Você está na página 1de 12

Número do processo: 1.0024.06.

076393-5/001(1) Númeração Única: 0763935-


54.2006.8.13.0024
Relator: GENEROSO FILHO
Relator do Acórdão: GENEROSO FILHO
Data do Julgamento: 12/08/2008
Data da Publicação: 30/08/2008
Inteiro Teor:
EMENTA: Ação de Indenização - Danos morais e materiais - Estádio - Partida de Futebol -
Agressão sofrida por TORCEDOR - Aplicação do CDC - ESTATUTO do TORCEDOR -
Exigências cumpridas - Segurança garantida - Responsabilidade objetiva - Procedência do
pedido - Recurso - Agravo retido - Não-conhecimento - Preliminar de ilegitimidade
rejeitada - Culpa exclusiva da vítima - Inexistência do dever de indenizar. Não se conhece
de agravo retido se a apelante não pede expressamente nas razões de recurso a sua
apreciação. Nos termos do art. 14 do ESTATUTO do TORCEDOR (Lei nº 10.671/2003) é
parte passiva legítima a entidade de prática desportiva detentora do mando do jogo.
Improcede o pedido de indenização de danos morais em razão de agressão sofrida em
campo de futebol, quando se verifica pelas provas dos autos inexistência de falha na
segurança e, principalmente, se o ato que deu causa à agressão, censurável e reprovável, foi
provocado por fato e culpa exclusiva da vítima.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.06.076393-5/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE


- APELANTE(S): CRUZEIRO ESPORTE CLUBE - APELADO(A)(S): JOSÉ
FERNANDES DE SALES - RELATOR: EXMO. SR. DES. GENEROSO FILHO

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 9ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de


Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos
julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NÃO CONHECER DO
AGRAVO RETIDO, REJEITAR PRELIMINAR E DAR PROVIMENTO AO RECURSO.

Belo Horizonte, 12 de agosto de 2008.

DES. GENEROSO FILHO - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

Produziu sustentação oral, pelo apelado, o Dr. Walter Bernardes de Castro.

O SR. DES. GENEROSO FILHO:

VOTO

Verificados os pressupostos de admissibilidade do recurso, dele conheço.

Trata-se de recurso de apelação contra sentença prolatada nos autos da ação de Indenização
proposta pelo apelado contra o apelante, na qual o magistrado sentenciante, após rejeitar a
preliminar de ilegitimidade passiva do apelante-requerido, julgou procedente o pedido
inicial, condenando o apelante a pagar ao apelado danos materiais no valor de cento e trinta
e três reais e setenta e quatro centavos (R$133,74), cujo valor será acrescido de juros
moratórios de um por cento (1%) ao mês e correção monetária pelos índices da Tabela
expedida pela Corregedoria de Justiça, a partir do desembolso de cada quantia e danos
morais, que arbitrou no valor de quinze mil e duzentos reais (R$15.200,00), sobre o qual
incidirão juros moratórios de um por cento (1%) ao mês e correção monetária pelos índices
da Tabela da Corregedoria de Justiça, a partir da publicação da sentença, condenando
também o apelante ao pagamento de custas e honorários advocatícios de quinze por cento
(15%) sobre o valor atualizado da condenação.

Em suas razões de recurso de fls. 89/96, que serão explicitadas no voto deste Relator, pede
o apelante, em preliminar, seja acolhida a preliminar de extinção do processo sem
julgamento de mérito, por ser o apelante parte ilegítima e, no mérito, caso assim não
entenda o Tribunal, seja reformada a sentença para julgar improcedente o pedido inicial e,
em caso de manutenção da procedência do pedido, seja diminuído o valor da condenação
por danos morais e o percentual dos honorários advocatícios fixados em quinze por cento
(15%), para outro menor, mais justo.

Pede também a improcedência do pedido de danos materiais, porque o autor apelado


confessou possuir plano de saúde junto à Unimed e os valores referem-se a despesas
hospitalares cobertas pela Unimed.

Pede seja reconhecido em seu favor, a culpa única e exclusiva do apelado pelas agressões
por ele sofridas.

Ao recurso, foram apresentadas as contra-razões de fls. 63 a 67, propugnando o apelado


pela manutenção da sentença.

Conheço do recurso, porque próprio e tempestivo.

I - Preliminarmente, deixo de tomar conhecimento do Agravo Retido lançado às fls. 62/63,


interposto contra o despacho de fls. 61, que indeferiu fosse feita a intimação do autor, por
hora certa, para prestar depoimento pessoal, porque em primeiro lugar, o apelante não
requereu que dele conheça o Tribunal, em preliminar, ao julgar o recurso de apelação (art.
523, § 1º, do CPC) e também porque o apelante desistiu do depoimento pessoal do autor-
apelado, conforme se vê da ata da audiência de fls. 29, o que tornou prejudicado o agravo
retido.

II - Preliminar de Ilegitimidade passiva do Cruzeiro Esporte Clube, em ser requerido, nesta


ação de indenização por danos materiais e morais, lançada na peça de contestação, rejeitada
na sentença e novamente lançada neste recurso de apelação.

Citando o disposto no art. 14 da Lei Federal nº 10.671/2003, que diz expressamente: "a
responsabilidade pela segurança do TORCEDOR em evento esportivo é da entidade de
prática desportiva detentora do mando de jogo e de seus dirigentes que deverão..." .
Entendeu a sentença recorrida que por ser o Cruzeiro Esporte Clube, detentor do mando de
jogo, no Estádio Mineirão, no dia dia dos fatos, se acha patente a responsabilidade do
requerido-apelante para figurar no pólo passivo da demanda.

III - O autor-apelado desde sua inicial, às fls. 4, alega:

"Segundo os termos da legislação aplicável na espécie, emerge clara a responsabilidade


objetiva do réu, ou seja, independentemente de culpa, de acordo com o estabelecido no art.
14 do CDC", ainda acrescentando: "Aliás, mesmo que fosse necessária a culpa do Réu, esta
restou demonstrada na medida em que ele não cumpriu a determinação do art. 14 do
ESTATUTO do TORCEDOR, ao não garantir a segurança do TORCEDOR, em jogo no
qual possuía o mando do campo".

IV - Por outro lado, o apelante-requerido ao contestar o pedido inicial (fls. 30) nega seja
culpado pelas agressões sofridas pelo autor e praticadas por terceiros, no interior do estádio,
durante o jogo. Diz que todas as exigências previstas no ESTATUTO de Defesa do
TORCEDOR foram cumpridas e todas as providências tomadas.

Assim, nega tenha havido falha na segurança do estádio, o que afasta por completo a
responsabilidade objetiva de que trata o art. 19 da Lei nº 10.671/03, o que por si só já
motiva a improcedência dos pedidos formulados pelo autor.

E continua o contestante:

"Ademais, corroborando o entendimento de que fora a segurança prestada de imediato e de


forma satisfativa, vê-se que, ainda, levando-se em conta os termos do B.O., fora o autor de
imediato socorrido, tendo-lhe sido prestados atendimentos médicos no próprio estádio e
posteriormente encaminhado ao Hospital Felício Rocho, motivo pelo qual nem mesmo
foram-lhe colhidas suas declarações e, ainda, que foram colhidos todos os dados dos
agressores, inclusive com voz de prisão e flagrante delito, o que não ocorreria no caso de
uma segurança falha, pois neste caso, estariam os agressores, no momento da chegada da
Polícia, bem distante daquele local e não teriam nem mesmo sido notificados" (fls. 31/32).

Ainda na contestação de fls. 31, está escrito: "Não houve falha na segurança, o que afasta
por completo a responsabilidade objetiva de que trata o art. 19 da Lei 10.671, o que por si
só motiva a improcedência dos pedidos formulados pelo autor".

E às fls. 33, o contestante atribui ao autor vítima ter dado causa às agressões sofridas pelo
próprio autor, pelo que requereu a improcedência do pedido inicial, como se vê da seguinte
frase: "Não teve o clube, conforme exaustivamente demonstrado, qualquer culpa em
relação às agressões eis que a segurança fora prestada de forma rápida e satisfatória e,
ainda, pelo fato de que a ação que deu causa às agressões fora praticada pelo próprio autor e
não pelo réu ou qualquer outra pessoa ou instituição, devendo, portanto, ser julgado
improcedente o pedido formulado na letra "b" da peça inaugural".

Ao decidir o feito o MM. Juiz recorrido diz que o art. 14 do Código do Consumidor atribui
responsabilidade objetiva ao prestador ou fornecedor de serviço e que pelo art. 17, do
mesmo Código ficam equiparadas ao consumidor todas as vítimas do sinistro, incluídas as
que, embora não tendo relação contratual com o fornecedor, sofra as conseqüências do
acidente de consumo.

Cita o sentenciante o art. 19 do ESTATUTO do TORCEDOR, cujo teor é o seguinte:

"Art. 19 - As entidades responsáveis pela organização da competição, bem como seus


dirigentes respondem solidariamente com as entidades de que trata o art. 15 e seus
dirigentes, independentemente da existência de culpa, pelos prejuízos causados a
TORCEDOR que decorram de falhas de segurança nos estádios ou da inobservância do
disposto neste capítulo".

Fundado em tais princípios e normas legais entende o magistrado sentenciante que no caso
se trata de responsabilidade civil objetiva e que caberia ao requerido, no caso autor do
dano, a prova da excludente de responsabilidade civil.

E acrescenta: "Se não demonstra cabalmente a ocorrência de caso fortuito, força maior, ou
de evento que atribua culpa exclusiva à vítima, razão pela qual se torna indiscutível o dever
de indenizar na forma do pedido inicial" (fls. 49).

E fundamentando sua convicção da responsabilidade objetiva do requerido apelante, assim


diz o sentenciante:

"Embasado nos documentos apresentados pelo réu às fls. 37/39, alerta o autor para a
insuficiência de agentes de segurança no estádio durante a realização do evento. Essa
alegação, não impugnada pelo réu, indica que foi previsto policiamento para um público de
10 mil torcedores enquanto, no dia da partida, estavam presentes mais de 15.500 pessoas no
Mineirão.

Cumpre destacar, ainda, que o depoimento da testemunha arrolada pelo réu (a senhorita que
teria se encontrado com o autor no banheiro) corrobora para a tese do autor:

"[...] a depoente gritou por socorro porque não viu segurança, nem policial naquele
momento [...]".

As normas de regência do caso, acima vistas, impõem ao anfitrião as honras da casa e o


risco do empreendimento. O aparato de segurança é disponibilizado pelo poder público na
medida da solicitação feita pelo produtor do evento. Se descompasso houve entre o
planejamento e a efetiva realização do evento, os danos advindos devem ser suportados
pelo responsável.

Demonstrada, então, a ocorrência da agressão física, o resultado desta, o nexo de


causalidade e a responsabilidade objetiva aplicada ao caso, impõe-se ao réu o dever de
indenizar os danos morais e materiais".
Com tais fundamentos, julgou o sentenciante procedente o pedido inicial, condenando o
requerido ao pagamento de danos morais e materiais, custas e honorários advocatícios de
15% sobre o valor da condenação.

Desta sentença recorre o Cruzeiro Esporte Clube, pelas razões de fls. 52/59, onde em
resumo alega:

-Seja acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva do Clube contestante pra figurar no


pólo passivo da ação, preliminar rejeitada na sentença e também no voto deste Relator.

- Volta a alegar que pelo documento de fls. 37/38 dos autos comprova-se que todas
imposições e obrigações legais foram cumpridas pelo Clube e no que diz respeito à
segurança e à expectativa de público, previu-se um público de 10.000 torcedores,
afirmando a PMMG que seriam necessários 90 (noventa) policiais nas dependências
internas do estádio e 70 (setenta) nas dependências externas, somando-se 160 (cento e
sessenta) policiais, além de 8 bombeiros e 8 policiais civis.

- Que apenas no caso de omissão do Clube é que aplicar-se-ia a mencionada


responsabilidade objetiva, tal como prevista naquele dispositivo legal.

- Que a responsabilidade no caso seria da ADEMG que administra o estádio Mineirão ou


então da PMMG que foi contratada e paga para zelar pela segurança.

- Que o apelante cumpriu com todas as imposições advindas do ESTATUTO do


TORCEDOR.

- Que o número de policiais é determinado pela própria PMMG e não pelo Clube.

- Que a lei do TORCEDOR é clara no sentido de que o Clube mandante deve "solicitar os
agentes de segurança, o que foi feito.

- Que valeu-se o julgador do trecho do depoimento de fls. 30/31, onde a testemunha disse
que "...gritou por socorro, porque não viu segurança nem policial naquele momento.

- Que foi equivocada a interpretação dada pelo magistrado sentenciante.

- Que a segurança estava sim no estádio e em número determinado pela PM.

- Que a forma como se dispõe a presença dos PMs nas dependências do estádio não é de
responsabilidade do apelante, mas sim da PM.

- Que conforme documento de fls. 39, no dia dos fatos, compareceram ao estádio 198 PMs
e 22 Policiais Civis, pois cientes da diferença de público, foram providenciando o aumento
de Policiais no estádio, número suficiente para a segurança.

- Que pelos termos da sentença guerreada, o seu prolator entendeu não ter havido a
demonstração de culpa única e exclusiva do apelado pelos danos por ele sofridos.
- Que "Pelos documentos de fls. 13 e 14, fica claro que a alegação do autor de que é fácil
"trocar" os banheiros é inverídica porquanto, como se alegou em sede de contestação, a
diferenciação é feita por letras vermelhas e garrafais, com os dizeres TORCEDOR e
TORCEDORA e, além disso, com desenhos de bonecos que usualmente determinam a
diferenciação entre o sanitário masculino e feminino.

- Que pelas alegações da Sra. Alessandra Paola Dal Zuffo nos termos do BO, à fl. 10, resta
claro que o autor, ora apelado, além de entrar no banheiro errado e deparar com aquela
senhora, proferiu-lhe ofensas verbais e mostrou-lhe os órgãos genitais o que, sem sombra
de dúvidas, foi a real causa para as agressões advindas dos "companheiros" da senhora.

- Desta forma, havendo o Clube cumprido com suas obrigações e, diante dos termos do BO,
inegável a demonstração que a culpa pelas agressões se deu única e exclusivamente pelas
atitudes do próprio apelado, provando a excludente da responsabilidade objetiva, não
podendo o apelante ser condenado na indenização pleiteada.

- Que como o próprio autor narrou em sua peça inicial, possui plano de saúde junto à
Unimed, não arcando por conseguinte com despesas hospitalares, pelo que indevida a
condenação em despesas hospitalares, pelo que pede a exclusão destas despesas pedidas a
título de despesas hospitalares.

Assim, pede seja reformada a sentença para declarar o apelante parte ilegítima para figurar
no pólo passivo da ação, com extinção do processo, sem julgamento do mérito e, em caso
de assim não entender o Tribunal, quanto ao mérito seja reformada a sentença para julgar
improcedente o pedido inicial, pois está configurada a culpa única e exclusiva do apelado
pela agressão por ele sofrida, ou então, seja diminuído o valor dos danos morais e o
percentual dos honorários advocatícios.

Contra-razões às fls. 64/67, pela manutenção da sentença, tal como prolatada, sendo notória
a responsabilidade do apelante, pelos fundamentos nela expostos.

DA APLICAÇÃO DO CDC E DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA AO CASO


CONCRETO

Em seu "Tratado de Responsabilidade Civil", 5ª edição, Editora RT 2001, pág. 110, o


jurista Rui Stoco, assim se expressa a respeito da teoria da responsabilidade civil:

"O que se observa, como ressuma da obra de Caio Mário, é a convivência de ambas: a
teoria da culpa impera como direito comum ou a regra geral básica da responsabilidade
civil, e a teoria do risco ocupa os espaços excedentes, nos casos e situações que lhe são
reservados.

No plano prático, e tendo em consideração a pessoa do lesado, a teoria do risco é defendida


com o argumento de que permite sempre reparar o dano sofrido, mesmo naqueles casos em
que, por um motivo qualquer, o lesado não logra estabelecer a relação causal entre o seu
prejuízo e a culpa do causador deste.
O Direito Civil brasileiro estabelece que o princípio geral da responsabilidade civil, em
direito privado, repousa na culpa. Isto não obstante, em alguns setores, e mesmo em
algumas passagens desse vetusto instituto, imperar a teoria do risco. Assim é que a
legislação sobre acidentes do trabalho é nitidamente objetiva; a que regula os transportes
em geral (aéreo, ferroviário) invoca-a; a responsabilidade por fato das coisas repousa na
responsabilidade objetiva. Há uma tendência para nela atrair as questões relativas à
responsabilidade civil dos bancos.

Com relação aos direitos do consumidor impera a responsabilidade objetiva".

No caso dos autos, entendo aplicar-se a teoria da responsabilidade objetiva, em que


desnecessária provar-se a culpa por parte do autor do dano.

Foi a própria lei citada pelo sentenciante que tornou o clube mandante, responsável pela
segurança do TORCEDOR (art. 14 da Lei 10.671/2003).

Assim correto o entendimento do ilustre sentenciante de aplicar, ao caso, o CDC e a teoria


da responsabilidade civil objetiva.

DO JULGAMENTO DO MÉRITO

Apesar da cultura e conhecimento técnicos demonstrados pelo MM. Juiz recorrido, em sua
sentença, ouso divergir de sua Excelência, quanto ao julgamento do mérito.

"Quandoque bonnus vir dormitat Homerus".

"Mesmo sendo Homero um bom homem, desta vez ele cochilou".

Mesmo sendo o MM. Juiz sentenciante magistrado de excelsas qualidades, desta vez
dormitou ao analisar o feito, não percebendo que na contestação de fls. 31 houve
argumentação do apelante, quanto à falta de segurança alegada pelo apelado em sua inicial.

"Às fls. 31, lá consta da contestação: "Não houve falha na segurança do estádio, o que
afasta por completo a responsabilidade objetiva de que trata o art. 19 da Lei 10.671/03, o
que por si só já motiva a improcedência dos pedidos formulados pelo autor".

Portanto, a falta de segurança alegada na inicial foi contestada, pelo que não é verdade de
que tal alegação de falta de segurança não foi impugnada.

E não só não foi impugnada, na contestação nega-se tenha sido falha a segurança. Lá está
na contestação de fls. 31:

"Ademais, corroborando o entendimento de que fora a segurança prestada de imediato e de


forma satisfatória vê-se que, ainda levando-se em conta os termos do B.O., fora o autor de
imediato socorrido, tendo-lhe sido prestados atendimentos médicos no próprio estádio e,
posteriormente, encaminhado ao Hospital Felício Rocho, motivo pelo qual nem mesmo
foram-lhe colhidas suas declarações e, ainda, que foram colhidos todos os dados dos
agressores, inclusive com voz de prisão em flagrante delito o que não ocorreria no caso de
uma segurança falha pois, nesse caso, estariam os agressores, no momento da chegada da
polícia, bem distante daquele local e não teriam, nem mesmo, sido identificados".

Entende este Relator que houve segurança no estádio, que não houve falha na segurança,
que tanto não houve falha, que os agressores foram presos em flagrante, ainda dentro do
estádio, que houve o devido socorro médico ao autor apelado, ainda dentro do estádio, que
o clube solicitou do Poder Público competente a presença de agentes públicos de segurança
na forma do art. 14, inciso I, do ESTATUTO do TORCEDOR, que nos termos do art. 14,
inciso I, deste diploma legal, os responsáveis pela segurança dos torcedores são os agentes
públicos de segurança e não o clube que pagou a taxa de segurança no valor de R$9.637,64
(fls. 40).

A documentação juntada às fls. 37, demonstra que no dia da partida, estavam presentes no
estádio 15.200 torcedores e que a estimativa era apenas de 10.000 torcedores.

No entanto, a própria Polícia ao verificar o aumento da torcida, trouxe ao estádio mais


policiais para garantir a segurança. Do que se vê de fls. 39, em vez de 160 policiais
militares antes presentes, compareceram 198 PMs e 20 policiais civis. Como se vê de fls.
39, número que a Polícia entendeu suficiente para o público que compareceu.

A responsabilidade em enviar número suficiente de policiais é da própria PM e não do


clube.

Assim, entendo que não houve falta de segurança, pelo que o clube não pode ser
penalizado.

Por outro lado, a agressão aconteceu não por falta de segurança, mas sim, por culpa
exclusiva da vítima apelada.

Com efeito, quem provocou a agressão foi unicamente o apelado, ao adentrar em banheiro
feminino, sendo ele homem.

E não se diga que o apelado seja analfabeto ou cego, porque não o é.

As fotos de fls. 13 e 14, trazidas aos autos pelo próprio apelado, demonstram que as placas
estão em letra vermelha, em letras garrafais, as palavras TORCEDOR e TORCEDORA e
ao lado a figura de um homem e de uma mulher, respectivamente.

Além de adentrar em banheiro errado o que se vê do depoimento de fls. 67, prestado pela
torcedora que pediu socorro, Senhorita Alessandra Paola Dal Zuffo, ela encontrou o
apelado lá dentro do banheiro feminino.

Vejamos o que ela diz:


"... que quando a depoente foi entrar no banheiro, o autor já estava lá dentro; que naquele
momento o autor proferiu alguns palavrões contra a pessoa da depoente quando foi dito
para ele que ela estava apertada e queria usar o banheiro; que ao tentar o autor sair do
banheiro, ele empurrou a depoente; ...; que a depoente gritou por socorro porque não viu
segurança, nem policial naquele momento; que o autor desceu as escadas correndo, que o
namorado da depoente desceu correndo atrás do autor; que em seguida o namorado da
depoente subiu e viu os policiais descendo. Que não viu o que aconteceu na parte debaixo;
que o menino que estava com o namorado da depoente foi detido e em seguida a depoente
foi abordada pelos policiais que ficaram sabendo que o fato envolvia a depoente, razão pela
qual foi conduzida também...".

O Boletim de Ocorrência de fls. 9 em seu histórico de Ocorrência, demonstra muito mais


do que em juízo declarou a torcedora, qual seja um dos palavrões: "Vai tomar no ..." e
mostrando os órgãos genitais para a senhora Alessandra. Que ao dizer a senhora Alessandra
que iria chamar a Polícia, o senhor desceu as escadas correndo...".

O policial não iria constar tais informações do Boletim de Ocorrência, se a própria


Alessandra não o tivesse falado, no momento em que foi abordada.

Tenho assim que o comportamento do apelado, saindo correndo escada baixo, está a
demonstrar ter agido de forma condenável, tentando fugir da ação policial.

Tal comportamento condenável aliado à invasão do banheiro feminino, as ofensas morais


ditas à Senhorita Alessandra, à agressão à senhorita Alessandra, ao grito de socorro feito
pela Senhorita Alessandra, provocou a reação do namorado da Alessandra e à agressão
sofrida.

Entendo assim que foi o próprio apelado que com seu proceder desqualificante, com seus
atos condenáveis, reprováveis e censuráveis, provocou a agressão que sofreu, sendo, pois, o
caso de culpa única e exclusiva dele, vítima.

A respeito da teoria da culpa exclusiva da vítima, a doutrina ensina Caio Mário da Silva
Pereira, citando Aguiar Dias:

"Como observa Aguiar dias, a conduta da vítima como fato gerador do dano "elimina a
causalidade". Com efeito, se a vítima contribui com ato seu na construção dos elementos do
dano, o direito não se pode conservar estranho a essa circunstância. Da idéia de culpa
exclusiva da vítima, chega-se à concorrência de culpa, que se configura quando ela, sem ter
sido a causadora única do prejuízo, concorreu para o resultado. De qualquer forma,
argumenta-se que a culpa da vítima "exclui ou atenua a responsabilidade, conforme seja
exclusiva ou concorrente".

E, mais adiante, menciona:

"Quando se verifica a culpa exclusiva da vítima, tollitur quaestio. Inocorre indenização.


Inocorre igualmente se a concorrência de culpas do agente e da vítima chegam ao ponto de,
compensando-se, anularem totalmente a imputabilidade do dano. O que importa, no caso,
como observam Alex Weill e François Terré, é apurar se a atitude da vítima teve o efeito de
suprimir a responsabilidade do fato pessoal do agente, afastando a sua culpabilidade".
(Responsabilidade Civil, 4ª edição, Editora Forense, p. 296).

No magistério de Sérgio Cavalieri Filho, citando renomados doutrinadores, temos:

"A culpa exclusiva da vítima - pondera Sílvio Rodrigues - é causa de exclusão do próprio
nexo causal... A boa técnica recomenda falar em fato exclusivo da vítima, em lugar de
culpa exclusiva. O problema, como se viu, desloca-se para o terreno do nexo causal, e não
da culpa . (...) Washington de Barros Monteiro afirma que o nexo desaparece ou se
interrompe quando o procedimento da vítima é a causa única do evento. No mesmo sentido
Aguiar Dias, ao dizer: "Admite-se como causa de isenção de responsabilidade o que se
chama de culpa exclusiva da vítima. Com isso, na realidade, se alude ao ato ou fato
exclusivo da vítima, pelo qual fica eliminada a causalidade em relaçao ao terceiro
interveniente no ato danoso".

Ensina Rui Stoco, que:

"É necessário que se estabeleça uma relação de causalidade entre a injuridicidade da acão e
o mal causado, ou na feliz expressão de Demongue, 'é preciso esteja certo que, sem este
fato, o dano não teria acontecido. Assim, não basta que uma pessoa tenha contravindo a
certas regras; é preciso que sem esta contravenção, o dano não ocorreria' (Traité des
Obligations em général, vol. IV, n.66).

O nexo causal se torna indispensável, sendo fundamental que o dano tenha sido causado
pela culpa do sujeito". (Tratado de Responsabilidade Civil, São Paulo, Ed. Revista dos
Tribunais, 5ª ed., 2001, p. 106).

Neste sentido, também é o entendimento jurisprudencial:

"A indenização por danos morais, como toda forma de responsabilidade civil, demanda
comprovação do nexo de causalidade e dos prejuízos sofridos. Inexistindo prova do nexo
causal, incabível a condenação do suposto agente do dano ao pagamento da indenização,
haja vista que a responsabilidade civil por ato ilícito, ainda que decorrente de dano moral,
segue, em regra, a teoria subjetiva" (TAMG, Apelação Cível nº 252.724-2/000, Rel. Juiz
Wander Marota, j. em 02.03.98, JUIS - Jurisprudência Informatizada Saraiva, CdRom nº
17).

Nesta 9ª Câmara, na Apelação Cível nº 1.0024.03.007828-1/002, sendo Relator o Des.


Tarcísio Martins Costa, assim se decidiu de forma unânime:

EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - ACIDENTE DE


TRÂNSITO - CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA - EXCLUSÃO DO NEXO DE
CAUSALIDADE. Se a vítima contribui, de forma decisiva, para o resultado danoso, ao
atravessar correndo a pista, em lugar impróprio, para apanhar um ônibus do outro lado da
avenida, sem prestar atenção ao fluxo do trânsito, não há como inculpar o motorista,
impossibilitado de evitar o atropelamento, não podendo o direito se conservar alheio a tal
circunstância. 'Admite-se como causa de isenção de responsabilidade o que se chama de
culpa exclusiva da vítima. Com isso, na realidade, se alude ao ato ou fato exclusivo da
vítima, pelo qual fica eliminada a causalidade em relação ao terceiro interveniente no ato
danoso" (Data do julgamento: 21/04/2007).

E, ainda:

EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS -


RELAÇÃO DE CONSUMO - CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA -
INADIMPLEMENTO CONTRATUAL - DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS -
DANOS MATERIAIS -PROCEDÊNCIA PARCIAL. Para que se condene alguém ao
pagamento de indenização por dano moral ou material, é preciso que se configurem os
pressupostos ou requisitos da responsabilidade civil, que são o dano, a culpa do agente, em
caso de responsabilização subjetiva, e o nexo de causalidade entre a atuação deste e o
prejuízo. A culpa exclusiva da vítima, em virtude de se tratar de excludente de
responsabilidade civil, afasta a ilicitude da conduta que interfere na esfera jurídica alheia,
ainda que a relação jurídica entre as partes seja de consumo (art. 14, § 3º, Lei nº 8.078/90).
O inadimplemento contratual, por si só, não acarreta danos morais, posto que não ofende a
qualquer dos direitos da personalidade do contratante prejudicado pelo não-cumprimento da
avença. Tratando-se de pedido de indenização por danos materiais, cabe à parte autora a
demonstração do prejuízo causado pelo ato ilícito da ré (art. 333, I, CPC). (TJMG -
Apelação Cível nº 1.0024.01.597841-4/001, 17ª Câmara Cível, Data do julgamento:
06/04/2006).

Pelo exposto, entendo não ter havido falha na segurança, o que por si só implica em
improcedência do pedido. Também entendo que a vítima sofreu agressão provocada por
mau comportamento dele mesmo, ou seja, que se

trata de culpa exclusiva da vítima, fato exclusivo da vítima, sendo, portanto, o autor, vítima
de sua própria torpeza, o que implica a não-procedência do pedido inicial.

Com essas considerações, dou provimento ao recurso de apelação, para reformar a sentença
recorrida e julgar improcedente o pedido inicial.

Custas e honorários advocatícios de 10% sobre o valor dado à causa, pelo apelado,
suspensa a exigibilidade, nos termos do art. 12, da Lei 1.060/50.

O SR. DES. PEDRO BERNARDES:

VOTO

De acordo.

O SR. DES. JOSÉ ANTÔNIO BRAGA:

VOTO
De acordo.

SÚMULA : NÃO CONHECERAM DO AGRAVO RETIDO, REJEITARAM


PRELIMINAR E DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.

??

??

??

??

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.06.076393-5/001

Você também pode gostar