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ELEVADOR (Gremory)

Olá, muito prazer. Não posso revelar o meu nome, e usarei esta carta
para contar-lhes como vim parar neste lugar estranho, silencioso e
terrível. Talvez ao fazer isso, algum de vocês possa me ajudar. Eu
preciso tentar.

Tudo começou aproximadamente em julho deste ano, em uma noite chuvosa,


sozinho no meu quarto. Estava no computador xeretando as contas de
Facebook dos meus amigos, quando o celular em cima da cama vibrou. Me
estiquei para pegá-lo, mas não era nada esperado. Apenas um número
desconhecido que havia me enviado um texto. Ele dizia o seguinte:

Como ir para um outro mundo através de um elevador de um prédio com


mais de 10 andares:

1. Tome o elevador. – É preciso estar absolutamente só.

2. A seguir, mova o elevador para o 4º andar, logo em seguida, ao 2º, ao


6º e ao 10º andar, nessa ordem – O experimento será quebrado, se
durante o processo alguém mais entrar no elevador.

3. Ao chegar no 10º andar, não desça e aperte o botão para o 5º andar.

4. Ao chegar no 5º andar, uma jovem mulher entrará no elevador. – Não


fale com ela.

5. Após ela entrar, aperte o botão para o andar térreo.

6. Ao apertar o botão, o elevador não irá para o térreo, mas sim, subirá até
o 10º andar. – Durante a subida, não aperte nenhum outro botão, ou o
experimento fracassará.

7. Ao passar pelo 9º andar, o ritual estará praticamente garantido.

Só existe um modo para se ter certeza de que foi um sucesso. Nesse outro
mundo, só existe uma única pessoa, você. Ah, e mais uma coisa: a garota
que toma o elevador no 5º andar, não é um ser humano.
O texto até era assustador, mas não me importei, pois para mim se tratava
de mais uma dessas correntes de internet. Lembro que após ler aquelas
instruções, desliguei o computador, coloquei o celular para carregar e fui
dormir.

Durante o sono, me vi flutuando em um céu noturno. Passeava por entre as


nuvens. O céu estava limpo e estrelado. Ao longe, vi um vulto que se
aproximava. Apesar de veloz, não me assustei. Sua presença era calma e
reconfortante. Uma mulher de pele alva, esguia, de cabelo negro, longo e
liso. Antes que eu pudesse analisá-la por inteira, o seu corpo se encostou por
completo ao meu, como um encaixe. Petrificado, observei sua boca ir
lentamente até o meu ouvido e sussurrar: - Me encontre no quinto andar...

Acordei apavorado, com a minha mãe gritando que iria me atrasar para o
trabalho. Na verdade, era o meu estágio não remunerado da faculdade. Claro
que se ela quisesse tratar aquela porcaria como um emprego de verdade,
para mim estava tudo bem. Troquei de roupa, peguei o celular e corri até a
minha bicicleta. Quando já estava a uns 10 metros da casa, pude jurar que
ouvi a minha mãe gritando algo relativo ao café que deixara de tomar. Se eu
pudesse voltar no tempo, teria dado meia volta para vê-la mais uma vez. Mas
não o fiz, pois no prédio do escritório havia uma cantina farta para os
estagiários.

O prédio estava localizado próximo a minha casa, em um bairro pouco


urbanizado. Não posso contar o local exato, mas é um edifício antigo, com
mais de 20 andares, e em cada um deles, há salas dos mais diferentes
serviços: dentista, consultórios médicos, escritórios de advocacia, escritórios
de contabilidade, e, entre eles, a agência de publicidade na qual eu
trabalhava, ou quase isso.

Logo na recepção do edifício, no térreo, há, ou havia, não sei, uma moça
muito bonita, que mesmo me vendo todos os dias, sempre pedia para conferir
o meu crachá. Queria pensar que se tratava de algum tipo de paquera, mas
no fundo, sabia que ela realmente não se lembrava de mim. E também
pudera, sou um rapaz discreto, magro, de 19 anos, que mesmo com
descendência oriental, não possui olhos puxados. Sou do tipo bem comum,
facilmente esquecível. – Isso não favorece muito a minha situação atual.

Antes que fosse até os elevadores, a garota me alertou que os dois principais
estavam com problema, que deveria usar o de serviço. - Sem problemas -
pensei.

Enquanto esperava o elevador abrir a porta, recordei da mensagem recebida


na noite anterior, e da mulher do sonho. Retirei o aparelho celular do bolso,
e após reler calmamente o texto, algo dentro de mim passou a pedir que eu
fizesse o teste. Meus pés batiam no chão com certa velocidade, estava
inquieto. Reparei no relógio do aparelho, e ainda faltava meia-hora para
ingressar no estágio.

Assim que as portas se abriram, entrei. Estava sozinho. O primeiro andar da


lista seria o quarto, e por coincidência, era o do meu serviço. Cliquei.
Enquanto subia, pensava em tudo aquilo. E quanto mais os segundos
passavam, mais tinha certeza que usar o tempo vago dessa maneira seria
uma grande besteira. É evidente que seria mais útil usar aquela meia-hora
de sobra para comer algo. Porém, assim que o elevador chegou ao andar
desejado, quase que como um instinto, meu dedo seguiu até o botão dois.

Não podia mais parar. No botão seis e dez, torci para que ninguém entrasse
no elevador, pois me sentiria um idiota. Ninguém entrou. Confesso que no
momento de pressionar o número cinco, passei a sentir um calafrio. Por mais
que no fundo eu soubesse que tudo aquilo era perda de tempo, ainda assim,
um pouquinho de mim esperava que a mulher do sonho estivesse naquele
andar.

No momento em que o elevador chegou ao seu destino, a porta se abriu. Uma


mulher entrou e rapidamente se virou de costas. Sem me conter, soltei um
“- Bom dia”, bastante empolgado. Precisava ter certeza que não era ela.
Entretanto, para a minha surpresa, logo após saudá-la, a porta
imediatamente se abriu e a moça misteriosa saiu por ela rapidamente.
Consegui ainda ver brevemente o seu rosto de soslaio. Era ela? – Naquele
momento fiquei em dúvida, mas hoje sei que sim. – Fiquei sem reação e sem
ar por um bom tempo. Abri o celular para ver se tinha feito algo indevido:
“Regra 4. Ao chegar no 5º andar, uma jovem mulher entrará no elevador. –
Não fale com ela”.

No tempo que me restava antes de entrar no estágio, tentei fazer a sequência


outras inúmeras vezes. Todavia, sempre antes do quinto andar, alguma
pessoa entrava no elevador. Impaciente, tinha que fazer tudo novamente. Ao
perceber que já estava bem atrasado para o estágio, frustrado, cliquei no 4º
andar e fui ao meu destino. Ao invés da bela mulher do sonho, teria que
encarar a bruxa da minha chefe. Minha vida era assim, e até já havia me
acostumado.

Passei o dia todo fazendo artes chatas para supermercados. Mas é claro, com
a cabeça no elevador e na donzela misteriosa. Sabia que na saída não
conseguiria privacidade no elevador, então resolvi fingir que estava indo
embora, e me escondi no local das escadas de emergência. Mandei uma
mensagem para a minha mãe, dizendo que iria do estágio direto para a
faculdade, e que depois dormiria na casa de um amigo. – Nunca cheguei a
ler a resposta. – Permaneci escondido até escurecer. Precisava ter certeza
que o prédio estava quase todo, ou completamente vazio.

Ao ler essa carta, você pode pensar que tudo isso não fazia sentido, e
hoje, pensando bem, também acho que não. E por isso mesmo, tenho
convicção de que algo maior estava me movendo, martelando a minha
mente. Mas preciso continuar, não sei mais quanto tempo eu ainda
tenho.

Em passos leves, abri a porta que dava para o corredor do andar. As luzes,
automáticas, se acenderam. Caminhei até o elevador, e iniciei o ritual: 4º
andar, depois 2º, 6º e 10º. Respirei fundo, tentei refletir o quão idiota eu
poderia estar sendo, mas a reflexão pouco durou e apertei o botão cinco.
Assim que o elevador parou nesse andar, a porta se abriu. Mas não havia
ninguém. Eu não sabia bem se estava frustrado ou aliviado. Mas um segundo
antes da porta se fechar, uma mão a segurou, a mulher estava lá,
novamente.

Fiquei completamente apavorado, mas também curioso. Acredito que em


uma situação normal, eu teria abandonado. Porém, naquela ocasião, sentindo
uma força maior, não desisti. Apertei o botão do térreo, e, conforme a
mensagem, o elevador iniciou a sua subida. Quando o ponteiro apontou o
nove, um arrepio tomou conta do meu corpo, sabia que não tinha mais volta.

No 10º andar a porta se abriu. Ao olhar para a garota, ela não estava mais
de costas. – Ainda fico pensando em como ela se virou tão rápido, sem que
eu percebesse. – Os seus olhos estavam fixos nos meus, e ela ria. Ou melhor,
gargalhava. O problema é que não emitia som. Era muito estranho vê-la
daquela forma, sem poder ouvi-la. Tentei perguntar o que era tudo aquilo,
mas também não escutei a minha própria voz. Assustado, saí trôpego do
elevador, e não consegui sequer impedir que a porta se fechasse às minhas
costas.

Desci desesperado pela escadaria do edifício, e só após me cansar, reparei


que o cenário não se alterava. Ainda estava no 10º andar. Olhei pela janela,
e a cidade não mais existia, um chão cinza se estendia até onde eu conseguia
ver. No céu, a noite era opaca, sem estrelas, sem nuvens, apenas preto. As
portas dos escritórios estavam fechadas, então precisei arrombar. Porém, ao
contrário do esperado, dentro não havia mais móveis. Estava tudo vazio,
escuro e silencioso. Peguei meu celular, mas foi mais uma tentativa frustrada,
ele também não funcionava.

Achava que meu corpo estava quente, por ter me cansado tentado descer as
escadas, mas o calor aumentou tanto, que mesmo com a fraca luz de
emergência, reparei que a minha pele estava começando a enrugar. Tirei toda
a roupa, que nesse momento estava molhada de suor. Por algum tempo, jurei
que os vultos ao meu redor eram frutos da minha mente cansada. Mas
infelizmente não eram alucinações.

Com o tempo, e mais acostumado ao escuro, percebi que os vultos é que não
me deixavam sair do chão. Eles estavam comendo o meu corpo lentamente.
Não sentia tanta dor, pois uma espécie de saliva anestesiava os meus
membros. Ainda assim, tem sido horrível sentir o meu corpo ser comido. Uma
das orelhas já desprendeu da minha cabeça, e o nariz, eu penso que também.
Só não tive ainda coragem de tocar para confirmar.
Uma hora atrás o elevador voltou a se abrir, e lá estava ela, a garota
misteriosa. Os vultos pareciam temê-la, eles se afastavam. Pude rastejar até
próximo aos seus pés. Ela continuava com aquele riso silencioso assustador.
Sua boca é enorme, cheia de dentes pontiagudos, nada compatível com o seu
rosto fino. Estou chorando, com muito medo. Não me lembro de ela ter
aqueles traços vampirescos.

Aquele ser medonho se ajoelhou ao meu lado e me entregou duas folhas,


uma escrita e outra em branco, além de uma caneta. Com a luz do elevador
aberto, que piscava, pude ler um pouco do que estava escrito. Dizia que eu
deveria escrever uma carta com a minha história, para que alguma pessoa
viesse me salvar. Afirmava ainda, que o texto feito por mim seria divulgado
amplamente.

Sei que muitas pessoas pensarão ser ficção, mas se alguma acreditar, e
seguir as regras dos andares, eu poderei voltar ao meu mundo.

Contei para vocês a minha história, o quanto consegui, sem revelar nomes e
local do apartamento, pois assim fora determinado. Eu já não sei quanto
poderei aguentar. Meus braços e pernas estão finos, praticamente não tenho
pele. Meus pelos corporais, e os dentes, todos caíram. Estou entregando a
carta neste momento para a mulher. Já não sei mais o que dizer para que
acreditem no que digo. A dor está voltando, preciso deixar os vultos me
comerem. O calor começa a dar lugar a dor.

Por favor, alguém siga as instruções dos andares, as que eu fiz. Isso não é
ficção! Me aju....

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