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RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO E DO AGENTE PÚBLICO POR

OFENSA AO PRINCÍPIO DA MORALIDADE

Juliana Andrade Cavalcanti de Albuquerque Parísio1

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO – 1. OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA


EM NOSSA CF/88 – 2. AS PRINCIPAIS MUDANÇAS ADVINDAS COM A
PROMULGAÇÃO DAS EMENDAS CONSTITUCIONAIS DE REFORMA
ADMINISTRATIVA – 3. PRINCIPAIS REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS
UTILIZADOS PELO CIDADÃO PARA A DEFESA DE SEUS DIREITOS,
INTERESSES E GARANTIAS – 4. RESPONSABILIDADE DO ESTADO E DO
AGENTE PÚBLICO POR OFENSA AO PRINCÍPIO DA MORALIDADE – 5.
CONSIDERAÇÕES FINAIS – 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

RESUMO:

O presente artigo tem por objetivo demonstrar qual a responsabilidade do ente


público diante do seu dever de agir, não apenas com legalidade, impessoalidade, publicidade e
eficiência, como também, e, principalmente, com moralidade e ética. Diante do atual quadro
que está sendo vivenciado, importante uma análise sobre a Responsabilidade do Estado e do
agente público quando há ofensa ao princípio da moralidade administrativa. Com isso foram
abordados temas que tratam da responsabilidade civil, dos princípios fundamentais da
Administração Pública, dos remédios constitucionais que todo cidadão pode utilizar para a
defesa de seus direitos, interesses e garantias e, nas considerações finais, conclui sobre a
corrupção e a responsabilização dos gestores públicos por seus atos ilícitos.

1
Artigo elaborado para a conclusão do curso de pós-graduação a nível de especialização em Gestão e Políticas
públicas na ASCES-Associação Caruaruense de Ensino Superior em julho/2004, pela autora, advogada e
consultora Jurídica desde 2003, que atua em Palmares e Região da Mata Sul nas áreas de Direito Administrativo,
de Família, Sucessões, Contratos, Consumidor, Previdenciário, Trabalhista; Presidente da Comissão da Mulher
Advogada da OAB-Palmares-PE na gestão 2013 a 2015; Ex-Secretária da Mulher de Palmares na gestão 2013 e
2014; Ex-Presidente do COMDIM-Conselho Municipal dos Direitos da Mulher em 2013; Ex-Conciliadora do
PROCON-Palmares em 2004; Recebeu votos de aplausos e parabéns pela atuação na Secretaria da Mulher de
Palmares, da Câmara de Vereadores do Município em 2013; Recebeu votos de parabéns pela atuação em defesa
da mulher como Presidente da Comissão da Mulher Advogada, da OAB-Pernambuco em 2014.
2

INTRODUÇÃO

O nosso país vem passando por profundas mudanças desde a promulgação da


Constituição Federal de 1988, que instituiu o regime democrático de direito.

Para se atualizar com os problemas e mudanças que surgem a cada momento,


são editadas novas emendas constitucionais, leis complementares, ordinárias, delegadas,
medidas provisórias, etc., todas com o único objetivo: atender ao bem-estar de toda a
sociedade.

Para esclarecer e demonstrar os pontos mais importantes que estas mudanças


trazem e a importância do princípio da moralidade tanto para os agentes públicos e políticos
quanto para o particular que contrata com a Administração Pública, foi elaborado este artigo,
principalmente para tratar sobre a Responsabilidade Civil do Estado diante de ofensas ao
Princípio da Moralidade na Administração Pública.

Por ser um tema atual, diversas alterações ocorreram, e as mais recentes foram
as promulgações das Emendas Constitucionais nº 32/2001 e 41/2003, que trazem informações
sobre a real conjuntura político-administrativa em que o país se encontra e no qual terá que se
adaptar.

Para demonstrar qual a responsabilidade do ente público diante do seu dever de


agir, não apenas com legalidade, impessoalidade, publicidade e eficiência, como também, e,
principalmente, com moralidade e ética, de acordo com o disposto no art. 37, caput, da nossa
Constituição Federal de 1988, será feito uma breve análise sobre a importância do princípio
da moralidade administrativa e da probidade, bem como será detalhado sobre o tema
Responsabilidade Civil do Estado, com os exemplos mais comuns do cotidiano.

Diante de tantas corrupções e ilegalidades, inúmeras normas estão surgindo a


cada dia e, em muitos casos, tornando-se ineficazes pelo desuso, ou em alguns pontos são
eficazes apenas na aparência, em virtude de não haver uma fiscalização rigorosa por parte do
Estado, para evitar que determinadas pessoas atuem de forma imoral, desonesta e exerçam
mal a sua função, necessitando, portanto, de uma atuação mais intensa e conjunta dos
cidadãos para a defesa de seus direitos e busca de soluções que façam cessar a corrupção, a
lavagem de dinheiro, o enriquecimento ilícito, a fraude, no âmbito da Administração Pública,
seja ela Federal, Estadual ou Municipal.
3

A nossa Lei Maior elencou alguns remédios constitucionais que podem e


devem ser utilizados sem medo e sem constrangimento pelos cidadãos para fazer cumprir os
Princípios que estão contidos no art. 37, caput da mesma, que é a Ação Popular, o mandado de
segurança individual ou coletivo, o habeas data, o habeas corpus, o direito de petição e o
mandado de injunção, a ação civil pública, etc.

Mais adiante, os leitores encontrarão uma breve análise sobre as principais


ofensas cometidas pelo ente público ao princípio da moralidade, tentando demonstrar quais as
formas de combatê-las, utilizando-se dos remédios constitucionais, enfatizando a
responsabilidade civil do Estado diante de casos concretos dessa natureza e o dever de
indenizar tanto ao cidadão que sofreu o dano quanto à própria Administração Pública nos
casos de dano ao patrimônio, à ordem econômica e financeira, etc.

As metodologias utilizadas foram de pesquisas em bibliografias, artigos


científicos, publicações em internet, todos atualizados e que tratam sobre o assunto.

1. Os Princípios da Administração Pública em nossa Constituição Federal


de 1988:

O processo de redemocratização do país inaugurou um novo regime político: a


democracia participativa ou semidireta ampliou, de modo significativo, o rol de direitos
fundamentais, dedicando-lhes mesmo um título inteiro, reduziu a competência do Poder
Executivo, aumentando proporcionalmente as do Legislativo e do Judiciário, promoveu uma
valorização sem precedentes na autonomia dos Estados e Municípios da Federação,
reorganizou o Sistema Tributário Nacional, disciplinou os princípios norteadores da
Administração Pública e unificou o regime de vinculação dos servidores públicos civis, entre
outras inovações.

Somente a Constituição confere poderes e competências


governamentais. Os governos da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal
não são soberanos, pois todos são limitados, expressa ou implicitamente pela Constituição.

O artigo 37, caput, da nossa carta Magna, informa quais são os Princípios da
Administração Pública: Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência e
ainda há outros que são extraídos dos demais incisos e parágrafos, como o da licitação, da
4

prescritibilidade dos ilícitos administrativos, da responsabilidade civil das pessoas jurídicas de


direito público (inc. XXI e §§ 1º a 6º), e o da finalidade, que está incluído na legalidade.

Os Princípios Constitucionais da Administração Pública são a base para a


orientação do Administrador na prática de diversos atos administrativos, sejam atos de
legalidade como também de discricionariedade e para a boa administração dos negócios
públicos.

O Princípio da Legalidade é o princípio basilar do Estado Democrático de


Direito e é de sua essência subordinar-se aos impérios da lei, mas da lei justa e que realize o
princípio da igualdade. Nesse sentido, o Estado ou o Poder Público e seus administradores
não poderão exigir qualquer ação ou impor qualquer abstenção ou proibir alguma coisa, senão
em virtude de lei.2

O Princípio da finalidade está inserido no da legalidade, porque qualquer ação


do administrador público só será válida se atender o seu fim legal, ou seja, as finalidades que
a lei prescreveu. Hely Lopes Meirelles destaca-o da seguinte maneira: “impõe que o
administrador público só pratique o ato para o seu fim legal”3.

O Princípio da Impessoalidade define que os atos administrativos praticados


deverão ser imputados ao órgão público e não ao funcionário, que é apenas um agente que
formalmente manifesta a vontade Estatal. A primeira regra do estilo administrativo é a
objetividade, que está em estreita relação com a impessoalidade. Os autores Augustin A.
Gordilho nos fala que “essa objetividade revela a neutralidade da atividade administrativa” 4, e
Cármen Lúcia Antunes Rocha que “o princípio constitucional da impessoalidade
administrativa tem como objetivo a neutralidade da atividade administrativa, fixando como
única diretriz jurídica válida para os comportamentos estatais o interesse público”5.

O princípio da Publicidade é tido como um dos princípios da Administração


Pública porque exige a transparência dos atos administrativos com o intuito de dar
conhecimentos aos administrados do que está sendo feito pelos administradores. Por isso,

2
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 22ª ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 419.
3
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 14ª ed. São Paulo: RT, 1989.p.81
4
GORDILHO, Augustín A. Tratado de derecho administrativo. Buenos Aires: Macchi-Lopez, 1975.
T.II/XVIII-13 e XVIII-30 e 31.
5
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública. Belo Horizonte: Del
Rey,1994. p.147.
5

exige-se que todos os atos sejam publicados para surtirem efeitos externos, fora dos órgãos da
Administração6.

O Princípio da Moralidade Administrativa sempre esteve garantido e é um dos


princípios que mais causam polêmicas, pois muitos autores não aceitam a sua existência
afirmando já estar incluído no Princípio da Legalidade.

Porém, o brocardo jurídico “non omne quod licet honestum est (nem tudo que
é leal é honesto)” exprime, de maneira clara e objetiva, que Licitude e honestidade são traços
distintos do direito e da moral.

A origem da moralidade administrativa se remonta ao direito civil, na doutrina


do exercício abusivo dos direitos que, posteriormente, verificou-se no âmbito do direito
público, em especial, no direito administrativo, quando se começou a discutir o problema do
desvio do poder.

O autor Maurice Hauriou7 define a moralidade administrativa como sendo o


“conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração”; implica saber
distinguir não só o bem e o mal, o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o
inconveniente, mas também o honesto e o desonesto.

Como dito anteriormente, a origem da moralidade está intimamente ligada à


idéia de desvio de poder. A imoralidade estaria na intenção do agente. Por isso, muitos autores
antigos, acreditam que o poder judiciário só poderia apreciar a legalidade dos atos e não a
moralidade, por esta se relacionar com a disciplina interna da Administração, e somente
internamente, poderia ser exercido este seu controle.

Porém, com o intuito de sujeitar a moralidade administrativa ao exame judicial,


o desvio de poder passou a ser ato ilegal, sujeito ao controle judicial.

O que a Constituição quer, na verdade, é que a imoralidade seja fundamento de


nulidade de ato viciado. Mas não é a moralidade comum e sim a moralidade jurídica, como
justifica Hauriou quando diz que a moralidade administrativa “consiste no conjunto de regras
de conduta tiradas da disciplina interior da Administração”8.
6
SILVA, José Afonso da. Op.cit (nota 1). p. 649
7
apud DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 14ª ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 78.
8
apud SILVA, José Afonso da. Op. Cit. (nota 1). P.648
6

É comum na Administração a execução de atos legais morais ou imorais,


quando prejudicam ou beneficiam alguém. Tanto a Administração quanto o particular deverá
respeitar o Princípio da Moralidade. Por exemplo, num procedimento licitatório, os conluios
entre os licitantes ou o servidor que beneficia algum participante, com parentesco ou não,
elaborando uma licitação fechada ou até mesmo aberta, fere esse princípio, devendo, com
isso, o ato ser anulado por ser imoral, apesar de estar correto legalmente.

Portanto, essa imoralidade administrativa produz efeitos jurídicos acarretando


a invalidade do ato, que pode ser decretada pela própria Administração ou pelo Poder
Judiciário.

A imoralidade administrativa será apreciada através da AÇÃO POPULAR


garantida pelo art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal, a todos os cidadãos, e demais arts. 15,
V, 37, § 4º, e 85, V, este último considera a improbidade administrativa, que é uma forma de
imoralidade qualificada, como crime de responsabilidade. Para Maria Sylvia Zanella Di
Pietro, “quando se exige probidade ou moralidade administrativa, isso significa que não basta
a legalidade formal, restrita, da atuação administrativa, com observância da lei; é preciso
também a observância de princípios éticos, de lealdade, boa-fé, de regras que assegurem a boa
administração e a disciplina interna da Administração Pública”9.

Diz Hauriou10, desenvolvendo a sua doutrina, que o agente administrativo,


como ser humano dotado da capacidade de atuar, deve, necessariamente, distinguir o Bem do
Mal, o honesto do desonesto. E, ao atuar, não poderá desprezar o elemento ético de sua
conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o
conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas também entre o honesto e o
desonesto. Por considerações de direito e de moral, o ato administrativo não terá que obedecer
somente a lei jurídica mas também a lei ética da instituição, porque nem tudo que é legal é
honesto.

Conclui-se, como já dito anteriormente, que “a inclusão do princípio da


moralidade administrativa na constituição foi um reflexo da preocupação com a ética na
Administração Pública e com o combate à corrupção e à impunidade no setor público”11.

9
Op. Cit. (nota 6). P. 79-80
10
HAURIOU, Maurice. Précis elémentaire de droit administratif. Paris, 1926. p. 197 e ss.
11
Op. Cit. (nota 6). P.670
7

A moralidade administrativa está intimamente ligada ao conceito do “bom


administrador”12. Portanto, são pressupostos de validade do ato administrativo, a moralidade,
a legalidade e a finalidade, sem os quais a atividade pública será considerada ilegítima.

2. As Principais mudanças advindas com a promulgação das emendas


constitucionais de reforma administrativa.

A Emenda Constitucional nº 32/2001, ocasionou várias alterações no âmbito


do direito tributário, constitucional, administrativo e penal. Aqui serão tratadas as alterações
ocorridas no âmbito do direito administrativo, que tiveram como principal objetivo a restrição
de medidas provisórias pelo Presidente da República.

A partir dela, uma medida provisória passará a vigorar por sessenta dias
prorrogável por mais sessenta, se não houver sido aprovada em ambas as casas do Congresso
Nacional ao término dos sessenta dias iniciais. Além disso, passaram a existir limitações
materiais expressas à edição de medidas provisórias, ou seja, passaram a discriminar
expressamente na Constituição, as matérias que não podem ser disciplinadas por meio de
medidas provisórias.

Uma questão foi recentemente abordada pelo Congresso Nacional e pela


Presidência da República: o fechamento das casas de Bingo de todo o país.

O Presidente editou uma Medida Provisória desautorizando o seu


funcionamento no país, que foi derrubada pelo Congresso Nacional numa votação estressante,
porque uns entendiam que era um ato discricionário que não tinha fundamento, pois o Bingo
não era ilegal, e essa medida iria causar um grande transtorno devido à paralisação dos
empregos de milhares de cidadãos que estavam se mantendo daquele negócio, já outros
entendiam que estava acarretando em lavagem de dinheiro, vícios, enriquecimentos etc.
Porém, ambos estão certos. E é certo também, que muitos deputados dependem e defendem a
autorização de funcionamento dessas casas de Bingo porque, na verdade, são elas que
financiam suas candidaturas. E, assim, o ciclo continua.

12
Op. Cit. (nota 2). P.80
8

A seguir, há alguns comentários sobre a questão dos Bingos no Brasil, que


ocasionou um tumulto não só no Congresso Nacional como em todo o país e, principalmente,
nas famílias que deles sobrevivem, com base em informações do texto Bingo não é ilegal, do
autor Hélder B. Paulo de Oliveira 13, que será de grande valor para o entendimento deste
capítulo.

Fala-se desse instituto desde o Código Penal de 1890, da CLP de 1932, do


Código Penal do Império. O jogo de azar foi proibido como contravenção penal pelo Decreto-
Lei 3688/41, artigo 50. E continuou até que a Lei Zico nº Lei 8672/93, criou o FUNDESP
(Fundo Nacional de Desenvolvimento Desportivo) que tratava do bingo no artigo 57, onde se
verifica: "o órgão competente de cada Estado e do Distrito Federal normatizará e fiscalizará a
realização de que trata esse artigo".

A Lei Pelé nº 9615/98 revogou a Lei Zico. O artigo 59 originariamente dizia:


"Os jogos de bingo são permitidos em todo o território nacional nos termos dessa Lei".
Primeiramente o Decreto nº 2554/98 regulamentou a Lei Pelé. Essa Lei criou o INDESP –
Instituto Nacional de Desenvolvimento do Desporto - regulamentado pelo Decreto 2554/98,
no artigo 6°.

Significa dizer que a partir da Lei Pelé, ou seja, 24 de março de 1998, os


bingos são lícitos. Só que a exploração passou a ser serviço público de competência da União,
executada direta ou indiretamente pela Caixa Econômica Federal, a qual deveria transferir
para o INDESP as receitas auferidas, de acordo com os incisos I, II e IV do artigo 6° da Lei
9615/98. O Decreto regulamentar 2554/98 cuidava expressamente do bingo, do artigo 74 ao
artigo 105, tratando dentre outras coisas, do credenciamento junto ao INDESP, da autorização
para o bingo eventual e para o bingo permanente e da prestação de contas. Todas as normas
regulamentares obter-se-iam no INDESP. Portanto, o Decreto regulamentar cuidou dos
Bingos até a promulgação da Lei nº 9981/2000, em julho de 2000, que revogou os artigos 59 a
81 da Lei Pelé, que tratam sobre os Bingos, e passou a vigorar a partir de 31 de dezembro de
2001, "respeitando-se as autorizações que estiverem em vigor até a data da sua expiração".

A Lei 9981/00 afirmou ainda: "Caberá ao INDESP o credenciamento das


entidades e à Caixa Econômica Federal a autorização e a fiscalização da realização dos jogos

13
Bingo não é ilegal. Disponível em: www.jusnavigandi.com.br. Acesso em: 16/05/2004
9

de bingo, bem como a decisão sobre a regularidade das prestações de contas" (artigo 2°
parágrafo único da Lei 9981/2000).

Compreende-se, pois, que os bingos poderiam existir até 31 de dezembro de


2001. O Decreto 3659/00 revogou o Decreto 2554/98 tratando de regulamentar os bingos
permanentes que ainda estavam autorizados sob a égide da Lei Pelé.

A Medida Provisória nº 2216-37 extinguiu o INDESP: "As atribuições do


órgão extinto ficam transferidas para o Ministério do Esporte e Turismo e as relativas aos
jogos de bingo para a Caixa Econômica Federal". E foi além:

"Art. 17. O art. 59 da Lei nº 9.615, de 24 de março de 1998, passa a vigorar


com a seguinte redação:

"Art. 59. A exploração de jogos de bingo, serviço público de competência da


União, será executada, direta ou indiretamente, pela Caixa Econômica Federal
em todo o território nacional, nos termos desta Lei e do respectivo
regulamento".

Ou seja, o que seria revogado pela Lei 9981/2000, continuou no mundo


jurídico força da Medida Provisória 2216-37, que entrou em vigor em 31 de agosto de 2001,
quatro meses antes do prazo estipulado pela Lei 9981/00 para a proibição dos bingos,
enquanto essa última ainda estava em "vacatio legis". Ou seja, a proibição dos bingos ofertada
pela Lei 9981/00 nunca valeu. Aplica-se o princípio da LICC "a Lei posterior revoga a
anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule
inteiramente a matéria de que tratava a Lei anterior".

Atente-se que a Lei 9981 é de 2000, ao passo que a medida provisória é de


2001, para espancar qualquer argumento em contrário. Ou seja, o Poder Executivo não quis
que a Lei 9981/00 vigesse, no que tange à proibição dos bingos. O respectivo regulamento
para o artigo 59 da Lei Pelé seria o Decreto 3659/00.

Dessa maneira, não é verdade que os bingos estivessem proibidos. Estariam,


depois da Lei Pelé, com a vigência da Lei 9981/00, a partir de 01 de janeiro de 2002. Só que a
Medida Provisória 2216-37 foi inúmeras vezes reeditada, reavivando o artigo 59 da Lei
9615/98. O número "37" indica que foi reeditada trinta e sete vezes.
10

Em conclusão, a Lei 9981/00 revogou os bingos e passaria a viger a partir de


31 de dezembro de 2001. A Medida Provisória 2216-37, ainda no período de "vacatio legis"
da Lei 9981/00, pois é de julho de 2001, restaurou com nova redação o artigo 59 e foi
reeditada tantas vezes.

Por isso que os bingos funcionam à base de liminares. Acredita-se competir à


União legislar sobre sorteios, por força do artigo 22 inciso XX. Existe até um Mandado de
Injunção que pretende regulamentar esse inciso (MI nº 694).

Com a edição da mais nova Medida Provisória nº 168/2004, do Senhor


Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, verificou-se que esta é uma medida ilegal, pelo fato de
negar indenização nas rescisões dos contratos perfeitos e acabados, tratar de assunto direito
penal, o que é expressamente proibido pela Emenda Constitucional nº 32/2001, dentre
inúmeras outras idéias autoritárias.

Diz o artigo 1° da MP dos bingos:

"Art. 1º Fica proibida, em todo território nacional, a exploração de todas as


modalidades de jogos de bingo, bem como os jogos em máquinas eletrônicas,
denominados “caça-níqueis", independentemente dos nomes de fantasia.

Parágrafo único. A vedação de que trata o caput deste artigo implica a expressa
retirada da natureza de serviço público conferida a tal modalidade de
exploração de jogo de azar, que derrogou, excepcionalmente, as normas de
Direito Penal."

Com efeito, aponta o artigo 4°:

"Art. 4º O descumprimento do disposto no art. 1º desta Medida Provisória


implica a aplicação de multa diária no valor de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil
reais), sem prejuízo da aplicação de medidas penais cabíveis". (grifo nosso)

A emenda constitucional nº 32 de 11/09/2001 aponta que é vedada a edição de


medida provisória sobre matéria relativa a direito penal.

Diante disto, pode-se discutir na Justiça e pedir "inaudita altera pars" uma
liminar, em mandado de segurança, porque a Medida 168/04 é ilegal já que quebra o ato
jurídico perfeito, fere direito líquido e certo, e o que é pior, sem direito a indenização, além de
legislar sobre direito penal, o que também proíbe a Magna Carta.
11

Esta nova Emenda foi bastante positiva para o nosso ordenamento jurídico
porque nos trouxe a limitação de reedição e do prazo da medida provisória, que como foi
visto, não apresentava limites e acomodava o editor na elaboração da Lei para firmar a
matéria. Com isso, o nome de Medida Provisória estava perdendo a sua nomenclatura que
precisava ser restabelecida e a nova Emenda restaurou-a.

Portanto, não há como negar que os benefícios que esta Emenda nos trouxe
foram muitos, uma vez que o Chefe do Executivo terá que limitar o seu poder de elaborar
medidas provisórias ou transformá-las em Lei no prazo de 60 dias, prorrogáveis por mais
sessenta, sob pena de perder a sua eficácia.

3. Principais remédios constitucionais utilizados pelo cidadão para a


defesa de seus direitos, interesses e garantias:

A Constituição Federal de 1988 preocupou-se em defender o cidadão das


diversas formas de corrupção, fraude, abusos, cometidos por agentes públicos, políticos e
demais autoridades que participam da Administração Pública, inserindo em seu texto os
meios, ou instrumentos, ou “remédios” pelos quais o cidadão poderá e deverá utilizar para ter
seus direitos garantidos e para preservar a ordem social, política e jurídica do nosso país.

O termo remédio "tem o significado de recurso, solução, socorro, aquilo que


combate o mal, a dor, ou uma doença" (Dicionário Aurélio).

São eles:

1. AÇÃO POPULAR, art.5º, inciso LXXIII:


2. MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL E COLETIVO, art. 5º,
incisos LXIX e LXX;
3. MANDADO DE INJUNÇÃO, art.5º, inciso LXXI;
4. HABEAS CORPUS, art.5º, incisos LXVIII e LXXVII;
5. HABEAS DATA, art. 5º, incisos LXXII e LXXVII;
6. DIREITO DE PETIÇÃO, art.5º, inciso XXXIV.
12

Os remédios constitucionais são instrumentos de defesa dos direitos


individuais e dos cidadãos que estão dispostos na Constituição Federal de 1988, para provocar
as autoridades competentes, visando a sanar, corrigir ilegalidade ou abuso de poder em
prejuízo de direitos e interesses individuais.

José Afonso da Silva diz que ”são garantias constitucionais na medida em que
são instrumentos destinados a assegurar o gozo de direitos violados ou em vias de ser violados
ou simplesmente não atendidos”.14

Manoel Gonçalves Ferreira Filho15, embora não ache errôneo o emprego da


expressão garantias de direito constitucional, em referência aos ditos remédios, denominação
que também não lhe agrada, observa “que, rigorosamente falando, as garantias dos direitos
fundamentais são as limitações, as vedações, impostas pelo constituinte ao poder público”.

Para o autor Diógenes Gasparini “são mecanismos que propiciam aos órgãos
jurisdicionais o controle da legalidade dos atos e atividades administrativas do Executivo e
dos órgãos de administração do Legislativo e do Judiciário”.16

São, na verdade, garantias constitucionais que estão à inteira disponibilidade


do cidadão, para garantir cumprimento, realização, concretização dos direitos individuais,
fundamentais ou coletivos, que foram lesados.

A seguir farei uma breve análise sobre cada um deles:

1) AÇÃO POPULAR: Segundo o art. 5º, LXXIII da CF/88: “qualquer cidadão é


parte legítima para propor ação popular que vise anular ato lesivo ao
patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade
administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando
o autor, salvo comprovada a má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da
sucumbência”. A definição de José Afonso da Silva explica que “o nome
ação popular deriva do fato de atribuir-se ao povo, ou a parcela dele,
legitimidade para pleitear, por qualquer de seus membros, a tutela
jurisdicional de interesse que não lhe pertence ut singuli, mas à

14
Op. Cit. (nota 1). P. 440
15
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 1990.
p.270-271.
16
GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 771-772.
13

coletividade.”17 A ação popular está regulamentada pela Lei Federal nº 4.717


de 29/06/1965. E só o cidadão tem legitimidade para propô-la. Diógenes
Gasparini define cidadão como sendo “a pessoa física brasileira no gozo dos
direitos políticos, isto é, portadora de título de eleitor”. 18 Portanto, qualquer
cidadão, maior de 16 e menor de 18 anos, tem legitimidade para propor, se
eleitor. Fazem parte do pólo passivo da referida ação popular: as entidades
da Administração Pública direta e indireta e as pessoas privadas beneficiárias
do ato ou contrato lesivo e o agente público que autorizaram, aprovaram,
ratificaram ou praticaram o ato ou firmaram o contrato. A prescrição para o
ajuizamento da ação é de 05 anos. A procedência da ação popular
determinará a invalidação da medida impugnada, com a conseqüente
restituição dos bens ou valores, ou, ainda, o pagamento de perdas e danos.

2) MANDADO DE SEGURANÇA: o art. 5º, inciso LXIX, dispõe: “conceder-


se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não
amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela
ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa
jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”. O mandado de
segurança não tem cabimento contra lei em tese. O autor Hely Lopes
Meirelles conceitua direito líquido e certo como sendo “o que se apresenta
manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercido
no momento da impetração”.19

3) MANDADO DE INJUNÇÃO: “sempre que a falta de norma


regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades
constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à
cidadania, conceder-se-á mandado de injunção”, é o que dispõe o art. 5º
inciso LXXI da nossa Lei Maior. È uma ação civil constitucional de natureza
mandamental, que deve ser impetrado por quem tiver inviabilizado um dos
citados direitos por falta de lei complementar reguladora de sua fruição. O
impetrante é a pessoa física ou jurídica que se encontra na situação, enquanto
impetrado é o Poder Público (União, Estado, Distrito Federal e Município)

17
Op. Cit. (nota 1). P. 460
18
Op. Cit. (nota 15). P. 775
19
Op. Cit. (nota 2). P .71
14

que deveria ter promovido a regulamentação e não o fez. A decisão proferida


nessa ação só faz coisa julgada entre as partes. A competência para processar
e julgar essa medida é do: a) STF, se a competência para a elaboração da
norma regulamentadora for do Presidente da República, do Congresso
Nacional, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, de qualquer das
mesas dessas casas de Leis, do Tribunal de Contas, de um dos Tribunais
Superiores ou do próprio STF, conforme estabelece o art. 102, I, q; b) STJ, se
a elaboração da norma regulamentadora for de órgão, entidade ou autoridade
federal da Administração Pública direta ou indireta, consoante prescreve o
art. 105, I, h. Com relação à competência para processar e julgar o mandado
de injunção no âmbito dos Estados-Membros ou Distrito Federal devem
conformar-se com o que prescrevem as Constituições Estaduais, que poderá
ser os Tribunais de Justiça.
4) HABEAS CORPUS: “sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de
sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou
abuso de poder, conceder-se-á habeas corpus, conforme dispõe o art. 5º,
inciso LXVIII da CF”. Portanto, qualquer pessoa, com ou sem capacidade
postulatória, que sofrer limitação ou ameaça em sua liberdade de locomoção
pode se utilizar desta garantia constitucional na forma preventiva ou
liberatória.

5) HABEAS DATA: dispõe o art. 5º inciso LXXII: conceder-se-á habeas data:


a) Para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do
impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades
governamentais ou de caráter público; b) Para a retificação de dados, quando
não se prefira faze-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo.
Segundo Diógenes Gasparini, consiste na ação civil constitucional destinada
a garantir ao impetrante o direito de conhecer, em relação a sua pessoa,
informações constantes de registros ou banco de dados de entidades
governamentais ou de caráter público20. O direito de acesso a informações
está regulado pela Lei federal nº 9.507/97.

20
Op. Cit. (nota 15). P. 776-777
15

6) DIREITO DE PETIÇÃO: O inciso XXXIV do art. 5º da CF, diz que “são a


todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de
petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou
abuso de poder; b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para a
defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal”.

Esses são os remédios ou garantias constitucionais que asseguram ao cidadão o


instrumento através do qual possa utilizar para encontrar, concretizar os seus direitos e o da
coletividade que forem lesados por atos dos Administradores Públicos ou demais servidores.

4. Responsabilidade Civil do Estado e do agente público por ofensa ao


Princípio da Moralidade:

A responsabilidade civil do Estado nasceu do direito Francês e através da


construção pretoriana do Conselho de Estado.

Inicialmente surgiu a teoria da irresponsabilidade estatal, em que o


funcionário, por um comportamento pessoal seu, diretamente relacionado com o ato lesivo,
era responsabilizado. Tornou-se superada e evoluiu para a teoria da responsabilidade subjetiva
do Estado, baseada na culpa, já na segunda metade do século XIX. Depois passou para a
Responsabilidade Objetiva do Estado, sem culpa.

Na tentativa de resolver a questão da responsabilidade do Estado surgiram três


teses, conforme o autor Rui Stoco: “a) da culpa administrativa; b) do risco administrativo; c)
do risco integral, todas elas descendentes do tronco comum da responsabilidade objetiva da
Administração Pública, mas com variações de fundamento e aplicação.”21

A tese da Culpa administrativa leva em consideração o estabelecimento do


binômio falta do serviço/culpa da administração. Não se indaga da culpa do agente
administrativo, mas apenas da falta do serviço, como fato gerador da obrigação de indenizar o
dano causado a terceiro. Há exigência da comprovação da falta do serviço, além do fato
material, para ensejar a indenização.

21
STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial. 3ª ed. São Paulo: RT, 1997. p.
372.
16

A do Risco administrativo defende a obrigação de indenizar por parte da


Administração só pelo fato de ocorrer a lesão contra o particular. Não exigindo qualquer falta
do serviço nem culpa de seus agentes, bastando ocorrer o dano. O autor Rui Stoco explica que
“baseia-se no risco que a atividade pública gera para os administrados e na possibilidade de
lhes causar danos, impondo a alguns membros da comunidade um sacrifício ou ônus não
suportado pelos demais.”22

A Lei Maior, em seu art. 37, § 6º, orienta-se por esta tese, mantendo a
responsabilidade civil objetiva da Administração, sob a modalidade do risco administrativo.

O autor Hely Lopes Meirelles entende que “embora dispense a prova da culpa
da Administração, permite que o Poder Público demonstre a culpa da vítima, para excluir ou
atenuar a indenização. Isto porque o risco administrativo não se confunde com o risco
integral. O risco administrativo não significa que a Administração deve indenizar sempre e em
qualquer caso o dano suportado pelo particular; significa apenas e tão-somente que a vítima
fica dispensada da prova da culpa da Administração, mas esta poderá demonstrar a culpa
parcial ou total do lesado no evento danoso, caso em que a Fazenda Pública se eximirá
integral ou parcialmente da indenização”.23

A do Risco Integral foi abandonada na prática, por conservar a obrigação de


indenização a todo e qualquer dano suportado por terceiros, ainda que resulte de culpa ou dolo
da vítima.

Portanto, a melhor idéia de Estado de direito é a da responsabilidade objetiva


do Estado, com fundamento na teoria do Risco Administrativo, e a sujeição de todos à ordem
jurídica nacional, de modo que a lesão a bens jurídicos alheios impõe ao causador do dano a
obrigação de repará-lo.

Em sua essência, a responsabilidade do agente público pelos ilícitos que venha


a praticar é conseqüência lógica da inobservância do dever jurídico de atuar em busca da
consecução do interesse público. Dessa concepção teleológica derivam o dever de
transparência e o dever de prestar contas da gestão dos recursos públicos. Descumpridos os
deveres, haverá de incidir a sanção correspondente. Inexistindo sanção, ter-se-á o
enfraquecimento da própria concepção de dever.
22
Op. Cit. (nota 19). P.372
23
Op. Cit. (nota 2). P.590
17

Segundo o autor Emerson Garcia, “a responsabilização dos agentes públicos


pode se disseminar em múltiplas vertentes, assumindo um colorido administrativo, político,
penal, cível ou mesmo moral. Tais vertentes, que acompanharão a natureza do ato e a sua
potencialidade lesiva no contexto social, possibilitarão a aplicação de sanções extremamente
variáveis, quer seja em grau ou em essência.”24

Diz em seu artigo que, especificamente em relação à responsabilidade moral,


tem-se a projeção dos efeitos da publicidade do ato no organismo social, que os absorverá e
formará um juízo crítico a respeito das virtudes e dos valores ético-morais do agente público.
Sua conduta tanto poderá merecer o beneplácito como o repúdio de seus pares, o que terá
grande relevância nas hipóteses em que o agente, por pretender exercer a representatividade
popular, dependa dos votos daqueles que tiveram conhecimento de seus atos. Frustrados os
mecanismos de controle social, não resta outra alternativa senão buscar a efetividade dos
instrumentos de persecução e de repressão à corrupção.

Yussef Said Cahali25 observou que apenas a Constituição Federal de 1946, em


seu art. 194, adotou expressamente a Responsabilidade Objetiva do Estado.

A Responsabilidade Objetiva é a obrigação de indenizar que incumbe a alguém


em razão de um procedimento lícito ou ilícito que produziu uma lesão na esfera juridicamente
protegida de outrem. Para configurá-la, basta a mera relação causal entre o comportamento e
o dano.

Em resumo, essa responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo,


que admite pesquisa em torno da culpa da vítima, para o fim de abrandar ou excluir a
responsabilidade da Administração, ocorre diante dos seguintes requisitos: a) dano; b) ação
administrativa e c) nexo causal entre dano e ação administrativa.

Já a responsabilidade baseada na culpa do serviço, falta do serviço, falha do


serviço é subjetiva, porque baseada na culpa ou dolo.

24
Corrupção: uma visão jurídico-sociológica. Disponível em: www. Jusnavigandi.com.Br. Acesso em:
26/05/2004
25
Responsabilidade civil do Estado. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1995. p.23.
18

Renato Rodrigues Gomes26, autor de um artigo publicado na internet, afirma


ser inconstitucional a denunciação da lide do agente público pelo Estado, no exercício de seu
direito de regresso.

No passado, vigorava a Teoria da Irresponsabilidade Estatal, onde Estado e


indivíduo eram pessoas distintas e as lesões causadas por este, no exercício de suas
atribuições não vinculava aquele. Apenas o causador do dano possuía legitimidade passiva
para ser demandado em juízo pelo prejudicado.

No atual Estado Democrático de Direito, com base na Constituição Federal de


1988, deve-se observância a todos os preceitos fundamentais constitucionais. Passa-se a ser
irrelevante se a lesão foi gerada licita ou ilicitamente, comissiva ou omissivamente, tornando-
se indispensável que a sua reparação seja suportada por toda a coletividade, a legítima
beneficiária dos efeitos produzidos pela conduta estatal, ora prejudicial a determinado cidadão
particular.

É importante olvidar que o Estado foi constituído para satisfazer as


necessidades do homem, como ser humano, não o inverso, com o mesmo submetendo-se
indiscriminadamente à vontade do Estado. E um dos modos de satisfazer o povo, é cumprir os
mandamentos da Constituição, assegurando-lhe os seus direitos e uma existência digna
segundo os ditames da Justiça social.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS:

A Lei, os Princípios Gerais do Direito e a Doutrina são excelentes fontes de


estudo e consulta que nos auxiliam nesta constante jornada do Direito. E, ao estudarmos, cada
vez mais adquirimos conhecimentos e esclarecemos as nossas dúvidas.

Muitas vezes, utilizamos-nos da aplicação de princípios de forma


individualizada, partindo das proposições iniciais e determinantes (princípios fundamentais)
para que possamos apontar as demais proposições conseqüentes (princípios derivados ou
subprincípios). É o que nos ensina o autor Jones Figueiredo Alves.27

26
Denunciação da lide pelo Estado ao agente causador do dano provocado ao indivíduo em decorrência de
ato da Administração Pública “lato sensu” – uma afronta à Constituição. Disponível em:
www.jusnavigandi.com.br. Acesso em: 02/05/2004;
27
Da aplicação prática dos princípios processuais – uma proposta de estudo. Monografia. Recife: ESMAP,1990.
p. 16.
19

Sabemos que a maioria de nossos deveres está descrito na Lei, nos Princípios,
na nossa Constituição, na doutrina, assim como os deveres éticos e morais, que todos devem
observar e incluir, acima de tudo, em todas as etapas de nossos trabalhos.

Porém, muitas vezes, quando se trabalha direta ou indiretamente num órgão


público, com acesso ao dinheiro público, em certas pessoas nasce espontaneamente a vontade
de “corrupção”. Os servidores públicos que dele se utiliza para se promover pessoalmente,
para praticar ato lesivo ao patrimônio público, à Lei, ou com desvio de finalidade, é punido
administrativa, penal e civilmente, devendo devolver tudo o que retirou com correção
monetária, juros e outros encargos, e ainda perde o cargo ou função que ocupava, além da sua
dignidade, por ter exposta toda a sua vida aos cidadãos, que são os mais prejudicados.

São tantos os prejuízos que chegam, às vezes, a serem irreparáveis, pela


imagem que nos deixam, como foi o caso de um ex-Presidente da República, de um ex-
Prefeito de um município do Estado de São Paulo, e inúmeros outros, como Juízes,
Advogados, Médicos, Engenheiros...

As pessoas sabem do mal que poderão sofrer, mas, lamentavelmente, se


contaminam facilmente, porque o dinheiro público não é pouco, e se torna fácil adquiri-lo,
mesmo que obedecendo a todos os trâmites legais de uma licitação pública, por exemplo.

Acontece que os cidadãos quando descobrem que houve fraude em alguma


licitação, ou enriquecimento ilícito, desvio de finalidade, corrupção, não têm a coragem de
denunciar à Promotoria de Justiça, porque devem algum favor, dependem daquele serviço, ou
porque têm medo de sofrer perseguição, constrangimentos, ameaças, etc, e muitos desses
criminosos nem chegam a ser punidos e continuam destruindo os cofres públicos.

Por isso grande parte da falta de obras, do progresso de um município, é culpa


da própria população que não denuncia essas práticas abusivas, desleais, corruptivas, que
levam o dinheiro dela, pago através dos impostos, ao bolso dos Administradores Públicos e a
sua equipe.

Os cidadãos devem perder esse medo e criar coragem para lutar pelo seu
dinheiro, que saiu com muito sacrifício de seu bolso, e exigir que obras sejam realizadas, que
o município seja fiscalizado, que os Tribunais de contas caiam pesados sobre eles, a fim de
20

descobrir se houve qualquer tipo de fraude, de enriquecimento ilícito, de desvio de finalidade


ou qualquer outro crime, para que a corrupção seja combatida ou evitada.

Os Tribunais de Contas foram os órgãos mais fortalecidos com a Lei de


Responsabilidade Fiscal (LRF), que é a Lei Complementar nº 101, de 04/05/2000. As cortes
de contas tiveram suas competências acrescidas com uma série de atribuições. Adotaram o
modelo de controle que privilegia o exame preventivo e concomitante, devendo avaliar o
resultado de cada gestão. Compete aos Tribunais de Contas alertar os Poderes e Órgãos
quando verificadas quaisquer irregularidades. É o que nos diz os ensinamentos dos autores
Marcos Antônio Rios da Nóbrega e Carlos Maurício Cabral Figueiredo.28

Depois que há danos a terceiros, à população, a responsabilidade deve recair


sobre o Estado, que posteriormente entrará com a ação regressiva contra o servidor público
que causou o referido dano. São inúmeros os casos de responsabilidade civil do Estado por
ofensa ao Princípio da moralidade, um dos mais recentes, que se encontra em alta nos meios
de comunicação, como foi o caso do ex-Prefeito do Município de São Paulo, que se utilizou
do dinheiro público para enriquecer-se ilicitamente.

Carlos Nogueira29, em seu artigo publicado na internet, afirma que existe uma
estrutura de controle da gestão pública estabelecida para o setor público e, se situações dignas
de críticas ocorrem, são decorrentes de falhas de natureza operacional e não por falta de
instrumento adequado. Concordo, mas o elemento essencial para haver um controle da gestão
pública é a postura ética e moral do administrador e de seus administrados em todas as
repartições públicas do país. Esse é o maior problema que está se tornando incontrolável.

Controlar, no dizer do mesmo autor, é: “qualquer ação tomada pela


Administração Pública com o objetivo de atingir metas preestabelecidas. A Administração
Pública planeja, organiza e supervisiona a execução de inúmeras funções, e estas atividades,
quando são bem executadas, devem resultar no atingimento destas metas. O resultado do
planejamento, da organização e da supervisão é o que se denomina Controle”.

Esse Controle será Externo e/ou Interno, dependendo da pessoa que irá exercê-
lo. Se for a própria Administração através de servidores designados para exercer tal função,

28
Os Municípios e a Lei de Responsabilidade Fiscal – Perguntas e Respostas. Editado pelo Departamento de
Relações Institucionais, em Junho de 2001. p. 64-65.
29
Controle da Gestão Pública. Disponível em: www.vemconcursos.com.br acesso em: 18/04/2004.
21

Auditorias Gerais, o Controle será Interno (art. 74 da Carta Magna). Se for por Órgãos
especializados, como por exemplo, o Tribunal de Contas, o Congresso Nacional, o Controle
será Externo (art. 70 da Lei Maior).

O Controle das ações do setor público é efetuado através de realização de


auditorias por órgãos especializados: Auditorias Gerais e Tribunais de Contas.

A Constituição Federal de 1988 em seu art. 70 estabelece que “a fiscalização


contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e dos órgãos da
Administração direta e indireta, quanto a legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação
de subvenções e renúncia de receitas, é exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle
externo, e pelo sistema de controle interno de cada poder”.

É aplausível a explicação do referido autor, também, quando afirma que poderá


melhorar o desempenho dos órgãos de controle, o aperfeiçoamento de seu quadro de pessoal e
a implementação de instrumentos modernos que possibilitem a agilização de suas ações e a
troca de experiências.

Mesmo com todo esse aparato, iremos sempre conviver com os problemas,
injustiças sociais, desmoralização pública causada por servidores ou políticos corruptos, mas
nunca devemos esquecer que nós é que temos o dever moral de agir com probidade,
legalidade, eficiência, responsabilidade, ética, disciplina e ensinar aos filhos que o respeito ao
cidadão é tudo isso e também parte de todos, ou melhor, de cada um de nós, para que
construam um mundo ainda melhor.

Portanto, este artigo traz aos leitores esses conhecimentos e uma reflexão sobre
a moralidade, tendo como público alvo não somente servidores públicos, políticos, mas
também qualquer cidadão para que, desde já, comecem a agir com respeito, responsabilidade,
ética e de acordo com a Lei, a moral, os bons costumes e os Princípios Constitucionais e da
Administração Pública, com o fim de garantir o que está disposto na Constituição Federal de
1988, concretamente, para que não passe apenas de um livro ou de uma folha de papel.

E, por sermos cidadãos, acima de tudo, para exigir nossos direitos, devemos
cumprir com nossos deveres, atuando retamente e sempre seguindo o caminho da paz, da
justiça e da solidariedade social, combatendo todas as formas de corrupção, e principalmente
buscando na Lei, a responsabilidade daqueles que cometem tais crimes.
22

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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Alterações no âmbito do direito administrativo. Disponível em:
www.vemconcursos.com.br. Acesso em: 10/05/2004;
2. ALVES, Jones Figueiredo. Da aplicação prática dos princípios
processuais – uma proposta de estudo. Monografia. Recife: ESMAP, 1990;
3. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: Responsabilidade
Civil. São Paulo: Saraiva, 2002;
4. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 14ª edição. São
Paulo: Atlas, 2002;
5. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional.
17ª ed. São Paulo: Saraiva, 1990.
6. FRANCO SOBRINHO, Manoel de Oliveira. O controle da moralidade
administrativa. São Paulo: Saraiva, 1973.
7. GARCIA, Emerson. Corrupção: uma visão jurídico-sociológica.
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8. GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 7ª ed. São Paulo: Saraiva,
2002;
9. GOMES, Renato Rodrigues. Denunciação da lide pelo Estado ao agente
causador do dano provocado ao indivíduo em decorrência de ato da
Administração Pública “lato sensu” – uma afronta à Constituição.
Disponível em: www.jusnavigandi.com.br. Acesso em: 02/05/2004;
10. HAURIOU, Maurice. Précis elémentaire de droit administratif. Paris, 1926;
11. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 14ª ed. São
Paulo: Malheiros, 1989;

______. Licitação e contrato administrativo. São Paulo: Revista dos


Tribunais, 1990.

12. MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo.


São Paulo: Malheiros, 1995;
23

______. Licitação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980.

13. NÓBREGA, Marcos Antonio Rios da, e FIGUEIREDO, Carlos Maurício


Cabral. Os Municípios e a Lei de Responsabilidade Fiscal – Perguntas e
Respostas. Editado pelo Departamento de Relações Institucionais, em
Junho de 2001.
14. NOGUEIRA, Carlos. Controle da Gestão Pública. Disponível em:
www.vemconcursos.com.br. Acesso em: 18/04/2004;
15. OLIVEIRA, Hélder B. Paulo de. Bingo não é ilegal. Site:
www.jusnavigandi.com.br. Acesso em: 26/05/2004;
16. STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação
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17. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 22ª ed.
São Paulo: Malheiros editores, 2002.
18. TÁCITO, Caio. Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 1975.
19. VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: Responsabilidade Civil. São
Paulo: Atlas, 2002.
20. VIEIRA, Felipe. Ética na Administração em face dos Princípios
Constitucionais de Administração Pública. Disponível em:
www.vemconcursos.com.br. Acesso em: 10/05/2004.

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