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06/02/2019 Brasil, pátria educadora | Opinião | EL PAÍS Brasil

OPINIÃO

COLUNA

Brasil, pátria educadora


Desde o fim da ditadura, passaram pela pasta 19 pessoas – sete sob
administração de Dilma. Com esse histórico, torna-se difícil até
mesmo formular políticas públicas de curto prazo
LUIZ RUFFATO

6 OUT 2015 - 16:03 CEST

Ao tomar posse no dia 1º de janeiro, Dilma Rousseff anunciou o lema de governo


de seu segundo mandato como Presidente da República: “Brasil, pátria
educadora”. Para aqueles que, como eu, sonham com um país mais justo e mais
digno, no qual a educação tem uma função fundamental de alicerce da cidadania,
as palavras poderiam até soar como uma aragem de esperança. Não que confie
em discursos de políticos – quaisquer que sejam eles, valem tanto quanto notas
de três reais –, mas o desejo de mudança é tão grande que qualquer bafejo
reacende a brasa dormida. No entanto, neste caso, sabíamos, “Brasil, pátria
educadora” não passava de slogan publicitário, forma sem conteúdo. O desprezo
do governo Dilma pela educação não é maior que o de todos os outros que a
precederam. A diferença é que nenhum antes havia manifestado tamanho
cinismo.

Com o anúncio da substituição de Renato Janine Ribeiro por Aloízio Mercadante,


Dilma perfaz quatro diferentes nomes no cargo de ministro da Educação em
apenas nove meses de mandato, um recorde. Desde o fim da ditadura, em 1984,
passaram pela pasta 19 pessoas – sete apenas sob administração de Dilma
Rousseff, ou seja, média de mais de um por ano. Com um histórico destes, torna-
se difícil até mesmo formular políticas públicas de curto prazo – e absolutamente
impensável elaborar projetos de longo prazo, que é o que necessitamos com
urgência. Em maio, o governo já havia anunciado cortes de R$ 9,5 bilhões no
orçamento destinado à educação – dois meses depois, a área perdeu outro R$ 1
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bilhão, numa clara sinalização de que o setor nunca foi e continua não sendo
prioridade do governo.

O Brasil ocupa o vergonhoso 60º lugar, numa lista de 76 países, no ranking de


qualidade de educação, segundo a Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), que avalia o conhecimento de alunos na
faixa de 15 anos em matemática, leitura e ciências. O resultado do Enem do ano
passado revela a tragédia: 529 mil redações (8,5% do total) tiraram nota zero – e
somente 250 de 6,1 milhões de candidatos alcançaram nota máxima (0,004% do
total). Calcula-se que 15% dos jovens brasileiros entre 15 e 24 anos sejam
analfabetos funcionais – ou seja, não conseguem interpretar textos e limitam-se a
compreender operações matemáticas simples. E a tragédia se estende ao ensino
superior: o Instituto Paulo Montenegro concluiu que os analfabetos funcionais
constituem 38% dos estudantes universitários.

Sucateadas, as universidades federais mantêm-se em greve


MAIS INFORMAÇÕES
há mais de quatro meses – nem durante a ditadura militar as
Na ‘Pátria
Educadora’ de instituições federais de ensino superior pararam por tão longo
Rousseff, crise põe tempo. O Fundo de Financiamento Estudantil (FIES), que
em risco Plano de
Educação
custeia bolsas de estudos para alunos carentes em
universidades privadas, sofreu uma redução de 50%: o
Sem aulas e dinheiro,
universidades são
número de novos contratos caiu de 480 mil em 2014 para 252
nova faceta da crise mil neste ano. E o programa Ciências sem Fronteiras, menina
no Brasil
dos olhos do governo Dilma, teve congeladas as vagas: o
Dilma oferece orçamento para 2016 cobre apenas a manutenção dos
Ministério da
estudantes que já se encontram no exterior. O Brasil não
Educação a
Mercadante possui nenhuma universidade entre as 250 melhores do
mundo, segundo ranking elaborado pela Times Higher
Janine Ribeiro:
“Cenário é crítico, Education – a primeira que surge, a USP, na faixa de 251º a
mas mudanças na 300º, é estadual; a primeira federal, a UFRJ, aparece
Educação não são
classificada na faixa de 501º a 600º.
quebra galho”

Cortes afetam
pesquisas brasileiras Se no topo do sistema educacional – os ensinos médio e
superior – nos deparamos com esta desolação, não é melhor
a realidade do ensino fundamental. Faltam bibliotecas –
presentes em apenas 27,5% das escolas (no estado de São Paulo, o mais rico da

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federação, 85% das unidades estaduais e municipais não contam com


biblioteca). Faltam 1,2 milhão de vagas nas pré-escolas. Os alunos, em todas as
etapas do ensino, têm aulas em prédios mal conservados e ambiente pouco
estimulante; os professores são em número insuficiente, recebem salários baixos
e contam com poucos recursos didáticos — ambos, alunos e professores, são
acossados pela violência. Se somarmos o número de analfabetos funcionais
(68% da população) aos analfabetos (7% do total), teremos que apenas 25% dos
brasileiros, ou seja, um em cada quatro, possuem pleno domínio da leitura, da
escrita e das operações matemáticas. É evidente que essa situação é uma
herança histórica e não pode e nem deve ser atribuída aos governos tucano e
petista que comandaram o país nos últimos 20 anos. Mas também é verdade que
nenhum deles fez, efetivamente, nada no sentido de reverter esse quadro.

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