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RESUMO — Nas duas últimas décadas, a Amazônia tornou-se foco de um processo de ocupação
acelerado e desordenado, criando sérias preocupações quanto ao futuro de seu vasto patrimônio
genético. A situação tende a se agravar à medida em que os métodos de conservação dos recursos
genéticos, que ora são utilizados na Amazônia para manter coleções de plantas em campo, revelam-
se inapropriados. Além de onerosos e limitados à espécies de reconhecido valor econômico.
Resultados de pesquisa evidenciam a importância de diversidade de espécies, densidade de plantas
e variabilidade genética, c o m o estratégias utilizadas pelas plantas para sobreviverem à
heterogeneidade do ambiente tropical. Tomando-se como referência essas características, propõe-
se discutir e apresentar um método de conservação ex situ de recursos genéticos de espécies
autóctones da Amazônia.
Novo León
. Floresta d e patula 27 VELA( 1980)
(México)
. Cerrados Brasília (Brasil) 82 OAKI & S A N T O S (1982)
. Floresta Tropical Panamá 133 KNIGTH (1971 )
S ã o Paulo BAITELLO & AGUIAR
. Floresta Subtropical 189
(Brasil) (1982)
Amazonas
. Floresta Tropical 265 R O S O T et al., ( 1 9 8 2 )
(Brasil)
Amazonas
. Floresta Tropical 310 S C H U B A R T ( 1983 )
(Brasil)
Por outro lado, o ambiente tropical meio ambiente. A manutenção dessa
permite alta taxa de evolução, interação é condição necessária para haver
diversificação e especiação, devido à equilíbrio da espécie com o meio ambiente.
reprodução rápida e contínua e à intensiva O equilíbrio é manifestado pelas plantas
seleção natural. Por isso, deve haver uma que conseguem sobreviver, mesmo num
substancial contribuição à diversidade. ambiente favorável ao aparecimento de
Segundo BROWN (1987), as regiões de doenças. Isso ocorre porque a floresta tropi-
maior heterogeneidade no ambiente cal caracteriza-se por apresentar baixa
permitem uma acomodação de uma parte densidade de plantas de uma mesma
maior dessa diversidade potencial. espécie por hectare.
É evidente que a diversidade de KAGEYAMA et ai, (1992)
ambiente que existe na floresta tropical, de referem-se à riqueza do ecossistema tropi-
certa forma, determina a existência de cal como sendo devida a freqüência de
diversidade nas populações de plantas. espécies raras que ocorrem em baixa
Além do que as perturbações que ocorrem densidade, com menos de um indivíduo
no meio também provocam alterações por hectare. Levantam, ainda, hipóteses de
nessas populações, no sentido de atingir um que esse grupo de plantas tem um
novo equilíbrio. A manutenção do polinizador específico, sofre uma seleção
equilíbrio também depende da existência dependente da freqüência e tem um sistema
de complexas interações entre as plantas e de reprodução alternativo.
o meio.
O cultivo de espécies autóctones na
Densidade de Plantas região, via de regra, desrespeita as
Quando se estuda a densidade de características básicas que as mantém em
plantas de uma espécie em seu local de suas populações naturais. Essas
ocorrência natural é comum inferir-se que, características - alta diversidade e baixa
quanto mais baixa for essa relação, maior densidade - são responsáveis, em parte,
é o nível de problemas biológicos pela manutenção do equilíbrio biológico
relacionados com a espécie. Por exemplo, existente nas populações.
a relação existente para a seringueira O monocultivo, por exemplo,
(Hevea brasiliensis) em populações normalmente não atende a esses lequisitos
naturais é de 4-6 plantas por hectare. No e conduz à uniformidade, na expectativa do
entanto, a seringueira cultivada na região aumento da produtividade. Em qualquer
apresenta um condicionante biológico, ambiente, a uniformidade do material
relacionado à doença das folhas, causada genético expõe o plantio a riscos de perdas,
pelo fungo Microcyclus idei, que devido ao surgimento de novas pragas e/
inviabiliza seu cultivo na densidade ou doenças. Nas regiões tropicais, a
recomendada de 476 plantas/ha uniformidade inviabiliza a manutenção da
(espaçamento de 7m χ 3m). atividade agrícola, em decorrência de um
Para ocorrer o fluxo gènico, entre e processo biológico mais dinâmico. Por
dentro de populações naturais, é necessário isso, pode-se afirmar que "o progresso
que a espécie mantenha interação com o conduz à uniformidade e a uniformidade
conduz ao fracasso" (PATERNIANI, (FAEGRI & PIJL, 1976). Esses
1988). resultados são corroborados pelos
estudos de BAWA ( 1 9 7 4 ) , que
Variabilidade Genética
demonstrou haver predominância de
A d i v e r s i d a d e g e n é t i c a , ou alogamia nas florestas tropicais.
variabilidade devido a diferenças nos HAMRICK (1983) relaciona a
alelos, conforme relata KAGEYAMA efetividade da distância de vôo do
(1987), pode ocorrer em diferentes polinizador com a distribuição da
níveis: a) de espécies dentro de variação genética entre e dentro de
ecossistemas; b) de populações dentro populações de espécies a r b ó r e a s
de espécies e c) de indivíduos dentro polinizadas por animais, sugerindo
de p o p u l a ç õ e s de e s p é c i e s . Essa padrões de variação próximos aos das
caracterização também é necessária espécies autógamas para aquelas cujos
para a compreensão dos padrões de polinizadores são de vôos curtos; até
distribuição da variabilidade genética padrões similares aos das espécies
existente em populações naturais na alógamas, com dispersão de pólen pelo
floresta tropical. vento, para aquelas que têm
A distribuição da variabilidade polinizadores de vôos longos.
genética natural é influenciada por Do mesmo modo, KAGEYAMA
fatores como: a) modo de reprodução; & PATINO-VALERA (1985)
b) sistema de cruzamento; c) tamanho formularam a hipótese de que a
efetivo da população; d) distribuição distribuição espacial dos indivíduos de
geográfica; e) estágio na sucessão; e 0 uma espécie está interligada
fluxo gènico, expresso pela migração intimamente ao tipo de polinização e
ou emigração de pólen e semente em de d i s p e r s ã o de s e m e n t e s dessa
uma população (HAMRICK, 1983). espécie. Assim, existiria um con-
Normalmente, uma população para tinuum de gradação, desde espécies
sobreviver e persistir no tempo deve arbóreas com distribuição agrupada
encontrar-se adaptada ao solo e ao meio em associada a polinizadores e dispersores
que vive, como também ter condições de de vôos c u r t o s , até à q u e l a s com
adaptação às mudanças que podem ocorrer distribuição muito dispersa, associadas
em seu ambiente, características que são a polinizadores e dispersores de vôos
favorecidas por alguns dos meca-nismos longos. Nesse contexto, os padrões de
promotores de variabilidade, tais como fluxo gènico, através da dispersão de
mutação e recombinação (KAGEYAMA pólen e semente, parecem fortemente
& PATINO-VALERA, 1985). relacionados com os padrões de
A fecundação cruzada representa variação genética nas populações.
um fator altamente positivo, baseado A complexidade dos e c o s s i s -
na maior variabilidade genética temas naturais das espécies arbóreas
produzida pelos constantes nas florestas tropicais é indicativo de
intercâmbios e recombinação genética que os estudos sobre estimativas de
entre os indivíduos heterozigotos variação genética em populações
naturais, devem orientar-se para a Tomando-se como referência
quantificação da variação entre e algumas características que contribuem
dentro de populações. para manutenção do equilíbrio entre as
Esses conhecimentos são espécies e o meio ambiente, apresenta-se
adquiridos a partir de informações um método de conservação ex situ de
básicas sobre a biologia reprodutiva, recursos genéticos de plantas, que seja mais
forma e padrão de distribuição da apropriado a região tropical úmida e
espécie e das estimativas de variâncias reproduza o equilíbrio das populações
fenotípicas e genotípicas. naturais.
A hipótese é implantar e avaliar
MÉTODOS DE sistemas que combinem diversidade de
CONSERVAÇÃO Ex Situ espécies, densidade de plantas de uma
mesma espécie por hectare e variabilidade
Combinando diversidade, genética dentro das espécies, para viabilizai"
densidade e variabilidade a conservação de germoplasma na região
Amazônica na forma de coleções mantidas
O aproveitamento racional da a campo, com custos reduzidos e
variabilidade genética das espécies respeitando-se as características de cada
cultivadas na região tem sido modesto, espécie.
comparativamente ao seu potencial.
Todavia, à m e d i d a que novos Em linhas gerais, no modelo de
conhecimentos vêm sendo adquiridos conservação proposto avalia-se o
sobre a forma de o r g a n i z a ç ã o , comportamento de 12 espécies, sendo 5
m a n u t e n ç ã o e d i s t r i b u i ç ã o da florestais dominantes e 7 de fruteiras, por
variabilidade genética das espécies hectare. São utilizados 3 tipos de
tropicais, se fortalece a hipótese de espaçamentos: i) 4 espécies no espa-
que o cultivo de uma espécie em çamento 20m χ 5m; ii) 3 espécies em 10m
ambiente tropical tem que, χ lOm; e iii) 5 espécies em 50m χ 10m.
obrigatoriamente, permanecer em No arranjo espacial utilizado 6 espécies
equilíbrio com os fatores bióticos e ficam com densidade de 80 plantas/ha, 5
abióticos do e c o s s i s t e m a . C a s o com 20 plantas/ha e 1 (uma) com 64
contrário está fadado ao insucesso. plantas/ha, totalizando 644 plantas/ha.
ex situ na região tem que ser BA1TELLO, J.B.; AGUIAR, O.T. 1982. Flora
sustentável em relação ao meio arbórea da serra da Cantareira (São Paulo).
Silvicultura em São Paulo, 16A( I ):582-590.
ambiente e apresentar baixo custo
BARRIGA, J.R; MACHADO, PER.; ALMEIDA,
operacional. Em princípio, essa
C.M.V.C.; ALMEIDA, C.F.G. 1984.
metodologia pode prejudicar a fase de Preservação e utilização dos recursos
avaliação ou c a r a c t e r i z a ç ã o dos genéticos de cacau na Amazônia brasileira.
acessos. É mais sensato hoje pensar Ilhéus, Comissão Executiva do Plano da
em conservar a variabilidade antes que Lavoura Cacaueira. 38p. (Comunicado
Técnico Especial, no. 5).
desapareça e, futuramente, avaliar o
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