Trata-se do arcabouço teórico de um projeto para construção de um
estacionamento subterrâneo a partir do sistema de contenção por cortina atirantada.
1 CONSTRUÇÃO DE SUBSOLOS EM OBRAS DE EDIFICAÇÕES
1.1 SUBSOLO: CONCEITO
Subsolo é todo pavimento situado abaixo do perfil do terreno. Não será
considerado subsolo o pavimento que possuir ventilação natural para o exterior, com área total superior a 0,006 m² para cada metro cúbico de ar do compartimento, e tiver sua laje de cobertura acima de 1,20 m do perfil do terreno (DECRETO 56.819/2011 – CORPO DE BOMBEIROS E POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO). As construções com escavação e contenção estão presentes há muitos anos, porém com o surgimento dos grandes centros urbanos surgiu a questão da preocupação com relação as edificações vizinhas. Com a redução do espaço físico nas cidades e a consequente proximidade das construções, começaram a surgir problemas para a execução de escavações, pois as mesmas afetariam o terreno vizinho devido ao movimento de solo. Com isso, entre 1920 e 1930 começaram a ser executadas as escavações com algum tipo de contenção, sendo essas feitas com peças de madeira. Eram utilizadas madeiras na direção horizontal, denominadas estroncas e na diagonal, denominadas escoras. As estroncas cruzavam o terreno apoiando-se nas paredes laterais, sendo comprimidas pelo empuxo lateral das paredes. As escoras eram colocadas de maneira mais aleatória sendo apoiadas nas paredes e em valas no solo (LAFRAIA et al., 2016).
1.2 OBRAS COM PAVIMENTOS SUBTERRÂNEOS
A construção de edificações com pavimentos subsolos, ou obras totalmente
subterrâneas, tem sido cada vez mais comum. Com o crescimento das cidades e a redução de áreas para a construção no espaço urbano, concomitantemente com o avanço nas tecnologias de escavação e contenção, contribui para esse aumento no número de obras subterrâneas. Contudo construções desse tipo apresentam diversas dificuldades e fatores restritivos. Os principais fatores e dificuldades são, presença de lençol freático, tipo de solo, proximidade de construções vizinhas, cronograma executivo, escolha de equipamentos adequados que serão utilizados para a execução da escavação, das contenções e das fundações.
1.2 REBAIXAMENTO DE LENÇOL FREÁTICO
A presença de lençol freático acima do nível do subsolo é um fator
preocupante para construções com pavimentos subterrâneos, sendo necessário o rebaixamento do mesmo. Algumas obras executam esse rebaixamento durante a etapa de construção, rebaixamento provisório, posteriormente realizam a impermeabilização do fundo da laje mais inferior e das paredes de contenção ao redor do subsolo, com isso o rebaixamento pode ser desligado e removido. Outra alternativa tem começado a ser aplicada em algumas edificações, nela o rebaixamento de lençol freático é definitivo não sendo desligado após o término da construção do prédio. Ao se fazer isso pode-se economizar no projeto, tendo uma laje inferior de menor espessura e economia em sistemas de impermeabilização do subsolo. Contudo essa alternativa aumenta os gastos com a manutenção do prédio, pois nela são utilizadas pelo menos duas bombas de rebaixamento uma principal e outra auxiliar em caso de falha da primeira. Ao se fazer essa escolha em projeto, deve-se fazer um estudo da vizinhança da edificação, pois os prédios vizinhos podem ser antigos e possuírem estacas de madeira, que precisam estar constantemente submersas para se manterem íntegras. Existem diversos tipos de rebaixamento de lençol, os principais tipos são: bombeamento direto, ponteiras drenantes, poços profundos e drenagem por eletrosmose (MÜLLER 2014).
2 TIPOS DE CONTENÇÕES
As contenções são classificadas, conforme o sistema utilizado para
resistência ao empuxo de terra aplicado, como: as que trabalham com peso, como muro de alvenaria de pedra, gabião, solo-cimento e muro de pneus; as que trabalham com ancoragem, caso de solo grampeado, cortina atirantada e terra armada; as que trabalham por ficha, como estacas justapostas; e os sistemas mistos, estacas justapostas com estroncas ou tirantes. Na escolha de qual tipo de intervenção deve ser aplicada, são enumerados alguns fatores, dentre eles, como dito por Mendes (2010), o tipo de solo de fundação bem como o tipo de solo a ser contido, as limitações de espaço e acessos, sobrecarga, altura da estrutura, tecnologia disponível, qualificação de materiais e mão-de-obra, além de investimento disponível. A estrutura pode ser de atribuição provisória ou permanente, sendo necessária essa definição na concepção do projeto, uma vez que os deslocamentos e diagramas de tensões são variáveis no tempo.
2.1 CORTINA ATIRANTADA
A utilização de cortinas atirantadas se constitui na solução técnica mais
adequada, quando se procura conter os elevados esforços horizontais advindos de escavações de grandes alturas, com um mínimo de deslocamentos do maciço de solo e das estruturas localizadas nas vizinhanças (MORE, 2013). No Brasil, esta técnica foi utilizada pela primeira vez no Rio de Janeiro em 1957, e que teve grande difusão, devido principalmente à significativa contribuição do Professor Costa Nunes, sendo empregada em larga escala a partir de 1966 com a grande enxurrada que assolou o Rio de Janeiro ocasionando deslizamentos de encostas e instabilidade de blocos de rocha. Um grande avanço ocorreu também na década de 1970, na implantação das obras do metrô de São Paulo, com a introdução de ancoragens reinjetáveis com calda de cimento sob altas pressões (MENDEZ, 2010). Cortinas atirantadas são contenções ancoradas ou acopladas a outras estruturas mais rígidas. Apresentam pequena deslocabilidade. Em geral, são compostas por tirantes injetados no solo e solicitados a esforços axiais de protensão, presos na outra extremidade em um muro de concreto armado, projetado para resistir aos esforços gerados pela reação do solo ao esforço confinamento exercido pelo conjunto muro-tirantes. 2.1.1 Componentes do tirante
Cabeça - Suporta a estrutura, possuindo os seguintes componentes
principais: placa de apoio, cunha de grau e bloco de ancoragem. Segundo a NBR 5629 (ABNT, 1996), bloco de ancoragem é o conjunto de peças que prende o tirante na região da cabeça. De acordo com More (2013), na prática, estas peças podem ser de três tipos: a) porcas, usadas em tirantes de barra onde existem roscas; b) cunhas, em tirantes com múltiplos fios; c) botões, onde a ponta de cada fio é prensada num macaco para formar um bulbo com diâmetro maior, para ser em seguida presa a uma peça de aço, com múltiplos furos de diâmetro praticamente igual ao dos fios. Trecho Ancorado - É a parte encarregada de transmitir ao solo, por meio das tensões cisalhantes entre bulbo de calda de cimento, e o maciço, os esforços normais suportados pelo trecho livre. É formado pelo tirante envolto em injeção de calda de cimento na relação de a/c de 0,5 sob pressão. O número de fases de injeção e a quantidade de calda injetada é sujeita à experiência do executor ou operador, sendo em geral aplicadas de 1 a 4 fases de injeção com volume de calda injetada de 20 a 60 litros por fase de injeção. Os ensaios de arranchamento, realizados de acordo com as exigências da NBR 5629:1996, das primeiras ancoragens da obra devem indicar se deve ou não ser necessário um incremento do número das fases de injeção inicialmente programadas. Trecho Livre - É a parte do tirante entre a cabeça do mesmo e o ponto inicial de aderência do bulbo de ancoragem, observada na montagem do tirante e conforme previsto em projeto (NBR 5629:1996). Elemento Resistente a Tração - Em geral, são utilizados como elementos resistentes a tração: Barras de aço, rosqueadas ou nervuradas, em diâmetros usualmente de 1 ¼” ou de acordo com a necessidade de projeto; Fios, que são elementos compostos por barras de aço, de menores diâmetros, em quantidade determinada de acordo a resistir aos esforços solicitantes; e elementos sintéticos, fabricados de forma a garantir alta resistência a tração. 2.2 METODOLOGIA EXECUTIVA
A metodologia cuja eficiência é comprovada pela prática consiste na seguinte
sequência de atividade: Preparo dos Tirantes - Para o uso de tirantes com barras de aço, deve-se preparar o corte de forma a posicionar as emendas dentro, ou o mais próximo possível do bulbo. Na utilização de fios, deve ser previsto um comprimento adicional não inferior a um metro, para a instalação do macaco hidráulico durante a fase de protensão. As cunhas de grau e placas devem ser tratadas com especial atenção, uma vez que a utilização de placas pequenas pode causar o puncionamento do concreto e cunhas de grau que não levem à ortogonalidade da cabeça com o eixo do tirante induzem flexão composta ao aço, que é crítica em elementos fortemente tracionados (YASSUDA; DIAS, 2008). Perfuração - A locação dos furos, direção e inclinação, determinadas em projeto, devem ser seguidas rigorosamente. De acordo com a NBR 5629:1996 qualquer sistema de perfuração é aceitável, para a execução dos tirantes, desde que o furo resultante seja retilíneo e com diâmetro, inclinação e comprimento previstos. Instalação e Injeção dos Tirantes - O posicionamento deve ser feito de acordo a não ferir a proteção anticorrosiva, não deslocar os acessórios (válvulas e espaçadores) e posicionar a cabeça na altura correta e podem ser de dois tipos: injeção em estágio único e aplicação com reinjeções. Protensão - A norma brasileira NBR 5629:1996 regulamenta que todos os tirantes devem ser submetidos a ensaios de prontensão. Sendo esses ensaios caracterizados como: ensaio de recebimento: aplicado a todos os tirantes, onde 10% destes são levados a cargas de protensão a até 175% da carga de trabalho, e os demais devem ser levados a 150% da carga de trabalho; e ensaio de qualificação: aplicado a 1% dos tirantes da obra, com esse ensaio é verificado a capacidade de carga do tirante e seus deslocamentos sob carga, calculando seu comprimento livre e avaliando o atrito ao longo deste comprimento livre (NBR 5629:1996). Dimensionamento - No dimensionamento estrutural é considerada a hipótese de uma laje cogumelo multi-apoiada. Estudo de Ruptura Externa - Coube ao professor Costa Nunes, desenvolver o método de estabilização com ancoragens, a partir do estudo de ruptura externa pelo Método de Culmann (FERREIRA, 2006). Dimensionamento do Tirante - Pela NBR 5629:1996, o material constituinte dos tirantes deve estar de acordo com as NBR 7480, NRB 7482, NBR 7483. Os esforços solicitantes nos tirantes devem ser calculados de acordo com métodos consagrados na mecânica dos solos, levando em consideração a deslocabilidade da estrutura de contenção, o número de níveis de tirantes e a sequência executiva. Dimensionamento do Bulbo de Ancoragem - A determinação do comprimento e seção transversal da ancoragem deve ser feita experimentalmente por meio dos ensaios básicos e de qualificação, sendo indicada para estimativas preliminares. Modos de Ruptura - O processo de ruptura de uma estrutura de cortina atirantada ocorre de forma progressiva dos elementos constituintes da estrutura (MENDES, 2010).
2.3 VANTAGENS E LIMITAÇÕES DO MÉTODO
A cortina atirantada oferece uma série de vantagens como solução de
contenção, principalmente, para taludes que apresentem elevadas cargas de solicitantes. Alguns exemplos de vantagens oferecidas pela cortina atirantada são: não oferece tensões elevadas na base; os tirantes trabalham ativamente, devido à protensão, suportando esforços com um mínimo de deslocamentos da estrutura; todos os tirantes são ensaiados individualmente, o que fornece uma segurança quanto à qualidade da execução; é capaz de suportar elevadas cargas de solicitação, contendo taludes com grandes alturas; e pode ser empregados em diversas situações, como na contenção de taludes de corte ou de aterro e contenção de blocos de rocha (TEIXEIRA, 2011). Já as limitações são: os tirantes, muitas vezes, necessitam de grandes comprimentos, o que, nas grandes cidades, pode gerar a necessidade de penetrar em terreno vizinho; as pressões exercidas pelo processo de injeção de ancoragem podem ocasionar deformações, como o levantamento do terreno, o que oferece risco a construções vizinhas; e devido a baixa densidade de tirantes empregados, a falha de um elemento pode ocasionar elevadas solicitações aos demais (TEIXEIRA, 2011).