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Poder Judiciário da União

Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios


Gabinete do Desembargador Roberval Casemiro Belinati

Órgão: CONSELHO ESPECIAL


Classe: ADI – AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Processo nº: 2017 00 2 022985-3
Requerente: ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE RESTAURANTES – ANR
Relator: DESEMBARGADOR ROBERVAL CASEMIRO BELINATI

RELATÓRIO

Cuida-se de AÇÃO DIRETA DE


INCONSTITUCIONALIDADE proposta pela Associação Nacional de
Restaurantes - ANR, na qual alega a inconstitucionalidade material da Lei
Distrital nº 1.954/1998, que dispõe sobre a obrigatoriedade de repartições
públicas e estabelecimentos de comercialização de gêneros alimentícios,
hotéis, bares, restaurantes, cafés, lanchonetes e congêneres fornecerem água
potável gratuitamente a seus clientes.
Inicialmente, a Associação Nacional de Restaurantes
defende sua legitimidade para propor a presente ação direta de
inconstitucionalidade, aduzindo que é associação civil regularmente constituída
desde 1991, que tem como objetivo institucional a defesa dos interesses de
seus associados, dentre eles os restaurantes e similares localizados no Distrito
Federal, que estão sujeitos aos ditames da Lei Distrital nº. 1.954/1998,
restando demonstrada sua legitimidade nos termos do artigo 8º, § 2º, inciso V,
da Lei nº. 11.697/2008.
No mérito, sustenta que a Lei Distrital nº. 1.954/1998, ao
impor aos estabelecimentos de comercialização de gêneros alimentícios,
hotéis, bares, restaurantes, cafés, lanchonetes e congêneres, o fornecimento
gratuito de água potável a seus clientes, padece do vício material de
inconstitucionalidade porque viola o princípio da livre iniciativa, consagrado no
artigo 2º da Lei Orgânica do Distrito Federal.
Argumenta que a violação ao princípio da livre iniciativa
se configura porque a norma impugnada pretende determinar o tipo de
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produto/mercadoria que será fornecido por estabelecimentos comerciais e por


determinar que o fornecimento ocorra de forma gratuita, gerando prejuízos aos
fornecedores, uma vez que a água filtrada tem um custo e prejudica a venda de
água mineral e outros tipos de bebida.
Destaca que os restaurantes, bares e similares têm
finalidade lucrativa, o que torna descabida a imposição de fornecimento de
qualquer tipo de produto ou mercadoria de forma gratuita, mormente por ser
um produto com custo elevado.
Assevera que a imposição de gratuidade somente tem
sido admitida em caso de serviço público, prestado diretamente pelo Estado ou
sob o modelo de concessão ou permissão, mas de forma limitada, a exemplo
do transporte gratuito de deficientes ou idosos e emissão gratuita de certidões
para pessoas reconhecidamente carentes, hipóteses em que o ônus
correspondente à gratuidade pode ser compensado, exigindo-se do Poder
Público o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato.
Acrescenta que a norma impugnada também viola o
princípio da proporcionalidade, uma vez que se trata de lei inadequada e
desnecessária, que criou um ônus inócuo e desarrazoado para os
estabelecimentos de comercialização de gêneros alimentícios, hotéis, bares,
restaurantes, cafés, lanchonetes e congêneres.
Postulou a concessão de liminar para suspensão da Lei
Distrital nº 1.954/1998 até o julgamento do mérito da presente ação direta de
inconstitucionalidade.
Pede a procedência do pedido para reconhecer a
inconstitucionalidade da Lei Distrital nº 1.924/1998, a fim de que seja retirada
do ordenamento jurídico.
A Mesa Diretora da Câmara Legislativa do Distrito
Federal prestou informações às fls. 123/128, nas quais sustenta a
constitucionalidade da norma.
Alega inexistir a alegada inconstitucionalidade material,
aduzindo que o princípio da livre iniciativa deve ter sua aplicação mitigada em
favor de um direito maior, que é o da dignidade e da sobrevivência, para os
quais a água potável é essencial. Sustenta que impor barreiras ao acesso à
água potável atenta contra a dignidade da pessoa humana e que os
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estabelecimentos comerciais como shopping centers, bares, restaurantes e


similares “têm adotado procedimentos que destoam dessa arraiga tradição de
hospitalidade”, privilegiando o inegável interesse econômico de lucrar com a
venda de bebidas industrializadas.
Argumenta que a lei impugnada não implica custos
adicionais aos estabelecimentos, pois já são obrigados a dispor de água
potável filtrada para o consumo de seus funcionários, e nada impede que
comercializem outros tipos de produtos e bebidas.
O Governador do Distrito Federal manifestou-se às fls.
130/143, pronunciando-se pela constitucionalidade da norma.
Em preliminar, requereu a extinção do processo por
ilegitimidade da autora. Argumenta que a parte autora, quando for entidade de
classe, deve compreender a representatividade de todas as categorias
alcançadas pela norma, e que, na hipótese dos autos, a autora representa
apenas a categoria dos restaurantes, sendo que a norma impugnada se dirige
a repartições públicas, estabelecimentos de comercialização de gêneros
alimentícios, hotéis, bares, restaurantes, cafés, lanchonetes e congêneres.
No mérito, sustenta que a norma impugnada presta-se a
concretizar a proteção ao consumidor e o princípio da dignidade humana,
valores de hierarquia constitucional, sendo relativizada, de forma razoável e
proporcional, a livre iniciativa.
Destaca que se mostra legítima a ponderação da livre
iniciativa com os princípios da defesa do meio ambiente e da saúde,
asseverando que a atividade empresarial deve ser conduzida por outros
valores de hierarquia constitucional.
Alega que a norma impugnada se harmoniza com os
objetivos do desenvolvimento sustentável e com a defesa do meio ambiente,
na medida em que contribui para a redução do uso de garrafas não recicláveis
e de garrafas plásticas.
Argumenta que o valor adicionado aos custos da
empresa, em função da medida estipulada pela Lei Distrital nº. 1.954/1998, não
é alto a ponto de justificar o argumento de inconstitucionalidade por lesão ao
princípio da livre iniciativa, além de existir a possibilidade de repasse dos
custos, de forma indireta, ao consumidor.
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Ressalta a existência de legislação em cidades como


Nova York e em países como Inglaterra, Escócia e França, nos quais é
obrigatório o fornecimento de água potável aos clientes, caso seja solicitado.
A Procuradora-Geral do Distrito Federal manifestou-se
às fls. 145/150, aduzindo, preliminarmente, ilegitimidade ativa, sob o argumento
de que a autora não engloba a representatividade de todas as categorias
alcançadas pela norma.
No mérito, sustenta a constitucionalidade da norma, por
entender que “água potável é inclusive aquela que vem das torneiras regulares,
não onerando os destinatários da norma, nem representando qualquer tipo de
violação à livre iniciativa ou à razoabilidade” (fl. 147).
Assevera que o princípio da livre iniciativa tem função
social e não é absoluto, devendo-se compatibilizar com outros princípios, como
o da função social da propriedade e da livre concorrência. Nessa linha, o
Estado pode limitar a atividade empresarial, respeitando a legalidade, a
igualdade e a proporcionalidade. Assim, a livre concorrência não é
consequência natural da livre iniciativa, cabendo ao Estado intervir para
assegurar aquela, razão pela qual a livre concorrência é instrumento para se
atingir a justiça social.
Salienta, ainda, que o princípio da proporcionalidade –
desdobrado em três subprincípios, quais sejam, necessidade ou exigibilidade,
adequação e proporcionalidade stricto sensu ou razoabilidade – deve pautar
toda atuação estatal, desde a edição de leis até a aplicação concreta,
especialmente nos casos de restrição de direitos. Entende que, em relação à
proteção do consumidor, o legislador distrital, ao obrigar o fornecimento de
água potável em estabelecimentos comerciais, atua em plena consonância
com os artigos 263, caput, da Lei Orgânica do Distrito Federal, e 170, inciso V,
da Constituição Federal.
Anota que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de
Janeiro reconheceu a constitucionalidade de norma no mesmo sentido da lei
ora impugnada (ADI 0014273-23.2016.8.19.0000). Em caso similar, este
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios não vislumbrou
inconstitucionalidade da norma que obriga o fornecimento de água potável
pelas escolas (ADI 2011.00.2.016333-7).
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Conclui, portanto, que o escopo da norma impugnada é


densificar os valores constitucionais da defesa do consumidor e da dignidade
humana e que a alegação da autora de ofensa ao princípio constitucional da
livre iniciativa contraria, na verdade, a orientação mais moderna de uso
eficiente da água pela iniciativa privada.
Isso porque a norma não impede a comercialização de
água engarrafada e também porque o fornecimento de água potável aos
clientes constitui medida adotada pelas políticas mais recentes de países
desenvolvidos visando à redução de custos. Nessa linha, destaca que,
segundo dados da CAESB, “a tarifa de água para utilização comercial e pública
é de, no mínimo, R$ 0,00748, e, no máximo, R$ 0,01273 por litro de água
consumido”. Assim, diante de tais dados e do custo aproximado de R$ 5,00 de
01 (um) litro de água mineral nos supermercados, conclui-se que “quase 400
litros de água da torneira custam menos que 1 litro de água engarrafada” (fl.
149v).
A Procuradoria-Geral de Justiça do Distrito Federal,
em parecer subscrito pelo eminente Procurador-Geral de Justiça do Distrito
Federal, na condição de custos legis, manifestou-se pelo acolhimento da
preliminar de ilegitimidade ativa da Associação Nacional dos Restaurantes e,
no mérito, pelo improcedência do pedido (fls. 154/161).
Sustenta que a autora não possui legitimidade para
ajuizar a presente ação direta, por representar somente um dos diversos
segmentos destinatários da norma impugnada.
No mérito, aduz que a lei impugnada reflete a
preocupação do legislador distrital com a proteção à saúde da população e
com a prevenção de doenças. Afirma que a norma não promove qualquer
alteração no rol de atribuições de qualquer entidade da Administração Pública.
Ademais, adverte que não depende de iniciativa reservada a proposição
legislativa que trate de proteção à saúde.
Ressalta que o fornecimento de água potável de forma
gratuita vai ao encontro de políticas de prevenção de doenças parasitárias e
infecciosas, o que evidencia a adequação da norma às garantias de qualidade
de vida humana. Nesse contexto, assevera que o Fórum Nacional da Água,
realizado no Distrito Federal, reforçou o objetivo n.º 6 das Nações Unidas, que
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estabeleceu a meta de disponibilização e gestão de água para todos. Ainda,


destaca que o artigo 333 da Lei Orgânica do Distrito Federal dispõe como
diretriz do plano de saneamento do Distrito Federal a garantia de níveis
crescentes de salubridade ambiental por meio de abastecimento de água
potável.
É o relatório.
Brasília – DF, 16 de novembro de 2018.

Desembargador ROBERVAL CASEMIRO BELINATI


Relator

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Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios
Gabinete do Desembargador Roberval Casemiro Belinati

VOTO

O Senhor Desembargador ROBERVAL CASEMIRO BELINATI – Relator

PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA

O Governador do Distrito Federal, a Procuradoria-Geral


do Distrito Federal e a Procuradoria-Geral de Justiça do Distrito Federal
suscitam a ilegitimidade da Associação Nacional de Restaurantes - ANR para
propor a presente ação direta.
Sustentam que a associação autora não compreende a
representatividade de todas as categorias alcançadas pela norma, já que
representa apenas a categoria dos restaurantes, enquanto a norma impugnada
se dirige a repartições públicas, estabelecimentos de comercialização de
gêneros alimentícios, hotéis, bares, restaurantes, cafés, lanchonetes e
congêneres.
A preliminar de ilegitimidade ativa não deve ser acolhida.
A Lei de Organização Judiciária do Distrito Federal
atribuiu legitimidade para propor ação direta de inconstitucionalidade às
entidades sindicais ou de classe, de atuação no Distrito Federal, desde que
demonstrada que a pretensão deduzida guarda relação de pertinência direta
com os seus objetivos institucionais, nos termos do inciso V do § 2º do seu
artigo 8º, in verbis:

“Art. 8º Compete ao Tribunal de Justiça:


I – processar e julgar originariamente:
[...]
n) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato
normativo do Distrito Federal em face de sua Lei Orgânica;
[...]
§ 2º Podem propor a ação direta de
inconstitucionalidade:
I – o Governador do Distrito Federal;
II – a Mesa da Câmara Legislativa do Distrito Federal;
III – o Procurador-Geral de Justiça;
IV – a Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do
Distrito Federal;
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V – as entidades sindicais ou de classe, de atuação


no Distrito Federal, demonstrando que a pretensão por elas
deduzida guarda relação de pertinência direta com os seus
objetivos institucionais;
VI – os partidos políticos com representação na Câmara
Legislativa.”

A presente ação direta impugna a Lei Distrital nº


1.954/1998, que dispõe sobre a obrigatoriedade de repartições públicas e
estabelecimentos de comercialização de gêneros alimentícios, hotéis, bares,
restaurantes, cafés, lanchonetes e congêneres fornecerem água potável
gratuitamente a seus clientes.
Segundo o Supremo Tribunal Federal, “a pertinência
temática decorre do cotejo entre os objetivos das Associações contidos em
seus estatutos e o conteúdo da lei impugnada”.1
Segundo o caput do artigo 4º do Estatuto da parte autora,
a Associação Nacional de Restaurantes é associação sem fins econômicos
cujos objetivos são os seguintes: “a) defender e representar os interesses dos
Associados, buscando articulá-los com aqueles voltados ao bem público; b)
prestar serviços de interesse dos Associados, com vistas a disseminar dados e
informações úteis para suas decisões de negócios e contribuir para o
aperfeiçoamento da gestão de suas empresas; c) promover o intercâmbio de
informações entre os Associados e destes com órgãos externos à Associação;
d) colaborar com as entidades governamentais com vistas ao aperfeiçoamento
das atividades do setor; e) gestionar junto aos órgãos legislativos federal,
estadual e municipal, inclusive apresentando ideias e sugestões, a fim de obter
uma legislação compatível com a realidade sócio-econômica do setor
representado pela Associação; f) promover, isoladamente, ou em conjunto com
outras entidades, iniciativas de caráter filantrópico e assistencial; g) coletar,
disseminar e discutir informações relativas a preços de bens e serviços dos
fornecedores dos Associados, criando condições para que os Associados se
organizem visando melhor aproveitamento das ofertas de mercado; h)
implementar mandado de segurança coletivo visando a defesa dos interesses
dos seus Associados; e) exercer outras atividades correlatas aos objetivos
previstos neste artigo, na forma da lei e deste Estatuto” (fl. 103).

1 ADI 4912, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 11/05/2016, PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-106 DIVULG 23-05-2016 PUBLIC 24-05-2016.
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Como a lei distrital impugnada impõe obrigação a


estabelecimentos de comercialização de gêneros alimentícios, bares,
restaurantes, cafés, lanchonetes e congêneres, verifica-se que a matéria
guarda relação de pertinência com os objetivos institucionais da requerente.
Igualmente, a representatividade da Associação autora
também resta caracterizada. De fato, consta das fls. 27/57 a lista dos
integrantes da requerente, o que permite verificar que a associação abarca
restaurantes, lanchonetes, bares, redes de fast food etc., com sede em
diversos Estados da Federação, com significativa representatividade no Distrito
Federal.
Ressalte-se que o fato de a Associação autora não ser
integrada por setores de hotelaria e repartições públicas não lhe retira a
representatividade. Com efeito, trata-se de entidades com atuação em áreas
distintas e interesses diversos. Não há, portanto, como exigir que a requerente
fosse composta por entidades tão distintas, sendo suficiente, para fins de
homogeneidade, o fato de que a requerente representa significativa parcela
dos atingidos pela norma, a saber: estabelecimentos de comercialização de
gêneros alimentícios, bares, restaurantes, cafés, lanchonetes e congêneres.
O Supremo Tribunal Federal já assentou que “a
democracia participativa delineada pela Carta de 1988 se baseia na
generalização e profusão das vias de participação dos cidadãos nos
provimentos estatais, por isso que é de se conjurar uma exegese
demasiadamente restritiva do conceito de "entidade de classe de âmbito
nacional" previsto no art. 103, IX, da CRFB. A participação da sociedade civil
organizada nos processos de controle abstrato de constitucionalidade deve ser
estimulada, como consectário de uma sociedade aberta dos intérpretes da
Constituição, na percepção doutrinária de Peter Häberle, mercê de o
incremento do rol dos legitimados à fiscalização abstrata das leis indicar esse
novel sentimento constitucional” (ADI 4.029, rel. min. Luiz Fux, j. 8-3-2012, P,
DJE de 27-6-2012.
Dessa forma, a Associação requerente possui
legitimidade ativa para inaugurar o processo de controle concentrado de
constitucionalidade perante esta Corte, atendendo ao requisito de pertinência
temática.
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MÉRITO

A Associação Nacional de Restaurantes questiona a


constitucionalidade da Lei Distrital n.º 1.954, de 08 de junho de 1998, que
estabeleceu a obrigatoriedade de repartições públicas e estabelecimentos de
comercialização de gêneros alimentícios, hotéis, bares, restaurantes, cafés,
lanchonetes e congêneres fornecerem água potável gratuitamente a seus
clientes.
Eis o teor da norma questionada:

“LEI Nº 1.954, DE 8 DE JUNHO DE 1998


(Autoria do Projeto: Deputado Manoel de Andrade)
Dispõe sobre a obrigatoriedade de repartições públicas e
estabelecimentos de comercialização de gêneros alimentícios, hotéis,
bares, restaurantes, cafés, lanchonetes e congêneres fornecerem
água potável gratuitamente a seus clientes.
Faço saber que a Câmara Legislativa do Distrito Federal
aprovou, o Governador do Distrito Federal, nos termos do § 3º do art.
74 da Lei Orgânica do Distrito Federal, sancionou, e eu, Presidente
da Câmara Legislativa do Distrito Federal, na forma do § 6º do
mesmo artigo, promulgo a seguinte Lei:
Art. 1º As repartições públicas e os estabelecimentos de
comercialização de gêneros alimentícios, hotéis, bares, restaurantes,
cafés, lanchonetes e congêneres fornecerão, gratuitamente, água
potável a seus clientes.
§ 1º Para os fins previstos nesta Lei, copos higienizados
e recipientes com água potável serão mantidos à disposição dos
clientes em local visível e de fácil acesso.
§ 2º Os estabelecimentos referidos nesta Lei ficam
igualmente obrigados a manter recipientes com água potável sobre
as mesas, para consumo dos clientes no momento das refeições.
Art. 2º A inobservância do disposto nesta Lei sujeitará os
infratores às penalidades previstas na Lei nº 8.078, de 11 de
setembro de 1990.
Art. 3º Esta Lei entra em vigor no prazo de noventa dias.
Art. 4º Revogam-se as disposições em contrário.
Brasília, 23 de junho de 1998
DEPUTADA LUCIA CARVALHO
Presidente”

Inicialmente, vale salientar que “as Constituições escritas


inseriram o ‘direito à vida’ no cabeçalho dos direitos individuais. No século XX
deu-se um passo a mais ao se formular o conceito do ‘direito à qualidade de
vida’. A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, na Declaração
de Estocolmo/72, salientou que o homem tem direito fundamental a
“...adequadas condições de vida, em um meio ambiente de qualidade...”

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(Princípio 1). A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e


Desenvolvimento, na Declaração Rio de Janeiro/1992, afirmou que os seres
humanos ‘têm direito a uma vida saudável’ (Princípio 1). [...] Não basta viver
ou conservar a vida. É justo buscar e conseguir a ‘qualidade de vida’. A
Organização das Nações Unidas - ONU anualmente faz uma classificação dos
países em que a qualidade de vida é medida, pelo menos, em três fatores:
saúde, educação e produto interno bruto. ‘A qualidade de vida é um elemento
finalista do Poder Público, onde se unem a felicidade do indivíduo e o bem
comum, com o fim de superar a estreita visão quantitativa, antes expressa no
conceito de nível de vida’”2.
De fato, o direito a uma vida saudável passa a integrar,
em uma nova perspectiva, o próprio direito à vida. Na mesma linha, é possível
afirmar que o acesso à água potável se insere no contexto do direito à vida,
sob o aspecto do direito à qualidade de vida e à saúde. Além disso, a água
consiste em bem de domínio público.
Dentre os fundamentos da República Federativa do Brasil
e do Distrito Federal está erigida a dignidade da pessoa humana, consoante
inciso III do artigo 2º da Lei Orgânica do Distrito Federal: “O Distrito Federal
integra a união indissolúvel da República Federativa do Brasil e tem como
valores fundamentais: [...] III - a dignidade da pessoa humana;”
Igualmente, o artigo 3º da Lei Orgânica elenca os
objetivos prioritários do Distrito Federal, dentre os quais se destacam: “I -
garantir e promover os direitos humanos assegurados na Constituição
Federal e na Declaração Universal dos Direitos Humanos; [...] IV - promover o
bem de todos; V - proporcionar aos seus habitantes condições de vida
compatíveis com a dignidade humana, a justiça social e o bem comum; [...]
XIII - valorizar a vida e adotar políticas públicas de saúde, de assistência e
de educação preventivas do suicídio”.
No capítulo destinado aos princípios gerais da ordem
econômica, o caput do artigo 158 da Lei Orgânica Distrital estabelece que a
ordem econômica tem por fim assegurar a todos existência digna e a melhoria
da qualidade de vida, verbis:

2MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 24. ed. São Paulo: Malheiros,
2016, p. 59.
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“TÍTULO V
DA ORDEM ECONÔMICA DO DISTRITO FEDERAL
CAPÍTULO I
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
SEÇÃO I
DOS PRINCÍPIOS GERAIS
Art. 158. A ordem econômica do Distrito Federal,
fundada no primado da valorização do trabalho e das atividades
produtivas, em cumprimento ao que estabelece a Constituição
Federal, tem por fim assegurar a todos existência digna,
promover o desenvolvimento econômico com justiça social e a
melhoria da qualidade de vida, observados os seguintes
princípios:
I - autonomia econômico-financeira;
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;
IV - livre concorrência;
V - defesa do consumidor;
VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante
tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e
serviços e de seus processos de elaboração e prestação;
VII - redução das desigualdades econômico-sociais;
VIII - busca do pleno emprego;
IX - integração com a região do entorno do Distrito
Federal.
X – fomento à inovação, dando-se prioridade à pesquisa
em desenvolvimento científico e tecnológico superior e,
principalmente, ao ensino técnico profissionalizante.
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício
de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização
de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.”

Nessa perspectiva, o fornecimento de água potável


gratuitamente aos clientes pelos estabelecimentos listados na norma
impugnada - repartições públicas e estabelecimentos de comercialização de
gêneros alimentícios, hotéis, bares, restaurantes, cafés, lanchonetes e
congêneres – atende ao princípio da dignidade da pessoa humana, ao direito à
vida, ao direito à qualidade de vida, ao direito à saúde e à proteção do
consumidor, na medida em que o acesso à água potável é essencial à saúde e
ao desenvolvimento físico do ser humano.
E não há que se falar que tal medida contrarie os
princípios da livre iniciativa e da proporcionalidade nem o direito de
propriedade. Em verdade, conquanto se reconheça que a obrigatoriedade de
fornecimento de água potável acarrete algum custo econômico ao comerciante,
é certo que tal custo não é elevado a ponto de prejudicar o pleno exercício da
atividade econômico-empresarial do setor. Além disso, trata-se de custo que
pode ser transferido, de forma indireta, ao consumidor.

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Não se pode perder de vista que, como ressaltado, o fim


da ordem econômica é a promoção da existência digna a todos, de modo que a
livre iniciativa e o direito de propriedade devem ser interpretados dentro dessa
perspectiva, priorizando-se a solução que melhor compatibilize os valores
envolvidos.
Na espécie, o juízo de ponderação entre os valores em
apreço revela que a ingerência na atividade privada, nos moldes em que
determinada pela Lei Distrital n.º 1.954/1998, se apresenta ínfima diante da
promoção do bem estar, de modo que não se pode afirmar que a norma esteja
eivada de inconstitucionalidade.
Além disso, a imposição de fornecimento de água potável
gratuita aos clientes vai ao encontro da proteção do meio ambiente, à medida
que privilegia a sustentabilidade no consumo de água aliada à redução de
circulação de bens poluentes, como garrafas de plástico.
Nessa linha, vale transcrever trecho das informações
prestadas pelo Governador do Distrito Federal:

“Em segundo, o fornecimento, aos clientes, de água


potável adequada para beber, nos estabelecimentos citados pela Lei
em análise, consiste em medida adequada pelas políticas mais
recentes de países desenvolvidos visando à redução de custos.
Com efeito, considerado os dados disponibilizados pela
Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (CAESB), a
tarifa de água para utilização comercial e pública é de, no mínimo, R$
0,00748, e, no máximo, R$ 0,01273 por litro de água consumido.
Considerando esses dados da CAESB, bem como que a
garrafa de 1 litro de água mineral custa aproximadamente R$ 5,00
nos supermercados do Distrito Federal, quase 400 litros de água da
torneira custam menos que 1 litro de água engarrafada.
Pesquisa recente, realizada pela Money Saving Expert
na cidade de Manchester, no Reino Unido, por ocasião das
discussões sobre o fornecimento gratuito de água por
estabelecimentos equivalentes aos aqui discutidos, o Licensing Act
2003, chegou a conclusão semelhante.
Dessa forma, o valor adicionado aos custos da
empresa, em função da medida estipulada pela Lei n.º
1.954/1998, não é alto a ponto de justificar o argumento de
inconstitucionalidade por lesão ao princípio da livre iniciativa,
até porque parte do aumento de custos pode ser indiretamente
repassado ao consumidor, o qual, ainda, que arcasse com todo o
custo, teria dispêndio menor do que se comprasse a água
engarrafada.
Em 2017, a pesquisa Environment Research, realizada
no Brasil, identificou que 81% dos brasileiros consideram muito
relevante a identificação de que o produto comercializado é
renovável, e revela a preocupação do consumidor com o impacto
gerado antes, durante e após a vida útil do produto,

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Ademais, as práticas e políticas contemporâneas de


gestão da água incentivam o consumidor a fazer escolhas mais
sustentáveis, como a utilização de água da torneira, medida que está
na Proposta de Revisão Diretiva Água Potável emitida pela Comissão
Européia em 1º de fevereiro de 2018, nos seguintes termos:
‘Isso contribui para a transição para uma economia
circular. Irá ajudar os países da União Européia a gerenciar a água de
beber de um modo eficiente e sustentável, a fim de que reduza
energia e perda de água desnecessária. Isso também irá ajudar a
reduzir o número de garrafas plásticas, seguido de um aumento da
confiança na água potável, melhor acesso e promoção da água de
beber’ [tradução livre constante dos autos].
No mesmo sentido, estados norte-americanos, como
Nova York, países como Reino Unido e França têm legislações que
determinam o fornecimento de água potável gratuita ao cliente caso
este solicite.
Como o recurso ao direito comparado não leva em
consideração a qualidade da água que chega na torneira do
consumidor de Brasília e das cidades-satélites, onde se aplica a Lei
ora em discussão, torna-se necessário recorrer à legislação referente
ao tratamento de água aplicável no Distrito Federal, de modo a
comprovar sua potabilidade.
As análises da água fornecida pela Companhia de
Saneamento Ambiental do Distrito Federal (CAESB) seguem os
parâmetros estabelecidos pelas Resoluções 357/2005 e 396/2008, do
CONAMA, bem como a Portaria n. 2.914/2011, do Ministério da
Saúde, a qual estabelece padrões rígidos de distribuição de água
potável.
De acordo com esses parâmetros, o Relatório da
Qualidade da Água Distribuída pela Caesb em 2016 concluiu que
‘dentre as análises realizadas em 2016, 95% dos resultados
atenderam aos padrões estabelecidos pelo Ministério da Saúde nas
amostras coletadas na saída das Unidades de Tratamento e/ou na
rede de distribuição’.
Dessa forma, resta claro que a concessão de água
gratuita a clientes dos estabelecimentos previstos na Lei n.
1.954/1998, além de concorrer para a implementação dos comandos
constitucionais vigentes, pouco afeta os custos dos estabelecimentos
afetados pela medida.” (grifos originais - fls. 140/142)

A título de exemplo, apesar de não se ignorar a existência


de entendimento em sentido contrário3, vale transcrever a ementa do acórdão

3
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - NORMA CONSTITUCIONAL ESTADUAL
REMISSIVA - PARÂMETRO NORMATIVO IDÔNEO PARA A REALIZAÇÃO DE CONTROLE
ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO -
PRELIMINAR REJEITADA - LEI MUNICIPAL QUE IMPÕE A INSTALAÇÃO DE BEBEDOUROS
EM DANCETERIAS E CASAS NOTURNAS - INVALIDADE - VIOLAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO
ECONÔMICA, ANALISADA COMO UM TODO HARMÔNICO E COERENTE.
- As normas constitucionais estaduais remissivas são parâmetros normativos idôneos para a
realização de controle abstrato de constitucionalidade das leis e atos normativos estaduais e
municipais pelos tribunais de justiça dos estados.
- A boa exegese das normas constitucionais que comandam a nossa vida político-econômica
depende não só de uma análise agregadora das disposições sobre a matéria, mas também da
ponderação de uma ampla gama de fatos econômicos e sociais.
- Se o benefício que determinada norma, restritiva do preceito constitucional da livre iniciativa,
traz para a saúde dos consumidores claramente não compensa os entraves por ela gerados na
busca pela realização dos desígnios do desenvolvimento econômico estadual e do pleno
emprego, o reconhecimento da sua invalidade é medida de rigor.” (TJMG - Ação Direta de
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S101
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS 15

do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que declarou a


constitucionalidade de norma semelhante, verbis:

“ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE – LEI Nº


7047/2015 – FORNECIMENTO GRATUITO DE ÁGUA POTÁVEL
POR RESTAURANTES, BARES E SIMILARES – LIVRE ACESSO A
BEM CONSIDERADO ESSENCIAL À DIGNIDADE E SUBSISTÊNCIA
– PROTEÇÃO DE CONSUMO – DEVER DO ESTADO – LEI
CONSIDERADA CONSTITUCIONAL – IMPROCEDÊNCIA DA
ARGUIÇÃO.” (ADI 0014273-23.2016.8.19.0000, Des(a). CAETANO
ERNESTO DA FONSECA COSTA - Julgamento: 15/05/2017 - OE -
SECRETARIA DO TRIBUNAL PLENO E ORGAO ESPECIAL – data
da publicação: 17/05/2017).

Dessa forma, não se evidencia a propalada


inconstitucionalidade material, devendo ser julgado improcedente o pedido.
Diante do exposto, admito a ação direta e julgo
improcedente o pedido, declarando a constitucionalidade da Lei Distrital nº
1.954/1998.
Comunique-se ao Governador do Distrito Federal e à
Câmara Legislativa do Distrito Federal, na pessoa de seu presidente, dando-
lhes ciência do inteiro teor do acórdão, com fulcro no artigo 25 da Lei n.º
9.868/1999 e no artigo 158 do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça.
Intimem-se.
Dez dias após o trânsito em julgado, publique-se o
dispositivo do acórdão, nos termos do artigo 28 da Lei n.º 9.868/1999 e artigo
161 do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça.
É como voto.

Desembargador ROBERVAL CASEMIRO BELINATI


Relator

Inconstitucionalidade n.º 1.0000.13.090925-2/000, Relator(a): Des.(a) Cássio Salomé , ÓRGÃO


ESPECIAL, julgamento em 25/06/2014, publicação da súmula em 04/07/2014).
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S101
Poder Judiciário da União
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios
Gabinete do Desembargador Roberval Casemiro Belinati

EMENTA

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI


DISTRITAL N.º 1.954/1998. DETERMINAÇÃO DE
FORNECIMENTO GRATUITO DE ÁGUA POTÁVEL
AOS CLIENTES POR REPARTIÇÕES PÚBLICAS E
ESTABELECIMENTOS DE COMERCIALIZAÇÃO DE
GÊNEROS ALIMENTÍCIOS, HOTÉIS, BARES,
RESTAURANTES, CAFÉS, LANCHONETES E
CONGÊNERES. LEGITIMIDADE ATIVA DA
ASSOCIAÇÃO AUTORA. MÉRITO. AUSÊNCIA DE
VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA LIVRE INICIATIVA E
DA PROPORCIONALIDADE. PREVALÊNCIA DOS
VALORES RELATIVOS AO DIREITO À VIDA, À
QUALIDADE DE VIDA, À SAÚDE, À DIGNIDADE DA
PESSOA HUMANA E À PROTEÇÃO DO
CONSUMIDOR. CONSTITUCIONALIDADE DA NORMA.
AÇÃO DIRETA ADMITIDA E JULGADA
IMPROCEDENTE.
1. Demonstrada a relação de pertinência temática entre a
matéria impugnada e os objetivos/interesses
institucionais da Associação Nacional de Restaurantes,
rejeita-se a preliminar de ilegitimidade ativa.
2. A determinação de fornecimento de água potável
gratuitamente aos clientes pelos estabelecimentos
listados na norma impugnada - repartições públicas e
estabelecimentos de comercialização de gêneros
alimentícios, hotéis, bares, restaurantes, cafés,
lanchonetes e congêneres – atende ao princípio da
dignidade da pessoa humana, ao direito à vida, ao direito
à qualidade de vida, ao direito à saúde e à proteção do
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS 17

consumidor, na medida em que o acesso à água potável


é essencial à saúde e ao desenvolvimento físico do ser
humano.
3. O fim da ordem econômica é a promoção da existência
digna a todos, de modo que a livre iniciativa e o direito de
propriedade devem ser interpretados dentro dessa
perspectiva, priorizando-se a solução que melhor
compatibilize os valores envolvidos. A ingerência na
atividade privada, nos moldes em que determinado pela
Lei Distrital n.º 1.954/1998, apresenta-se ínfima diante da
promoção do bem estar e da dignidade da pessoa
humana, de modo que não se pode afirmar que a norma
esteja eivada de inconstitucionalidade.
4. Conquanto se reconheça que a imposição de
fornecimento gratuito de água potável acarrete algum
custo econômico ao comerciante, é certo que tal custo
não é elevado a ponto de prejudicar o pleno exercício da
atividade econômico-empresarial do setor, de modo que
não há violação dos princípios da livre iniciativa e da
proporcionalidade nem ao direito de propriedade.
5. Ação direta admitida e julgada improcedente,
declarando-se a constitucionalidade da Lei Distrital n.º
1.954/1998.

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