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SÍNDROME DE TENSÃO MUSCULOESQUELÉTICA,


MUSCULATURA LARÍNGEA EXTRÍNSECA E POSTURA
CORPORAL: CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS

Musculoskeletal stress syndrome, extrinsic laryngeal muscles and


body posture: theoretical considerations
Carla Aparecida Cielo(1), Mara Keli Christmann(2), Vanessa Veis Ribeiro(3), Carla Franco Hoffmann(4),
Juliana Falcão Padilha(5), Eduardo Matias dos Santos Steidl(6), Gabriele Rodrigues Bastilha(7),
Débora Bonesso Andriollo(8), Letícia Fernandez Frigo(9)

RESUMO

O tema deste estudo é a Síndrome de tensão musculoesquelética, musculatura laríngea extrínseca


e postura corporal.Tem como objetivo descrever, a partir de revisão de literatura,as características da
musculatura extrínseca da laringe; postura corporal; Síndrome de tensão musculoesquelética e suas
implicações vocais; avaliação e tratamento fisioterapêutico e fonoaudiológico.Foi realizado levanta-
mento bibliográfico dos últimos 13 anos em que foram incluídos artigos cujo objetivo e/ou corpo do
texto estivessem em consonância com os objetivos do estudo. A pesquisa foi realizada nos bancos de
dados das bases Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde, Biblioteca Regional
de Medicina, PublicMedline, Medical Literature Analysis and Retrieval System on Line, Scientific
Electronic Library Online e Google Schoolar. Estabeleceram-se relações importantes do âmbito fisio-
terapêutico e fonoaudiológico, dentre as quais se destacam as relações musculares, posturais e
funcionais na sinergia do aparato vocal. Na fisioterapia para redução da tensão muscular, a literatura
aponta uso de eletroterapia transcutânea, laser de baixa intensidade, laser acupuntura, crioterapia,
bem como terapia manual com tração, massagens, manipulações e mobilizações cervicais, associa-
das ou não a exercícios, alongamentos, relaxamento isométrico, mobilização assistida dos tecidos
moles, exercícios terapêuticos visando à correção e equilíbrio muscular, reeducação respiratória dia-
fragmática e terapia com flexão craniocervical. Na fonoaudiologia, foram encontrados apenas estudos
com a manipulação digital da laringe e exercícios de trato vocal semiocluído.

DESCRITORES: Laringe; Disfonia; Postura; Músculos Laríngeos; Sistema Musculoesquelético;


Terapêutica

(1)
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria, „„ INTRODUÇÃO
RS, Brasil.
(2)
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria,
A musculatura laríngea pode ser dividida,
RS, Brasil.
conforme sua localização, em extrínseca e
(3)
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria,
RS, Brasil.
intrínseca. A musculatura extrínseca possui uma
das inserções nas cartilagens laríngeas e a outra
(4)
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria,
RS, Brasil.
(5)
Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, Santa (8)
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria,
Maria, RS, Brasil. RS, Brasil.
(6)
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria,
(9)
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria,
RS, Brasil. RS, Brasil.
(7)
Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria, Fonte de auxílio: CAPES; CNPq; FAPERGS
RS, Brasil. Conflito de interesses: inexistente

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em estruturas adjacentes, enquanto a intrínseca Considerando o exposto, este trabalho pretende


possui as duas inserções em estruturas da própria descrever, a partir de revisão de literatura, a muscu-
laringe1. latura extrínseca da laringe; postura corporal; STME
O aumento da tensão dos músculos extrínsecos e suas implicações vocais; avaliação e tratamento
resulta em elevação da laringe no pescoço, com a fisioterapêutico e fonoaudiológico.
participação constante da musculatura extrínseca
à fonação1-3. Em alguns casos, essa tensão é tão
„„ MÉTODOS
intensa que o conjunto de manifestações passa a se
chamar Síndrome de Tensão Musculoesquelética
(STME) ou disfonia por tensão muscular1-3 e Realizou-se pesquisa teórica e exploratóriacom
inclui diversos prejuízos vocais. A STME pode ser a técnica de revisão nãosistemática da literatura.
classificada em primária, quando não há lesões A busca foi realizada em bancos de dados das
na estrutura laríngea,e secundária, quando se bases de dados Literatura Latino-Americana e do
apresentam reações teciduais1-3. Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), Biblioteca
A evolução pode ser acompanhada por Regional de Medicina (Bireme), Medical Literature
alguns sinais e sintomas laríngeos e vocais como Analysis and Retrieval System online (MedLine),
compressão mediana das pregas vocais, causando PublicMedline (PubMed), Scientific Electronic
diminuição do ângulo de abertura; constrição global, Library Online (Scielo) e Google Schoolar (Google
mediana (aproximação das pregas vestibulares) ou Acadêmico),selecionando-se os trabalhos publi-
anteroposterior do vestíbulo; presença de fendas cados no período de 2000a 2012. Os Descritores
triangulares; elevação da laringe e predominância em Ciências da Saúde (DeCS, 2013) utilizados para
de ataques vocais bruscos1-3. a localização dos artigos foram: voice; dysphonia;
Além disso, podem ser observados sinais como larynx; laryngeal muscles; posture; musculoske-
elevação da caixa torácica e dos ombros; aumento letal system; therapeutic. A procura foi realizada
da massa muscular do pescoço e da nuca; trava- por descritores isolados e posteriormente pela
mento mandibular; distensão venosa; tensão da associação entre eles.
musculatura supra-hioidea; cabeça hiperestendida; Foram incluídos livros, artigos originais de
respiração curta e comprimida; expressão facial pesquisa e de revisão bibliográfica sobre STME,
restrita e tensa; resultando em esforço global musculatura extrínseca da laringe, postura corporal
excessivo e não eficiente1-3. e tratamento fonoaudiológico e fisioterapêutico,
De modo geral, o prejuízo na produção vocal está correlacionados ou não, de fontes clássicas e
relacionado à inadequação da função respiratória, atuais da literatura científica nacional e interna-
uso incorreto das caixas de ressonância,hipertensão cional. Os critérios de exclusão adotados foram:
lingual,glótica e da musculatura cervical1-3. periódicos não indexados nas bases de dados
A participação da musculatura laríngea supracitadas; trabalhos que tratavam de outros
extrínseca sobre a voz tem sido foco de estudos tipos de síndromes musculoesqueléticas; trabalhos
e investigações científicas nos últimos anos, uma com tempo de publicação superior a 13 anos.
vez que as disfonias, principalmente as hiperfun-
Aplicaram-se os critérios de inclusão e de
cionais, podem estar relacionadas a desequilíbrios
da musculaturacraniocervical2-7. exclusão nas pesquisas encontradas, restando40
trabalhos para análise. Esses materiais foram
Por meio de avaliação criteriosa, é possível
organizados de acordo com os autores, o título, o
determinar se a disfunção vocal altera o comporta-
ano de publicação e o tipo do estudo. Foi necessária
mento dos músculos cervicais e verificar a possível
a redução do número de referências, adotando-se
influência sobre a postura corporal e vice-versa.
É de fundamental importância o conhecimento como critério manter 80% dos trabalhos dos últimos
da relação entre postura corporal, musculatura cinco anos, priorizando-se os artigos originais de
laríngea e produção vocal, pois a atuação (multipro- pesquisa, dentro de um total de 40 referências
fissional e interdisciplinar) da Fonoaudiologia e da no máximo, excluindo-se os trabalhos que não
Fisioterapia poderá otimizar o tratamento e propor- trouxeram contribuições individuais a esta revisão.
cionar maiores benefícios aos pacientes3. A partir dessa categorização, as referências
Estudos8-11 sugerem que a reabilitação da foram agrupadas conforme os temas que deram
produção vocal, enfocando a musculatura origem aos subtítulos do corpo deste trabalho:
extrínseca da laringe e de outros grupos muscu- musculatura extrínseca da laringe e postura
lares cervicais, associada à reeducação respiratória corporal; tensão musculoesquelética; STME e suas
e à correção de desvios posturais, pode reduzir o implicações vocais; avaliação e tratamento fisiote-
tempo de terapia. rapêutico e fonoaudiológico para STME.

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„„ REVISÃO DE LITERATURA as estruturas e astraciona anteriormente, estirando
as pregas vocais e influenciando o aumento da
Musculatura extrínseca da laringe e postura frequência fundamental da voz para a produção dos
corporal sons agudos5,14,15.
A laringe constitui-se de uma estrutura composta O músculo estilo-hioideo origina-se no processo
por cartilagens articuladas, conectadas por estiloide e sua inserção ocorre no corpo do osso
ligamentos e membranas, ativadas por músculos hioide13, elevando e posteriorizando esse osso e a
laríngeos intrínsecos. A musculatura extrínseca laringe, também contribuindo com a produção de
possui ligação com estruturas externas da laringe sons agudos15.
e é responsável por manter a posição da laringe Em síntese, os músculos digástrico anterior,
em relação a outras estruturas do pescoço (susten- gênio-hioideo e milo-hioideo elevam e anteriorizam
tação laríngea) e por sua depressão, elevação e o osso hioide, favorecendo os agudos; atuam
tração anteroposterior para os movimentos de fala também na depressão mandibular e na produção
e deglutição, podendo haver influência sobre a de vogais anteriores ou consoantes que requerem
fonação1,3. posição elevada de língua5,13-15. Os músculos digás-
Os músculos extrínsecos subdividem-se em trico posterior e estilo-hioideo elevam e posterio-
músculos supra-hioideos e infra-hioideos, sua rizam o osso hioide e a laringe. A ação conjunta de
inervação é realizada pelo plexo cervical e a todos esses músculos supra-hioideos eleva e fixa a
irrigação sanguínea provém das artérias laríngeas laringe sem tracionamento anteroposterior, favore-
superiores, anteroposteriores e ramos da artéria cendo a adução das pregas vocais15.
tireoidea superior12. O grupo da musculatura infra-hioidea é composto
A musculatura supra-hioidea engloba quatro pelos músculos que se inserem inferiormente
músculos: digástrico, milo-hioideo, gênio- no osso hioide: esterno-hioideo, omo-hioideo,
-hioideo e estilo-hioideo, localizados na região esternotireoideoe tiro-hioideo8,13,15. Tais músculos
anterior do pescoço, acima do osso hioide e nele participam da depressão, anteriorização, posterio-
inseridos1,3,8,13,14. De maneira geral, esses músculos rização e ou fixação da laringe no pescoço15, com
estão envolvidos na elevação, anteriorização, exceção do tiro-hioideo que deprime o hioide e
posteriorização e ou fixação da laringe no pescoço, eleva a laringe. Ele traciona a cartilagem tireoide
alongamento das pregas vocais, aumento da para cima, estirando as pregas vocais e favore-
pressão subglótica e alteração das cavidades de cendo os agudos, pois sua atividade é semelhante
ressonância durante a produção de sons agudos e à do músculo intrínseco cricotireoideo, podendo
de forte loudness15. também favorecer a medialização das pregas
O músculo digástrico é espesso e profundo, vestibulares8,15.
divide-se em feixe anterior e posterior, com O músculo esterno-hioideo insere-se na face
inserções na borda interna da mandíbula e na posterior do manúbrio do esterno, na extremidade
mastoide do osso temporal, respectivamente13. medial da clavícula, no tecido ligamentoso
O ventre anterior do digástrico é ativado durante adjacente, cujas fibras fazem um percurso vertical,
a produção de vogais anteriores e de consoantes e na margem inferior do corpo do osso hioide13.
que requerem posição elevada de língua. Auxilia Quando contraído durante a fonação, traciona a
a elevação e anteriorização do osso hioide e da laringe para baixo e as pregas vocais são estiradas,
laringe,a depressão mandibular, a tosse e a deglu- influenciando a adução glótica e o controle do fluxo
tição. O ventre posterior eleva e posterioriza o osso de ar, podendo aumentar a duração da emissão, a
hioide e a laringe15. pressão subglótica e a loudness15.
O músculo milo-hioideo está localizado no O omo-hioideo possui ventres inferior e posterior.
soalho da boca, origina-se na linha milo-hioidea da O inferior insere-se na face superior da escápula e
mandíbula, desde a sínfise mentual até a região no tendão intermediário; o superior insere-se no
do terceiro molar, tem inserção no corpo do osso tendão intermediário, no corno maior e ao longo da
hioide13. Sua função na fonação está relacionada face inferior do corno maior do osso hioide13. Sua
à articulação da fala; à produção de sons agudos, função é deprimir e posteriorizar a laringe e manter
pois participa da elevação, da estabilização e do a fáscia cervical tensa, impedindo o colapso da
tracionamento anterior do osso hioide e da laringe; região do pescoço na inspiração profunda e que as
e à deglutição15. veias e artérias do pescoço e o ápice dos pulmões
O gênio-hioideo possui uma inserção na porção sejam comprimidos durante a inspiração15.
inferior do músculo mentual e outra no osso hioide13 O esternotireoideose origina na face posterior
sobre o qual exerce força diretamente e indireta- do manúbrio do esterno e na primeira cartilagem
mente sobre a cartilagem tireoide, pois eleva ambas costal13. Quando age conjuntamente com o músculo

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intrínseco cricotireoideo, participa da produção de Desvantagem Vocal (IDV) e do Índice de


de sons agudos, pois auxilia o basculamento e Severidade da Disfonia (ISD), foi pesquisada em 25
a fixação laríngea. Isoladamente, sua ativação professoras. Observou-se correlação positiva entre
traciona a laringe, a língua e o hioide caudalmente, índice de tensão, IDV e ISD, principalmente para a
auxiliando a produção de sons graves. Além disso, hipertensão dos músculos esternocleidomastoideo
influencia a abertura da glote e da laringe na inspi- e gênio-hioideo. A combinação de hipertensão do
ração e no bocejo15. músculo gênio-hioideo, posição elevada do osso
Além da musculatura laríngea extrínseca supra hioide e anteriorização da cabeça foram os mais
e infra-hioidea, existem outros músculos não importantes preditores da baixa pontuação no
laríngeos relacionados à coluna cervical, região ISD. Os resultados mostraram piora do índice de
onde se encontram laringe e pregas vocais3,7,12. O disfonia à medida que diminuía a qualidade de
músculo esternocleidomastoideo, cuja inserção vida em relação à voz e aumentava o índice de
ocorre junto à mastoide, linha nucal superior, hipertensão, reforçando a importância da avaliação
manúbrio do esterno e borda anterior do terço medial da tensão muscular e da postura corporal no
da clavícula3, quando contraído unilateralmente, diagnóstico de distúrbiosvocais5.
inclina e roda a cabeça homolateralmente e,em Pesquisa com 27 indivíduos saudáveis buscou
contração bilateral, participa da flexão cervical14. determinar se a tensão vocal é um efeito colateral
Originando-se das cinco últimas vértebras do esforço e da postura inadequada durante a
cervicais e inserindo-se na primeira e segunda comunicação, avaliando-os em três diferentes
costela, há os músculos escalenos, que, contraídos níveis de esforço vocal. Observou-se que, conforme
unilateralmente, têm por ação primária a inclinação o aumento da amplitude e a duração do movimento
homolateral do pescoço e, quando contraídos corporal, o esforço fonatório também era maior,
bilateralmente, participam da elevação das costelas havendo correlação significante6. Tais dados
na inspiração. Por sua vez, o músculo trapézio se confirmam a estreita relação e a coordenação entre
origina na linha nucal superior, ligamento nucal e postura corporal e voz no comportamento comuni-
processo espinhoso da sétima vértebra cervical e cativo. Outro estudo que buscou correlacionar
12ª vértebra torácica, inserindo-se na borda posterior postura corporal e tensão durante a fonação, por
da clavícula, acrômio e espinha da escápula, com meio da estabilometria, verificou correlação positiva
função de inclinar e rodar a cabeça homolateral- entre o deslocamento do centro de gravidade do
mente, quando contraídos unilateralmente, e de corpo e o aumento do sinal elétrico dos músculos
participar da extensão cervical, quando contraídos posturais durante o esforço vocal16.
bilateralmente3. A identificação da influência de diferentes
Durante a extensão cervical, a musculatura posturas corporais na produção vocal foi pesquisada
anterior do pescoço se alonga e a musculatura analisando-se 25 amostras da vogal sustentada /a/
suboccipital (trapézios e elevadores da escápula) em três diferentes posturas corporais: ortostática
se encurta. Quando essa postura em extensão (A), com anteriorização da cabeça associada à
cervical se estabelece, surge fraqueza dos extensão da coluna cervical (B) e com aumento
músculos anteriores do pescoço, com encurtamento da cifose torácica associada à anteriorização da
adaptativo do grupo suboccipital. Pode decorrer cabeça (C). A comparação foi realizada por meio de
mudança no formato da laringe, principalmente o fotogrametria e análise vocal perceptivo auditiva e
seu estreitamento, o que aumenta a adução das acústica. Os resultados mostraram variação signi-
pregas vocais e altera a ressonância vocal. Desta ficante de jitter entre as posturas A e B e modifi-
forma, verifica-se a influência da musculatura cações significantes perceptivo auditivas entre as
paralaríngea que participa da postura cervical sobre posturas A-B e A-C quanto à ressonância, pitch e
laringe e produção vocal7. qualidade vocal, afirmando-seque a postura ereta é
Na flexão cervical, ocorre o alongamento da mais adequada à produção vocal7.
musculatura suboccipital e o encurtamento da Um estudo piloto investigou a relação entre
musculatura anterior do pescoço (musculatura cefalometria, imagens de ressonância magnética
supra e infra-hioidea). A laringe deprime-se com a e funcionamento muscular do sistema estoma-
flexão cervical, favorecendo a abdução glótica e tognático durante a produção da voz. Verificou-se
mudanças da ressonância vocal. Estudos atuais5-7 a presença de correlações entre as estruturas
reforçam a correlação entre postura corporal e fonatórias, o esqueleto craniofacial e a coluna
musculatura extrínseca da laringe. cervical, com aumento do tamanho das vias aéreas
A relação entre hipertrofia da musculatura associado a maiores distâncias entre a base do
extrínseca laríngea, desvios posturais e desvan- crânio,osso hioide, laringe, epiglote, úvula e C3 a
tagem vocal, por meio da aplicação do Índice partir do mento17.

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A literatura consultada mostra a importância da Em pesquisa com professores, avaliaram-
postura correta para uma produção vocal eficiente. -se aspectos posturais durante o uso profissional
A manutenção do tronco ereto, cabeça levemente da voz e em situações fora do contexto laboral.
abaixada, ombros relaxados, buscando a livre Observou-se que a maioria significante apresentou
movimentação da laringe, sem bloqueios para a hipertensão dos músculos esternocleiodomas-
produção e projeção do som no trato vocal parece toideo e do gênio-hioideo; o peso corporal esteve
ser o ideal6,7,17,18. em posição alterada em relação ao plano frontal,
sendo concentrado na região posterior; também
foram observados osso hioide em posição alta,
Tensão musculoesquelética
hipertensão muscular e anteriorização da cartilagem
Fisiologicamente, durante a contração muscular, tireoide. Por meio de questionários, os participantes
ocorrem processos químicos que fornecem energia relataram dor ao final do dia, consequência da tensão
para a execução dos movimentos. Após a contração musculoesquelética; não foi observada diferença
(durante o relaxamento do músculo), as reservas de resultados nas duas situações avaliadas. Os
de energia são novamente reconstituídas. De professores com maior carga horária e tempo de
acordo com o grau de exigência,há diminuição das serviço apresentaram maiores alterações14.
reservas de energia (açúcar e ligações de fósforo) Pesquisa com mulheres disfônicas e grupo de
e aumento de resíduos (entre eles, ácido láctico e controle com voz adaptada analisou a postura e
ácido carbônico), ocorrendo acidificação do tecido a função da região crânio-cervical por meio de
muscular, o que pode gerar diminuição da sua fotogrametria e avaliação do índice de disfunção
função19. crânio-cervical (IDCC). Os resultados da avaliação
Quando um músculo perde sua flexibilidade fotogramétrica não mostraram diferença entre os
ocorre diminuição da relação comprimento-tensão, valores médios do ângulo de protrusão da cabeça
incapacitando-o de produzir o pico de tensão entre os grupos, isso sugere que a posição da
adequado, o que gera fraqueza e retração20. O cabeça no plano sagital não difere entre os grupos
aumento da tensão muscular representa uma forma estudados. Entretanto, a maioria das mulheres
de o corpo demonstrar a alteração de determinado do grupo disfônico apresentou disfunção crânio-
segmento corporal. Isso leva a compensações e -cervical moderada e severa no IDCC. Os sujeitos
sobrecargas que geram prejuízos na funciona- disfônicos não apresentaram alteração postural
lidade corporal. Esse raciocínio pode ser feito para da região crânio-cervical; porém, as mulheres
o sistema estomatognático, a laringe e a postura disfônicas foram classificadas como portadoras
cervical, pois possuem conexões nervosas e de um grau mais acentuado de disfunção crânio-
musculares em comum20. -cervical do que as clinicamente normais. O estudo
A contração bilateral da musculatura do pescoço, sugere que as disfonias estão mais relacionadas às
que causa flexão anterior da coluna cervical sobre alterações funcionais da região cervical do que às
a torácica e anteriorização da cabeça, possibilita posturais da mesma região22.
o aumento do esforço inspiratório, contribuindo Observou-se em pesquisa que as mulheres são
com um padrão ventilatório apical e, por sua vez, mais suscetíveis a tensões cervicais, sendo que o
maior recrutamento dos músculos acessórios da principal responsável pelas algias musculares foi o
inspiração21. A hipertensão da musculatura cervical aumento da cifose torácica ocasionada por fatores
também prejudica o equilíbrio corporal, pois afeta o ambientais, maus hábitos posturais, retrações
posicionamento do aparelho vestibular e da muscu- musculares, estresse físico e emocional1.
latura responsável pela regulação da movimentação
ocular, causando também diminuição da amplitude Síndrome de Tensão Músculo Esquelética e
dos movimentos cervicais e anteriorização da suas implicações vocais
cabeça, aumentando a tensão da musculatura Na STME primária, há aumento da tensão genera-
hioidea e tracionando a mandíbula posteriormente21. lizada em toda musculatura laríngea intrínseca
Em estudo sobre a musculatura envolvida na e extrínseca simultaneamente, associando-se a
postura externa e interna da laringe, em repouso postura laríngea alterada2,3,14,22,23.Na presença de
e durante a fonação, verificou-se que a tensão lesões laríngeas teciduais reacionais, a STME é
aumentada dos músculos supra-hioideos resultava classificada como secundária1-3,24.
em elevação excessiva da laringe. A contração dos ASTME também é classificada em tipo “I” e tipo
músculos tiro-hioideos traciona o osso hioide e a “II”, sendo o último subdividido em “a” e “b”1,3. No
cartilagem tireoide em conjunto e, em casos graves, tipo “I”, ao exame otorrinolaringológico, a laringe
fecha o espaço tiro-hioideo, produzindo constrição apresenta-se estruturalmente normal, porém, com
supraglótica ânteroposterior8. fenda posterior à fonação e rigidez da musculatura

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supra-hioidea à palpação. A STME do tipo “II a” firme­mente contra os arcos dentais, com o rebordo
assemelha-se à primeira categoria, porém, com lingual marcado e sulcado pelos dentes. A língua se
lesão organofuncional estabelecida. Na STME do liga à laringe por meio do osso hioide e movimenta-
tipo “II b”, a laringe encontra-se elevada no pescoço, -se constantemente durante a fala. Dessa maneira,
com presença de fenda posterior,além de alterações sua posição hiperfuncional posteriorizada ocasiona
em local fora da laringe como a mandíbula, entre ressonância horizontal posterior. Os sintomas
outras. Pode haver mudanças difusas em toda vocais da STME tendem a amenizar em períodos
extensão das pregas vocais e episódios de laringite de maior repouso e menor estresse1,27.
crônica1-3. O diagnóstico da STME é difícil, uma vez que
A instalação da STME ocorre de forma lenta há possibilidade de as pregas vocais apresentarem
e progressiva, o grau de alteraçãogeralmente é aspecto normal ao exame otorrinolaringológico, mas
compatível com a história clínica e com os dados com quadro sintomático de disfonia inexplicável e
da avaliação fonoaudiológica realizada. Embora a persistente. Algumas vezes, inclusive, ocorre erro
STME se enquadre como uma subclassificação das no diagnóstico em função da similaridade dos
disfonias psicogênicas, não ocorre supressão dos sintomas com outros tipos de disfonia, como a
sintomas com manipulação sintomática1,2. A STME disfonia espasmódica de adução1,2,27.
sofre influência de fatores externos como estresse Apesar de não haver relação direta entre STME
no trabalho, problemas familiares, preocupações e presença de afecções laríngeas, é possível que
profissionais, além de fatores intrínsecos, referentes as alterações funcionais decorrentes da síndrome
à personalidade do sujeito que podem levar ao favoreçam a formação de lesões organofuncionais
aumento de tensão, como o perfeccionismo e a em razão dos ajustes vocais inadequados, o
ansiedade1,2. que corrobora as dificuldades na elaboração do
Os pacientes apresentam hipertensão muscular diagnóstico correto1.
durante a fala, sem associação direta com afecções Propôs-seuma ferramenta de avaliaçãoclínica da
laríngeas. A incoordenação ou contração excessiva tensão da musculatura laríngea extrínseca (TMLE)
dos músculos associados à produção da voz pode-se porpalpaçãoe a investigaçãoda relação entre essa
manifestar em qualidade vocal rouca, comprimida tensãoeos diferentestipos de alterações vocais,
ou tenso-estrangulada, hiperadução das pregas principalmentea STME, ea presença ouausência de
vocais e das bandas ventriculares, constrição refluxogastroesofágico (RGE). Estabeleceram-se
esfinctérica da laringe, com predomínio de ataques uma técnica depalpação eum sistema de classifi-
vocais bruscos, ressonância laringofaríngea e caçãode tensãopara quatrogrupos muscularesdis-
aumento do número de quebras de voz. Também tintos (supra-hioideos, tiro-hioideos, cricotireoide-
são observados desvios de pitch e loudness para osefaringolaríngeos). Participaram 465 pacientes,
ambos os extremos, além de sintomas como dor 65%do sexo feminino e 35%do masculino, e os
na região do pescoço e/ou fadiga ou, até mesmo, resultadosda TMLE foram analisados ​em relaçãoao
afonia1,3,24. diagnóstico de RGE.Encontrou-se forte relação-
Em casos de fadiga da musculatura da laringe, entrea tensão do músculo tiro-hioideo e o RGE e
é coerente haver aumento de esforço na produção a STME. Tensão musculartireo-hioideafoio único
vocal e estresse mecânico resultante da colisão grupo que mostrou relação significante com STME.
entre as pregas vocais durante a fonação excessiva, Não houve diferença significante da TMLE quanto
causando a morte de células epiteliais e a separação à presença ou não de RGE, sendo também encon-
das fibras de colágeno e elastina da membrana trada uma possível relação causal entre TMLE e o
basal. Posteriormente, em virtude do aumento RGE8.
de vibração, pode ocorrer aumento da pressão Outros estudos também consideram relevante
intravascular e consequente extravasamento de a tensão de outros grupos musculares como os
eritrócitos e variação da dinâmica dos fluidos na esternocleidomastoideos, paraespinhais cervicais,
estrutura da prega vocal. Esses processos alteram fibras superiores do trapézio e escalenos9,10. A
as propriedades biomecânicas do tecido como a eletromiografia de superfície torna possível a
viscosidade e, portanto, têm capacidade de causar avaliação da musculatura de forma objetiva em
mudança nas características vibratórias. Isso diversas situações como para determinar a possível
deslocaria o limiar de pressão fonatória e causaria influência da limitação cervical e alteração postural
instabilidade à fonação com quebras de voz. Esse no padrão de ativação muscular9.
processo resulta em sintomas como desconforto, O aumento de atividade eletromiográfica
dor ou sensação de voz arranhada1,3,24-26. dos músculos cervicais superficiais se associa
Outro sinal comumente encontrado na STME é a a desordens da coluna cervical tais como dor,
língua em posição rebaixada e hipertensa, apoiada whiplash (lesão de concussão ou em chicote,

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Musculatura laríngea extrínseca  1645
após trauma na coluna cervical), dores de cabeça e como auxílio no desenvolvimento da reabilitação
cervicogênicas, entre outros9,10,28. Assim, supõe-se por terapia vocal comportamental1.
que a hipertensão dos músculos flexores cervicais Técnicas de manipulação digital de laringe
superficiais pode ser uma estratégia compensatória também podem ser empregadas no tratamento
para a disfunção dos músculos flexores profundos9. da STME, resultando em mudanças da qualidade
Ainda, com possível relação com a STME, vocal, emissão mais relaxada e em frequência
dentre os diversos tipos de dores, aquelas de fundamental mais grave. Entretanto, sua realização
origem muscular normalmente ocorrem por tensão pode causar desconforto extremo aos pacientes1,2.
da musculatura craniana ou cervical9,10,28. O principal objetivo da terapia manual da laringe
é relaxar a musculatura hipertensa que inibe a
Tratamento fisioterapêutico e fonoaudiológico função fonatória normal2 e vem sendo utilizada
para STME em diversos estudos com sujeitos portadores de
STME31,32. Um deles verificou, por meio da melhora
A literatura propõe que a avaliação para identi- dos resultados da análise acústica, que a terapia
ficação da STME seja composta por entrevista, manual de laringe é eficiente no tratamento das
seguida da avaliação da função vocal, palpação da alterações vocais decorrentes da STME33. Outro34,
tensão da musculatura extrínseca da laringe, exame com 93 pacientes com disfonia funcional, avaliou os
otorrinolaringológico padrão e videolaringoestro- efeitos da massagem circunlaríngea realizada em
boscopia8, sendo interessante o encaminhamento sessão única e observou melhora acústica, mas
para a avaliação fisioterapêutica, dado o caráter de sem relação com a melhora perceptivo auditiva da
hipertensão muscular generalizado desta síndrome. voz.
Estudos da área da fisioterapia sugerem uma A literatura sugere que a redução da tensão
terapêutica que inclua eletroterapia como estimu- musculoesquelética, obtida por meio de técnicas
lação elétrica nervosa transcutânea (TENS), light vocais como bocejo e suspiro, manipulação laríngea
amplification by stimulated emission of radiation e /b/ prolongado, leva a uma produção vocal de
(laser) de baixa intensidade, laser acupuntura, melhor qualidade12.
crioterapia, entre outras10,29. Uma modalidade
A relação das alterações posturais com a disfonia
comprovadamente efetiva para a normotensão
foi pesquisada em 40 mulheres antes e após
da musculatura cervical é a terapia manual,
terapia fonoaudiológica, associada a modificações
com tração, massagens, manipulações e mobili-
posturais. Os resultados mostraram, por meio de
zações cervicais, associadas ou não a exercícios,
laringoestroboscopia, melhora da disfunção em
bem como alongamento passivo e/ou resistivo, todas as participantes. Isso sugere relação com
relaxamento isométrico, mobilização assistida o aumento da precisão no desempenho postural,
dos tecidos moles (importante no tratamento da provavelmente devido ao fato de que a reabilitação
fáscia muscular), exercícios terapêuticos visando proporcionou maior consciência proprioceptiva das
à correção e ao equilíbrio muscular, reeducação estruturas corporais. Os autores acreditam que
respiratória diafragmática e terapia com flexão a melhora do controle sobre a voz e a respiração
craniocervical9,10,29. promove reeducação postural, sendo o oposto
Pesquisa30 que investigou o efeito da também verdadeiro. Sugere-se, portanto, que a
Reeducação Postural Global (RPG) no alinhamento reabilitação não deva ser focada exclusivamente
corporal e nas condições clínicas de indivíduos com na laringe, mas envolver também a reeducação
disfunção temporomandibular e desvio postural, postural11.
com hipertensão dos músculos esternocleidomas- Um estudo com 11 estudantes de teatro (idades
toideos, trapézios (fibras superiores), masseteres entre 18 e 23 anos), diagnosticados com STME
e temporais, observou que, após a RPG, houve tipo I (quatro homens e sete mulheres), utilizou
melhora do alinhamento horizontal da cabeça. Isso espectrografia de banda estreita, questionários de
mostra que desvios posturais geram tensão nas qualidade de vida e nasofibrolaringoscopia para
cadeias musculares e, por sequência, nos músculos avaliar o efeito de um programa terapêutico com
mastigatórios e cervicais28,30, podendo influenciar a exercícios de trato vocal semiocluído (ETVSO).
função dalaringe. A terapia foi composta por seis sessões (uma por
O tratamento fonoaudiológico para a STME inclui semana), cada uma com duração de 30 minutos, em
o uso de técnicas corporais, massagem laríngea que foi realizada uma sequência de três exercícios,
e da cintura escapular, mudanças posturais de ordenados de acordo com o grau de impedância
cabeça, além de técnicas de suavização da emissão aplicada ao trato vocal, desde o mais artificial ao
vocal1,2. Em casos extremos, pode ser empregada a mais natural: fonação em tubo de plástico (0,5cm
injeção de toxina botulínica para alívio dos sintomas de diâmetro interno e 30cm de comprimento);

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fonação em tubo de plástico (0,5cm de diâmetro menor tensão da musculatura intrínseca e extrínseca
interno e 10cm de comprimento); e som fricativo da laringe, além de maior apoio respiratório, fazendo
/ß:/.Cada exercício foi aplicado com três variações: com que o individuo use maior pressão respiratória
emissão sustentada em pitch e loudness habituais; em detrimento da forte adução entre as pregas
glissandos ascendentes com intervalos de quinta e vocais. Como essa técnica também trabalha o nível
oitava; glissandos descendentes com os mesmos ressonantal, o indivíduo passa a dividir as forças
intervalos de quinta e oitava3. nos três níveis da produção vocal40. Em trabalho
Os participantes foram orientados a realizar realizado com quatro professores com histórico
os exercícios duas vezes ao dia. Após a terapia, de fadiga vocal que comparou a terapia com voz
os resultados mostraram melhora significante na salmodiada com uma terapia placebo (cada uma
espectrografia e, na nasofibrolaringoscopia, seis das duas modalidades de terapia foi composta por
sujeitos apresentaram diminuição dos padrões de seis sessões de uma hora cada), observou-se que
tensão muscular laríngea, três mantiveram a mesma a técnica diminuiu a fadiga muscular justamente por
tensão e dois acionaram a contração das bandas melhorar os ajustes motores durante a produção
ventriculares à fonação, sendo possível sugerir vocal e diminuir a hipertensão40. Embora os autores
que a terapia fonoaudiológica deveria se estender não tragam a indicação para pacientes com STME,
por maior tempo. Houve correlação positiva entre com base nos benefícios mostrados pela técnica de
a melhora na nasofibrolaringoscopiae a melhora voz salmodiada, é possível pensar que a mesma
na espectrografia indicando que os indivíduos que possa ser utilizada no tratamento fonoaudiológico
melhoram os padrões laríngeostambém melhoram de pacientes com STME.
naespectrografia. Assim, é possível que o uso de Da mesma forma, é possível fazer analogia com
tubos de ressonância tenha favorecido uma fonação outras técnicas, tais como os ETVSO. A literatura
mais fácil e relaxada3. aponta que tais exercícios aumentam a impedância
Estudo realizado com 23 mulheres sem queixa do trato vocal, gerando uma fonação com menor
vocal e idades entre 23 e 40 anos, que executaram esforço, pois a ressonância retroflexa faz com que
duas vezes os exercícios Finger Kazoo e fonação aumente a pressão aérea na região sub e supra-
com canudo, evidenciou redução da frequência glótica e, consequentemente, em nível glótico.
fundamental após ambos os exercícios que, Isso tende a aumentar a amplitude de vibração da
segundo os autores, pode estar relacionada à mucosa, mas com redução do impacto no contato
redução da tensão à fonação35. medial entre as pregas vocais. Em outras palavras,
Ressalta-se que a literatura ainda é escassa pode-se dizer que esses exercícios produzem uma
quando se trata de STME, possivelmente em decor- fonação mais econômica e sem esforço3,35-37.
rência da dificuldade do diagnóstico dos pacientes. Após a execução dos ETVSO, esperam-se
Por tal motivo, sugerem-se estudos com essa alguns efeitos como: redução da pressão fonatória
população que promovam maior respaldo ao trata- e do fluxo aéreo glótico, aumento da energia
mento fonoaudiológico. Inclusive, não foi encon- harmônica, modificação da forma do pulso aéreo
trado na literatura nenhum estudo com tratamento glótico e das características oscilatórias das pregas
simultâneo entre fonoaudiologia e fisioterapia, que vocais, incremento da pressão sonora, além de
pareceser mais eficaz, tendo em vista a literatura aumento da percepção de vibrações em diversas
pesquisada10,29. regiões do trato vocal. De modo que, assim como
Entretanto, apesar de poucos trabalhos de a voz salmodiada, os ETVSO também dividem
pesquisa sobre fonoterapia vocal na STME, muitos o esforço entre os três níveis da produção vocal,
autores2,3,35-37 indicam diferentes técnicas vocais para reduzindo a hipertensão3,35. Assim, também é
a diminuição da hiperfunção fonatória, do esforço e possível pensar que pacientes com STME seriam
da fadiga, entre os quais estão os ETVSO (vibração beneficiados com o uso dos ETVSO.
de lábios e de língua, sons fricativos, /b/ prolongado,
humming, firmeza glótica, Finger Kazoo, constrição
labial, Lessac Y-Buzz e fonação em tubos), bocejo- „„ CONCLUSÃO
-suspiro, rotação de língua no vestíbulo, técnicas de
sobre articulaçãoe voz salmodiada. O exercício de A literatura mostra que a STME pode ser consi-
som basal ou vocal fry também pode ser indicado derada como uma série de compensações em
em alguns casos de disfonia por tensão muscular que os desvios posturais podem gerar adaptações
(isometria laríngea, fadiga vocal, fonação descon- corporais e, por conseguinte, acarretar modifi-
fortável, fenda triangular médio-posterior)1,38,39. cações morfofisiológicas na laringe e em toda a
A voz salmodiada é uma técnica vocal que musculatura corporal, destacando-se a laríngea
promove um ajuste muscular mais eficiente e com extrínseca e a cervical.

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Foi possível compreender melhor a interface à correção e ao equilíbrio muscular, reeducação
dos tratamentos fisioterapêutico e fonoaudiológico, respiratória diafragmática e terapia com flexão
dentre as quais se destacam as relações entre a craniocervical.
musculatura corporal, principalmente a respiratória Na Fonoaudiologia, foram encontrados apenas
e cervical, e a postura e os aspectos funcionais estudos com a manipulação digital da laringe e
na sinergia do aparato vocal que devem se refletir ETVSO direcionados à STME, entretanto, muitos
durante a avaliação e a terapia da STME. Dessa autores sugerem diferentes técnicas vocais para
maneira, a eficácia da terapêutica ocorrerá de a diminuição da hiperfunção fonatória, do esforço
maneira mais rápida e com menores chances de e da fadiga: nasais, bocejo-suspiro, técnica do /b/
recidivas. prolongado, vocal fry, rotação de língua no vestíbulo,
Na Fisioterapia para a redução da tensão técnicas de sobrearticulação e voz salmodiada.
muscular, a literatura aponta a utilização de TENS,
laser de baixa intensidade, laser acupuntura, „„ AGRADECIMENTO
crioterapia, bem como terapia manual com tração,
massagens, manipulações e mobilizações cervicais, Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento
associadas ou não a exercícios, alongamentos, Científico e Tecnológico (CNPq) pelo auxílio na
relaxamento isométrico, mobilização assistida dos modalidade de bolsa de Iniciação Científica, CAPES
tecidos moles, exercícios terapêuticos visando e FAPERGS.

ABSTRACT

The theme of this study is the musculoskeletal stress syndrome, extrinsic laryngeal muscles and
body posture. The purpose is to describe, from the literature review, the characteristics of the extrinsic
muscles of the larynx; posture; vocal implications of musculoskeletal stress syndrome; evaluation
and physical therapy and voice therapy. We performed a literature review of the last 13 years which
included articles aimed and/or body textwere in line with the objectives of this study. The research
was conducted in the databases of Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde,
Biblioteca Regional de Medicina, Public Medline, Medical Literature Analysis and Retrieval System
on Line, Scientific Electronic Library Online and Google Schoolar. Were established important
relationships within the physical therapy and voice therapy, among which stand out the relationships
muscular, postural and functional synergy in the vocal apparatus. In physical therapy to reduce
muscle tension, the literature indicates use of transcutaneous electrical stimulation, low level laser,
laser acupuncture, cryotherapy, manual therapy and traction, massage, cervical manipulations
and mobilizations, associated or not to exercise, stretching, isometric relaxation , assisted soft
tissue mobilization, therapeutic exercises aimed at correcting balance and muscle, diaphragm and
respiratory rehabilitation therapy craniocervical flexion. In speech therapy, studies found only through
digital manipulation of the larynx and semi-ocluded vocal tract exercises.

KEYWORDS: Larynx; Dysphonia; Posture; Laryngeal Muscles; Musculoskeletal System; Therapeutics

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http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201410613
Recebido em: 13/06/2013
Aceito em: 04/10/2013

Endereço para correspondência:


Carla Aparecida Cielo
Rua Guilherme João Fabrin, 545 -
Nossa Senhora de Lourdes
Santa Maria – RS – Brasil
CEP: 97050-280
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