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Limites Fisiológicos do Melhoramento Genético

de Aves: Teoria e Prática


Elsio Antonio Pereira de Figueiredo
Pesquisador, Bolsista do CNPq
Embrapa Suínos e Aves, Concórdia, SC
Endereço eletrônico: elsio@cnpsa.embrapa.br

Introdução
A avicultura comercial tem obtido excelente progresso nas últimas quatro décadas.
Entre as espécies de maior interesse econômico, cujo progresso tem sido notável,
estão as galinhas de postura, os frangos de corte, os perus, as codornas, os marrecos
e as galinhas d’angola. Parte do referido progresso é devido à eliminação de
linhagens menos produtivas e ao melhoramento no manejo das aves, porém uma parte
substancial é devido à seleção artificial. Neste momento, porém, a sociedade começa
a se questionar por quanto tempo ainda será possível realizar progresso genético
da magnitude daquele já realizado? O desenvolvimento de novas metodologias e
tecnologias de biologia celular contribuirá para acelerar tal progresso? ou as novas
ferramentas contribuirão para acelerar a chegada de limites, ou fatores limitantes, no
progresso genético causado pela seleção artificial? Este trabalho discute tópicos sobre a
natureza dos limites fisiológicos no melhoramento genético de aves e as possibilidades
existentes para vencer as barreiras impostas por supostos limites.

A Teoria
Não se pode teorizar sobre o limite do progresso genético nos animais domésticos,
sem antes definir um conceito muito importante para o entendimento dos mecanismos
de imposição de limites, que é o conceito de homeostase. Homeostase é a tendência
do sistema fisiológico dos animais superiores de manter um ambiente de estabilidade
orgânica, mesmo quando sua condição ou função natural for perturbada (Dicionário
Webster, 1973).
Teoricamente, de acordo com Falconer (1989), sem a criação de nova variação
genética, por meio de mutação, não se deve esperar que a resposta à seleção continue
indefinidamente. Cedo ou tarde, os genes ainda segregando na população-base serão
fixados (ou entrarão em estado de equilíbrio, se existir sobredominância), pela seleção
ou pela consangüinidade que acompanha a seleção. A resposta à seleção, portanto, vai
se reduzindo a cada geração, até cessar. A população então alcança um patamar ou
limite da seleção.
O resultado de experimentos de seleção de longa duração com camundongos serviu
para mostrar que, alcançado o limite em duas linhas selecionadas divergentemente,
aquela selecionada para alto peso era apenas 2,5 vezes maior que a selecionada

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para baixo peso. Em contraste, o peso da maior raça canina é cerca de cem vezes
o peso da menor raça. A razão para resultados desapontadores, nos experimentos
com camundongos, é que os experimentos de seleção são realizados em populações
fechadas, geralmente de tamanho não muito grande. No caso das raças de animais
domésticos, o melhorista, em contraste, estende sua rede de captura de genes muito
mais além do que nos experimentos, por meio de cruzamentos intermitentes, e por isso
pode utilizar novas mutações que tenham ocorrido em qualquer outra população, em
qualquer parte do mundo, algumas das quais com efeitos muito pronunciados.
Do ponto de vista genético, a resposta total, relativa à variação genética inicial,
depende principalmente do número de lócus contribuindo para esta variação. Se,
por exemplo, existir apenas um lócus aditivo com freqüências gênicas de 0,50, os
genótipos mais extremos aparecerão, cada um, na população básica, com freqüências
de 1/4; ou, se existirem dois tais lócus, com freqüências de 1/16. O limite para a
seleção, que é representado pelos genótipos extremos, vai estar dentro da amplitude de
variação encontrada na população-base. Logicamente, com grande número de lócus,
os genótipos extremos serão cada vez mais raros na população-base, e os limites para
a seleção cada vez mais distantes em unidades de desvio-padrão genético da média
original.
Da genética quantitativa sabe-se, de antemão, que o número de genes e os
seus efeitos são inversamente relacionados, pois para determinada quantidade de
variação genética, se existirem poucos genes, cada um causa grande efeito, mas em
contrapartida, se existirem muitos genes, cada um causa efeito reduzido. Uma vez que
nem o número de genes nem a magnitude dos seus efeitos é completamente conhecida
antes do início da seleção, então na verdade não é possível predizer o limite. É possível
entretanto, predizer um máximo teórico para o limite.
Do ponto de vista teórico (Falconer, 1989), sabe-se que nova variação genética é
produzida por mutação, mas que cada nova mutação apresenta efeito muito pequeno
no decorrer das gerações iniciais subseqüentes, pelo fato de que o gene recém-mutado
se encontra em freqüência gênica muito baixa (igual a 1/2N, onde N é o tamanho da
população). Nestas baixas freqüências, o gene recém-mutado contribui muito pouco
para a variação genética e, sem seleção, a maioria dos novos mutantes são perdidos por
desvios ao acaso (“random drift”). A seleção, entretanto, pode aumentar a freqüência
dos mutantes favoráveis, de maneira que eles não sejam perdidos, e, à medida que
suas freqüências forem aumentadas,a variância que eles produzem aumentará e estes
passarão a contribuir mais para a resposta à seleção.
Existe, portanto, a teoria de que, no início da seleção, a resposta é devida à variância
genética aditiva existente na população-base. A taxa de resposta vai diminuindo
gradualmente à medida que esta variância diminui. Após talvez umas 20 gerações de
seleção, a variância genética nova, originada pela contribuição dos genes mutantes,
começa a contribuir para a resposta, que deverá decrescer mais lentamente. Após
algum tempo, todos os genes segregantes na população-base terão sido fixados pela
seleção ou pela consangüinidade conseqüente, e a nova resposta depende inteiramente
das mutações que se acumularam durante a seleção. Portanto, desta maneira, a resposta
irá continuar indefinidamente a uma taxa constante, e não se espera limite à seleção
quando existe mutação.
Do ponto de vista genético (Falconer, 1989), existem duas situações que explicam
o limite da seleção: limite onde não existe variação genética e limite onde existe
variação genética, mas a população não responde. No primeiro caso, provavelmente a
nova variação genética produzida por mutação não é grande o suficiente para produzir

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resposta detectável, ou talvez a maioria dos mutantes apresentem efeitos adversos para
a adaptação natural. O segundo caso pode acontecer devido aos seguintes problemas:

1. Maneira pela qual o caráter é expresso. Por exemplo, porcentagens apresentam


limites de zero e cem. Neste caso, os limites podem ser estreitamente
aproximados, com pouca fixação dos genes de interesse.
2. A fertilidade pode ser drasticamente reduzida nas linhas selecionadas, e, neste
caso, o diferencial de seleção será drasticamente reduzido nas gerações futuras.
3. Alelos favoráveis podem ser dominantes. Quando genes recessivos desfa-
voráveis são conduzidos a freqüências muito baixas, a maior parte da variância
que eles causam é não aditiva. Nesta situação, a média mudará na direção
contrária sob consangüinidade.
4. É possível haver sobredominância em alguns lócus para o caráter selecionado.
No limite da seleção, genes sobredominantes estariam em equilíbrio em
freqüências mais ou menos intermediárias. A variância que eles produzem será
apenas não aditiva. Sob consangüinidade, existirá mudança imediata da média
em direção ao nível da população-base. Entretanto, não existe evidência de que
esta seja uma característica comum do limite da seleção.
5. A seleção artificial pode ser contrabalançada pela seleção natural, o que poderá
ser confirmado se o diferencial de seleção efetivo (ponderado) for menor do que
o esperado (não ponderado).
6. A seleção natural pode favorecer os indivíduos heterozigotos, pela ação conjunta
de seleção artificial e seleção natural, o que ocorre comumente em contraste com
sobredominância simples para o caráter selecionado.

Do ponto de vista fisiológico, Bakken et al. (1998) revisa os conceitos de bem-estar


animal e conclui que, quando um animal é confrontado com algo estressante/agressor,
a sua adaptação envolve uma amplitude de comportamento e de respostas fisiológicas,
onde os sistemas endócrinos, imunológicos e nervoso central respondem aos estímulos
de maneira coordenada para restabelecer a homeostase. Em termos fisiológicos,
o hormônio liberador da corticotropina (HLC) parece exercer o papel central em
muitos dos comportamentos observados durante o estresse. O HLC é liberado em
apenas poucos segundos após o animal ter percebido o mecanismo estressante e
estimula a glândula pituitária para que esta libere hormônio adrenocorticotrópico,
que em troca, estimula as supra-renais para liberação de glicocorticóides. O HLC
não ativa apenas o eixo hipotálamo-pituitária-supra-renais (HPS), mas, pelos seus
neurotransmissores, também ativa a função cerebral. O HLC pode também estar
envolvido na ativação de outros caminhos principais de resposta ao estresse, como
o sistema simpático-supra-renal medular (SSM), resultando num aumento do nível
de catecolaminas. Tanto o caminho HPS como o SSM alteram a função biológica
no animal, numa tentativa de mobilizar recursos biológicos (glicose, ácidos graxos e
animoácidos), com prejuízo do sistema imunológico e das atividades biológicas em
andamento (como, por exemplo, crescimento), necessárias para enfrentar a situação
crítica. Tais respostas podem ser totalmente apropriadas, quando a resposta à agressão
permitir que o animal escape do agressor. Entretanto, na maioria dos sistemas avícolas
as aves freqüentemente são incapazes de remover o agressor. Desta maneira, a resposta
ao estresse pode continuar e envolver um ajustamento substancial tanto do sistema

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autonômico como do neuroendócrino, e colocar a ave sob risco de patologias, tais como
doenças, falhas em reproduzir-se, redução no crescimento e comportamento aberrante.
De acordo com Beilharz et al. (1993), nos sistemas de produção intensivos, onde se
fornece alimento, abrigo e proteção dos predadores, é permitido ao melhorista realizar
progresso genético rápido para muitas características de interesse, incluindo adaptação
e outras características de produção demandantes de recursos biológicos, sem muitos
efeitos colaterais, até que um determinado nível seja alcançado, onde o nível de
recursos não seja suficiente para proporcionar progresso extra. Esta teoria prevê que,
neste ponto, todo aumento extra numa característica de produção que seja demandante
de recursos vai resultar em resposta negativa em uma ou várias outras características.
Então, com base nesta teoria, pelo menos quatro relações importantes entre bem-estar
animal e seleção artificial para produção melhorada podem ser derivadas:

1. Em ambientes sem restrição de recursos biológicos, a seleção tenderá a


favorecer indivíduos com maior habilidade para obter e converter recursos em
características produtivas.
2. Em ambientes com limitação de recursos, o progresso além do permitido em
uma determinada característica causará efeito colateral negativo no indivíduo e
poderá reduzir o seu bem-estar;
3. Melhoramentos no ambiente causarão relaxamento nas restrições de ambiente e
podem reduzir a severidade de efeitos colaterais negativos causados pela seleção;
4. Relaxamento da seleção, em populações que mostram efeitos colaterais nega-
tivos, pode permitir a restauração de novo ótimo na distribuição de recursos, por
via de seleção natural, para todas as características, melhorando os componentes
maiores da adaptação.

De acordo com Villanueva e Kennedy (1991), as variâncias e covariâncias


genéticas e, portanto, a resposta genética esperada mudam a cada geração, devido
ao desequilibrio de ligação dos cromossomos, e, no caso de seleção direcional e por
truncamento, os parâmetros genéticos aproximam-se do limite máximo de maneira
assintótica após várias gerações de seleção.
Para Villanueva e Kennedy (1990), que estudaram o comportamento dos parâmet-
ros genéticos das características correlacionadas, com o estabelecimento automático
do desequilíbrio de ligação, pelo fato de se efetuar repetidos ciclos de seleção por
truncamento, uma situação de equilíbrio se desenvolve após várias gerações de seleção,
onde não há mais mudanças nos parâmetros genéticos, e alcança-se então o limite.
As mudanças nos parâmetros genéticos da geração zero ao limite tornam-se cada vez
maiores, à medida que o valor da herdabilidade da característica sob seleção direta
aumenta, e, em menor grau, à medida que a intensidade de seleção aumenta. Isto é, as
mudanças nos parâmetros genéticos dependem mais do valor da herdabilidade do que
da intensidade de seleção. As mudanças do valor da herdabilidade das características
correlacionadas, sob seleção indireta, aumentam com o aumento do valor absoluto da
correlação genética entre a característica sob seleção indireta e aquela sob seleção
direta. A mudança é máxima quando o valor inicial da herdabilidade é próximo de
0,50 e insignificante quando esse valor aproxima-se de zero ou de 1,00. A mudança
no valor da correlação genética entre uma característica sob seleção direta e outra sob
seleção indireta é máximo quando seu valor inicial é proximo de 0,60 e insignificante
quando seu valor inicial é próximo de zero ou de 1,00.

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Enquanto existir variação genética na característica, o limite genético ainda não


foi alcançado, e, sob seleção continuada, as variâncias e covariâncias genéticas, e
portanto as respostas mudam a cada geração, devido ao desequilíbrio na recombinação
dos gametas em cromossomos ligados.
O uso da informação de parentes num índice de seleção maximiza a resposta apenas
na primeira geração de seleção. Nas gerações subseqüentes, o desequilibrio de ligação
induzido pela seleção reduz as variâncias genéticas e fenotípicas. Após alguns ciclos
de seleção, alcança-se um estado de equilíbrio, onde o novo desequilíbrio causado pela
seleção é contrabalançado pela recombinação livre (Gomez-Raya e Burnside, 1990).

A Prática
Em galinhas de postura, segundo Hunton (1997), a redução na maturidade sexual é
responsável pela maior parte do progresso genético na produção de ovos. Aquele autor
considera que existe claramente um limite, além do qual não é vantajoso se reduzir a
maturidade sexual das aves, pois certamente haverá comprometimento do tamanho do
ovo e de outras características do ovo e da ave. Atualmente, a maioria dos plantéis
comerciais apresenta produção de ovos acima de 90% por longo período, durante o
ciclo, e acréscimos acima desta marca são cada vez mais difíceis, devido ao limite
natural de 100%. É possível, porém, ainda certa redução na mortalidade das galinhas,
mas a única característica óbvia para selecionar é a taxa de declínio da produção após
o pico de postura.
É necessário ter em mente que, nos programas de seleção simultânea para múltiplas
características, como é o caso da seleção de linhas comerciais, o ganho genético para
as características de interesse maior tem de ser maximizado em cada geração, sem
permitir deterioração das características de interesse menor.
Para o propósito deste trabalho, em aves de postura, as características podem ser
classificadas em: 1. características que se aproximam do limite, que são aquelas para
as quais se tem buscado maximizar os ganhos em cada geração; 2. características
compostas, que são principalmente aquelas ligadas aos fenômenos reprodutivos; e
3. características cujos parâmetros genéticos são pobremente conhecidos, que são
as ligadas aos fenômenos imunológicos. Por exemplo as características fertilidade,
eclodibilidade, viabilidade, manchas de sangue nos ovos e doenças congênitas se
enquadram nos grupos 2 e 3. Para Gowe et al. (1993), as complicações originadas dos
casos de presença de doenças congênitas entre as características de interesse, funções
econômicas não lineares nem quadráticas e estimativas genéticas teóricas baseadas
em informação de “pedigree”, usadas repetidamente após várias gerações de seleção,
podem trazer à tona a idéia de limite genético da seleção.
De acordo com Dunnington (1990) alguns limites são claramente documentados
em aves como aqueles relatados na seleção para diminuição do peso corporal,
que resultaram numa população de aves de tamanho muito reduzido, impedindo a
reprodução. Naquele caso, o limite, em termos de peso, foi 168 g de peso corporal
às 8 semanas de idade. Abaixo deste peso, nunca foi possível reproduzir a linha.
No caso de frangos de corte, a seleção para crescimento acelerado tem proporcionado
sucesso, em parte pela intervenção humana com meios não genéticos. O problema que
se originou, caracterizando um limite, foi o da disfunção reprodutiva em reprodutores.
Além disso, segundo aquela autora, duas outras respostas correlacionadas ao rápido
crescimento, que podem ser mais difíceis de solucionar, são a síndrome da morte
súbita (SDS) e ascite. Num lote de frangos com alimentação à vontade, geralmente

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as aves mais pesadas e de mais rápido crescimento são as mais afetadas pela SDS.
Os sintomas incluem arritimia cardíaca, fibrilação ventricular e estresse respiratório.
A ascite caracteriza-se pela barriga dágua resultante de extravasamento de líquido do
fígado para o abdome, devido ao aumento da pressão arterial pulmonar, com fadiga do
músculo cardíaco.
Para Dunnington (1990), a seleção artificial para características de importância
econômica em aves tem resultado em considerável mudança genética. Como em todos
os sistemas animais, entretanto, a força da seleção natural contrabalança as mudanças
produzidas pela seleção artificial. Este balanço é função direta da distribuição
de recursos disponíveis para um determinado indivíduo, num tempo determinado,
divididos entre os gastos de mantença, crescimento, reprodução, resistência à doenças
e outras demandas (Beilharz et al., 1993). O sucesso ou a falha da seleção artificial
geralmente depende do critério de seleção e sua taxa de mudança. Em alguns casos, a
intervenção humana ou a habilidade do animal se adaptar às mudanças têm permitido se
obter sucesso. Em outros casos, têm sido alcançados limites à seleção, além das quais
a resposta genética não pode ser obtida. Os recentes desenvolvimentos de técnicas
moleculares, que podem garantir seleção artificial e acelerar a mudança genética,
sugerem que progressos muito maiores são possíveis.
A habilidade reprodutiva dos plantéis de linhas puras de frango de corte tem
sido adversamente afetada pelo excessivo aumento no consumo de alimentos, que
tem ocorrido como conseqüência da resposta correlacionada da seleção para rápido
crescimento (Siegel e Dunnington, 1985). Ainda que possa parecer que a resposta
deletéria para adaptabilidade fosse autoeliminatória, isto não tem sido necessariamente
verdadeiro, segundo aqueles autores, uma vez que efeitos detrimentais são aliviados
por processos não-genéticos. Tais manipulações do ambiente podem mascarar
completamente as deficiências genéticas no nível fenotípico dentro de uma geração,
mas não evitam a perpetuação do defeito nas gerações subseqüentes. Além disso,
a seleção artificial não necessariamente favorece os indivíduos mais adaptados no
sentido darwiniano. A seleção artificial, à medida que distancia o indivíduo do seu
ótimo peso corporal, tem alterado os mecanismos de controle, tanto endócrinos quanto
neurais, que afetam o consumo de alimento, causando obesidade. Os aumentos na
freqüencia de óvulos defeituosos, espermatozóides, óvulos e infertilidade, que ocorrem
concomitantemente com a seleção para rápido crescimento, podem ser atribuídos à
desequilíbrios neuro-endócrinos, ruptura da sincronia na gametogênese, disfunções
em padrões de ovulação-oviposição e libido reduzida (Barbato et al., 1984). Os
efeitos principais destas disfunções têm permanecido ocultos em frangos, porque estes
alcançam peso de abate ainda jovens. Por outro lado, nos plantéis de seleção de linhas
de frango de corte, o consumo de ração é restrito rotineiramente desde a juventude e
continuado por toda a vida, para reduzir os efeitos negativos da obesidade e os efeitos
nocivos na locomoção e na fecundidade. Até agora, as influências negativas, que a
seleção para rápido crescimento tem acarretado na reprodução, têm sido combatidas
com pouco sucesso por meio de meios não genéticos.
Para McCarthy e Siegel (1983), a seleção prolongada para maior peso corporal em
aves de corte tem produzido resposta contínua, com pouca evidência de diminuição
da variância genética na taxa de crescimento. Entretanto, existe evidência de limites
incipientes, sugerida pela infertilidade de aves grandes e obesas. A taxa de crescimento
melhorada de linhagens selecionadas está associada principalmente com apetite.
O apetite das linhas selecionadas é caracterizada por taxa de consumo voluntário
acelerado; ao contrário do que acontece na alimentação de linhas não selecionadas, as
primeiras usam a capacidade do aparelho digestivo no limite máximo. A mediação

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fisiológica do apetite aumentado parece envolver a supressão dos mecanismos de


satisfação. A taxa de crescimento melhorada das linhagens selecionadas também está
associada com pequeno aumento na eficiência de utilização do alimento para ganho
de peso. A base metabólica da resposta correlacionada na eficiência ainda não está
esclarecida.
Barbato et al. (1984) sugere que a seleção para crescimento rápido em linhas de
frangos de corte tem resultado em falha do hipotálamo em reduzir o controlador do
apetite, levando ao consumo excessivo. Assim, aves selecionadas consomem acima das
exigências metabólicas, até alcançar o limite físico do trato gastrointestinal. A seleção
para alta eficiência de produção tem resultado em relações antagônicas a diversas
características reprodutivas. As matrizes de linhas de frango de corte selecionadas
para alto peso corporal mostram crescente padrão de ovulação errática e síndrome de
ovos defeituosos, além de maior porcentagem de espermatozoides mortos e anormais,
em comparação com linhas de baixo peso corporal.
Para Gavora et al. (1993), as doenças avícolas, no sentido amplo, incluem
aqueles problemas de saúde que se originam de ambientes fisicamente adversos,
nutrição inadequada, disfunções orgânicas de desenvolvimento e doenças infecciosas
e parasitárias. O melhoramento genético é particularmente importante para os dois
últimos grupos de doenças, pois existe vasto conhecimento sobre o mecanismo
causador das disfunções orgânicas, especialmente naqueles casos onde se envolvem
genes de efeito maior; mas a sua base molecular ainda é extensamente desconhecida.
Ainda segundo Gavora et al. (1993), existe evidência ampla de que os fatores
genéticos apresentam papel importante na resistência genética a doenças infecciosas,
e de que tal resistência parece ser controlada por poligenes e genes de efeito maior. O
conhecimento da base molecular dos mecanismos de resistência genética, tais como o
sistema de histocompatibilidade maior, a resposta imune e os receptores do patógeno
esta aumentando rapidamente. Também a estrutura genética dos genomas de muitos
patógenos já é conhecida e poderá ser utilizada no delineamento de estratégias para o
melhoramento da resistência do hospedeiro. Informação em genética molecular pode
ajudar na seleção para resistência, por empregar tanto marcadores genéticos que sejam
ligados aos genes, ou marcadores que sejam eles próprios componentes dos genes de
resistência. Tal seleção não requer exposição ao patógeno e é, portanto, desejável do
ponto de vista de bem-estar animal. O progresso no mapeamento molecular do genoma
das aves, juntamente com a elucidação da base molecular para a resistência genética,
vai representar papel importante no futuro melhoramento de resistência genética a
doenças em aves.
Para Pym (1985), entre os relativamente poucos trabalhos publicados sobre seleção
para conversão alimentar em frangos de corte, todos usaram a relação alimento
consumido:ganho de peso (g/g), medido até uma idade padrão, como característica
de seleção. Tais estudos indicaram que a seleção para eficiência alimentar melhorou
esta característica (h2 = 0,30–0,40) devido ao moderado aumento no ganho de
peso (correlação genética entre as duas características: 0,50); pequeno efeito no
peso inicial no começo do teste ou sobre consumo de alimento; decréscimo na
proporção de gordura do corpo, se medido a uma idade ou peso-padrão; aumento
na metabolizabilidade da energia da dieta; redução nas exigências energéticas para
mantença; aumento na disponibilidade líquida de energia metabolizável (EM) para
crescimento; leve depressão tanto em produção de ovos quanto eclodibilidade. Em
comparação com seleção para ganho de peso, a seleção para eficiência alimentar
resultou em conversão de alimentos superior, se medida a uma idade ou peso-padrão;
resposta reduzida em termos de ganho de peso; menos gordura corporal, se medida

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a uma idade ou peso-padrão; maior disponibilidade líquida de EM para crescimento,


melhor produção de ovos e eclodibilidade.

O Futuro
Para Preisinger (1998), no futuro os criadores deverão ter visão do mercado
específico para cada produto, para só então definir as metas de seleção e determinar
as prioridades. Por exemplo, sabendo-se que existe uma redução aparente na taxa de
progresso genético, os selecionadores de galinhas de postura terão de intensificar os
programas de teste para melhorar as estimativas da acurácia do valor genético e da
seleção. Os selecionadores principais já estão respondendo a este desafio, ao testar
galinhas cruzadas com controle de “pedigree” em vários sistemas de alojamento e
numa amplitude grande de ambientes. Os plantéis de elite são mantidos sob condições
de máxima biossegurança e testados quanto a características de herdabilidade alta.
As metas da seleção deverão ser redefinidas, e a seleção deverá ser concentrada
em características componentes da produtividade total que ainda estejam respondendo
à seleção. Antes de considerar outras características, os dados das aves com
“pedigree”, testadas em ambientes críticos, deverão ser coletados. Os parâmetros
genéticos estimados poderão ser empregados para predizer os benefícios potenciais da
seleção. Melhora da sobrevivência e da adaptabilidade geral são as metas principais,
num mercado globalizado, para os selecionadores aumentarem o número de ovos
comercializáveis por galinha alojada. Todos os esforços de seleção deverão ser
acompanhados por formulação de ração apropriada, programas de vacinação e de
manejo para otimizar sobrevivência e produção de ovos. Será requerida atenção
especial em programas específicos de cruzamento para desenvolver uma ave para
sistemas alternativos de alojamento. Os objetivos principais incluirão baixa prevalência
de canibalismo e ingestão de penas em aves sem debicagem. A seleção contra
comportamento aberrante vem se tornando mais importante para alcançar as exigências
de mercado e melhorar a produtividade global.
No caso das aves de corte, as demandas dos clientes tenderão a variar. Serão
necessárias raças/linhas diferentes para suprir necessidades diferentes (McAdam,
1997). Os objetivos do melhoramento de frangos de corte e de galinhas de postura
estarão centradas na melhora genética contínua das características, tanto do frango
como do ovo, além de melhora das linhagens para maximizar a produção de carne
e ovos de alta qualidade com o mínimo de custos, considerando a saúde humana e
o bem-estar animal. Os critérios de seleção serão definidos com base em consultas
aos clientes sobre as exigências do mercado, entendimento do negócio avícola,
desempenho do produto e as novas oportunidades de mercado. Atualmente as
linhagens de frangos de corte buscam crescimento rápido, excelente taxa de conversão
alimentar, boa sobrevivência, bom rendimento ao processamento e boa produção de
pintinhos.
O melhoramento genético previsto para o ano 2001, numa grande companhia de
genética de frango de corte, consiste na redução de 4 dias para alcançar o mesmo
peso de abate, com aumento na taxa de crescimento de 6g de ganho de peso diário,
com conversão alimentar melhorada em 25 pontos e consumo reduzido em 350g, com
rendimento de carcaça de 1,30% ou 33g e rendimento de carne no peito de 1,80% ou
44 g (McAdam, 1997).
As implicações da seleção sobre o bem-estar deverão levar a uma busca por melhora
na taxa de sobrevivência, resistência das pernas e do aparelho locomotor e adaptação

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cardiovascular. No aspecto econômico, busca-se melhorar a eficiência alimentar e a


qualidade da carne, pois esta já começa a apresentar a síndrome de palidez e maciez
(PSE: Pale Soft Sindrome).
No manejo das matrizes, busca-se controlar o ambiente, o peso à maturidade,
os perfis de crescimento e o nível de restrição alimentar. Na dimensão nutricional,
busca-se desenvolver a maturidade precoce e reduzir as exigências para postura. Do
ponto de vista sanitário, busca-se otimizar a imunidade materna. Já no caso dos frangos
de corte, as implicações do manejo do frango levam a buscar controle do ambiente por
meio de ventilação e densidade. No caso da nutrição, controlar a composição dos
alimentos e a época de ingestão dos constituintes. Do ponto de vista da saúde dos
frangos, busca-se melhorar a imunidade, a adaptação cardiovascular e a integridade do
esqueleto.
Em plantéis-núcleos, onde existe alta taxa reprodutiva das fêmeas, a con-
sangüinidade deverá ser evitada ao máximo. As estratégias que maximizam a resposta
genética e que minimizam a consangüinidade deverão ser utilizadas. Uma estratégia
é acasalar um fêmea com vários galos, isto é inseminar cada galinha com sêmen de
varios galos um por vez por incubação. Esta técnica oferece maior progresso do
que a clonagem que por sua vez vai apresentar impacto apenas na disseminação do
melhoramento genético. Plantéis de reprodução genéticamente inferiores aos clones
serão necessários para multiplicar o ganho genético contínuo.
Por outro lado a seleção indireta quando mais eficiente do que a seleção direta, no
início do esquema, torna-se gradualmente menos eficiente até perder em eficiência para
a seleção direta no caso de alcançar o limite.
Períodos de seleção relaxada tenderão aumentar as possibilidades de se alcançar
progresso genético extra após ter se alcançado platôs. Seria interessante considerar esta
estratégia nos programas intensivos de melhoramento genético da indústria avícola.
Outra estratégia seria a inclusão de parâmetros de bem-estar animal nos objetivos
de seleção destes programas. Os limites biológicos serão menos pronunciados nos
programas industrias do que nos experimentos de seleção, uma vez que aqueles
incluem maior número de características no agregado genotípico, porém o grau no qual
a biologia limita o progresso genético, parece ainda maior do que a teoria da genética
quantitativa tem indicado, principalmente em função de que existem características
com mecanismos de ‘threshold’ para funções biológicas importantes, notadamente
aquelas que dependem de ótimos hormonais, além do fato de que as correlações
genéticas mudam conforme o nível de produção de cada característica.

Referências Bibliográficas
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