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No que se refere aos papéis estipulados para as mulheres como inerente à sua natureza,
apresenta-se a maternidade.No entanto, arelação mãe e filho, assim como outras formas de
comportamento, estão em constantes mudanças que se adaptam aos valores políticos e
econômicos de determinada época.
De acordo com Badinter (1985) apud Moura e Araujo (2004) o amor materno, não
deve ser visto como uma qualidade essencial da mulher, mas como uma construção histórico-
social. Durante a Idade Média e na Antiguidade o conceito de maternidade era desvalorizado
devido à autoridade e poder paternal, já que o homem era superior tanto à mulher quanto à
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criança.A relação da mãe com o filho era apenas de reprodução e não cabia a ela os cuidados
na infância, mesmo a amamentação. As crianças nem sequer ficavam muito tempo com a
família burguesa, sendo enviadas para um instrutor a fim de aprender as tarefas dos adultos.
Os sentimentos de ternura e valorização da criança são de certa forma recente. O amor
materno, convencionalmente descrito como “instintivo” e “natural” foi reforçado por
discursos filosófico, médico e político a partir do século XVIII.
O culto à Maria, proclamada imaculada pela Igreja, a define como a única pessoa a ter
concebido sem pecado, reafirmando o modelo cristão de mulher submissa, pura, virgem e
mãe. Acentua-se então, o papel da mulher com relação à maternidade, e define o não desejo
de gerar ou cuidar de um filho como um comportamento anormal, e o aborto como exercício
de crueldade. (NUNES, 2006)
diz que o desejo de conceber novas vidas é um ato plenamente humano. Dessa forma, seguir
com uma gravidez não pode ser apenas uma aceitação de um resultado biológico, mas o
desejo de amar essa nova pessoa.
A maternidade adquire um sentido específico para cada mulher, e está vinculado à sua
historia de vida e o momento da gravidez. A gravidez altera o senso físico da mulher,
reorganiza aspectos de sua identidade, além de alterar sua relação com seu corpo, com o pai
da criança e seus planos de vida. Uma gravidez não desejada pode ser bastante opressiva. Um
conflito moral é aí estabelecido, já que a expectativa social da maternidade como algo ideal,
onde se espera um papel desempenhado com perfeição barra o sentido individual da mulher
de não ter este desejo. Como no Brasil a legislação só permite o aborto intencional em poucas
exceções, o comportamento da mulher que não deseja o filho, não só é desviante como
também transgredi as leis, desencadeando um sentimento de culpa. (BENUTE, NOMURA,
PEREIRA, LUCIA e ZUGAIB, 2009)
O Código Penal Brasileiro de 1940 permite o aborto apenas nos casos de estupro e
risco de morte materna. Quando ocorre diagnóstico de anomalia fetal há possibilidade de
interrupção da gestação, porém mediante autorização judicial. Dessa forma, a mulher que
deseja o aborto acaba fazendo-o de maneira insegura, com pessoas não especializadas, sem
técnicas e em ambientes sem preparo básico. As consequências são desastrosas para estas
mulheres, para a própria sociedade e o sistema público. (BENUTE, NOMURA, PEREIRA,
LUCIA e ZUGAIB, 2009)
Por tentar justificar a oposição ao aborto, diz-se lutar pelo direito à vida, apoiando-se
na ideia fortemente arraigada de que a maternidade seria a expressão máxima de respeito pela
vida humana, enquanto o aborto seria sua negação. Defender o aborto não é banalizar o
argumento de defesa da vida, pois não se deve restringir esse direito ao feto. Muitas mulheres
não têm outra opção e correm risco de vida, ou danos físicos e psicológicos por conta de
abortos inseguros. Nesse momento ignora-se o direito à vida dessas mulheres. (NUNES,
2006)
A dificuldade encontra-se nas relações políticas em âmbito global que constituem leis
que mantêm a condenação moral e cultural às mulheres que recorrem ao aborto, em vez de
realizar esforços para entender porque é que o fazem e investir em campanhas e políticas de
planejamento familiar. As medidas políticas unilaterais estão em boa parte atreladas a
interpretações patriarcais e religiões fundamentalistas, além de não escapar das negociações
políticas e interesses econômicos. Para uma democracia plena é necessário adissociação entre
religião e Estado. (CORRÊA, 2010)
Considerações Finais
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É preciso se atentar que mesmo considerado crime o aborto não deixa de existir. Ele
está posto na nossa realidade e deve ser tratado como assunto pertinente à saúde física e
psicológica da mulher. O dever do Estado não é controlar o corpo das mulheres, mas sim
atendê-las em todas as suas necessidades, principalmente nos seus direitos como indivíduo de
capacidades intelectuais.
Este trabalho não esgota as discussões acerca do assunto, apenas ilustra alguns pontos
considerados pertinentes. As ciências humanas juntamente com as médicas e as políticas têm,
portanto, a importante tarefa de contribuir para esse movimento de reflexão acerca dos valores
e ideais postos na sociedade contemporânea.
REFERÊNCIAS
BENUTE, Glaucia R.G.; NOMURA, Roseli M.Y.; PEREIRA, Pedro P.; LUCIA,
Maria C.S. e ZUGAIB, Marcelo.Abortamento espontâneo e provocado: ansiedade, depressão
e culpa. Revista da Associação Médica Brasileira, vol. 55, nº 3, São Paulo, 2009.
NUNES, Maria José R. Aborto, maternidade e a dignidade da vida das mulheres. In:
CAVALCANTE, Alcilene e XAVIER, Dulce (Orgs.). Em defesa da vida: aborto e direitos
humanos. São Paulo: Católicas pelo Direito de Decidir, 2006, p. 23-40.