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LIGETI, György. De nouvelles voies dans l’enseignement de la composition: un compte-rendu.

In:
SZENDY (org.). Enseigner la composition: de Schoenberg au multimédia. Ircam. p.147-184.

Dúvida:
- como estimular o aluno e ir além da técnica?
- quais técnicas? Qual seu critério de escolha?
- qual tradição?

Proposta do Ligeti:
- método em duas vias: técnicas herdadas e técnicas novas (“já é codificado, portanto, antigo”)
- complemento: confrontar o próprio material musical (como?)

“divergência entre arte e ensino. … é um traço essencial de toda arte que, à partir do momento
onde seus caracteres estruturais e formais tornaram-se descritíveis e codificáveis, ela pertence ao
passado histórico; ora, só se pode aprender o que é passível de uma descrição e de uma
codificação exatas. Por consequência, é inevitável que o curso trate do que já existe, isto é, de certo
modo, do antigo.” (p. 147)

Questão: “qual seria a profundidade e natureza da fissura entre as técnicas transmitidas e o estado
cada vez mais atual da composição se deseja-se que os estudantes possam ao menos dispor de
elementos utilizáveis?” (p. 148)

“Há contudo épocas onde as técnicas herdadas que se transmitem no ensino parecem
desesperadamente velhas. Uma tal situação aparece quando uma profunda mudança afeta os
métodos de trabalho do compositor no espaço de uma geração.” (p. 148)
- exemplos: Machaut ou Caccini em relação às técnicas de Perotin ou Palestrina; filhos de Bach em
relação ao pai; terceira revolução, com Debussy, Schoenberg e Stravinsky; jovens compositores
redescobrindo Webern nos anos 1950.

*** “Face à esta situação, a alternativa é a seguinte: … seria talvez mais oportuno dar um curso
em duas vias, ensinar as técnicas herdadas e as técnicas novas em paralelo?” (p. 149)

“eu mesmo fiz a experiência - os estudos academicamente rigorosos podem muito bem ser
explorados, mesmo hoje em dia. … Certamente não se deve aprender as técnicas tradicionais
simplesmente para perpetuar a herança/tradição [héritage]; se trata mais, de um lado, de se
familiarizar de algum modo com o material e, de outro lado, de ser capaz de trazer o que resta a
criar ao nível da música anterior. O trabalho criativo pessoal não saberia ficar indiferente à visão
do conjunto que se abre a partir de então sobre as possibilidades composicionais de diversas
épocas.” (p. 150)

“A habilidade nas técnicas mais complexas da composição deve ser aprendida, ou seja deve-se
adquirir os meios técnicos para poder compor o que se deseja compor. … No entanto, um tal
ensino é capaz de fornecer ao futuro artista uma ferramente que possa servir, na medida onde se
transmite não somente o que é puramente artesanal, mas também uma consciência das
possibilidades múltiplas forjando uma sensibilidade à produção artística. Assim o curso se reduz
ao que pode ser ensinado.” (p. 151)
“Sem dúvida não podemos contornar um aspecto normativo …
Pois assim como a criança desenvolve sua personalidade autônoma por identificação das ideias – de
fato, seguidamente, por uma atitude de desafio em relação aos modelos – do mesmo modo, o artista
deve igualmente, e de maneira vinculativa, ou bem eleger os modelos ideais, ou bem realizar seu
desenvolvimento em oposição radical. …
O que está em jogo no ensino, é o saber artístico tanto quanto a consciência que se desenvolve. O
resultado de um saber insuficiente é seguidamente uma atitude primitiva de epígono, perigosa
por causa do fato que é tomada por originalidade.” (p. 152)

*** “O estudo aprofundado da tradição antiga como da mais recente é então um componente
essencial de todo curso de composição exigente.” (p. 152)
→ como aprofundar tanta coisa?

Método em duas vias: amplo e englobante


“como já tentei mostrar, me parece que um ensino limitado às técnicas recentes conduz em direção
a um ponto de vista unilateral tanto quanto um curso consagrado às técnicas tradicionais.” (p. 153)
- ainda assim não resolve a fala arte/ensino

Fissura arte X ensino:


“Digo que só o que é codificável pode ser ensinado. Contudo, isto vale somente para as conexões
estruturais e as técnicas de escritura já existentes, para tudo o que podemos chamar de “sintaxe
musical”. O que aconteceria se, indo mais longe, encorajássemos nossos estudantes à abordar um
nível mais profundo que o da sintaxe, se confrontando com o próprio material musical tal como se
manifesta no estado atual da composição e tal como ele corresponde às suas tendências latentes?
Sem dúvidas esta é apenas uma maneira de completar o método de duas vias. Mas o
complemento é essencial: vai-se de um novo aspecto do ensino da composição que nos engaja
também de maneiras desconhecidas até hoje.” (p. 153)

Curso 1962-63:
a) conferências analíticas e teóricas para fins generalistas
b) curso de composição mais restrito

a) Conferências analíticas:
1) pensamento por “estruturas”
1.1) Webern: Bagatela op.9, V
→ ligação com música mais recente: serial e aleatória
1.2) música serial
- Messiaen, Mode de valeurs e d’intensités
- Goyevaerts e Boulez: peças estritamente seriais
1.3) composição por grupos
- Stockhausen
- métodos seriais aplicados a categorias estruturais e formais mais vastas
1.4) composição por estratos [camadas]
- Kagel (Sonant), Cerha (Mouvements) e Cardew (Second Exercise)
1.5) permutabilidade dos componentes formais, formas abertas
- Stockhausen
- Cage
1.6) aprofundamento dos problemas da composição estrutural
- Webern, Variations pour piano op.27, II
2) domínio dos “timbres”
2.1) composição com timbres
- timbres sem misturas
- Webern, op.6 e 10, op.7, intro instrumental Cantata op. 29
2.2) composição de timbres
- criação de misturas e sua função construtiva
- Schoenberg op.16 – III (Farben), Webern op.10 – I
2.3) obras mais recentes
- Koenig: Quarteto de cordas
- Ligeti: Apparitions e Atmosphères
- música eletrônica
2.4) anexo: Debussy
- harmonia, ritmo e timbre: fragmentos de Jeux
- timbre com função geradora da forma: “Nuages”, Nocturnes

b) curso de composição
- exercícios de composição correspondendo às técnicas analisadas (à maneira de Webern ou
música serial): “imitação das técnicas novas já existentes não é particularmente útil” (p.157)
→ Ligeti não impôs que seus alunos fizessem exercícios "à maneira" das técnicas
mais modernas: ele não crê ser útil a imitação
→ Tampouco utiliza "exercícios de estilo": ele propõe trabalhos realizáveis "em
qualquer estilo
- escolha dos exercícios: “eu tinha a intenção de tornar acessíveis aos estudantes as áreas da
composição que, até aqui, tinham sido bastante levadas em conta em seu ensino” (p. 157)
→ ensino tradicional - ênfase em exercícios de melodia e harmonia
→ Ligeti – compensação: ênfase em ritmo, dinâmica e timbre
→ Problema composicional limitado, um objetivo, mas deixa a maneira de realizá-lo
livre.
- Exercícios de situação (ao invés de exercícios de escritura)
1) uma nota, sem oitavas: exploração de cores instrumentais, modos de ataque, etc.
- miniatura, até 1 min.
- 2 versões: 5 a 8 instrumentos; ou para peq/med orquestra
- ritmo: 2 possibilidades
→ figuras rítmicas, interrupção por silêncios;
→ complemento rítmico, sem silêncio
- cor instrumental:
→ sem mistura;
→ com mistura (em diferentes proporções);
→ ambos
- forma: cada um uma solução (desenvolvimento, estática, redução
progressiva, ondulações - podendo ser combinas e variadas)
- pre-determinação:
→ plano serial
→ outro tipo plano
→ combinações; planos diferentes para cada parâmetro (princípio da
composição por camadas)
→ categorias globais
Exemplo:
- plano geral para as dinâmicas ("seções")
- cada seção um tipo de variação dinâmica
- mudança brusca ou assíncrona/superposta
Exemplo:
dinâmica: p - f - mf - f
p: variações dinâmicas por salto
f: variações contínuas <>
mf: sem variações
etc.
*** “Quando o estudante encontrar em seu plano uma inibição maior que uma ajuda para
seu trabalho, eu o aconselho a lhe modificar, até mesmo de abandoná-lo completamente.”
(p. 161)
“É por isso que igualmente evito eu mesmo de fazer correções; procuro conduzir o aluno a
encontrar os “pontos fracos” de sua solução ele mesmo...” (p. 161)

2) (segundo exercício)

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