Aula - A SUPREMACIA DE CRISTO: Colossenses 1. 15 – 20
Cristo encarnado é supremo sobre todas as coisas, pois Ele é o criador do universo, a esfera na qual tudo subsiste e o agente de Deus na reconciliação do universo.
Segundo D. A. Carson, Paulo enfatiza nesta poesia, a supremacia de Cristo, que é “a imagem do Deus invisível”, aquele que trouxe a criação à existência, bem como a mantém unida. E junto com tudo isso, ele é “o cabeça do corpo, a igreja”, aquele que fez a paz pelo sangue derramado na cruz. Em seguida há uma aplicação das verdades supracitadas a vida da igreja. (1.21-23).
CONTEXTO CANÔNICO
Será apresentado apenas às correlações principais dos aspectos cristológicos presentes na perícope aqui analisada. A ideia de Cristo como sendo o Deus eterno que se fez um de nós, se encontra, também, no prólogo do quarto Evangelho (Jo. 1. – 14). No que se refere a Cristo como “à imagem de Deus” essa verdade já fora afirmada pelo Apóstolo em 2 Cor. 4.4. Em ambos os lugares, Cristo como “à imagem de Deus” aponta para a revelação da essência do Pai na Pessoa do Filho. Ainda, com o uso da palavra “imagem”, Paulo está enfatizando que Jesus é a manifestação perfeita de Deus. Como assevera o autor de Hebreus ele é “a expressão exata do seu Ser” (Hb. 1. 3).
O título “Primogênito” No que se refere a sua supremacia apresentada no verso dezesseis, (o qual Paulo afirma que Cristo é superior a todos os seres angélicos, inclusive dos mais sublimes) vemos o autor de Hebreus dá a mesma ênfase. (cf. Hb. 1:1-14).
Finalmente, em relação à restauração cósmica: “reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer nos céus” (Cl 1.20), é possível perceber a mesma ideia em Romanos quando Paulo diz que “a ardente expectativa da criação aguarda a revelação dos filhos de Deus... na esperança de que a própria criação será redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus” (Romanos 8. 19 – 22).
COMENTÁRIOS
1ª ESTROFE - A EXALTAÇÃO DO FILHO DE DEUS O CRIADOR, SENHOR E GUIA DO UNIVERSO (V. 15,16).
ὅς ἐστιν εἰκὼν τοῦ θεοῦ τοῦ ἀοράτου (“O qual é imagem de Deus o invisível”). Esse sem dúvida é um ponto importante neste texto, por isso, será dado atenção devida a ele. A palavra traduzida por “imagem” (εἰκὼν [eikon] - substantivo nominativo feminino singular).
Observa-se que em ambos os textos onde Paulo afirma que Cristo é a εἰκών [eikon] (“imagem”) de Deus (aqui e em 2 Coríntios. 4:4), o foco está na revelação de Cristo como sendo igual em essência a Deus.
Cristo é a imagem de Deus no sentido ontológico (isto é, tem a mesma essência de Deus).
O uutro o uso da palavra “imagem”, Paulo está enfatizando que Jesus é a manifestação perfeita de Deus. Para vermos como é Deus devemos olhar para Jesus (cf. João 14.7-10; 1.14-18; 12.45; Hebreus 1.3). Assim, a natureza e o caráter de Deus foram perfeitamente revelados em Cristo, no qual o Deus invisível se tornou visível.
O CRIADOR DE TODAS AS COISAS.
Após falar de Cristo como manifestação do Pai, Paulo continua a louvar a pessoa de Cristo, agora como o criador de todas as coisas. Dos versos 15b a 16, Paulo fala da Supremacia e centralidade de Cristo em relação à criação, e mostra que o universo foi criado no Filho (ἐν αὐτῷ - a esfera da criação) por meio dele (ἐν αὐτῷ - como o agente divino da criação), para ele (εἰς αὐτόν - como o objetivo ou alvo da criação).
O termo πρωτότοκος (adjetivo pronominal nominativo masc. Singular – “primogênito”) sintetiza o pensamento paulino sobre a Supremacia de Cristo. A palavra πρωτότοκος (primogênito) não pode ser entendida como se Cristo fosse o primeiro ser criado, observa-se que o contexto deixa claro que o título não pode se referir a ele como o primeiro de todos os seres criados, pois as palavras imediatamente a seguir, que fornecem um comentário sobre o título, enfatizaram o ponto que ele é o único por quem a criação toda veio a existir. O erro de muitos estudiosos ao longo da história (entre eles Ário) foi o de não entender à luz do contexto, o genitivo κτίσεως (substantivo genitivo feminino singular – “criação”). Este não pode ser entendido como “partitivo” (Cristo como parte da criação), mas sim como genitivo de “subordinação” (a criação subordinada a Cristo ou Cristo sobre a criação).
Assim, como corretamente observa Keathley, “primogênito”, neste texto, significa duas coisas: Ele precedeu toda a Criação, e Ele é soberano sobre toda a criação.
Após falar da supremacia de Cristo sobre a criação (verso 15), Paulo passa a descrever a centralidade de Cristo na mesma. No verso 16, ele cita três formas específicas em que Cristo e a criação são relacionados: “nEle foram criadas todas as coisas”... “Tudo foi criado por meio dele” e finalmente “tudo foi criado para ele”.
À luz do verso 17, entendemos que a preposição ἐν deve ser vista como um locativo. Nesse sentido, ela aponta para Cristo como a “esfera” dentro da qual a obra da criação ocorre. Segundo Haupt, a frase “nele” tem a mesma força como em Efésios 1.4, onde se ler: “Porque Deus nos escolheu nele antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis em sua presença” (NVI - destaque nosso). Nesse sentido a criação de Deus, como a sua eleição, ocorre ἐν (em) “Cristo” e não a parte dele. Vaughan segue este mesmo caminho e diz que a criação em relação a Cristo estava condicionada a sua causa, o seu centro de origem, a sua localização espiritual. Sendo assim, ἐν αὐτῷ deve ser entendida como “em sua mente” ou “em sua esfera de influência e responsabilidade”.
2ª ESTROFE - A exaltação de Cristo o Sustentador de todas as coisas e Senhor da igreja. 17-18a
O SUSTENTADOR DE TODAS AS COISAS
Após falar da supremacia e centralidade de Cristo em relação à criação, Paulo passa a exaltá-lo como sendo o Sustentador de todas as coisas e Senhor da igreja. 17-18a.
Bruce assevera que o ensinamento da primeira estrofe é recapitulado, nesta estrofe de transição, em uma dupla reafirmação da preexistência e do significado cósmico de Cristo: “E ele é antes de todas as coisas”, e, “as coisas todas nele se postaram juntas e permanecem juntas” (v. 17). Na primeira parte Paulo destaca a Primazia de Cristo. “E ele é antes de todas as coisas” (v. 17a). A preposição πρὸ (“antes de”) pode designar tanto prioridade no tempo como “prioridade na classificação”. Segundo Wallace, considerando o contexto, ela aponta para ambas nuances (tempo e prioridade). Assim, Cristo tem prioridade sobre todas as coisas e está antes delas.
Em seguida, Paulo assevera que Ele é o sustentador de todas as coisas: “As coisas todas nele se postaram juntas e permanecem juntas” (v. 17b). O verbo συνέστηκεν (verbo indicativo perfeito ativo 3a pessoa singular) significa, neste contexto, “manter juntos”, “coerentes”. O tempo perfeito, aponta para o fato que, o universo teve e continua tendo sua coerência contínua em Cristo.
Calvino lembra que o Criador não esqueceu a criação. Ele diariamente mantém o equilíbrio no universo. Nas palavras de Lightfoot, Cristo é “o princípio da coesão”, que faz o universo um cosmos em vez de um caos. Sem ele, a gravidade deixaria de funcionar, os planetas não permaneceriam em suas órbitas.
3ª ESTROFE - EXALTAÇÃO DO CRISTO RESSURRETO, EM QUEM TODA PLENITUDE HABITA E QUE É TAMBÉM O AGENTE DE DEUS PARA TRAZER O UNIVERSO EM HARMONIA ATRAVÉS DA RECONCILIAÇÃO (18B – 20).
CRISTO RESSURRETO
“Ele é o princípio, o primogênito dentre os mortos”. A pessoa que é a cabeça do corpo, a igreja, é o Cristo ressurreto. A ideia de ἀρχή (“princípio”) deve ser entendida em um aspecto cronológico. Por essa razão, “princípio” nesta passagem, implica em “fundador” ou o que “abri o caminho”.
Esse entendimento lança luz na compreensão da segunda menção do termo πρωτότοκος (“primogênito”). Ele é um eco do verso v. 15b. “o primogênito de toda criação”. No verso quinze πρωτότοκος (“primogênito”) sugere tanto a precedência no tempo.
Ao que parece aqui a ideia de precedência é a mais proeminente.
O significado é que Cristo foi o primeiro a ressuscitar sem voltar a morrer.
Ele é o que inicia a ressurreição escatológica (cf. 1Co. 15:20).
Ele tem supremacia sobre tudo. O hino já havia afirmado a precedência de Cristo na criação, mas agora menciona sua primazia na ressurreição. Em ambas (criação e nova criação) tudo vem dele e é para ele.
O verbo πρωτεύω (“tendo primazia”) ocorre apenas aqui no Novo Testamento e traz a ideia de “ter o primeiro posto”.
Moule traduz como: “que ele possa ficar sozinho supremo entre todos” ou “cabeça única de todas as coisas”. Já a frase ἐν πᾶσιν (“em todas as coisas”), poderia também ser traduzida como “entre todos os povos”, apontando assim, para o reinado de Cristo sobre toda a terra
CRISTO A PLENITUDE DE DEUS
A maioria dos exegetas entende πλήρωμα (“plenitude”) como paralelo com “plenitude da divindade” (2.9). Nesse sentido o Filho encarnado era e é à plenitude de Deus, isto é, possui todas as qualidades da essência divina. Os falsos mestres em Colossos estavam convidando os cristãos para experimentar “plenitude” verdadeira, seguindo sua filosofia (2.8) e regras humanas (cf. 2.16-23), a que Paulo responde: a “plenitude” que você está procurando só é encontrada em Cristo.
Observa Douglas Moo, “plenitude” em si indica totalidade o objetivo de Paulo com esse recurso literário é enfatizar que Cristo era a única coisa que os cristãos de Colossos precisavam para receber a redenção da alma e plenitude da vida.
Paulo fala ainda, que Cristo é a fonte permanente da plenitude. Ele é o “lugar,” no qual o Pai em toda sua plenitude teve o prazer de fazer a sua residência, a qual é uma casa de habitação permanente, e não temporária, como o tempo presente no verso nove do capítulo dois deixa claro (κατοικεῖ - habita em contraste com “παροικέω”, “peregrinar”).
CRISTO O RECONCILIADOR DE TODAS AS COISAS
No último verso do “hino” Paulo apresenta Cristo como o reconciliador de todas as coisas: “E através dele reconciliar todas as coisas para ele, tendo feito paz através do sangue dele, através dele, quer as coisas sobre a terra, quer as coisas no céu”. (v. 20).
“Através dele” é enfático e envolve mais uma vez uma antítese entre Cristo e os demais poderes espirituais. Ele aponta para Cristo como o único agente de reconciliação.
Os falsos mestres estavam dizendo que os anjos e emanações poderiam de alguma forma aproximar os homens a Deus.
Em contrapartida, Paulo diz que, Jesus Cristo é o único meio de reconciliação e sua morte na cruz o único método que Deus escolheu para usar. Mais uma vez foi o Pai que soberanamente, quis reconciliar todas as coisas através (δι') do Filho.
É digno de nota que o verbo aqui utilizado para “reconciliação” (ἀποκαταλλάξαι - apokatallaxai) ocorre apenas mais duas vezes no Novo Testamento (v. 22; Ef 2.16.). Seu uso neste texto parece similar aos demais usados pelo Apóstolo e traz a ideia de “mudança de inimizade para amizade”, “nova harmonia” e “nova paz”. (cf. Rm 5.10, 11; 2 Cor 5.18-20;). “mudar de modo a remover toda a inimizade”.
Todavia, o verbo (ἀποκαταλλάξαι - apokatallaxai) aponta para uma reconciliação unilateral. Em suma, a reconciliação é a obra completa de Deus Pai por meio do Deus Filho, pelo qual o homem é levado da posição de inimizade para a posição de harmonia e paz ele mesmo.
Paulo assevera ainda que, a cruz é o lugar, uma parte vital e necessário da reconciliação. Isto é evidente nas palavras, “tendo feito paz através do sangue dele” (Col. 1:20 , cf. também Ef. 2:14-18 ). É na cruz que Cristo se tornou o substituto do corpo que é a igreja e pagou o preço pelos pecados de cada membro eleito.
Essa mensagem da Cruz, que para os filósofos era loucura, para os legalista era escândalo, é meio de reconciliação e salvação para os que creem.
Finalmente, o apostolo assevera que este trabalho de reconciliação se estende a “todas as coisas... na terra ou nos céus”. De início deve-se entender que este versículo não ensina o universalismo ou a salvação universal.
Paulo quer mostrar que a reconciliação de Deus não se limita a humanidade. Exegetas e comentaristas têm afirmado que colossenses 1. 20 deve ser entendido à luz de Romanos 8.18-23. Johnson, explicando este texto a luz de Romanos, diz que o apóstolo vê o homem e a criação ligados entre si. O pecado do homem afetou toda a criação (cf. Gn 3,17-19). Respondendo a isso, a reconciliação afeta não só o homem, mas o universo criado. A própria criação geme e está cheia de dor enquanto espera o dia da sua redenção (cf. Rm 8.22).
Hoekema falando sobre esse assunto assevera que:
Para entender completamente o sentido da história, portanto, devemos ver a redenção de Deus em dimensões cósmicas. Uma vez que a expressão “céus e terra” é a descrição bíblica de todo o cosmos, podemos dizer que o alvo da redenção é nada menos do que a renovação do cosmos, aquilo que os cientistas da atualidade denominam de universo. Uma vez que a queda do homem no pecado afetou não apenas a ele só mas, também, ao resto da criação (ver Gn 3.17-18; Rm 8.19-23), a redenção do pecado deve igualmente envolver a totalidade da criação de Deus.