informação prestada pelo fornecedor deve conter as
advertências ao consumidor a respeito dos riscos que podem eventualmente frustar a
utilização do serviço contratado. A correta prestação de informação, além de ser
direito básico do consumidor, demonstra a lealdade inerente à boa-fé objetiva e
constitui ponto de partida para a perfeita coincidência entre o serviço oferecido e o
efetivamente prestado. Isto posto, na hipótese, caberia à companhia aérea ter se
pronunciado de forma escorreita a respeito das medidas que deveriam ser tomadas
pelas passageiras para que se viabilizasse o sucesso da viagem, o que engloba não só
advertencias quanto ao horário do check-in, como também o alerta acerca da
necessidade de obtenção de prévio visto de ingresso no país estrangeiro. Com esse
entendimento, a truma fixou a indenização dos danos morais em R$ 20 mil. Anote-se
que o pedido de indenização por danos materiais foi tido por improcedente pelas
instâncias ordinárias, decisão da qual não houve recurso. Resp 988.595-SP, Rel. Min.
Nancy Andrighi, julgado em 19/11/2009.

5.3 Responsabilidade civil pelo fato do produto ou serviço

5.3.1. Defeitos

* Defeito = Vício + Dano (Obs: Se trata apenas de uma fórmula oriunda de um conceito
semântico)

* OBS IMPORTANTE:

 Costuma-se também falar em “acidentes de consumo”, mas o CDC (Seção II,


Capítulo IV, do Título I) fala em fato do produto e serviço. Fato tem conexão
com a idéia de acontecimento;
 O mais adequado é guardar a expressão “acidente de consumo” para as hipóteses
em que tenha ocorrido mesmo um acidente: queda de avião. Batida de veículo
por falha de freios; e deixar fato ou defeito para as demais ocorrências danosas.

5.3.2. O Fato do Produto – Art. 12 e 13 do CDC

A) Análise do art. 12

a.1) O Defeito

Diretiva 85/374/CEE da União Européia para conceituar o defeito do produto e do


serviço.

Assim os produtos e serviços defeituosos podem ser definidos como os bens e serviços
de consumo que não apresentam a segurança que deles o mercado legitimamente espera.

OBS IMPORTANTE: 1 – A definição é ampla e vaga. O conteúdo da expressão


“segurança legitimamente esperada” permite englobar uma ampla variedade de
hipóteses. Porém, o legislador optou pela utilização de uma cláusula geral justamente
para garantir uma maior flexibilidade do sistema. Desta forma, o dimensionamento
específico do que venha a ser a “segurança legitimamente esperada” passa a ser papel
do juiz.

2 – O CDC não criou um sistema de segurança absoluta. O que se espera é o


enquadramento dos produtos e do serviços dentro dos padrões de uma expectativa
legitima dos consumidores, o qual é fixado de forma coletiva pela própria sociedade de
consumo. Para que seja possível esta fixação “o juiz leva em conta a percepção de
fragmentos da sociedade de consumo, assim o faz com os olhos postos em matizes
coletivos específicos de uma determinada categoria de consumidores, seja por mera
divisão geográfica, seja por determinação de classes sociais, seja, finalmente, por levar
em consideração a capacidade de assimilar informação ( é o caso das crianças, dos
idosos, dos analfabetos, dos portadores de deficiência). Tal não quer significar,
todavia, que o juiz, para chegar ao quadro geral da expectativa legitima, não considere
a situação individual do consumidor-vitima. Só que assim o fará como um dado a mais,
entre outros.”

* Classificação:

 Defeito de criação ou de concepção: A falha de segurança está na estrutura, no


projeto ou nas fórmulas do produto ou do serviço.
Afirma Antônio Herman V. Benjamin que os defeitos de concepção possuem
três traços caraterísticos: a) inevitabilidade; b) dificuldade de previsão estatística
quanto à sua frequência; e c) manifestação universal ( o defeito de concepção
não se limita a apenas um ou outro produto ou serviço da cadeia de produção,
mas sim, manifesta-se em todos os produtos daquela série ou em todos os
serviços executados)

 Defeito de produção ou fabricação: É o defeito decorrente da falha instalada no


processo produtivo e está presente na fabricação, montagem, construção ou no
acondicionamento do produto.
Afirma Antônio Herman V. Benjamin que os defeitos de fabricação possuem
três traços caraterísticos: a) a inevitabilidade, por ser um desdobramento natural
dos processos de automatização dos bens de consumo; b) previsibilidade
estatística quanto à sua frequência; c) manifestação limitada em alguns
consumidores.

 Defeito de comercialização e informação: Decorre da apresentação do produto


ou serviço ao consumidor, na qual inclui todo o processo de informação
destinado ao mercado de consumo. Se manifesta principalmente na embalagem,
rotulagem e nas mensagens publicitárias.
OBS: Na Gênese da acepção não é um defeito em si, mas sim da mensagem
errônea ou insuficiente sobre o produto ou serviço. Pode ocorrer de duas formas:
a) o fornecedor não esclarece a forma correta de utilização do produto ou
serviço; b) o fornecedor não alerta o consumidor acerca dos cuidados e
precauções a serem tomados na utilização de um produto ou serviço.

a.2) Responsável

* A norma diz “o fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro e o


importador”.

* Na responsabilidade civil por defeito, a regra é a da especificação do agente. Com


isso, a sujeição passiva se altera, limitando a escolha do consumidor. Na hipótese de
dano por acidente de consumo com produto a ação do consumidor tem que se dirigir ao
responsável pelo defeito: fabricante, produtor ou construtor e, em caso de produto
importado, o importador.

a.2.1) Solidariedade

* Na fabricação de qualquer produto sempre entra em cena uma série de componentes,


tais como matéria-prima, insumos básicos, peças, equipamentos, o próprio projeto, etc.
Assim, o produto final é uma justaposição de elementos produzidos por vários agentes.

* A norma aponta o responsável direto pelo defeito. Mas e os outros produtores


envolvidos indiretamente estão excluídos?

* Não, pois são todos responsáveis solidários na medida de suas participações. Ex: um
automóvel que apresenta vício de fabricação, consistente em um amortecedor que
se rompe no momento em que o consumidor dirigindo, faz uma curva, capotando e
sofrendo danos, a montadora é a responsável. Mas o fabricante do amortecedor
também é. Do ponto de vista prático a escolha cairá na montadora. Mas esta
poderá posteriormente, após ter indenizado o consumidor, por via direta, acionar
o fabricante do amortecedor para cobrar dele o desembolso em razão do acidente.

* Fundamentação: Art. 12, caput c/c parágrafo único do art. 7º c/c §§ 1º e 2º d art. 25.

a.2.2) Responsabilidade do comerciante

* O comerciante também pode ser responsabilizado pelo fato do produto, na forma do


art. 13 do CDC. A responsabilidade aqui é subsidiária.

* Hipóteses:

 Sempre que não puder ser identificado ou quando não houver identificação do
fornecedor – fabricante, construtor, produtor ou importador ( I e II);

 Se o comerciante não conservar adequadamente o produto (III);

* Art. 13, parágrafo único: “Aquele que efetivar o pagamento ao prejudicado poderá
exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis, segundo sua participação
na causação do evento danoso.”

* Ação de Regresso: O comerciante que arca com a indenização terá o direito de


regresso em face do causador do dano, devendo o comerciante demonstrar a culpa do
fornecedor no evento danoso para ter os prejuízos ressarcidos, vedada a denunciação
da lide, nos termos do art. 88 CDC.
a.3) Critérios de valoração de defeitos dos produtos – Art. 12, § 1º CDC

* Os critérios adotados pelo CDC de valoração dos produtos defeituosos são:

 Apresentação (art. 12, § 1º, I): A apresentação consiste num ato unilateral do
fornecedor para divulgação dos elementos característicos do produto. Deve ela,
portanto, funcionar como uma barreira eficaz à possível incidência ou
materialização de defeitos, uma vez que o consumidor devidamente
informado tem condições de avaliar os riscos no uso e fruição do bem
adquirido.

 O uso e risco que razoavelmente dele se esperam (art. 12, § 1º, II): A
razoabilidade afasta a necessidade de uma segurança absoluta. Assim, há
produtos que naturalmente geram insegurança, tais como a faca, a tesoura, um
remédio para dormir, um aquecedor elétrico.

 A época em que foi colocado em circulação (art. 12, § 1º, III): O momento em
que o produto foi colocado em circulação é o marco temporal para se averiguar a
existência do defeito.

OBS: Esse inciso é ininteligível. Gerar acidente de consumo não depende da


época em que o produto foi posto em circulação. Não há data que evite o
defeito. Não é a época que pode determinar se há defeito ou não.
(RIZZATO NUNES)

* Art. 12, § 2º: Dispõe que o produto não pode ser considerado defeituoso pelo fato de
outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado de consumo. Se o fornecedor,
em razão dos avanços tecnológicos, melhora a qualidade de seu produto, não pode ser
penalizado, já que não era defeituoso o produto que foi substituído.

a.4) Causas excludentes da responsabilidade pelo fato do produto – Art. 12, § 3º

* Excludente de responsabilidade é o fato que isenta o agente da conduta delituosa de


arcar com os ônus do resultado danoso à vitima.. As excludentes de responsabilidade
pelo fato do produto ou serviço no CDC são:

 Falta de colocação do produto no mercado de consumo: Se o produto não foi


colocado no mercado, ou seja, se não existe conduta, não há que se imputar
responsabilidade no fornecedor, sendo que a colocação do produto no mercado
de consumo deve ser feita de maneira consciente e voluntária.

 Ausência de defeito do produto e do serviço: É aplicável tanto no fato do


produto quanto no fato do serviço. O defeito do produto ou do serviço é o
pressuposto essencial para a responsabilidade pelo fato. Não havendo defeito
não há nexo de causalidade entre a conduta do fornecedor e o dano sofrido pelo
consumidor.
OBS: A prova de ausência de defeito deve ser feita pelo fornecedor.
Inversão do ônus da Prova Opus Legis.

 Culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro: Cabe ao fornecedor provar que o


consumidor ou terceiro agiu com culpa no evento danoso. Terceiro é qualquer
pessoa estranha à relação de consumo.

 Culpa concorrente (?): O STJ, em acórdão (REsp 287.849/SP) já reconheceu


essa possibilidade – “ Responsabilidade do hotel, que não sinaliza
convenientemente a profundidade da piscina, de acesso livre aos hóspedes.
Art. 14 do CDC. A culpa concorrente da vítima permite a redução da
condenação imposta ao fornecedor. Art. 12, § 2º, III, do CDC. A agencia de
viagens reponde pelo dano pessoal que decorreu do mau serviço do hotel
contratado por ela para a hospedagem durante o pacote de turismo.” ( STJ,
REsp 287849/SP, Rel Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ 13/08/2001).

OBS: Prof. Rizzato Nunes é contra a aplicação da culpa concorrente como


causa de exclusão de responsabilidade, baseado na teoria do risco integral e
que o art. 12, § 3º é numerus clausulus.

 Caso fortuito e força maior (doutrina e jurisprudência): O CDC não elencou o


caso fortuito e a força maior entre as causas de exclusão de responsabilidade,
existindo divergência na doutrina.

Doutrina minoritária (Rizzato Nunes): Pelo fato do CDC estar fundado na teoria
do risco do negócio, a responsabilidade objetiva não admite que o caso fortuito
ou força maior excluam o dever de indenizar, pois as cláusulas de excludentes
no CDC são numerus clausulus.

Doutrina majoritária e jurisprudência do STJ: reconhecem a aplicação desta


excludente. Porém o STJ diferencia o fortuito interno e o fortuito externo.

 Fortuito interno: é fato que se liga à organização da empresa, relacionando-


se com os riscos da atividade desenvolvida pelo fornecedor. Não exclui a
responsabilidade segundo STJ.
 Fortuito externo: é fato estranho à organização do negócio, não guardando
nenhuma ligação com a atividade negocial do fornecedor. STJ -.> exclui a
responsabilidade do fornecedor

* OBS: O caso fortuito é uma das causas excludentes da responsabilidade civil, previsto
no artigo 393 , do Código Civil :
Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força
maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos
efeitos não era possível evitar ou impedir.
De acordo com o professor Pablo Stolze, a diferença entre caso fortuito interno e
externo é aplicável, especialmente, nas relações de consumo. O caso fortuito interno
incide durante o processo de elaboração do produto ou execução do serviço, não
eximindo a responsabilidade civil do fornecedor. Já o caso fortuito externo é alheio ou
estranho ao processo de elaboração do produto ou execução do serviço, excluindo a
responsabilidade civil.
O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento segundo o qual assalto em
transporte coletivo é hipótese de fortuito externo, excluindo a responsabilidade do
transportador:
PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇAO POR DANOS MORAIS,
ESTÉTICOS E MATERIAL. ASSALTO À MAO ARMADA NO INTERIOR DE ÔNIBUS
COLETIVO. CASO FORTUITO EXTERNO. EXCLUSAO DE RESPONSABILIDADE
DA TRANSPORTADORA.
1. A Segunda Seção desta Corte já proclamou o entendimento de que o fato
inteiramente estranho ao transporte em si (assalto à mão armada no interior de ônibus
coletivo) constitui caso fortuito, excludente de responsabilidade da empresa
transportadora.
2. Recurso conhecido e provido. (STJ, REsp 726.371/RJ , Rel. Ministro Hélio Quaglia
Barbosa, DJ 05/02/2007)
Contudo, existe corrente nos tribunais inferiores no sentido de que se o assalto é
sucessivo, freqüente, na mesma linha, passaria a haver previsibilidade. Desta feita, o
transportador seria obrigado a indenizar.

 Risco do Desenvolvimento: é aquele risco que não pode ser identificado quando
da colocação do produto no mercado mas, em função de avanços científicos e
técnicos, é descoberto posteriormente, geralmente depois de algum tempo de uso
do produto. A questão é: poderia o risco de desenvolvimento ser considerado
excludente de responsabilidade? A maioria da doutrina consumerista considera
que não.

5.3.3 O Fato do Serviço – Art. 14 CDC

A) Análise do art. 14

a.1) Responsável

* No caso de serviço, é sempre o prestador o responsável, quer em caso de defeito (art.


14), quer em caso de vício (art. 20).

* A redação do caput do art. 14 segue e mesma regra do art. 12. O prestador de serviços
responde de forma objetiva pela reparação de danos causados aos consumidores pelos
defeitos relativos aos serviços prestados e pelas informações insuficientes ou
inadequadas sobre a fruição e os riscos dos serviços.

a.2) Solidariedade

* Há alguns serviços prestados de maneira direta e praticamente pura, tais como o de


consulta médica, o de ensino, o do cabeleireiro etc. Mas há serviços que são compostos
de outros serviços tais como o de administração de crédito, correios, etc.

* Assim, é possível a responsabilização solidária para o fornecedor de serviço direto e o


indireto. Vide art. 7º, 25, § § 1º e 2º.
a.3) Critérios de valoração de defeitos dos serviços – Art. 14, § 1º CDC

* Os critérios adotados pelo CDC de valoração dos serviços defeituosos são:

 O modo de seu fornecimento


 O resultado e os riscos que dele razoavelmente se esperam
 A época em que foi colocado em circulação

a.4) Causas excludentes da responsabilidade pelo fato do serviço – Art. 14, § 3º

 Inexistência do defeito: Vide comentários no fato do produto


 Culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro: vide comentários no fato do
produto

5.3.4 Responsabilidade dos Profissionais Liberais – Art. 14, § 4º

* A responsabilidade dos profissionais liberais é apurada mediante culpa =>


RESPONSABILIDADE SUBJETIVA

* Profissionais Liberais => Obrigação de meio x Obrigação de resultado:

 Obrigação de meio: é aquela em que o profissional se obriga a empenhar todos


os esforços possíveis para a prestação de determinados serviços, não existindo
qualquer compromisso com a obtenção de um resultado específico. Ex: o serviço
prestação por um advogado em uma causa judicial.
 Obrigação de resultado: é aquela que o profissional garante a consecução de um
resultado específico. Ex: cirurgia estética.

STJ: Se a obrigação for de resultado, a responsabilidade do profissional liberal será


objetiva. Assim, para o STJ, somente quando for obrigação de meio é que será
responsabilidade subjetiva, nos moldes do art. 14, § 4º.

“Contratada a realização da cirurgia estética embelezadora, o cirurgião assume


obrigação de resultado (Responsabilidade contratual ou objetiva), devendo indenizar
pelo não cumprimento da mesma, decorrente de eventual deformidade ou de alguma
irregularidade.” (STJ, REsp 81101/PR, Rel. Min. Waldemar Zveiter, DJ
31.05.1999)”

OBS IMPORTANTE: 1) Importante destacar que parte da doutrina discorda desta


diferenciação. Sustentam que não houve por parte do legislador a intenção de criar
regime especial para os profissionais liberais no tocante à reponsabilidade de meio e
de resultado. O que o legislador fez foi excepcionar a regra da reponsabilidade
objetiva, imputando aos profissionais liberais a responsabilidade subjetiva (com
culpa). Assim, não haveria como imputar responsabilidade objetiva aos profissionais
liberais, mesmo na obrigação de resultado, pois a norma não autoriza tal
interpretação. O que pode acarretar na obrigação de resultado é a inversão do ônus
da prova quanto à culpa, ou seja, haveria o que chamamos de culpa presumida, em
que o profissional liberal teria o ônus de provar que não agiu com culpa. Mas frise-
se: teria que haver culpa, ao contrário da responsabilidade objetiva. Teríamos então,
segundo este raciocínio, culpa provada nos casos de obrigação de meio e culpa
presumida nos casos de obrigação de resultado.

2) A 4ª Turma STJ vem seguindo este entendimento. Vide Informativo 383.

* Responsabilidade dos hospitais e médicos:

Questão atualmente divergente no STJ é a responsabilização dos hospitais em face


da atuação dos médicos. Poderia o médico, profissional liberal, ser responsabilizado
subjetivamente e o hospital ser responsabilizado objetivamente?

4ª Turma: Trata a questão a luz do art. 951 do CC/02, entendendo que o hospital
somente será responsabilizado por ato do médico mediante comprovação de culpa.
Nesse caso, a responsabilidade objetiva dos hospitais circunscreve-se apenas aos
serviços exclusivamente relacionados com o estabelecimento empresarial
propriamente dito, ou seja, aqueles que digam respeito à estadia do paciente
(internação), instalações, equipamentos, serviços auxiliares (enfermagem, exames,
radiologia), etc.

3ª Turma: Aplica o CDC, responsabilizando o hospital de forma objetiva.

Parece que a controvérsia foi dirimida pela 2ª seção do STJ (órgão que compõe a 3º
e a 4º Turma) por 4 votos a 3 prevalecendo o entendimento da 4ª Turma.
Informativo 365 STJ.

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