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Governança corporativa:

o essencial para líderes


Governança corporativa:
o essencial para líderes

Alexandre Di Miceli da Silveira


© 2014, Elsevier Editora Ltda.

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ISBN 978-85-352-7936-8
ISBN (versão digital) 978-85-352-7937-5

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CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

S588g
Silveira, Alexandre Di Miceli da
Governança corporativa: o essencial para líderes / Alexandre Di Miceli da Silveira.
- 1. ed. - Rio de Janeiro : Elsevier, 2014.
23 cm.
ISBN 978-85-352-7936-8
1. Governança corporativa. 2. Administração de empresas. I. Título.
14-12683 CDD: 658.4
CDU: 005.5
Agradecimentos

Este livro é resultado das interações e aprendizados com inúmeras pessoas e dezenas
de organizações ao longo de mais de uma década dedicada à governança corporativa.
Em primeiro lugar, gostaria de expressar minha gratidão aos amigos Caetano Altafin
Cunha, Edison Simoni da Silva, Rafael Vieira Teixeira e Rafael Liza Santos, os quais se
dispuseram a ler os originais deste livro e a proporcionar contribuições valiosas para seu
aprimoramento.
Agradeço também às pessoas com as quais tive o prazer de desenvolver trabalhos de
consultoria em parceria ao longo dos anos, com destaque para Sandra Guerra e João Laudo
de Camargo, bem como aos executivos e conselheiros das dezenas de organizações que
me propiciaram experiências ricas e uma compreensão in loco da complexa temática da
governança empresarial.
Em especial, agradeço e dedico esta obra para minha querida esposa Angela. Além do
incentivo inicial e apoio diário, sem os quais este livro não teria sido gerado, Angela atuou
intensamente em todas as etapas, como revisora, editora e debatedora (não poupando
críticas!) de todo o conteúdo. Mais correto seria dizer que esta obra é resultado de nosso
esforço conjunto e indissociável.

Muito obrigado a todos.


Alexandre Di Miceli
Introdução

A missão maior do líder é fazer com que sua organização tenha sucesso ao longo
do tempo de forma sustentável. Para isso, é importante que as pessoas pratiquem a boa
governança para valer no seu dia a dia. Mas, o que isso quer dizer?
De forma simples, a boa governança significa criar um ambiente no qual as pessoas
desejem voluntariamente cumprir as regras estabelecidas e tomar decisões no melhor in-
teresse coletivo de longo prazo. Para os públicos externos – tais como acionistas distantes
da gestão diária, credores e comunidade em geral – significa, também, propiciar a devida
transparência sobre o negócio em suas várias dimensões, incluindo aspectos financeiros
e não financeiros. Cabe às lideranças empresariais – principalmente altos executivos,
conselheiros e empreendedores – fazer isso acontecer.
O objetivo deste livro é ajudá-lo, por meio de uma abordagem objetiva e prática, a
liderar sua organização na jornada rumo aos mais elevados padrões de governança. Ele
foi escrito não apenas para as companhias de capital aberto, mas – principalmente –
para as empresas de capital fechado, interessadas em aprimorar seu modelo e práticas de
governança. A metodologia apresentada pode ser facilmente adaptada para outros tipos
de entidades, tais como cooperativas, fundações e aquelas sem fins lucrativos. O texto é
um convite, portanto, para você refletir, de forma estruturada, sobre como melhorar sua
organização, independentemente de seu porte e forma jurídica. Afinal de contas, todas
as organizações humanas precisam ser bem governadas.
Com este objetivo em mente, o livro é dividido em cinco capítulos. O primeiro,
“Por que a governança corporativa é um tema-chave para minha organização?”, fornece
argumentos a fim de convencer você e as demais lideranças que o tema deve ser encarado
como algo prioritário para o sucesso da sua organização. Para isso, são apresentados exem-
plos não apenas de como a boa governança pode agregar valor ao negócio, mas também
de como a ausência de bons padrões de gestão pode levar a colapsos e grandes prejuízos
empresariais e sociais.
Uma vez convencidos sobre a relevância do tema, os dois capítulos seguintes propor-
cionam um aprofundamento conceitual sob diferentes perspectivas.
O segundo capítulo apresenta uma visão inovadora sobre o tema: enquanto a maioria
dos textos tradicionais se concentra em formalismos e tecnicalidades do sistema de
governança – tais como a necessidade de implantação de órgãos como comitês, áreas de
controle, políticas e outros regramentos –, esse enfatiza que o fator humano é o grande
desafio para alcançar a boa governança empresarial. Isto porque as empresas são contextos
sociais nos quais é preciso fomentar um comportamento orientado a boas decisões e ao
cumprimento das regras. Como resultado, são abordados, de forma prática, temas como
xvi

vieses cognitivos na tomada de decisões, técnicas decisórias alternativas, aspectos


psicológicos associados ao descumprimento das regras e a relevância das atividades
de conscientização.
O terceiro capítulo aborda o tema sob uma perspectiva mais tradicional, des-
crevendo os principais elementos que compõem um bom sistema de governança. São
apresentados, de forma concisa e objetiva, o papel e o funcionamento esperado de
órgãos como o conselho de administração, comitês do conselho, diretoria executiva,
comitês de gestão e secretaria de governança. Discute-se, ainda, as responsabilidades
legais dos administradores e os principais passivos aos quais podem estar sujeitos ao
exercerem seus cargos, algo de ciência obrigatória para todos os executivos. Ao final,
examina-se a importância das áreas de controle, incluindo formas de implantação
dos controles internos, gestão de riscos e atividades de compliance.
Após a compreensão dos conceitos-chave sobre o tema, parte-se então, nos dois
últimos capítulos, para a implantação da governança corporativa sob uma pers-
pectiva mais prática.
O quarto capítulo mostra como implantar – passo a passo – um bom modelo
de governança em sua organização. São fornecidos indicadores que permitem um
diagnóstico estruturado de sua situação atual, incluindo a identificação de lacunas
e pontos críticos de governança. Na sequência, sugerem-se formas de priorização
dos pontos levantados, de forma a se construir uma agenda de governança para sua
organização. Após a definição do novo modelo de governança, parte-se para sua
formalização e funcionamento. Para isso, são disponibilizados resumos de diversos
documentos e políticas a serem considerados por sua empresa como resultado do
aprimoramento de seu sistema de alta gestão.
O último capítulo se concentra na avaliação de desempenho dos órgãos e car-
gos-chave de governança. Trata-se de um aspecto ainda incipiente na maioria das
companhias brasileiras, porém essencial para o estabelecimento de um ambiente
meritocrático e cada vez mais eficiente e produtivo ao longo do tempo. São dis-
ponibilizados diversos modelos de avaliação de elementos centrais, como o conselho
de administração, presidente do conselho, diretoria executiva, diretor-presidente e
comitês de gestão, entre outros.
Ao final da leitura, meu interesse é que você conclua que a governança corpo-
rativa – quando abordada em sua essência – é um tema muito estimulante e nada
burocrático, algo vivo e dinâmico na organização e que depende do papel das
lideranças para de fato acontecer.
Além de ser considerado o principal tema para a alta gestão atualmente, trata-se
de um assunto importante para todos os executivos e colaboradores. Do ponto de
vista interno, a qualidade da governança praticada pode contribuir para o sucesso
empresarial ou para seu fracasso, ocasionando enormes prejuízos. Como todos estão
no mesmo barco, a forma como a organização é governada afeta as perspectivas de
xvii

vida e carreira de todos. Do ponto de vista externo, a governança corporativa se


situa no topo das atenções dos investidores de todo o mundo, o que pode resultar
em um acesso mais fácil ou mais difícil ao capital. Ademais, como as empresas estão
naturalmente inseridas na comunidade, a forma como são governadas pode gerar
impactos substanciais (positivos ou negativos) sobre terceiros, incluindo clientes,
fornecedores, parceiros de negócio e sociedade em geral.
Logo, embora este livro tenha como foco as principais lideranças empresariais –
particularmente altos executivos, conselheiros e empreendedores –, trata-se de um
tema relevante para reflexão por todos os públicos de interesses ligados ao ambiente
empresarial. Acima de tudo, espero que esta seja uma obra útil para sua organização.
Ao aprimorá-la, você contribuirá para um país mais meritocrático, transparente e
avançado. Boa leitura!
Capítulo 1
Por que a governança corporativa é um
tema-chave para minha organização?

1.1  Uma questão de princípios

Todas as organizações – com ou sem fins lucrativos – possuem sua estrutura de poder
e forma de direcionamento. Elas podem ser mais autocráticas, centralizadas e dependentes
de pessoas específicas, ou mais democráticas, descentralizadas e institucionalizadas. Podem
possuir regras e processos decisórios mais formalizados, ou serem mais informais. Algumas
podem ser mais orientadas a atitudes éticas e ao cumprimento das regras, enquanto outras
desenvolvem uma cultura na qual os resultados financeiros se sobrepõem aos meios –
mesmo que ilícitos ou antiéticos – para se obtê-los.
A combinação de diferentes características de governança é interminável. A questão
central é que, diferentemente de um mero modismo gerencial ou de um tema técnico que
as empresas podem ou não optar por implantar, todas as organizações, necessariamente,
2

terão sua forma própria de governo, que pode ou não ser resultado de um processo
de reflexão estruturada de seus líderes.
O que chamamos de “governança corporativa” diz respeito a um conjunto de
práticas de negócio alicerçadas sobre princípios comuns que foram desenvolvidas
em todo o mundo a partir do início da década de 1990.1 A discussão sobre o tema
se inicia, portanto, a partir dos sólidos princípios que desde o início nortearam o
movimento em prol da boa governança.2
E quais são esses princípios? No Brasil, o IBGC – Instituto Brasileiro de Gover-
nança Corporativa, organização de referência sobre o tema criada em 1995 – elenca
quatro em seu Código de Melhores Práticas: transparência, prestação de contas,
equidade e responsabilidade corporativa.3 Além do código nacional, documentos
internacionais4 discorrem sobre outros preceitos basilares de boa governança. De
forma agregada, esses documentos elencam 10 grandes princípios globais de boa
governança aplicáveis a qualquer tipo de empresa ou organização:

Princípio global
# de governança Esse princípio diz respeito a:
Divulgação aberta, honesta e tempestiva das informações materiais
Transparência financeiras e não financeiras do negócio aos públicos interno e externo.
e integridade Entre os aspectos não financeiros, destacam-se aqueles relativos
1
das informações ao modelo de governança, estrutura de propriedade, principais
prestadas políticas e diretrizes, perspectivas estratégicas, sistemas de incentivos,
avaliação de desempenho, impactos socioambientais etc.
Prestação de Vontade dos administradores de apresentar os resultados de sua
contas voluntária e gestão e os elementos que fundamentaram as principais decisões
2 responsabilização tomadas, bem como de assumir a responsabilidade pelas ações e
Governança corporativa: o essencial para líderes 

pelas decisões omissões ocorridas durante seus mandatos.


tomadas
Necessidade de avaliar regularmente e formalmente o desempenho
de todos os administradores e órgãos de governança, atribuindo
Avaliação de remuneração em montante adequado, vinculada a desempenho e
desempenho, levando em consideração os riscos incorridos e a visão de longo prazo
3 do negócio.
remuneração justa
e meritocracia Além de impactar a remuneração, a avaliação de desempenho
deve resultar em recompensas e sanções justas, de forma a
fomentar um ambiente meritocrático.5
Implantação de um modelo de governança que permita visões
Contrapesos diferentes na tomada das decisões, evitando excessiva concentração
4 independentes no de poder e mitigando potenciais análises parciais ou vieses cognitivos.
processo decisório Deve haver regras para mitigar situações envolvendo conflitos de
interesses e mecanismos eficientes para a resolução de disputas.
Adoção de um horizonte de longo prazo como foco das decisões, o
Sustentabilidade
que implica assegurar relações saudáveis com as partes interessadas
e visão de
(stakeholders6) e iniciativas concretas a fim de melhorar a situação
5 longo prazo na
das comunidades às quais a organização está inserida. Temas como
condução do
sucessão de lideranças, mitigação de potenciais passivos futuros e
negócio
impactos socioambientais inserem-se nesse princípio.

(Continua)
3

Princípio global
# de governança Esse princípio diz respeito a:
Conscientização de que a informalidade é um inimigo da boa
governança e de que controle e supervisão independentes
são elementos essenciais. É necessário desenhar os processos e
Respeito às estabelecer as regras a serem cumpridas antes, durante e depois
formalidades, das reuniões dos órgãos de governança.
6 controles e
supervisão Entre os controles contidos neste princípio, destacam-se aqueles
independentes relacionados à gestão formal dos riscos do negócio, o compliance
e as auditorias. Essas áreas e responsáveis devem contar com toda
a independência e os recursos humanos, financeiros e tecnológicos
necessários.
Necessidade de que os membros da cúpula organizacional,
notadamente conselheiros e diretores, se comportem com
Tom e integridade e apliquem elevados padrões éticos e de conduta nas
comportamento suas decisões, liderando pelo exemplo.
7
ético das
lideranças É preciso promover, incessantemente, os valores da organização
por meio de ações de aculturamento e atitudes concretas, como a

Capítulo 1 Por que a governança corporativa é um tema-chave para minha organização? 


priorização da ética na seleção dos administradores.
Criação de um contexto social que fomente a cooperação entre
os colaboradores e executivos, evitando competição excessiva e
Cooperação entre rivalidades internas que releguem o interesse coletivo comum a um
colaboradores segundo plano.
8 e promoção do
interesse coletivo É necessária a conscientização de que o interesse da empresa deve
da organização prevalecer em todas as situações, mesmo em situações de conflito
com os interesses pessoais dos indivíduos ou dos acionistas que os
elegeram.
Observância da igualdade de direitos de todos os acionistas e
Equidade e facilitação do exercício efetivo desses direitos. A companhia precisa
promoção da estabelecer uma boa comunicação com seus acionistas de forma
9 participação proativa, incentivando e facilitando, ao máximo, sua participação
efetiva de todos nas assembleias. O tratamento com os acionistas deve ser imparcial,
os acionistas evitando benefícios particulares decorrentes de informações
privilegiadas.
Diversidade interna, Criação de políticas concretas para ampliar a diversidade (de
tratamento justo gênero, etnia, formações acadêmicas, idade, cultural etc.) nos
dos stakeholders órgãos de governança, bem como evitar preconceitos e punir
10
e ausência de quaisquer atitudes discriminatórias para com seus stakeholders. É
políticas e práticas preciso definir e monitorar parâmetros concretos em relação a esses
discriminatórias temas.

Tabela 1.1 – Princípios globais da boa governança empresarial

Com o passar do tempo, os princípios globais de governança foram convertidos


em um número crescente de práticas recomendadas. Tendo em vista, entretanto, que
cada empresa possui suas peculiaridades em termos de estratégia, porte, estágio de
vida, estrutura acionária etc., não há uma receita pronta de práticas a serem adotadas
igualmente por todas as organizações.
Como resultado, a efetiva adesão aos princípios acima – aplicáveis a qualquer
tipo de organização, incluindo naturalmente as empresas de capital fechado – é
mais importante do que a adoção irrefletida de práticas recomendadas, muitas vezes
4

implantadas apenas com o objetivo de atender, de maneira formal, aos documentos


de referência sobre o tema.
Para internalizar esses princípios, você e as demais lideranças devem refletir sobre
três questões-chave. A primeira, e mais importante, é:

1. Estamos genuinamente dispostos a aderir a uma nova abordagem para o


negócio com bases nos princípios e boas práticas de governança?
Em caso positivo, então deve-se prosseguir para as duas outras questões-chave:
2. Quais são os nossos princípios de governança corporativa, nosso conjunto
de valores essenciais do qual não abrimos mão sob quaisquer circunstâncias?
3. Que práticas devemos adotar a fim de assegurar que esses princípios sejam
internalizados por todos e estejam presentes no dia a dia?

Crítica do autor:

Na medida em que a governança corporativa passou a ser mais disseminada


no mercado, muitas pessoas recém-expostas ao tema passaram a visualizá-lo
apenas como um conjunto de práticas a serem implementadas de forma tecni-
cista, saltando a etapa fundamental de internalização de seus preceitos basilares.
O próprio lançamento do Novo Mercado pela bolsa de valores – apesar de seu
provável mérito na retomada de nosso mercado de capitais ao longo da década de
2000 – pode ter, inadvertidamente, reforçado esta visão, já que muitas companhias
parecem ter interpretado o cumprimento restrito do check-list exigido de práticas
do segmento como um atestado permanente de qualidade em governança.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

O resultado geral é que, atualmente, muitas companhias parecem fazer


as seguintes questões-chave em relação ao tema:

j Quais práticas de governança temos que adotar a fim de não sermos


penalizados pelos investidores?
j Quais práticas precisamos adotar para obter o selo do Novo Mercado?

Trata-se de uma visão errada que não leva à geração de valor intrínseco
para o negócio e seus acionistas de longo prazo.
Na verdade, é o cumprimento do “espírito” dos princípios apresentados
– mesmo que por diferentes práticas de governança apropriadas às peculiari-
dades de cada organização – que agrega valor às companhias, bem como gera
um ambiente empresarial mais sadio, com efeitos positivos para a atração de
investimentos e o desenvolvimento do país.
5

1.2  Objetivos e reflexões centrais


da governança corporativa

Após a compreensão de que os princípios de governança são essenciais, o próximo


passo é dar um pouco mais de concretude ao tema. Para isso, as lideranças devem
refletir, de forma estruturada, sobre os quatro objetivos centrais da governança
corporativa. São eles:

a) Aprimorar continuamente o processo decisório, de forma a assegurar que as


decisões sejam tomadas no melhor interesse de longo prazo da organização: este
objetivo diz respeito a atuação dos órgãos de governança como conselho,
comitês e diretoria, mecanismos de avaliação de desempenho, sistema
de remuneração, fluxo de informações, seleção de pessoas, sucessão de

Capítulo 1 Por que a governança corporativa é um tema-chave para minha organização? 


lideranças etc.
b) Reduzir a probabilidade de surpresas negativas: contempla os temas relati-
vos à gestão dos riscos, compliance, controles internos, auditorias interna e
independente, canais de denúncia, ouvidoria, adesão aos princípios éticos e
valores da organização, mitigação dos conflitos de interesses etc.
c) Proporcionar elevada transparência para os públicos interno e externo: aborda
temas como transparência das informações financeiras e não financeiras,
sustentabilidade e impactos socioambientais, prestação de contas e relacio-
namento com stakeholders etc.
d) Promover o exercício efetivo dos direitos de todos os sócios: trata dos proce-
dimentos relativos à assembleia de acionistas, previsões estatutárias, eleição
de administradores, canais de comunicação com investidores, mecanismos
para resolução de disputas societárias, entre outros.

Cada um desses objetivos, detalhados ao longo do livro, se desdobra em ques-


tões-chave que podem servir como ponto de partida para as iniciativas de governança
a serem empreendidas por sua empresa. A tabela a seguir descreve as principais
questões a serem consideradas:
6

Objetivos
centrais da boa
governança Reflexões a serem feitas pelas lideranças da organização
j Nossos órgãos-chave de governança – conselho de administração,
comitês e diretoria – possuem papéis, composição e funcionamento bem
definidos e vêm funcionando conforme o desejado?
j Estou satisfeito com nosso processo decisório em relação à agilidade, nível
1. Aprimorar
de centralização das decisões, responsabilização pelas decisões tomadas
continuamente
e conformidade com as leis?
o processo
j Possuímos um fluxo de informações e interfaces adequado entre os órgãos?
decisório a fim
j Há contrapesos independentes, eficazes e com autoridade necessária em
de assegurar
nosso processo decisório?
decisões no
j Nosso sistema de remuneração é adequado?
melhor interesse
j Há um plano de sucessão formal de nossas lideranças?
de longo prazo
j Temos um ambiente meritocrático? As pessoas o percebem desta forma?
da organização
j Nossos órgãos de governança se autoavaliam formalmente e

periodicamente?
j Temos um programa de aculturamento em relação ao nosso modelo de

governança?
j Temos uma noção clara dos principais riscos a que estamos sujeitos,
incluindo sua probabilidade de ocorrência e impacto potencial? Eles são
gerenciados por meio de uma estrutura formal, com envolvimento das
principais lideranças?
j Temos políticas formais em relação aos principais temas que podem afetar

nosso negócio?
j Estou satisfeito com nossos controles internos e confortável com a precisão

2. Reduzir a de nossas informações financeiras?


probabilidade j Nossas áreas de controle possuem recursos humanos, tecnológicos e

de surpresas financeiros adequados?


negativas j Possuímos uma área ou um responsável pelas atividades de compliance e um

programa formal de conformidade em curso?


j Temos um código de ética aprovado pelo conselho e um programa

contínuo para assegurar sua internalização?


j Estou satisfeito com os trabalhos desenvolvidos pelas auditorias interna e

externa, incluindo sua seleção e avaliação?


Governança corporativa: o essencial para líderes 

j Lidamos adequadamente com as matérias que envolvem conflitos de

interesses em nossa organização?


j Propiciamos elevada transparência aos nossos públicos interno e externo
além das exigências legais?
j Há evidências de que os públicos interno e externo estão satisfeitos com

nossa transparência?
j Temos bons canais de comunicação com nossos acionistas, clientes e
3. Proporcionar
outros stakeholders chave?
elevada
j Nosso website e relatório anual estão sempre atualizados e ricos em informações?
transparência
j Possuímos ações concretas no campo socioambiental?
para os
j Procuramos publicar informações de governança, sustentabilidade e
públicos interno
socioambientais de forma integrada em linha com diretrizes internacionais,
e externo
tais como o GRI (Global Reporting Initiative)?7
j Realizamos encontros periódicos com representantes de nossos principais

públicos de interesse?
j Nossos administradores possuem acesso a um portal interno que lhes permite

visualizar e analisar a situação da empresa sob diferentes dimensões?

(Continua)
7

Objetivos
centrais da boa
governança Reflexões a serem feitas pelas lideranças da organização
j Procuramos estimular ao máximo a participação dos acionistas nas assembleias?
j Preparamos um manual de assembleia8 e realizamos convocações com
antecedência mínima de 30 dias?
j Viabilizamos o voto de nossos acionistas por meio de procurações ou voto

a distância?
4. Promover
j Temos uma área de relacionamento com investidores? Temos evidências
o exercício
de que os investidores estão satisfeitos com ela?
efetivo dos
j Procuramos entender, de forma proativa, as demandas dos investidores?
direitos de
j Procuramos ativamente resolver quaisquer problemas com nossos
todos os sócios
acionistas antes de chegarem à esfera judicial?
j Nossos conselheiros têm prestado contas diretamente para nossos

acionistas por meio de participação nas assembleias gerais?


j O conselho de administração elabora um relatório periódico descrevendo

seu funcionamento e principais resultados de suas atividades no exercício?

Capítulo 1 Por que a governança corporativa é um tema-chave para minha organização? 


Tabela 1.2 – Questões-chave de governança corporativa

As respostas às questões acima – o que requer devida reflexão e debate interno –


possibilitam o entendimento dos pontos críticos de governança a serem enfrentados
pela organização. Só então as lideranças devem passar a analisar as recomendações
de boas práticas disponíveis nos documentos de referência sobre governança corpo-
rativa, comparando-as com os principais pontos críticos identificados.
É desse comparativo fundamental que deverá emergir a “agenda de governança”
da organização, isto é, a definição das principais mudanças organizacionais e práticas
a serem adotadas no curto, no médio e no longo prazos. O processo para criar uma
agenda de governança adaptada à realidade da sua organização – detalhado no capí-
tulo 4 – é ilustrado na figura a seguir (Figura 1.1).
Conforme observado pela figura anterior, a jornada rumo ao estabelecimento de
padrões mais elevados de governança exige um amplo processo de reflexão interna
das lideranças. Não se trata, portanto, do mero cumprimento mecânico de um
conjunto de recomendações contidas nos códigos de boas práticas, já que tais reco-
mendações podem naturalmente não ser aplicáveis ou agregar valor à organização
em determinado momento.
Ao final desse processo, sua empresa poderá a alcançar a excelência em gover-
nança corporativa, tornando-se uma sociedade na qual:

a) Do ponto de vista interno: as pessoas tomam decisões no melhor interesse


de longo prazo da organização, cumprem as regras e se comportam de forma
ética; e,
b) Do ponto de vista externo: é transparente com seus stakeholders e confere
plenos direitos a todos os seus acionistas de forma equitativa.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

8
Figura 1.1 – Criação da agenda de governança da organização.
9

1.3  Diferentes formas de controle acionário


e seus desafios específicos

Além das reflexões gerais apresentadas na seção anterior, as diferentes formas de


controle acionário – como o controle familiar,9 estatal,10 disperso,11 compartilhado12
e estrangeiro – geram desafios específicos adicionais a serem endereçados por suas
lideranças.
Comecemos pelas empresas familiares, as mais recorrentes em nosso país. Nelas,
além dos relacionamentos potencialmente conflituosos entre executivos, conselheiros
e acionistas, surge um fator complicador adicional: a família. Esse componente, com
seus aspectos psicológicos e sentimentais do relacionamento entre parentes, pode
afetar substancialmente as decisões relativas ao negócio. Como resultado, surgem

Capítulo 1 Por que a governança corporativa é um tema-chave para minha organização? 


as seguintes questões específicas de governança:

Questões específicas de governança para as empresas familiares


1. Que mecanismos devem ser implantados a fim de assegurar que a empresa – e não a família –,
seja colocada em primeiro lugar nas decisões empresariais?
2. Como criar um sistema de contrapesos no processo decisório que evite concentração
excessiva de poder nas mãos do fundador ou representante da família controladora?
3. Como estruturar um processo de sucessão de lideranças e de transição de gerações que
assegure sucesso nesse momento especialmente crítico para as empresas familiares?
4. Que medidas devem ser implantadas para criar um ambiente meritocrático na alta gestão,
evitando situações de nepotismo e fuga de talentos?
5. Como estruturar um sistema de avaliação de desempenho formal e imparcial nos órgãos e
cargos-chave de governança?
6. Como criar mecanismos de prestação de contas transparentes para com os familiares não
envolvidos com a gestão diária, evitando ruídos em relação aos resultados e utilização
indevida de recursos da empresa por familiares?
7. Como resolver as questões familiares de forma a assegurar uma relação harmônica entre os
diferentes ramos da família controladora, principalmente quando da entrada de agregados e
da formação dos membros mais jovens?
8. Como equacionar as demandas de financiamento da empresa vis-à-vis as demandas de
recursos por parte dos familiares?

Tabela 1.3 – Controle familiar: questões específicas a serem endereçadas

No caso das empresas de controle estatal, a possibilidade de interferência


indevida do Estado no papel de controlador – priorizando questões políticas em
detrimento de decisões técnicas de negócio – naturalmente constitui a principal
peculiaridade dessas sociedades. Como resultado, destacam-se os seguintes desafios
específicos:
10

Questões específicas de governança para as empresas sob controle estatal


1. Como lidar com a dualidade entre a maximização do valor da companhia (objetivos
comerciais) e a promoção de políticas públicas (objetivos sociais), equacionando a questão
da função-objetivo da empresa13?
2. Como criar mecanismos para assegurar que o conselho de administração tenha autonomia
para cumprir seu papel estratégico, incluindo o poder para de fato selecionar e substituir o
diretor-presidente e demais diretores?
3. Como estruturar um procedimento para a seleção de conselheiros de forma a assegurar
diversidade de experiências, qualificação técnica e pontos de vista independentes no órgão?
4. Como criar um procedimento para nomeação de altos executivos que assegure um ambiente
meritocrático, incluindo a devida “blindagem” contra indicações de cunho eminentemente político?
5. Como proteger o modelo de gestão contra mudanças bruscas no cenário político – tais como
aquelas associadas às eleições –, assegurando continuidade administrativa e manutenção de
compromissos prévios com os investidores e demais stakeholders?
6. Como definir regras claras para as políticas de preços e as transações com partes
relacionadas, tornando-as independentes de questões políticas momentâneas, tais como
períodos eleitorais?
7. Como superar as restrições legais e políticas de forma a implantar um sistema adequado de
remuneração e avaliação de desempenho na alta gestão, incluindo sistemas efetivos de
recompensas e sanções?
8. Como assegurar transparência periódica ao mercado acerca dos custos associados ao
atendimento de políticas públicas por parte da empresa?

Tabela 1.4 – Controle estatal: questões específicas a serem endereçadas

As companhias com estrutura acionária dispersa ou pulverizada, caracterizadas


pela ausência de um acionista controlador ou bloco de controle, tornaram-se realidade
no ambiente empresarial brasileiro a partir da década de 2000. Nessas sociedades –
traduzidas erroneamente como “corporações”, em virtude de sua similaridade com
as corporations norte-americanas no que diz respeito à estrutura de propriedade –, os
executivos de mercado tendem a possuir um poder substancialmente maior do que
nas companhias com acionistas majoritários. Isso leva a desafios específicos, tais como:
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Questões específicas de governança para as empresas com estrutura dispersa


1. Como incentivar a participação dos acionistas nas assembleias, principalmente nas quais
devem ser tomadas decisões cruciais?
2. Como estruturar um processo de nomeação de conselheiros que limite a influência dos
executivos em sua escolha?
3. Como assegurar a presença de conselheiros não apenas independentes, mas envolvidos
ativamente com a companhia e interessados na geração de valor de longo prazo para
acionistas e demais stakeholders?
4. Como evitar que o conselho de administração se torne manipulado ou dominado, do ponto
de vista informacional, pelo diretor-presidente?
5. Como criar um sistema de remuneração que estimule os executivos a agir no melhor interesse
de longo prazo e na perenidade da companhia?
6. Como estruturar um canal de comunicação entre o conselho de administração e os acionistas
da companhia de forma a estabelecer um diálogo contínuo sobre suas percepções,
preocupações e sugestões?
7. Como evitar que o maior poder nas mãos dos executivos os leve a maximizar sua remuneração
de curto prazo em detrimento da geração de valor de longo prazo para os acionistas?
8. Como evitar que os executivos criem barreiras de difícil remoção a fim de dificultar sua
substituição e se perpetuarem em suas posições?

Tabela 1.5 – Controle disperso ou gerencial: questões específicas a serem endereçadas


11

O controle compartilhado é outra forma de controle societário que se tornou


muito popular no ambiente empresarial brasileiro a partir da década de 1990.
Trata-se de uma situação intermediária entre as empresas com um único acionista
majoritário e as pulverizadas, na qual um grupo composto tipicamente por dois
a quatro acionistas, com participações acionárias relevantes, exercem, de forma
conjunta, o controle – geralmente regrados por um acordo de acionistas sem que
qualquer um detenha isoladamente o poder para deliberar sobre as principais ques-
tões empresariais. Entre os desafios específicos para a boa governança das sociedades
sob controle compartilhado, destacam-se:

Questões específicas de governança para as empresas sob controle compartilhado

Capítulo 1 Por que a governança corporativa é um tema-chave para minha organização? 


1. Como assegurar coesão e priorização do valor de longo prazo da empresa nas deliberações
do conselho, evitando que o órgão se torne um “campo de batalha” de acionistas com
horizontes temporais e interesses estratégicos diferentes?
2. Como assegurar que os conselheiros sejam, de fato, leais à empresa e não aos acionistas que
os elegeram em sua atuação no conselho de administração, particularmente nas situações
em que recebem instruções ou orientações de voto?
3. Como evitar que as reuniões prévias entre representantes dos acionistas esvaziem a
atuação do conselho de administração como órgão decisório e o papel dos conselheiros
independentes?
4. Como definir regras para a atuação dos conselheiros suplentes (muito comuns nesse tipo
de empresa), incluindo presença contínua ou não nas reuniões, forma de remuneração e
avaliação de desempenho?
5. Como assegurar coesão e meritocracia na diretoria executiva, evitando que o processo de
nomeação de diretores se torne um “loteamento de cargos” entre os acionistas do bloco de
controle?
6. Quais devem ser as regras para o acesso de representantes dos controladores junto aos
gestores das sociedades investidas, incluindo visitas, recebimento de informações operacionais
do negócio etc.?
7. Como assegurar o sigilo acerca das informações recebidas por conselheiros indicados pelo
bloco de controle, muitas vezes disseminadas na estrutura organizacional das entidades que
compõem o bloco de controle como forma de preparar a instrução ou orientação de voto
aos conselheiros?
8. Como “blindar” a empresa contra os impactos negativos decorrentes de eventuais disputas
entre os acionistas do bloco de controle, evitando a desconsideração dos interesses dos
demais acionistas e a destruição de valor empresarial?

Tabela 1.6 – Controle compartilhado: questões específicas a serem


endereçadas

Por fim, tem-se as sociedades sob controle estrangeiro, tipicamente multinacio-


nais, ou empresas controladas por acionistas internacionais. Em alguns casos, essas
empresas possuem participações minoritárias de acionistas brasileiros, aumentando
a complexidade de seu modelo de governança. Entre suas reflexões específicas,
destacam-se:
12

Questões específicas de governança sob controle estrangeiro


1. Como evitar que o conselho local se torne um órgão meramente proforma, haja vista que as
decisões estratégicas tendem a ser emanadas diretamente pela matriz?
2. Como assegurar um bom funcionamento do conselho de administração – incluindo reuniões
com frequência adequada –, tendo em vista que a maioria dos conselheiros muitas vezes
reside no exterior?
3. Como equacionar o modelo de reporte matricial sem esvaziar excessivamente o poder das
lideranças locais?
4. Como evitar lentidão excessiva nas matérias que dependem de aprovação da matriz?
5. Como harmonizar as políticas e regras corporativas da matriz com a realidade local, de
forma a assegurar que os executivos estrangeiros possuam conhecimento adequado sobre a
regulação e práticas de governança locais?
6. Como adaptar o modelo de gestão da matriz ao modelo de governança brasileiro, evitando
a criação de órgãos e cargos exóticos e de difícil compreensão pelo mercado local?
7. Como definir regras equitativas para as transações com a matriz, principalmente quando a
companhia possui outros acionistas locais?
8. Como assegurar adequada transparência para com os stakeholders locais em qualidade
similar àquela proporcionada pela matriz no exterior?

Tabela 1.7 – Controle estrangeiro: questões específicas a serem endereçadas

Como se pode observar, cada forma de controle acionário suscita questões es-
pecíficas de governança a serem endereçadas. Você e as demais lideranças devem,
portanto, refletir e responder não apenas àquelas grandes questões apresentadas na
seção anterior, mas também às questões específicas apresentadas nesta seção, tendo
em vista a realidade de sua organização.
Após tantas perguntas e reflexões necessárias, deve-se reconhecer que a boa
governança exige, de fato, um investimento substancial de tempo e de recursos
financeiros por parte das lideranças, bem como sua abertura para a mudança em
relação ao status quo, o que pode levar, inclusive, à redução do poder absoluto das
Governança corporativa: o essencial para líderes 

principais lideranças nas decisões empresariais.


Mas, todo esse investimento vale a pena?
Nas próximas seções apresento evidências de que sim. A boa governança agrega
valor ao negócio, bem como sua ausência aumenta a probabilidade da organização
ocasionar prejuízos substanciais para seus acionistas e demais públicos de interesse.

1.4  Por que investir no tema? Governança


corporativa e criação de valor

O objetivo maior de qualquer líder é criar valor de forma sistemática para seu
negócio. Em outras palavras, fazer com que suas perspectivas de longo prazo sejam
cada vez melhores ao longo do tempo. Uma questão central, portanto, é avaliar se os
investimentos em governança corporativa realmente contribuem para este objetivo.
13

Em primeiro lugar, é necessário harmonizar o conceito de valor. De acordo com a


abordagem do fluxo de caixa descontado, a mais aceita para valoração das empresas,
há dois elementos centrais que determinam o valor de um negócio: sua perspectiva
de geração de fluxos de caixa ao longo do tempo e o risco percebido pelo mercado
de que essa perspectiva futura de resultados de fato irá se concretizar ou não.
No jargão técnico, o primeiro elemento é mensurado pelo chamado fluxo de
caixa livre para a empresa (FCLE14), isto é, o montante disponível a distribuir para
todos os credores e acionistas da empresa ao final de um período. O segundo é
medido pelo custo médio ponderado de capital (WACC – weighted average cost of
capital15), que representa a taxa geral de retorno exigida pelos credores e acionistas,
levando em consideração os montantes investidos por cada um deles na empresa.
Quanto maior a perspectiva de geração de fluxos de caixa ao longo do tempo
(FCLE) e menor o custo de capital (WACC), maior o valor da empresa. A boa
governança pode contribuir em ambos os sentidos dessa equação.

Capítulo 1 Por que a governança corporativa é um tema-chave para minha organização? 


De um lado, um sistema de governança efetivo tende a melhorar as decisões
empresariais e a aumentar a probabilidade de cumprimento dos regramentos es-
tabelecidos, levando a melhores perspectivas de fluxo de caixa. Esses são os chamados
benefícios internos da governança corporativa. Dentre eles, cinco se destacam:

a) Aprimoramento do funcionamento da alta gestão, com separação mais


clara dos papéis e dos responsáveis pelas quatro etapas-chave do processo
decisório – geração de ideias; sua aprovação ou não; execução; e, avaliação
dos resultados obtidos –, além da melhoria das interfaces entre órgãos e áreas;
b) Relacionamento mais estruturado entre acionistas, conselheiros e execu-
tivos, levando a uma menor dependência de pessoas específicas;
c) Aprimoramento dos mecanismos de avaliação de desempenho e do sistema
de incentivos dos executivos, levando a um ambiente mais meritocrático;
d) Diminuição da chance de surpresas negativas, em decorrência da melhor
gestão dos riscos, controles internos e mecanismos de aculturamento a fim
de assegurar aderência às regras; e,
e) Maior transparência e conforto para os stakeholders.

Por outro lado, a implantação de um bom modelo de governança gera mais


confiança para os stakeholders, isto é, todos aqueles que apostaram suas “fichas” na
empresa. Logo, aquelas percebidas como bem governadas se tornam mais atraentes
para os investidores – credores e acionistas –, aumentando a quantidade de pes-
soas interessadas em comprar seus papéis. Há, então, uma diminuição no custo de
capital dessas companhias – tanto do custo do capital próprio (via ações), quanto do
custo do capital de terceiros (via títulos de dívida e empréstimos de longo prazo) –,
resultando em um menor custo médio ponderado de capital (WACC). Este é o
racional por trás do chamado “benefício externo” da governança corporativa.
14

O impacto final dos benefícios interno e externo da governança é o aumento


do valor do negócio, algo amplamente disseminado como missão maior de todos
os administradores. A Figura 1.2 resume os possíveis impactos positivos da boa
governança sobre o valor da empresa.

Figura 1.2 – Impactos da boa governança sobre o valor da empresa.

O argumento em favor do valor criado pela boa governança é convincente.


Entretanto, deve-se verificar se a ilustração acima ocorre na prática, isto é, se as
evidências corroboram a ideia de que os investimentos em governança de fato
criam valor.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Centenas de estudos foram realizados, nas últimas duas décadas, buscando res-
ponder essa questão. A maioria dos trabalhos constata uma forte relação positiva
entre a adoção de práticas recomendadas de governança e indicadores de valor
comumente empregados pelo mercado. Em outras palavras, observa-se que as em-
presas com práticas superiores de governança tendem a ser negociadas a um prêmio
em relação aos seus pares.16
Uma das abordagens mais utilizadas nesses trabalhos é a atribuição de uma
“nota” de governança com base na adesão da companhia a determinadas práticas
recomendadas. Em geral, essas notas se baseiam em diferentes dimensões de gover-
nança, tais como: conselho de administração, direitos dos acionistas, transparência
das informações, políticas corporativas etc. Na sequência, relaciona-se a nota obtida
pelas empresas com medidas de valor relativo, de forma a investigar se há uma
eventual relação positiva entre ambos. A tabela a seguir apresenta os resultados de
alguns dos inúmeros estudos realizados em todo o mundo nos últimos anos com
base nessa abordagem geral:
15

Companhias
# Estudo analisadas Principal conclusão
“Corporate Attributes,
Corporate Governance Forte relação positiva entre governança
Quality, and the Value corporativa e valor: aumento da
154 companhias
of Public Brazilian capitalização de mercado entre 85% e
1 listadas brasileiras
Companies” 100% para uma empresa que conseguisse
em 2002.
evoluir da pior para a melhor nota de
Silveira, Barros e Famá governança da amostra.
(2006).

“Corporate governance Forte relação positiva entre governança


and value in Brazil (and corporativa e valor: aumento da
131 companhias
in Chile)”. capitalização de mercado de 95% para
2 listadas brasileiras
uma empresa que conseguisse evoluir do
Leal e Carvalhal da Silva de 1998 a 2002.
pior para o melhor índice de governança
(2007). da amostra.
“Practical Guide to
Corporate Governance: 14 companhias
Experiences from Companhias líderes em governança
latino-americanas

Capítulo 1 Por que a governança corporativa é um tema-chave para minha organização? 


the Latin American negociadas a um prêmio em relação a
(oito brasileiras)
Companies Circle” seus pares latino-americanos de 2005 a
3 líderes em
2008: múltiplo preço-lucro (PE) de 21 contra
OCDE – Organização governança na
16 dos pares e preço-valor patrimonial
para Cooperação região de 2005 a
(PBV) de 2,9 contra 1,8 da região.17
e Desenvolvimento 2008.
Econômico (2009).

“Corporate governance 6.623 Forte relação positiva entre governança


and firm value: observações corporativa e valor: incremento de cerca
International evidence” de companhias de 15% no valor da empresa para aquelas
4
de 22 países que elevassem sua nota de governança
Ammann, Oesch e desenvolvidos de do extremo inferior (2,5%) para o extremo
Schimd (2011). 2003 a 2007. superior.

“Legal protection of Melhor governança associada a menor


investors, corporate 559 observações custo de capital próprio: uma empresa
governance, and the de empresas que migrasse do pior quartil (25% piores) de
5 cost of equity capital” de 17 países governança para o melhor quartil obteria
emergentes em redução no seu custo de capital próprio de
Chen, Chen e Wei 2001 e 2002. 1,5%, resultando em aumento de cerca de
(2009). 22% no valor da companhia.
“The usefulness of 1.667 Forte relação positiva entre governança
corporate governance observações de corporativa e valor: incremento de cerca
6 ratings – insights from empresas alemãs de 20% no valor da empresa em caso de
European settings” e britânicas de aumento da nota de governança do extremo
Hitz e Lehmann (2013). 2003 a 2007. inferior (2,5%) para o extremo superior.

Um aumento de 15% na nota de governança


“Corporate 864 companhias de 2010 a 2012 levaria a incremento de 14%
Governance Watch listadas da Ásia e no preço das ações no período, enquanto
7 2012” Pacífico de 2010 que a redução da nota de governança em
CLSA Group (2012). a 2012. 15% leva a retornos 11% menores do que o
benchmark de mercado utilizado.
“Corporate-Governance
Ratings and Company 1.199 Forte relação positiva entre governança
Performance: A observações de corporativa e valor: incremento de 16% no
8 Cross-European Study” empresas de 14 valor para as empresas que elevassem sua
países europeus nota de governança do extremo inferior
Renders, Gaeremynck, de 1999 a 2003. (2,5%) para o extremo superior.
Piet Sercu (2010).

Tabela 1.8 – Governança corporativa e criação de valor: resultados


de estudos selecionados
16

Conforme observado na tabela, a relação positiva entre a adesão a práticas de


governança e maior valor corporativo foi observada por diferentes estudos realizados
em todos os principais mercados mundiais.18 Embora ainda haja uma disputa acadê-
mica sobre o real valor da governança corporativa, pode-se inferir, com base nesses
estudos, um potencial para aumento substancial – talvez com uma ordem de grandeza
de 15 a 20% – no valor da empresa em função de melhores práticas de governança.
É importante destacar ainda que a maioria dos trabalhos tende a encontrar resulta-
dos bem mais robustos quando realizados em mercados emergentes do que em países
desenvolvidos. Em outras palavras, a boa governança parece ser um fator ainda mais
importante para o valor das empresas situadas em países associados a uma proteção
mais frágil dos investidores, como é o caso do Brasil. Logo, no cenário brasileiro, os
ganhos da boa governança tendem a ser muito maiores do que a média internacional.
Se as evidências de que há potencial para incrementar o valor de suas empresas mui-
tas vezes não sensibilizam os líderes a buscarem aprimorar ao máximo suas práticas de
governança, há ainda o outro lado da moeda: muitos estudos mostram que más práticas
de governança tendem a ocasionar substancial destruição do patrimônio empresarial,
geralmente como resultado de conflitos de interesses e decisões erradas na alta gestão.
O trabalho de Silveira e Dias Junior corrobora essa afirmação. Os autores ana-
lisaram o impacto do anúncio de problemas de governança19 em 24 companhias
brasileiras ao longo da década de 2000. Ao final, constataram uma destruição de
valor da ordem de 12% nos dias ao redor do anúncio de tais problemas para o
mercado. Em média, as companhias analisadas perderam US$497 milhões de seu
valor de mercado logo após os anúncios, reforçando a necessidade da adoção de
boas práticas para evitar destruição de valor.
Os estudos acadêmicos apresentados procuram aferir o valor da governança para
Governança corporativa: o essencial para líderes 

uma empresa “média” do mercado, isto é, para aquela que apresenta indicadores de
rentabilidade, endividamento etc., não muito diferente das demais.
Entretanto, há um valor fundamental da boa governança que não é coberto
por esses trabalhos, mas que é essencial para os acionistas e demais stakeholders de
qualquer empresa. Trata-se da criação de um sistema organizacional que evite o
surgimento de escândalos associados a problemas de governança, de forma a as-
segurar a perenidade da companhia. A próxima seção analisa esta questão em detalhe.

1.5  Lições dos colapsos empresariais associados


a problemas de governança

Colapsos empresariais associados a problemas de governança são sempre mar-


cantes, resultem eles de ações ilegais, de atitudes antiéticas ou simplesmente de
decisões erradas na alta gestão.
Banco Lehman
Enron Worldcom Parmalat Siemens Sadia Panamericano Banco Cruzeiro do
Santos Brothers
(EUA) (EUA) (Itália) (Alemanha) (Brasil) (Brasil) Sul (Brasil)
(Brasil) (EUA)
Royal OGX
Dutch Shell (Brasil)
Xerox Agrenco Aracruz
Tyco (EUA) (Reino Bear Sterns (EUA) BP (Reino Unido) Olympus (Japão)
(EUA) (Brasil) (Brasil)
Unido /
Holanda)
Royal Société Barclays HSBC
Adelphia Vivendi Livedoor AIG HRT
Ahold Refco (EUA) Générale Madoff (EUA) (Reino (Reino
(EUA) (França) (Japão) (EUA) (Brasil)
(Holanda) (França) Unido) Unido)
2001-2002 2003-2004 2005-2006 2007-2008 2009-2010 2011-2012 2013

Tabela 1.9 – Exemplos de empresas que sofreram problemas críticos de governança

Capítulo 1 Por que a governança corporativa é um tema-chave para minha organização? 

17
18

Como não se recordar dos problemas ocorridos nos últimos anos com diver-
sas empresas estrangeiras – a exemplo de Societé Générale, Lehman Brothers,
Satyam, Siemens, AIG e Olympus – e brasileiras – como Agrenco, Sadia, Ara-
cruz, Banco Panamericano, Banco Cruzeiro do Sul, HRT e OGX?
Voltando um pouco mais no tempo, é impossível esquecer casos emblemáti-
cos do início da década de 2000 envolvendo companhias como Enron, World-
com, Royal Ahold, Tyco, Parmalat e Banco Santos. A Tabela 1.9 elenca um
conjunto de grandes companhias nacionais e estrangeiras que sofreram graves
problemas de governança20 ao longo da última década.
Apesar das especificidades inerentes a cada um dos problemas de governança
vividos pelas organizações acima, um exame aprofundado permite identificar causas
comuns que os propiciaram. Elas podem ser classificadas em três grupos: causas
fundamentais, mediadoras e imediatas.
O primeiro diz respeito às causas fundamentais, isto é, aquelas que representam
a raiz dos problemas por envolver a estrutura de comando das empresas e seu
monitoramento externo. Cinco se destacam: excesso de concentração de poder,
conselho de administração ineficaz, passividade dos investidores, falhas dos cha-
mados “guardiões” de governança (auditorias, agências de rating, analistas de ações
etc.) e regulação deficiente. A Tabela 1.10 as descreve em detalhes.

# Causas fundamentais Essa causa se manifesta quando…


...as principais decisões são resultado da visão unilateral
Excesso de concentração de de indivíduos com poder demasiado, sem o devido
1
poder crivo de contrapesos organizacionais como conselhos,
comitês e outras lideranças.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

...o conselho não desempenha de forma


Conselho de administração satisfatória seus papéis de manutenção dos valores
2
ineficaz organizacionais, supervisão da gestão e promoção do
correto direcionamento estratégico.
...os acionistas deixam de cuidar de seu patrimônio de
forma ativa, atuando de forma passiva e premiando
3 Passividade dos investidores
erroneamente empresas com práticas insustentáveis, o
que permite a inflação artificial do preço das ações.
Falha dos guardiões de
mercado (gatekeepers): ...agentes de mercado que oferecem seu capital
auditorias, analistas, agências reputacional para atestar informações de difícil
4
de risco de crédito, bancos verificação direta pelos investidores falham no exercício
de investimento, escritórios de de suas funções.
advocacia etc.
...a ausência ou deficiência de regulação adequada
5 Regulação deficiente permite práticas empresariais que ocasionam
problemas de governança.

Tabela 1.10 – Causas fundamentais associadas aos problemas críticos


de governança
19

Além do potencial destrutivo de cada causa fundamental apontada, é importante


destacar que elas se inter-relacionam e se reforçam. Como exemplo, investidores pas-
sivos abrem espaço para o aumento na concentração de poder, que, por sua vez, pode
levar à eleição de conselheiros pouco independentes, contribuindo para a ineficácia
do órgão. Um conselho inoperante também tem, naturalmente, o potencial para
reforçar a concentração de poder na organização.
O colapso do Lehman Brothers ilustra esta situação. Entre 2003 e 2007, período
imediatamente anterior à crise financeira, o preço de suas ações disparou de US$15
para cerca de US$80. O sucesso perante os investidores – em sua maioria passivos
e pouco questionadores dos riscos aos quais o banco estava sujeito – reforçou o
poder de seu então CEO Richard Fuld. Isso não apenas permitiu a Fuld manter
simultaneamente os cargos de diretor-presidente e presidente do conselho, como
também propiciou a formação de um conselho de administração amigável e pas-
sivo, composto em sua maioria por pessoas com baixo conhecimento do mercado

Capítulo 1 Por que a governança corporativa é um tema-chave para minha organização? 


financeiro. A passividade do conselho do Lehman, por sua vez, permitiu que os
altos executivos recebessem bônus milionários pouco atrelados ao sucesso de longo
prazo do banco.
O segundo grupo de causas associadas aos problemas de governança é o das
causas mediadoras. Embora não ocasionem diretamente os escândalos de governan-
ça, elas intensificam os potenciais impactos negativos das causas fundamentais em
termos de destruição de valor. Quatro causas mediadoras são detalhadas no quadro
a seguir: atmosfera interna de ganância e arrogância, ausência de comportamento
ético na alta gestão, ilusão de sucesso do negócio e governança corporativa vista
como mera ferramenta de marketing.

# Causas mediadoras Essa causa se manifesta quando…


...um ambiente interno de soberba cria um sentimento de
Atmosfera interna de superioridade em relação às partes interessadas da empresa
1
ganância e arrogância e de desconsideração dos impactos das decisões tomadas
sobre terceiros.
...as lideranças falham em assegurar elevados padrões
Ausência de
éticos na organização, deixando de tratar o tema como
2 comportamento ético na
algo prioritário e essencial para o sucesso de longo prazo da
alta gestão
empresa junto aos seus stakeholders.
...pessoas internas e externas à organização (Ex.: mídia
Ilusão de sucesso do especializada, investidores, analistas de ações) passam a
3
negócio acreditar que a empresa é um sucesso absoluto, gerando
uma sensação de invencibilidade em seus administradores.
Governança corporativa ...a empresa procura cumprir um check-list de práticas
4 vista como mera de recomendadas sem incorporar os princípios da boa
ferramenta de marketing governança na essência dos atos de sua gestão diária.

Tabela 1.11 – Causas mediadoras associadas aos problemas críticos de


governança
20

As causas fundamentais e mediadoras se relacionam de diversas formas. O caso


clássico da Enron mostra como a falha na atuação dos guardiões da boa governança
(como auditorias, agências de classificação de risco de crédito e analistas) pode
aumentar a ilusão de sucesso do negócio, o que acaba ampliando a atmosfera interna
de ganância e arrogância.
A concentração excessiva de poder associada à ausência de tom ético, no topo
da organização, também pode fazer a governança corporativa ser vista como mero
elemento de marketing para os públicos externos, ao invés de algo integrado à cultura
organizacional da companhia. A seguir, são apresentados alguns casos marcantes
que ilustram esse problema.
Em seu relatório anual de 2005, a Siemens afirmava:

“...estamos comprometidos em ser um membro ativo e responsável de cada comu-


nidade em que fazemos negócio em todo o mundo. Nossa meta é nos tornarmos
os “melhores da classe” em governança corporativa, sustentabilidade e cidadania
corporativa... Acreditamos que um compromisso inabalável com a responsabilidade
corporativa é vital para nosso sucesso de longo prazo. É por isso que não medimos
esforços para equilibrar as questões de negócio, éticas, ambientais e sociais... Re-
gras e diretrizes asseguram que todas as nossas negociações são éticas e aderentes às
exigências legais.”

Três anos depois, a companhia pagou multas de US$1,6 bilhão aos reguladores
norte-americano e alemão em função do pagamento de propinas estimadas em
US$1,4 bilhão para governos de todo o mundo entre 2001 e 2008 em troca da
obtenção de contratos.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Outro caso emblemático é o do Banco Panamericano. Ao se referir ao Banco, o


relatório anual do grupo Silvio Santos de 2007 afirmava:

“...acreditamos que governança corporativa é muito mais do que normas e pro-


cedimentos, é uma filosofia de gestão. Esse modelo visa a garantir segurança e
desempenho dos negócios... Atuamos de forma proativa e eficaz em relação aos
princípios, práticas e mecanismos de governança corporativa... As áreas de com-
pliance, auditoria interna, security officer, ouvidoria e controladoria compõem o
núcleo de controles internos, zelando para que todos procedimentos internos estejam
em conformidade... Não há gestão de riscos eficaz sem um comportamento ético
comum. Desde 2000, contamos com um código de conduta ética aplicado a todos
os colaboradores...”

Dois anos depois, descobriu-se um rombo no banco da ordem de R$ 4,2 bilhões,


cerca de três vezes seu patrimônio líquido e metade do seu ativo total.
21

Ainda no ano de 2007, o relatório anual do Lehman Brothers enaltecia a gover-


nança corporativa com o seguinte texto:

“Mantivemos nosso comprometimento com as melhores práticas de governança


corporativa. Nosso conselho de administração é composto por 10 pessoas, 9 das quais
são independentes. Nossos comitês de auditoria, nomeação e governança, finanças e
risco, e remuneração são exclusivamente compostos por conselheiros independentes com
expertise nas respectivas áreas. Nosso conselho se reúne regularmente sem a presença do
CEO. Comitês e conselho realizam autoavaliação anual. No último ano, a taxa de
presença dos conselheiros nas reuniões foi de 96%. Temos um programa de educação
continuada para todos os conselheiros. Possuímos Código de Ética. Contamos com
um comitê de riscos, um chief risk officer independente e os mais elevados padrões de
gestão de riscos em todos os níveis da companhia. Nossos controles internos relativos às
demonstrações financeiras são adequados e efetivos, conforme atestado pelos auditores

Capítulo 1 Por que a governança corporativa é um tema-chave para minha organização? 


independentes. Possuímos planos de incentivo baseados em ações como forma de
promover maior alinhamento de interesses dos nossos executivos.”

Poucos meses após divulgar esse documento, em setembro de 2008, o famoso


banco de investimentos norte-americano faliu de forma espetacular, atuando como
estopim de uma crise financeira global de enormes consequências.
Por fim, vale a pena destacar o relatório anual da BP de 2009, ano imediatamente
anterior ao grande vazamento de petróleo no Golfo do México que causou a morte
de 11 pessoas. Em uma entrevista inserida no documento, o então CEO, Tony
Hayward, afirmava que:

“...segurança, pessoas e desempenho continuam a ser as nossas prioridades. Nossa


prioridade número um é fazer todo o possível para termos operações seguras, confiáveis
e em conformidade... Boas políticas e processos são essenciais, mas, em última ins-
tância, a segurança diz respeito a como as pessoas pensam e agem. É crítico para a
linha da frente, mas também é essencial para o grupo como um todo. A segurança
deve ser a base para cada decisão e ação. Nosso sistema de gestão operacional converte
o princípio de operações seguras e confiáveis em realidade. Nosso trabalho na área de
segurança tem sido reconhecido dentro e fora do grupo.”

Após o acidente, a comissão do governo norte-americano encarregada de investigar


o vazamento concluiu que os executivos da BP e de empresas terceirizadas ignoraram
em diversas ocasiões procedimentos de segurança básicos a fim de cortar custos.21
Em todos esses casos, a prática diária, obviamente, se mostrou muito distante
do discurso de boa governança que as companhias apresentavam para seus públicos
externos.
22

O terceiro e último grupo corresponde às causas imediatas, isto é, aquelas mais


visíveis aos públicos externos e que levam diretamente ao surgimento dos escândalos.
Cinco se destacam: expansão excessiva do negócio, decisões estratégicas enviesadas,
demonstrações financeiras inflacionadas, controles internos deficientes, e sistema de
remuneração inadequado. Elas são apresentadas no quadro abaixo.

# Causas imediatas Essa causa se manifesta quando…


...a empresa cresce de forma excessiva nos anos imediatamente
Expansão
anteriores aos problemas de governança, principalmente via
1 excessiva do
aquisições, o que dificulta a manutenção dos valores, padrões
negócio
operacionais e controle vigentes.
...são tomadas decisões estratégicas erradas devido à presença
Decisões
de vieses cognitivos individuais ou coletivos na organização,
2 estratégicas
decorrentes de excesso de confiança, efeito manada,
enviesadas
groupthink22 etc.
...a empresa publica demonstrações financeiras manipuladas
Demonstrações a fim de inflar seus lucros ou ocultar dívidas. Em muitos casos, a
3 financeiras manipulação tem início por um gerenciamento de resultados que
inflacionadas se situa numa zona cinzenta entre práticas contábeis permitidas e
ilegalidades.
...os principais componentes de um sistema de controles internos –
Controles internos
4 tais como um bom ambiente de controle e um sistema efetivo de
deficientes
gestão de riscos – inexistem ou são deficientes.
Sistema de ...um sistema de remuneração excessivamente agressivo e pouco
5 remuneração vinculado a objetivos de longo prazo gera incentivos perversos,
inadequado contribuindo para o surgimento dos escândalos de governança.

Tabela 1.12 – Causas imediatas associadas aos problemas críticos de governança


Governança corporativa: o essencial para líderes 

Há diversas inter-relações entre os três tipos de causas apresentados. Conforme


ilustrado pelos problemas com as instituições financeiras americanas, como
AIG, uma regulação deficiente pode permitir sistemas de remuneração opacos e
pouco alinhados à geração sustentável de valor, os quais podem levar a decisões
excessivamente arriscadas e com horizonte temporal de curto prazo. Esse tipo de
decisão é muito presente em escândalos de governança.
Investidores que não exercem o devido escrutínio de suas empresas inves-
tidas podem reforçar a ilusão de sucesso e o ambiente interno de arrogância,
que são, por sua vez, terreno fértil para decisões estratégicas enviesadas, como
aquisições a preços inflacionados que destroem valor. Isso foi observado em
diversos escândalos, como os da Parmalat (17 aquisições apenas no ano de 1993)
e Worldcom (60 aquisições nos cinco anos anteriores ao colapso).
Os casos brasileiros de Sadia, Banco Panamericano e Banco Cruzeiro do Sul
são exemplos de como um conselho de administração ineficaz pode permitir que a
governança corporativa seja encarada como algo pró-forma. A consequência disso
23

é a adoção de controles internos aparentemente adequados, porém deficientes no


dia a dia.
O conjunto de inter-relações possíveis é apresentado de forma esquemática na
Figura 1.3:

Capítulo 1 Por que a governança corporativa é um tema-chave para minha organização? 


Figura 1.3 – Anatomia de um desastre: causas comuns associadas
a escândalos de governança.

A figura acima, elaborada com base na análise dos diversos escândalos de go-
vernança da última década em todo o mundo, revela a anatomia de um desastre
corporativo. Os fatores externos e internos muitas vezes se reforçam, criando um
círculo vicioso que infelizmente leva a uma substancial destruição de valor para os
acionistas e a impactos negativos severos para os stakeholders, incluindo as comu-
nidades onde atuam.
Em última instância, os colapsos empresariais são sempre decorrentes de
decisões ruins ou do descumprimento das regras, algo que decorre não apenas de
falhas nos mecanismos formais de governança – como conselho de administração,
comitês e áreas de controle –, mas também do fracasso das lideranças na criação
de um contexto social em suas organizações que induza certos comportamentos
desejados.
24

A criação desse contexto depende do foco no fator humano, incluindo a com-


preensão dos vieses cognitivos e outros aspectos psicológicos que afetam a qualidade
das decisões e o cumprimento ou não das regras e políticas corporativas.
Esse será o tema do próximo capítulo, já que se trata do elemento mais im-
portante para a boa governança corporativa, apesar de ser pouco abordado pela
literatura. Nos capítulos seguintes, abordaremos os mecanismos de incentivo e
controle tradicionais da governança corporativa.
Governança corporativa: o essencial para líderes 
Capítulo 2
Em que devo investir primordialmente?
O fator humano como chave para a boa
governança empresarial

2.1  Governança para valer: muito além da cenoura


e do chicote

No capítulo anterior, apresentamos diversas evidências de que a boa governança não


apenas agrega valor ao negócio, como também contribui para sua perenidade ao evitar
surpresas negativas e, no extremo, escândalos empresariais.
Apesar dessas evidências, continuamos a nos deparar com diversos casos de em-
presas – muitas delas consideradas de primeira linha – que acabam sofrendo enorme
destruição de valor devido à ausência de um bom sistema de governança. Por que isto
continua a ocorrer após tantos anos de debates e, em tese, aprendizados sobre o tema?
26

A raiz do problema está na forma como o tema foi percebido pela grande
maioria das companhias, investidores e acadêmicos de todo o mundo. Tendo
por base trabalhos de economistas ortodoxos elaborados sob a perspectiva da
chamada “teoria do agente-principal”,1 a governança corporativa foi reduzida a
um “conjunto de mecanismos de incentivo e controle que visam a fazer com que
os agentes (administradores) tomem decisões no melhor interesse dos principais
(conjunto de acionistas)”.
Essa literatura tradicional transmitiu a ideia de que a mera implantação de
estruturas de incentivo (remuneração variável, avaliação de desempenho etc.) e
de controle (áreas de gestão de risco, compliance, controles internos, auditorias,
conselhos com independentes etc.) seria suficiente para que as empresas se
tornassem bem governadas. Como consequência, o debate sobre o tema pas-
sou a gravitar estritamente ao redor de como implantar esses mecanismos nas
empresas.
Embora esses mecanismos sejam elementos importantes de um bom sistema
de governança, algo a ser detalhado no capítulo seguinte, a implantação de es-
truturas de incentivo e controle não é suficiente para assegurar empresas de fato
bem governadas.
Na verdade, elas podem ser até mesmo utilizadas apenas para transmitir aos
públicos externos a impressão de que a empresa possui boas práticas, sem que
isso de fato se traduza em um bom governo da organização no seu dia a dia. Isso
explica, entre outras coisas, os escândalos ocorridos com companhias que apa-
rentemente haviam adotado práticas de governança alinhadas às recomendações
de mercado.
Essa visão tradicional da governança corporativa – cujo cerne deriva da ideia
Governança corporativa: o essencial para líderes 

limitada da “cenoura e do chicote” da economia tradicional – permitiu ainda


que muitos líderes empresariais passassem a tratar o tema como um conjunto de
check-lists a ser cumprido de maneira técnica, fria e desconectada do dia a dia da
organização.
Governança corporativa não é um tecnicismo que pode ser delegado para ser
implantado por determinadas áreas. Na verdade, a boa governança para valer de-
pende do equacionamento de questões intrinsecamente humanas nas organizações
empresariais, algo que exige, acima de tudo, substancial investimento de tempo e
envolvimento das principais lideranças.
É o foco no fator humano, por sua vez, que permitirá alcançar o objetivo
maior da boa governança: criar um ambiente no qual as pessoas desejem vo-
luntariamente tomar decisões no melhor interesse de longo prazo do negócio
e cumprir as regras. Enquanto a expressão “melhor interesse de longo prazo do
negócio” se refere às decisões que agregam maior valor para a companhia dentre
27

um conjunto de opções disponíveis, o conceito de “regras” inclui não apenas as


normas internas da empresa, mas também o atendimento às leis e aos princípios
éticos.
As próximas seções exploram a fundo a dimensão humana como fator-chave para
a governança corporativa, incluindo os aspectos psicológicos e comportamentais que
podem induzir as pessoas a agir no melhor interesse da organização.

2.2  Por que as pessoas não tomam as melhores


decisões e descumprem as regras?

A boa governança para valer começa pela compreensão dos três motivos centrais
que levam as pessoas – em sua atuação como colaboradores, executivos, conselheiros
ou acionistas – a, muitas vezes, não tomarem as melhores decisões possíveis para o
negócio e a não cumprirem as regras.

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


O primeiro diz respeito às limitações técnicas. Muitas vezes, as pessoas tomam
decisões ruins ou descumprem as regras simplesmente porque não conseguem
identificar o melhor curso de ação para a organização ou porque não sabem qual
deveria ser o procedimento correto a seguir em determinada situação.
O segundo motivo decorre do conflito de interesses. Neste caso, as pessoas
optam conscientemente por não tomar a melhor decisão para a empresa ou por
descumprir as regras. Em geral, isso ocorre quando o melhor resultado para o
indivíduo diverge do que é o melhor para a organização. Como consequência, sua
agenda pessoal acaba sendo colocada à frente da agenda da empresa. No caso da
gestão, isso pode levar a decisões ruins em temas como seleção de pessoas, aprovação
de projetos, celebração de contratos, apresentação de resultados etc. No caso das
matérias de acionistas, isso pode levar a más decisões em temas como eleição de
conselheiros, fusões e aquisições, distribuição de dividendos, transações com partes
relacionadas etc.
O terceiro motivo são os chamados vieses cognitivos,2 os quais levam indiví-
duos e grupos decisórios a inconscientemente tomarem decisões erradas apesar
de terem convicção de que estão fazendo o melhor para o negócio. Trata-se do
problema de governança mais sutil – e talvez o mais perigoso de todos – para a
organização.
Dos três aspectos acima, a limitação técnica é o problema mais óbvio a ser
mitigado. Na medida em que a complexidade organizacional aumenta, torna-se
cada vez mais improvável que um único indivíduo detenha todos os conheci-
mentos para as decisões-chave da empresa, incluindo aquele relativo às matérias
28

de investimento, financiamento, marketing, recursos humanos, posicionamento


estratégico, tecnológicos etc. Esse é um problema que se torna especialmente
crítico, portanto, nas organizações sujeitas a elevada concentração de poder, tais
como as empresas familiares. Nesses casos, mecanismos de governança – como a
existência de um conselho de administração qualificado, independente e composto
por pessoas com diferentes visões de mundo – podem levar a melhores decisões
empresariais.
Dada a maior complexidade dos outros dois fatores que podem levar a decisões
erradas e ao descumprimento das regras – o conflito de interesses e os vieses cogni-
tivos –, discorreremos separadamente sobre eles nos itens a seguir.

2.2.1  Conflito de interesses

O conflito de interesses é a questão central que motivou inicialmente os


debates sobre governança corporativa. Basicamente, ele ocorre quando interesses
secundários de uma pessoa envolvida em uma decisão podem divergir do interesse
coletivo da empresa ao qual deve lealdade – seu interesse primário. Dentre os
interesses secundários, incluem-se não apenas os potenciais ganhos financeiros
particulares, mas também vantagens de outra natureza, tais como aquelas de-
correntes de relações pessoais com contrapartes envolvidas em uma decisão. Um
exemplo simples ocorre quando um executivo avalia a contratação de um familiar
para prestação de um serviço para sua empresa. Mesmo que ele não perceba ne-
nhum ganho financeiro decorrente desta contratação, tem-se, naturalmente, um
conflito de interesses.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

É importante destacar que o conflito existe independentemente da influência


efetiva do interesse secundário sobre a decisão final, o que tende a causar confusão
sobre o tema. É comum, por exemplo, uma pessoa acusada de estar sob con-
flito de interesses negar sua existência por não ter agido de forma imprópria ou
antiética.
Na verdade, o conflito de interesses é uma situação anterior à decisão, que pode
existir mesmo que não ocorram atos impróprios decorrentes da atuação do indivíduo
conflitado. No exemplo anterior, mesmo que o executivo optasse por contratar seu
familiar com base em condições de mercado, sem qualquer benefício adicional, isso
não eliminaria o fato de que, naquela situação, ele teria agido em uma situação de
interesses conflitantes.
Nas empresas, as lideranças devem perceber que os problemas resultantes dos
conflitos de interesses podem se manifestar em três esferas principais, destacados
na tabela a seguir.
29

Os conflitos de interesses podem gerar Exemplo de situação envolvendo


Esfera
problemas quando: conflito de interesses
Acionistas em posição de controle tomam Aquisição de participação
Assembleia de decisões que maximizam seu resultado acionária de empresa vinculada
acionistas individual em detrimento dos demais ao grupo econômico do
acionistas. acionista controlador.
Conselheiros votam em linha com seus
Seleção de executivos com
Conselho de interesses pessoais ou dos interesses dos
base em critérios políticos em
Administração acionistas que os elegeram, em detrimento
vez de meritocráticos.
do interesse coletivo da empresa.
Executivos tomam decisões a fim de Apresentação de indicadores
Diretoria
maximizar os resultados de suas carreiras, de desempenho favoráveis
Executiva /
em detrimento da melhor decisão de longo à maximização de sua
gestão diária
prazo para a organização. remuneração pessoal.

Tabela 2.1 – Formas de manifestação do conflito de interesses no mundo


empresarial

Considerando que os conflitos de interesses são inerentes ao dia a dia da alta


gestão, como você e as demais lideranças podem superar as situações apontadas, na

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


tabela, que certamente ocorrerão ao longo do tempo? De acordo com as melhores
práticas de governança, não parece haver dúvida sobre como proceder: pratica-
mente todos os códigos do mundo determinam que as pessoas sujeitas a interesses
potencialmente conflitantes com os da organização se abstenham de participar das
discussões e de votar durante sua deliberação. O quadro abaixo apresenta a visão de
alguns documentos de referência.

Código de Procedimento a ser adotado em situações envolvendo conflito de


Governança interesses
“1.4.7. Conflito de interesses nas Assembleias Gerais: O sócio que,
por qualquer motivo, tiver interesse particular ou conflitante com o
da organização em determinada deliberação deverá comunicar
Brasil – IBGC
imediatamente o fato e abster-se de participar da discussão e da
(Instituto Brasileiro
votação desse item, ainda que esteja representando terceiros.”
de Governança
Corporativa) “6.2. Conflito de interesses: Há conflito de interesses quando alguém
não é independente em relação à matéria em discussão e pode
4ª edição do Código
influenciar ou tomar decisões motivadas por interesses distintos daqueles
das Melhores Práticas
da organização (...) 6.2.2 Afastamento das discussões e deliberações:
de Governança
Tão logo identificado conflito de interesses em relação a um tema
Corporativa (2009)
específico, a pessoa envolvida deve afastar-se, inclusive fisicamente,
das discussões e deliberações, sem descuidar dos deveres legais do
administrador. O afastamento temporário deve ser registrado em ata.”
ICGN (International “2.9.2. Conflito de interesses do conselheiro: As empresas devem ter um
Corporate processo para identificar e gerenciar conflitos de interesses potenciais
Governance de seus conselheiros. Se um conselheiro possui um interesse específico
Network) em uma matéria sob análise do conselho, então o conselheiro não
Global Corporate deve participar dessas discussões.”
Governance “8.2.3. Grandes decisões: (...) Matérias envolvendo transações com
Principles: Revised partes relacionadas significativas devem ser decididas em assembleias
(2009) de acionistas. Nelas, apenas os acionistas não conflitados devem votar.”

(Continua)
30

França –
AFEP-MEDEF Code
“17. Ética do administrador: O administrador tem a obrigação de
de Gouvernement
informar o Conselho de quaisquer conflitos de interesses – mesmo que
d’Entreprise des
potencial –, devendo se abster de votar sobre a matéria em questão.”
Sociétés Cotées
(2008)
“85. O presidente do conselho de administração deve gerenciar os
conflitos de interesses. Ele deve solicitar aos conselheiros sujeitos a
África do Sul – King interesses conflitantes que se abstenham das discussões e decisões
Committee on relativas a essas matérias, a não ser que sejam solicitados a fornecer
Governance Code of alguma informação específica, situação na qual não devem fazer
Governance parte da decisão do órgão.”
Principles for South “Princípio 9.1: Os conselheiros devem divulgar quaisquer potenciais
Africa (2009) conflitos de interesse, incluindo sua natureza em relação a tal
matéria. A divulgação deve ser feita imediatamente após ciência
do conflito.”

Tabela 2.2 – Recomendações de códigos de governança em relação


ao conflito de interesses

Apesar da clareza das recomendações, poucas empresas brasileiras seguem atual-


mente o que é preconizado pelos códigos de boas práticas. É muito comum os
administradores conflitados não apenas participarem ativamente das discussões
sobre matérias nas quais possuem interesses conflitantes, como também votarem
sem qualquer impedimento.
Há inclusive uma corrente jurídica – denominada de material ou substancial –
que procura legitimar a deliberação por indivíduos sujeitos a interesses conflitantes.
Ela argumenta que a existência de conflito de interesses deveria ser avaliada caso a
caso e após as decisões a fim de verificar se houve dano. De acordo com esta visão, as
deliberações deveriam ser sempre tomadas com a participação de todos os envolvidos
Governança corporativa: o essencial para líderes 

na matéria, incluindo os conflitados.


Os defensores dessa corrente de pensamento em geral justificam sua visão com
base em duas afirmações relativas à natureza humana: 1) que conseguimos analisar
as questões e decidir com neutralidade se assim o desejarmos, mesmo quando es-
tamos sujeitos a conflitos de interesses; e, 2) que a divulgação plena dos diferentes
interesses envolvidos na matéria (o chamado full disclosure) constitui uma solução
razoável para mitigar quaisquer potenciais problemas.
Há diversos experimentos recentes de psicologia comportamental, realizados com
seres humanos, que refutam veementemente ambos os argumentos que procuram
sustentar a corrente material ou substancial para o conflito de interesses.
Nos quadros a seguir, apresento, separadamente, dois deles. Enquanto o pri-
meiro mostra como o conflito de interesses é algo que afeta nossa neutralidade de
julgamento de forma inconsciente, o segundo mostra como a divulgação plena da
existência de interesses conflitantes na matéria – o chamado full disclosure – pode
inclusive piorar o resultado final da decisão.
31

Experimento 1: Impacto dos conflitos de interesse


sobre nossa capacidade de análise imparcial

Quatro neurocientistas recrutaram 150 pessoas, pagando um montante


fixo por sua participação. Os participantes deveriam avaliar obras de
arte provenientes de duas galerias com nomes fictícios: “Third Moon” e
“Wecyclers”. Os participantes eram informados que o estudo e seu paga-
mento – de US$30 para o primeiro grupo, aumentando até US$300 para
outros grupos posteriores – estavam sendo generosamente patrocinados
por uma das duas galerias: alguns eram aleatoriamente informados que o
patrocínio seria da “Third Moon”, enquanto outros acreditavam que era
da “Wecyclers”.
As pessoas eram então colocadas dentro de um escâner de ressonância
magnética (fMRI – Functional Magnetic Resonance Imaging). Na sequência,
eram apresentadas 60 obras de arte, uma de cada vez por 5 segundos. No

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


canto superior direito de cada obra, aparecia o logotipo da galeria que seria a
hipotética proprietária dos quadros. Algumas obras pertenciam à galeria que
estava “financiando” o participante, enquanto as outras pertenciam à galeria
não patrocinadora. A figura a seguir resume o experimento:

A seguir, os participantes avaliavam as obras em uma escala de -4 (não


gostei) a +4 (gostei). A remuneração dos participantes era fixa e independente
da avaliação atribuída aos quadros. O que aconteceu?
Os participantes avaliaram muito melhor as obras da galeria que, em tese,
os havia patrocinado. A fim de verificar se as respostas eram apenas resultado
de uma tendência social de retribuição à gentileza da galeria patrocinadora,
os pesquisadores analisaram os dados da ressonância magnética, chegando
a uma conclusão impressionante: a presença do logotipo do patrocinador
aumentou substancialmente a atividade do córtex pré-frontal ventromedial,
uma área do cérebro associada ao prazer.

(Continua)
32

Em outras palavras, a gentileza da galeria em patrocinar o estudo in-


fluenciou profundamente como as pessoas avaliavam as obras de arte. Cu-
riosamente, quando os voluntários foram interrogados se achavam que o
logotipo do patrocinador havia impactado suas preferências, a resposta geral
foi que “não, com certeza não houve qualquer influência”.
Os pesquisadores resolveram então aumentar o valor pago aos voluntários,
com alguns passando a receber US$100 e outros US$300. O que aconteceu?
A preferência pela galeria patrocinadora aumentou de acordo com in-
cremento do montante pago: não apenas a diferença de pontuação entre as
galerias se tornou maior, como também a magnitude da ativação das áreas
de prazer no cérebro aumentou substancialmente quando o pagamento saiu
de US$30 para US$100 e de US$100 para US$300!
O resultado do trabalho evidencia nossa forte tendência à reciprocidade:
quando alguém nos faz um favor, tendemos a nos tornar parciais e a apoiar
qualquer coisa que possa resultar em algum tipo de retribuição.
É importante observar que, neste experimento – diferentemente das
situações no ambiente empresarial –, a remuneração dos participantes não
dependia de sua avaliação, bem como eles não teriam qualquer relação futura
com ambas as galerias, já que elas simplesmente não existiam...

Fonte: Harvey, A., Kirk, U., Denfield, G., Montague, P. 2010. Monetary Favors and Their
Influence on Neural Responses and Revealed Preference.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Experimento 2: Efeitos perversos da divulgação plena


(full disclosure) como mecanismo de mitigação
dos conflitos de interesses

Três pesquisadores recrutaram 146 participantes, os quais poderiam ter


papel de “decisores” ou “assessores”. Enquanto os decisores deveriam avaliar
com a maior precisão possível quanto dinheiro havia em um jarro repleto
de moedas, sendo ao fim pagos pela acurácia de sua estimativa, os assessores
deveriam aconselhar os decisores sobre quanto dinheiro existia no jarro.
Havia duas diferenças entre decisores e assessores: i) Os decisores podiam
olhar o jarro por alguns segundos e a certa distância, enquanto os assessores po-
diam olhar o jarro por muito mais tempo (alguns minutos) e bem mais de perto;
ii) Os assessores sabiam que havia entre $10 e $30 no jarro, os decisores não.

(Continua)
33

A ideia era conferir vantagem informacional aos assessores, que, mesmo


não sabendo o valor exato no jarro, tornar-se-iam uma espécie de “experts”
no assunto (de forma análoga ao que acontece com analistas de investimento,
advogados etc.).
Em uma versão inicial do experimento denominada “sem conflitos de
interesses”, os assessores eram pagos de acordo com a precisão dos decisores.
Nesta variante, os assessores recomendavam aos decisores a existência de um
valor médio de $16,50 no jarro.
Na sequência, os pesquisadores criaram uma nova versão denominada
“com conflito de interesses, sem divulgação”, na qual os assessores eram pagos
quanto mais distante (para cima) fosse a opinião dos decisores em relação ao
montante real no jarro. O que aconteceu?
Nesta variante, os assessores passaram a recomendar um valor de $20
em média.
Os pesquisadores criaram então a versão denominada “com conflito de

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


interesses, com divulgação”. Nela, os assessores continuariam a ser pagos em
função da imprecisão (para cima) da opinião dos decisores. Desta vez, entre-
tanto, eles deveriam informar previamente aos decisores que estavam sujeitos
a este conflito de interesses, isto é, que sua remuneração estava atrelada ao
erro para cima em relação ao montante estimado. O que aconteceu?
Nesta variante, os assessores passaram a recomendar um valor de $24,16
em média, $4 a mais do que quando não tinham que manifestar seu conflito
de interesses.
Mais importante: enquanto na versão “sem divulgação” os decisores
tendiam a aceitar os $20 de sugestão dos assessores (por não saberem da
existência do conflito de interesses), na situação “com divulgação” eles pas-
saram a descontar em média apenas $2 do valor sugerido pelos assessores,
resultando em estimativas de $22 – mais distantes, portanto do montante
correto.
O trabalho possui duas conclusões principais. Primeiro, as pessoas não
“descontam” as opiniões dos sujeitos conflitados como deveriam, mesmo
quando há divulgação plena do conflito de interesses. Segundo, a prática do
full disclosure pode gerar um efeito perverso, aumentando o viés da opinião
da parte conflitada, já que ela se vê livre moralmente e encorajada, estrategi-
camente, para distorcer ainda mais sua opinião.
Logo, a divulgação plena de outros interesses envolvidos na decisão não
apenas não resolve os problemas de conflitos de interesses, como pode au-
mentar o viés do aconselhamento e tornar o resultado final ainda pior.
34

Os trabalhos apresentados nos quadros acima demonstram claramente como


a existência de conflitos de interesses mina, inconscientemente, nossa capacidade
de avaliar questões com neutralidade. Trata-se de uma questão essencial para
você e as demais lideranças, uma vez que vocês, continuamente, administram
situações envolvendo conflitos de interesses por parte de executivos e parceiros
de negócios.
De um lado, nosso sentimento de retribuição reforça os potenciais problemas
decorrentes dos interesses conflitantes. Do outro, esses problemas não se resolvem
com a divulgação completa dos diferentes interesses na matéria, conforme advogam
os defensores da solução do full disclosure.
Logo, permitir que pessoas sujeitas a interesses conflitantes participem ativa-
mente de deliberações é algo não apenas distante das boas práticas de governança
e da lógica – haja vista que a situação de conflito de interesses ocorre por definição
ex-ante às decisões –, mas também parte de uma compreensão errônea sobre a
natureza humana.3
O melhor a fazer – para as empresas e para os próprios conflitados – é evitar
a participação das pessoas em decisões nas quais possuam mais de um interesse
simultaneamente. Em outras palavras, basta seguir as recomendações dos códigos
de boas práticas.

2.2.2  Vieses cognitivos

A abordagem tradicional para a governança corporativa se concentra quase que


exclusivamente na criação de mecanismos a fim de alinhar os interesses dos gestores
Governança corporativa: o essencial para líderes 

aos da organização.
Em outras palavras, parte-se do pressuposto que os executivos “sabem” quais
são as melhores decisões de negócios a serem tomadas, porém precisam de um
conjunto de mecanismos de incentivo (ex.: sistema de remuneração) e de controle
(ex.: auditorias) para que não optem por outros cursos de ação em função de seus
interesses particulares.
Entretanto, mesmo que as situações, envolvendo conflitos de interesses, sejam
resolvidas e que os executivos sejam altamente qualificados, a boa governança possui
ainda outro valor potencial: ela assegura a criação de um sistema de “pesos e con-
trapesos” que diminui a chance de que decisões erradas sejam tomadas devido aos
chamados “vieses cognitivos” aos quais todos nós, atuando individualmente ou em
grupos, estamos sujeitos.
Para entender essa afirmação em sua plenitude, é necessário entrarmos um pouco
no campo da psicologia aplicada às decisões econômicas.
35

A literatura tradicional sobre governança parte da premissa de que somos ra-


cionais em nossas decisões. Isto é, que conseguimos processar de forma completa e
imparcial – sem influências do ambiente ou de outras pessoas – todas as informações
disponíveis em relação a um problema (mesmo que muito complexo), e que, ao
final, conseguimos optar pelas melhores escolhas.
Entretanto, pesquisas no campo da psicologia aplicada realizadas desde a década
de 1970 desmistificaram, há tempos, a visão de que sempre tomamos decisões
racionais. Entre os pesquisadores dedicados a esse tema, merece destaque Daniel
Kahneman, primeiro psicólogo a ganhar um prêmio Nobel de economia em 2002.4
De forma resumida, Kahneman demonstrou como nossas decisões são fortemente
influenciadas tanto pela forma como as escolhas nos são apresentadas quanto pela
percepção, muitas vezes distorcida, que temos da realidade.
Tudo deriva da forma de funcionamento do nosso cérebro. Ele é dividido em
dois componentes, denominados Sistemas 1 e 2. O Sistema 1 opera de forma
automática e rápida, praticamente sem esforço e dispêndio de energia. Já o
Sistema 2 é bem mais lento e deliberativo, exigindo mais concentração e subs-

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


tancial gasto de energia de nosso corpo. A maioria de nossas decisões cotidianas,
como dirigir um carro em uma rua deserta ou ler frases curtas, é tomada pelo
Sistema 1. Por outro lado, as decisões que requerem mais esforço mental, como
estacionar o carro em uma vaga muito apertada ou realizar cálculos complexos,
são tipicamente tomadas pelo Sistema 2. Em suma, o Sistema 1 é rápido, in-
tuitivo, inconsciente e emocional, enquanto o Sistema 2 é mais, lento, lógico,
consciente e deliberativo.
Como o Sistema 2 exige muita energia de nosso organismo, procuramos utilizar
ao máximo o Sistema 1. Para tomar decisões rápidas e quase sem dispêndio de
energia, o intuitivo Sistema 1 lança mão de “regras de bolso” ou “atalhos cognitivos”
(denominados formalmente de heurísticas) que desenvolvemos ao longo de nossas
vidas.
O problema é que – apesar de úteis em muitas ocasiões – nossas regras de bolso
podem ser afetadas por nossa capacidade limitada de processamento mental ou
por motivações morais e emocionais, o que pode nos levar a tomar decisões sis-
tematicamente erradas.
Quanto mais ocupados e apressados estivermos, assim como quanto mais ex-
periência tivermos na atividade em questão, maior a chance de lançarmos mão do
intuitivo Sistema 1, em nossas decisões, aumentando a probabilidade de erros nos
nossos julgamentos.
Esses são os chamados vieses cognitivos: erros previsíveis e sistemáticos decor-
rentes de nossas crenças e preferências pessoais que nos levam a tomar decisões que
fogem da racionalidade.
36

Estamos sujeitos a inúmeros vieses cognitivos, tanto no âmbito individual quanto


no âmbito coletivo. Ao longo das últimas décadas, já foram catalogados mais de 100
vieses cognitivos que podem afetar o julgamento de pessoas e grupos decisórios.
Apesar de sua importância, o tema raramente é abordado pela literatura tradicional
sobre governança corporativa.
Como as decisões enviesadas podem levar a análises e decisões desastrosas
e o executivo é acima de tudo um tomador de decisões, é imprescindível que
todo líder tenha ciência dos vieses aos quais ele e as pessoas de sua organização
possam estar sujeitos. Afinal, este é o primeiro passo para mitigar seus potenciais
problemas.
Na sequência, abordaremos, em maior profundidade, dois vieses individuais –
otimismo e excesso de confiança – e dois vieses coletivos – groupthink (ou pensamen-
to grupal) e o efeito manada (ou efeito conformidade) – como forma de exemplificar
a importância da compreensão do tema pelas principais lideranças organizacionais.
Posteriormente, descreveremos, de forma resumida, dezenas de outros vieses e seus
possíveis impactos para as organizações.

Exemplos de vieses individuais: otimismo e excesso


de confiança

O otimismo e o excesso de confiança são dois dos vieses mais documentados.


Eles são inter-relacionados e presentes em quase todas as pessoas, em maior ou
menor grau. As pessoas sujeitas a esses vieses de forma pronunciada possuem
forte tendência a superestimar as perspectivas de resultado de suas iniciativas e
Governança corporativa: o essencial para líderes 

a subestimar riscos, numa espécie de “ilusão de controle” dos resultados de suas


atividades – mesmo quando não possuem controle algum sobre diversos fatores
que as impactam.
Uma das descobertas mais interessantes no campo da psicologia aplicada ao
mundo empresarial é a de que empreendedores tendem a ser sistematicamente
mais otimistas e excessivamente confiantes do que a média das pessoas. Trata-se
de um resultado intuitivo, já que, para empreender, as pessoas têm que ser
otimistas por definição, muitas vezes indo contra análises mais racionais. Em
certas situações, esses vieses podem ter consequências positivas, como na entrada
em mercados aparentemente não promissores. Entretanto, eles também podem
ocasionar decisões altamente destruidoras de valor, levando as empresas, por
exemplo, a investir ou a se endividar excessivamente. Muitos trabalhos foram
feitos a fim de evidenciar os potenciais impactos das decisões tomadas por
executivos excessivamente otimistas. A tabela a seguir apresenta os resultados de
alguns desses estudos.
37

# Estudo Análise Principal conclusão


Empresas com CEOs excessivamente
confiantes, sempre acham que
“Corporate seus papéis são subavaliados pelo
Financial Policies mercado. Como resultado, tendem a:
With Overconfident 477 companhias
1 Managers” norte-americanas Utilizar bem menos o mercado de
durante 15 anos capitais; e a,
Malmendier, Tate e
Yan (2007). Acessar o mercado de ações bem
menos quando precisam levantar
capital junto a fontes externas.
“Excesso de
Confiança, Otimismo
Gerencial e os Empresas dirigidas por
153 companhias
Determinantes da empreendedores caracterizados como
2 brasileiras durante 5
Estrutura de Capital” otimistas tendem a apresentar níveis
anos.
bem mais elevados de endividamento.
Barros e Silveira
(2007).
“Who Makes Empresas com CEOs excessivamente
Acquisitions? CEO confiantes tendem a:
Overconfidence 477 companhias Realizar mais operações de fusões e

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


3 and the Market’s norte-americanas aquisições (M&As);
Reaction” durante 15 anos
Pagar mais pelas empresas-alvo; e, a
Malmendier, Tate e
Yan (2008). Realizar aquisições que destroem valor.

Empresas com CFOs caracterizados


por maior excesso de confiança
tendem a:
“Managerial Entrevistas com
7 mil CFOs (diretores Aplicar menores taxas de desconto em
Overconfidence and
financeiros) de seus projetos de investimento;
4 Corporate Policies”
companhias Investir excessivamente,
Ben-David, Graham norte-americanas principalmente por meio de maior
e Harvey (2008). durante 6 anos. endividamento; e,
Efetuar recompra de ações com maior
frequência.

“Managerial Empresas com CEOs mais otimistas


Overconfidence tendem a aumentar as operações
92 companhias
and Corporate Risk com derivativos de suas companhias
norte-americanas do
5 Management” após ganhos financeiros decorrentes
setor de mineração
de posições especulativas, bem como
Adam, Chitru e ao longo de 10 anos
tendem a reduzir menos suas posições
Golubeva (2012). do que os pares após perdas.

Tabela 2.3 – Impactos do otimismo e do excesso de confiança nas decisões


empresariais
Além das evidências acadêmicas, é fácil constatar no cotidiano que muitas pes-
soas – entre elas empreendedores e altos executivos – parecem ter uma percepção sis-
tematicamente distorcida da realidade, levando-as a tomar decisões potencialmente
desastrosas. No quadro a seguir, é apresentado o caso da HRT, o qual ilustra os
perigos da ausência de contrapesos independentes em organizações lideradas por
pessoas potencialmente enviesadas.
38

Otimismo e excesso de confiança: O Caso da HRT


Petróleo

A HRT é uma companhia do setor de petróleo que realizou sua oferta


pública inicial de ações (IPO) na BM&FBovespa em 2010. Na ocasião, a em-
presa se encontrava em estágio pré-operacional, isto é, possuía apenas projetos
de investimento, sem receitas. A companhia foi fundada por Márcio Rocha
Mello, seu presidente do conselho de administração e diretor-presidente após
o IPO. Como fundador e, inicialmente, controlador da companhia, o poder
decisório na HRT naturalmente se concentrava em torno de Mello.
Em uma entrevista para a Revista Capital Aberto na edição de maio de
2011 (“O Super-Homem do Petróleo”), Mello expressava em diversos trechos
sinais claros dos vieses de otimismo e excesso de confiança:
“...Tenho o poder de responder a qualquer pergunta, avisa o CEO...”
“...Tenho as respostas. É o mapa das riquezas embaixo da terra, nítido em
sua mente? Mello confirma.”
“...Por causa desse meu jeito muito positivo as pessoas acham que estou au-
mentando as coisas. Chegam aqui e me perguntam que problemas teremos para
atingir nossos objetivos, quais são os nossos desafios. Eu respondo: nenhum.”
“...Ele conta ter convencido um grupo de céticos banqueiros a apoiar sua com-
panhia... Quando Mello revelou o plano do IPO, todos disseram que era loucura.
Chamei todo mundo até a janela e perguntei: vocês estão vendo ali, no segundo
andar? Ninguém via nada. Falei: sou eu, caindo. Já pulei. Vou para o meu IPO.
Como havia acontecido em ocasiões anteriores, alguns resolveram pular junto.”
Governança corporativa: o essencial para líderes 

“...Seremos uma das maiores companhias de petróleo do mundo, afirma Mello.


Quanto aos problemas… Mania das pessoas de procurar problema...”
“...Nessa altura da entrevista, Mello já havia dito que nunca ficou doente
na vida, que toma todas as decisões em um milésimo de segundo e jamais comete
erros nos negócios.”
“...Cobro de mim ser o melhor, explica. Mas sou humilde, porque não dou
pelota para dinheiro. Porém, diante de tanta confiança, um visitante pode des-
confiar. Além de dormir duas horas por dia e não envelhecer, teria Mello outros
poderes?”
A oferta de ações da HRT foi um sucesso inicialmente. A companhia
captou R$ 2,6 bilhões junto aos investidores, com as ações cotadas acerca
de R$ 24. Meses depois, seu valor de mercado chegou a US$6 bilhões, e as
ações alcançaram um pico de cerca de R$ 42 em março de 2011.

(Continua)
39

Pouco tempo depois, porém, as pesadas apostas da empresa na Amazônia


e na Namíbia começaram a mostrar que dificilmente dariam resultado. Um
ano depois do IPO, a empresa ainda não havia encontrado uma gota de
petróleo sequer. A empresa fechou o ano de 2012 com um prejuízo de R$
277 milhões, o que não impediu os executivos da HRT, incluindo Mello, de
receberem R$ 31 milhões no período.
Dois anos depois do pico de valorização, em maio de 2013, os acio-
nistas da companhia, particularmente fundos estrangeiros, começaram a
demonstrar publicamente sua insatisfação com Mello. Inicialmente, eles se
organizaram para eleger conselheiros na assembleia da empresa e para subs-
titui-lo na presidência do Conselho de Administração. Na ocasião, o mero
anúncio de que os acionistas estavam se unindo para mudar a estrutura
do conselho elevou o preço das ações em 33% em dois dias, um claro indício do
valor que estava sendo destruído em função do modelo de governança
vigente na companhia.

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


Os acionistas tiveram sucesso em substituir Mello da presidência do
conselho de administração, na assembleia de acionistas realizada ao final de
abril de 2013. Apenas onze dias após a assembleia, durante a primeira reunião
do novo conselho, Mello pediu demissão da presidência da companhia. No
mesmo dia, as ações da HRT subiram 10,8%.
No final de setembro de 2013, a companhia continuava em uma situação
muito difícil, com as ações cotadas a ínfimos R$ 1,12, queda de 97,5% em
relação ao pico. A empresa divulgou ter encontrado poços secos ou em volume
não comercial na Amazônia e na Namíbia, ocasionando um aumento de
quase 1.000% no prejuízo líquido do segundo trimestre em relação ao mesmo
período do ano anterior (R$ 546 milhões contra R$ 50 milhões). A empresa
começou a vender seus ativos, e notícias na mídia aventaram inclusive a pos-
sibilidade de sua liquidação completa.
Claramente, o otimismo exacerbado do fundador Mello não deu
resultado. Para os investidores da HRT, ficou a lição da importância de
se ter contrapesos independentes a fim de mitigar decisões tomadas por
indivíduos enviesados. Ao final, fica a impressão de que os investidores
foram realmente otimistas ao colocar seus recursos nas mãos do fundador
Mello...
40

Exemplos de vieses coletivos: groupthink e o efeito


manada
Além dos indivíduos, grupos decisórios, como comitês e conselhos, também
podem desenvolver vieses coletivos. Entre eles, dois merecem destaque: o groupthink
(ou pensamento grupal) e o efeito manada (ou efeito conformidade).
O groupthink, ou pensamento grupal, ocorre em grupos que buscam minimizar
o conflito e alcançar consenso a qualquer custo, deixando de analisar criticamente
ideias externas. Ele leva as pessoas a evitar expor pontos de vista fora da zona de
conforto do pensamento de consenso do grupo, de forma a evitar constranger ou
irritar os outros membros. O pensamento grupal pode também levar a forte rejeição
de qualquer visão externa diferente daquela gerada internamente. De acordo com
Irving Janis, psicólogo pioneiro no estudo do tema nos anos 70, “a busca por consenso,
aprovação e solidariedade entre os membros pode levar o grupo a ignorar informações
que contradizem a visão dominante, levando a decisões rápidas e irracionais que apenas
solidificam as posições iniciais do grupo. Quanto mais coeso for o grupo e mais complexo
o assunto para análise, mais provável será a existência de groupthink.”
Como grupos altamente coesos são bem mais propensos ao problema, vários
estudos recentes argumentam que órgãos decisórios com baixo grau de diversidade –
em termos de idade, gênero e formação de seus membros – têm sido vítima deste
viés.
Já o efeito manada ocorre quando os membros do grupo possuem pouca in-
formação prévia para tomada de decisão, deixando-se levar pelas opiniões iniciais dos
demais membros, geralmente mais bem informados e com interesses específicos no
assunto em questão. Como resultado, as ações iniciais de certos indivíduos resultam
Governança corporativa: o essencial para líderes 

em um efeito cascata, no qual os membros acabam repetindo as ações dos que se


manifestaram inicialmente. Perde-se então o ganho da “sabedoria coletiva”, essência
da busca por decisões colegiadas, já que a decisão passa a conter apenas a visão das
primeiras pessoas, e não a soma das opiniões individuais.
No contexto dos comitês e conselhos, é provável que pessoas com pouca prepara-
ção para as reuniões – sem tempo para leitura e aprofundamento dos temas da pauta –
sejam muitas vezes levadas a aceitar as opiniões das pessoas que se manifestaram
inicialmente sobre a matéria em questão. O fenômeno não decorre de má-fé,
mas simplesmente da tendência dos membros não arriscarem sua reputação con-
frontando o ponto de vista de outros sem profundo entendimento das matérias
debatidas.
Como resultado, diversos estudos recentes argumentam que conselhos e comitês
com membros sobrecarregados (Ex.: atuando simultaneamente em diversos outros
órgãos e empresas) e sujeitos à pressão de tempo para tomar decisões são bem mais
propensos ao efeito manada.
41

Vieses cognitivos e seus impactos sobre as empresas:


resumo

Centenas de vieses foram documentados após anos de trabalhos sobre o tema.


A seguir, são descritos de forma resumida diversos vieses cognitivos individuais
e coletivos selecionados, incluindo seus potenciais problemas para a governança
corporativa.
Como vários deles podem impactar substancialmente nas empresas, cabe a você
e aos demais líderes tomarem ciência deles de forma a encontrar a melhor maneira
de mitigá-los.

Problema potencial
# Viés Descrição para a governança empresarial

Tendência a subestimar
Excesso de investimentos;
riscos (otimismo) e
Otimismo, excesso Aquisições mais caras;
a superestimar as
1 de confiança ou
perspectivas de resultados

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


ilusão de controle Excesso de endividamento;
futuros (excesso de
Desconsideração de riscos.
confiança).
Propensão a justificar
investimentos crescentes
em um projeto ou iniciativa
Apego a iniciativas e projetos que
Escalada decidida no passado,
não deram certo e que deveriam
2 irracional de apesar de evidências
ser racionalmente tratados como
comprometimento claras de que o custo da
fundos perdidos (sunk funds).
continuidade no mesmo
curso de ação é superior
aos benefícios esperados.
Tendência a subestimar
a probabilidade da Menor investimento na gestão
Viés da ocorrência de desastres de riscos considerados como de
3
Normalidade que nunca ocorreram, bem alto impacto, porém com baixa
como a sofrer paralisia em probabilidade de ocorrência.
caso de ocorrência.
Propensão das pessoas
a subestimar quanto
tempo levarão para Atrasos em projetos;
Falácia do
4 completar uma tarefa, Promessas irrealistas a
planejamento
mesmo quando possuem stakeholders.
experiência prévia em
tarefas similares.
Tendência a pensar que a
probabilidade de eventos Crença de que resultados de
futuros é alterada por projetos passados diferentes do
Falácia do eventos passados, mesmo esperado serão “compensados”
5
jogador quando os eventos são naturalmente por resultados de
independentes e sua projetos futuros, mesmo quando
probabilidade permanece são atividades independentes.
a mesma.

(Continua)
42

Problema potencial
# Viés Descrição para a governança empresarial

Dificuldade das pessoas


que são experts em Lançamento de produtos de difícil
um tema analisarem as compreensão pelos consumidores;
Maldição do questões relativas a ele sob
6 Dissonância entre a visão
conhecimento a perspectiva de pessoas
com baixo conhecimento. estratégica da alta gestão e do
Tende a ocorrer com restante da organização.
pessoas especializadas.
Tendência a ver as coisas a
partir do seu ponto de vista
profissional, ao invés de
Redirecionamento do foco das
sob uma perspectiva mais
Deformação atividades da empresa em função
7 ampla: como resultado,
profissional da formação profissional de seus
o condicionamento
dirigentes.
profissional leva a uma
forma distorcida de ver o
mundo e tomar decisões.
Tendência a valorizar
excessivamente bens e Desperdício da chance de venda
Efeito dotação,
projetos pessoais: Ex.: as de ativos ao valor justo;
valorização
8 pessoas tendem a pedir
excessiva das Valorização excessiva das
muito mais para vender
próprias obras iniciativas próprias.
um ativo do que estariam
dispostas a pagar por ele.
Tendência a dar mais
importância à informação
Dificuldade de aceitação de
Viés da que confirma sua crença
novas visões e paradigmas a
confirmação, ou ponto de vista inicial:
9 fim de mudar cursos de ação
percepção efeito maior em temas
problemáticos – manutenção do
seletiva com maior carga emotiva
status quo.
e com preconceitos mais
enraizados.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Propensão a manter o status


quo em situações nas quais Decisões importantes
mudanças em relação ao procrastinadas, com perda
Viés da
10 curso atual possuem maior de oportunidades, aumento
procrastinação
benefício esperado do que contínuo de prejuízos e perda de
a manutenção da situação competitividade.
corrente.
Tendência a valorizar
análises de terceiros (Ex.:
consultores) como algo
Efeito do agente Desperdício de ideias internas,
objetivo, confirmador e sem
11 externo, paradoxo desmotivação de colaboradores
conflitos de interesses, bem
dos consultores e perdas de talentos.
como de oferecer menor
apoio a soluções propostas
internamente.
Propensão das pessoas
a chegar a diferentes
Decisões erradas em função
Efeito conclusões a partir da
12 da manipulação no formato de
enquadramento mesma informação,
apresentação das informações.
dependendo de como a
informação é apresentada.

(Continua)
43

Problema potencial
# Viés Descrição para a governança empresarial

Tendência a julgar uma


decisão por seu resultado Penalização errônea de pessoas
e não pela qualidade do por decisões que geraram
Viés do resultado processo no momento em resultados ruins (mesmo que
13
final que a decisão foi tomada. tomadas de forma correta à
(Destaca-se que uma boa época). O inverso também é
decisão é diferente de um verdadeiro.
resultado de sorte.)
Tendência a acreditar
que eventos vívidos na
Consideração exclusiva das
memória possuem uma
Heurística da experiências pessoais de seus
14 probabilidade maior
disponibilidade líderes na tomada de decisão,
de ocorrerem do que
ignorando parâmetros estatísticos.
eles de fato possuem
estatisticamente.
Tendência dos indivíduos
a atribuir seu sucesso a
fatores pessoais internos Atribuição de culpa a terceiros;
Viés da causa
e seu fracasso a fatores Desmotivação de colaboradores,
15 própria ou ilusão

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


externos ou situacionais. com impacto negativo para a
de superioridade
É resultado da busca meritocracia.
inconsciente pela proteção
da autoestima.
Tendência a
reivindicar para si uma
responsabilidade maior Centralização de poder;
Viés do sobre resultados positivos
16 Desmotivação dos demais
egocentrismo de uma iniciativa
coletiva do que o que colaboradores.
seria atribuído por um
observador externo.
Propensão a ver eventos
passados como mais
Distorção da memória na análise
previsíveis do que de fato
Viés da visão de eventos passados, com
17 eram quando ocorreram
retrospectiva atribuição injusta de culpa por
(Ex.: “eu sempre soube que
decisões anteriores.
deveríamos ter seguido
outro caminho...”).
Tendência das pessoas
a confiar demais (se
“ancorar”) em algum
Decisões erradas em função da
parâmetro ou informação
18 Ancoragem disponibilização de informações
prévia para a tomada de
iniciais que distorcem a análise.
decisão, mesmo que esta
não tenha relação direta
com o assunto sob análise.

Tabela 2.4 – Vieses individuais e seus potenciais impactos sobre as empresas


44

Problema potencial para a


# Viés Descrição governança empresarial

Tendência de membros do grupo


– especialmente aqueles com Perda da sabedoria coletiva,
Efeito menos informações, para tomada com decisões tomadas
1 manada ou de decisão – se deixarem levar em função dos interesses
conformidade pelas opiniões iniciais dos outros dos indivíduos mais bem
membros, resultando em um efeito informados sobre o assunto.
cascata.
Tendência de grupos
excessivamente homogêneos a Tendência do grupo a se
minimizar o conflito e alcançar tornar mais extremista em
2 Groupthink consenso a qualquer custo, suas opiniões, bem como
ignorando ideias externas que desconsiderar informações
possam contradizer a visão relevantes de terceiros.
dominante.
Propensão do indivíduo a achar
que suas opiniões, crenças,
Tendência de isolamento de
hábitos, valores etc. são “normais”,
3 Falso consenso pessoas com pontos de vista
superestimando a probabilidade
sistematicamente diferentes.
das outras pessoas concordarem
com seu ponto de vista.
Tendência a apoiar visões de
Favoritismo
pessoas do próprio grupo em Desconsideração de visões
4 dentro do
relação a opiniões de pessoas de externas valiosas.
grupo
fora do grupo.
Tendência dos grupos atribuírem
o sucesso a suas características
Viés da causa
internas e o fracasso a fatores Atribuição de culpa a terceiros,
5 própria do
externos ou situacionais: É manutenção do status quo.
grupo
resultado da busca pela proteção
da autoestima coletiva.

Tabela 2.5 – Vieses coletivos e seus potenciais impactos sobre as empresas


Governança corporativa: o essencial para líderes 

2.3  Técnicas para melhorar as decisões


na alta gestão

Ter ciência dos vieses aos quais estamos sujeitos permite aos líderes se poli-
ciarem e aprimorarem seus processos decisórios. Como os vieses decorrem de
uma percepção distorcida da realidade, a melhor forma de mitigar seus impactos
negativos é criar um sistema de contrapesos efetivo na organização, que assegure
que as decisões relevantes passem por um crivo independente, qualificado e
bem informado, o que melhorará em última instância a qualidade das decisões
tomadas.5
45

A maioria das empresas já tem certa ciência dos potenciais impactos negativos
decorrentes das visões unilaterais dos indivíduos. Como resultado, as principais
decisões corporativas são em geral tomadas coletivamente, por meio de órgãos como
conselho, diretoria, comitês ou grupos de trabalho.
O problema, entretanto, é que esses órgãos nem sempre funcionam como
deveriam. Quando um dos membros possui muito mais conhecimento prévio
sobre o tema ou poder sobre os demais, por exemplo, os grupos tendem a ser
monopolizados, fazendo com que decisões, em tese colegiadas, passem a refletir as
visões individuais de determinados indivíduos. A tabela a seguir descreve os três
motivos principais que tendem a fazer com que os grupos decisórios não funcionem
a contento nas empresas:

Porque seus membros muitas vezes: Isso ocorre devido a:

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


Conflitos de interesses;
Priorização de suas carreiras pessoais;
1. Preferem não falar o que Intimidação explícita ou tácita de lideranças;
pensam Timidez excessiva;
Nossa tendência a evitar confrontos com outros membros
do grupo.
Processos decisórios desestruturados;
2. Não têm a oportunidade Monopólio do tempo por parte de alguns;
de falar o que pensam Excesso de membros;
Falta de tempo para maior aprofundamento dos temas.
Disponibilização de informações direcionadas
3. Analisam uma determinada ou parciais (que não contemplam todas as facetas
matéria de forma enviesada de um problema);
Vieses cognitivos individuais ou coletivos.

Tabela 2.6 – Por que os órgãos de governança nem sempre funcionam como
deveriam?

Os problemas apontados na tabela acima têm como consequência o que muitos


líderes observam no dia a dia de suas empresas: discussões superficiais e impro-
dutivas, análises desestruturadas, monopólio do tempo por alguns, timidez ou
intimidação por parte de outros, tendência a seguir a opinião daquele percebido
como líder ou com maior expertise no assunto sem criticidade etc. Para melhorar
esta situação, o líder deve procurar aprimorar a composição e o funcionamento dos
órgãos de governança.
46

Em relação à composição, é importante que os grupos possuam boa diversidade


de seus membros em termos de gênero, expertises, experiências de vida, formações
acadêmicas etc. Como exposto anteriormente, isso leva a mais visões e pontos de
vista diferentes, o que tende a enriquecer as análises e decisões. Adicionalmente, é
importante que as pessoas que participam dos grupos decisórios sejam intelectual-
mente independentes (pensem por si só), tenham tempo para se dedicar ao órgão
(bom preparo para as reuniões) e sejam incentivados pelas lideranças a participar
ativamente com espírito crítico.
Do ponto de vista do funcionamento, existem diversas técnicas decisórias de-
senvolvidas nos últimos anos que visam a fazer com que os órgãos decisórios se
tornem mais ricos em visões alternativas. Essas técnicas induzem os grupos a uma
maior controvérsia de opiniões, de forma a tirar os membros da “zona de conforto”
e extrair o melhor do órgão como um todo.
Na sequência, descrevo em detalhe quatro técnicas decisórias especialmente
úteis para que você e os demais líderes possam enfrentar temas complexos ou que
requerem soluções inovadoras. Elas são denominadas de “advogado do diabo”,
“grupo nominal”, “escalada decisória” e “seis chapéus pensantes”.
Inovar e evoluir constantemente é algo crucial para o sucesso de qualquer em-
presa. Isso deve ocorrer não apenas com produtos e serviços, mas também com a
estrutura organizacional e o processo decisório, dois aspectos-chave de qualquer
organização. Cabe ao líder, portanto, conhecer novas técnicas a fim de melhorar as
decisões tomadas em sua organização.

2.3.1  Técnica do “Advogado do Diabo”


Governança corporativa: o essencial para líderes 

Uma solução simples que pode ajudar os órgãos de governança a melhorar subs-
tancialmente sua efetividade é formalizar o papel do “advogado do diabo” para as
matérias mais relevantes.
O termo faz referência ao papel de “advocatus diaboli”, cargo formalmente criado pela
igreja católica, em 1587, com o objetivo de aumentar a credibilidade do seu processo
de canonização, bastante desacreditado à época. A pessoa designada tinha como função
avaliar com ceticismo os candidatos à canonização, elaborando argumentos contrários
ao processo por meio de questionamentos da conduta pessoal dos potenciais santos e
da identificação de fraudes nos eventuais milagres a eles atribuídos. A ideia parece ter
funcionado muito bem. Basta dizer que, após a extinção do cargo pelo papa João Paulo II,
em 1983, até o final do século XX, cerca de 500 pessoas foram canonizadas, cinco vezes
mais do que as 98 canonizadas por todos os seus predecessores nos 80 anos anteriores!
47

Trazendo a ideia para o contexto empresarial, o advogado do diabo seria uma


pessoa formalmente incumbida de criticar um determinado plano de ação ou
estratégia a ser apreciada. Ela deve procurar identificar fragilidades e inconsis-
tências nas premissas subjacentes às propostas apresentadas, bem como potenciais
problemas em caso de sua aprovação. Essa pessoa ajudaria a garantir que a in-
formação relativa a uma matéria importante fosse compartilhada, suas premissas
estudadas em profundidade, que os argumentos contrários fossem ouvidos, que
eventuais conflitos de interesses fossem manifestados e que explicações deficientes
fossem evidenciadas.
A formalização do papel de advogado do diabo propiciaria a institucionalização
do dissenso nas empresas, deixando os outros membros do grupo mais livres para
expressarem seus pontos de vista e questionarem a visão daqueles com maior poder
dentro do grupo.
Na verdade, apesar de muitos líderes – tais como presidentes e fundadores –
adotarem o clichê de que “adoram ouvir opiniões contrárias e serem desafia-
dos”, muitos de seus subordinados e mesmo conselheiros podem relutar em

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


acreditar nisso para valer, deixando de expressar suas reais opiniões. Trata-se
de um comportamento natural, já que em geral é difícil para qualquer pessoa
reconhecer que não se sente confortável ao ser confrontado em suas visões.
Como resultado, deve-se buscar equacionar o conflito entre a necessidade
de obter opiniões diferentes a fim de tomar melhores decisões e nossa difi-
culdade inata em sermos contrariados. A forma de solucionar essa questão
acaba sendo um elemento crítico a ser trabalhado continuamente por todos
os líderes.
Na medida em que uma pessoa designada ad hoc como advogado do diabo
passe a levantar questionamentos, os outros membros também podem se sentir
mais à vontade para tecer críticas sem temor de serem rotulados negativamente.
Isso aumentaria o nível de reflexão no grupo e evitaria a monopolização da decisão
pelo membro mais poderoso.
O êxito do trabalho do advogado do diabo depende de três fatores fundamentais.
Em primeiro lugar, o líder do órgão tem que realmente acreditar no valor do dis-
senso, encorajando visões críticas e alternativas.
Em segundo lugar, deve haver um rodízio dos membros designados para a
função. Se a mesma pessoa detiver a função de advogado do diabo continuamente,
então ela poderá sofrer um processo de desgaste junto ao grupo, com seu criticismo
sendo levado cada vez menos a sério. Uma escolha por sorteio em função do tema a
ser deliberado pode ser uma opção para assegurar a impessoalidade e independência
do processo.
48

Em terceiro lugar, o papel de advogado do diabo deve ser usado apenas para as
matérias mais relevantes e complexas, principalmente aquelas nas quais parece haver
unanimidade, sem maiores contendas dentro do grupo.
Deve-se, portanto, evitar sua utilização frequente para matérias rotineiras. Para
assuntos extremamente complexos, pode-se inclusive constituir um comitê ad hoc
com essa finalidade, em vez de pessoas isoladas.
Independência intelectual e boa estatura profissional são dois atributos impor-
tantes para o perfil de um bom advogado do diabo. Em relação às atividades, as
pessoas designadas para essa tarefa devem procurar:

a) Identificar as premissas centrais por trás dos cursos de ação propostos, de


forma a avaliar criticamente aquelas menos defensáveis.
b) Obter informações junto a especialistas externos sobre aspectos com os quais
não possuam muita expertise.
c) Conversar com pessoas da organização – membros ou não do órgão de
governança em questão – que possam ter visões diferentes e úteis para o
embasamento de sua crítica.
d) Elaborar um relatório formal contendo contra-argumentos, dados con-
traditórios e opções alternativas, registrando todas as deficiências ob-
servadas.

Acima de tudo, o advogado do diabo deve se ver (e ser visto pelos colegas)
como um assessor com a missão de ajudar a melhorar a decisão final, e não como
crítico gratuito das pessoas e propostas apresentadas. Ele tem de exercer seu papel
Governança corporativa: o essencial para líderes 

com extrema seriedade, dedicando tempo adequado para analisar a matéria em


questão. No caso dos conselhos de administração, a pessoa designada não deve
ter como objetivo competir pelo poder com o diretor-presidente ou almejar
substituí-lo. O objetivo é propiciar maior riqueza dos debates, e não denegrir o
corpo executivo.
Do ponto de vista organizacional, deve-se propiciar, à pessoa designada, o acesso
irrestrito a informações de qualidade. Isso a ajudará não apenas a fazer perguntas
difíceis, mas também a identificar respostas evasivas dos proponentes, além de
oferecer alternativas decisórias.

2.3.2  Técnica de grupo nominal6

Esta técnica é especialmente útil quando se deve escolher entre diferentes cursos
de ação possíveis ou quando é necessária uma solução criativa para um determinado
problema. Ela é dividida em cinco etapas:
49

Etapas Título Descrição


Inicialmente, o moderador do grupo – geralmente
o coordenador do grupo – apresenta a questão a
1 Apresentação do problema
ser resolvida, incluindo todos os fatos disponíveis a
respeito.
Individualmente, sem conversarem entre si, os
membros escrevem a solução que dariam para o
2 Geração de alternativas
problema. Ao final, o moderador recolhe todos os
papéis e lista as soluções propostas em um quadro.
Cada membro apresenta sua solução em um
Compartilhamento
3 tempo pré-determinado, sem ser interrompido
de ideias
pelos demais.
Inicia-se o debate sobre as ideias apresentadas.
Os membros esclarecem dúvidas dos demais em
relação às suas soluções propostas. O papel do
moderador nesta etapa é fundamental: além de
assegurar tempo adequado para avaliar cada
4 Debate
ideia, deve identificar pontos em comum ou
dissonâncias entre as diferentes opções. Ao final,
elenca-se o rol definitivo das soluções possíveis,
eliminando ideias duplicadas e consolidando as

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


correlatas.
Os membros, individualmente, atribuem uma
nota de 1 a 5 para cada proposta em função
do nível de priorização percebido. O moderador
Votação e ranqueamento compila as notas e a ideia com maior pontuação
5
das alternativas geral é selecionada. A reunião se encerra com
um resultado objetivo e a sensação de que todos
foram ouvidos e que suas ideias foram debatidas
de forma equânime.

Tabela 2.7 – Etapas da técnica de grupo nominal

A técnica de grupo nominal possui diversas vantagens. Em primeiro lugar, as-


segura que todos os membros participem igualmente e com liberdade intelectual,
evitando que aqueles mais reticentes ou tímidos deixem de apresentar suas ideias por
temerem ser criticados pelo grupo. Além disso, ao solicitar as opiniões individuais
em papel, aumenta-se o número de alternativas geradas, impedindo que o desejo
de evitar conflitos no grupo para manter um clima agradável prevaleça sobre a di-
versidade de pontos de vista. Ao realizar uma votação estruturada ao final, a técnica
proporciona ainda um sentimento de completude do debate, diferentemente de
processos decisórios desestruturados.
Diversas pesquisas recentes atestaram que a utilização dessa técnica tende a levar
a decisões coletivas de maior qualidade, maior satisfação e sentimento de realização
entre os membros. Tendo em vista seus comprovados benefícios, é uma opção
a ser considerada pelos líderes que desejam obter o máximo número possível de
alternativas para um determinado problema.
50

2.3.3  Técnica da escalada decisória7

A técnica da escalada decisória é outra forma de encorajar a participação in-


dividual de todos os membros, antes de serem influenciados pelos demais do grupo,
levando a uma maior diversidade de ideias. O método é dividido em quatro etapas,
descritas no quadro abaixo:

Etapas Título Descrição


O moderador apresenta um problema ou
decisão a ser tomada pelo grupo. Antes de
1 Introdução debaterem, concede-se, aos membros, tempo
suficiente para pensarem individualmente a
respeito e formarem suas opiniões.
O moderador convoca um membro do grupo
para que expresse sua opinião a respeito do
2 Formação do núcleo inicial problema. Separadamente, ambos debatem
preliminarmente a opinião apresentada,
formando um núcleo inicial.
Após um tempo fixo pré-determinado, um
terceiro membro é adicionado ao núcleo. Ele
apresenta suas ideias antes de ouvir as opiniões
debatidas previamente.
Os três membros debatem, então, as soluções
Expansão gradual do núcleo de apresentadas entre si. O processo é repetido
3
debate com o ingresso de um quarto membro ao grupo,
e assim, sucessivamente, com os demais.
Nesta etapa, é fundamental que cada
ingressante tenha tempo adequado para
Governança corporativa: o essencial para líderes 

expressar sua opinião no início, sem saber o que


foi discutido anteriormente pelos demais.
Após o ingresso do último membro e o debate
4 Deliberação de suas ideias, o grupo delibera sobre o
problema em questão.

Tabela 2.8 – Etapas da técnica da escalada decisória

A técnica da escalada decisória é uma abordagem baseada no aumento paulatino


do número de membros que assegura a participação efetiva de todos. A técnica
permite que as pessoas tímidas e introvertidas sejam ouvidas antes que possam ser
influenciadas por outros membros do grupo, bem como evita que algumas pessoas
se “escondam” dentro do grupo. Tendo em vista que diversas pesquisas já demons-
traram a eficácia da técnica como forma de levar a decisões melhores, tem-se mais
uma alternativa interessante a ser considerada pelo líder.
51

2.3.4  Técnica dos “seis chapéus pensantes”8

A técnica dos seis chapéus pensantes parte de uma abordagem diferente das
técnicas anteriores. Em geral, para chegarmos a uma decisão coletiva, lançamos
mão do pensamento confrontador ou adversário. Se, por exemplo, “A” e “B” têm
opiniões diferentes em um grupo, ambos tentam criticar e invalidar os argumentos
do outro para, assim, obter o apoio dos demais membros.
O método dos seis chapéus pensantes se baseia em uma abordagem diferente,
denominada “pensamento lateral”. Nela, um problema é dividido em seus diferentes
aspectos, fazendo com que todos pensem simultaneamente a partir dos mesmos pon-
tos de vista. A abordagem, portanto, faz com que “A” e “B” analisem em conjunto
diferentes facetas de um problema, em vez de procurarem atacar os argumentos
contrários ou, pior, se atacar mutuamente.
No método, os membros devem, metaforicamente, colocar – todos ao mesmo
tempo e sequencialmente – chapéus com cores simbólicas que correspondem aos seis
diferentes aspectos de nosso pensamento: otimismo, pessimismo, facticidade, criativi-

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


dade, racionalidade e emotividade. Logo, ao invés de o grupo pensar no problema de
uma só vez, procura-se desmembrar o pensamento, concentrando-se separadamente
em suas diferentes facetas. Os “chapéus” a serem colocados são os seguintes:

Cor do Perguntas típicas a serem


chapéu Foco Explicação realizadas

Com este chapéu, as pessoas Quais são os fatos?


devem se concentrar apenas O que podemos aprender a
Branco Informação nos fatos, analisando toda a partir dos dados disponíveis?
informação conhecida ou Que informações são necessárias
necessária para o problema. para podermos deliberar?
É o ponto de vista otimista, que
procura identificar os aspectos Quais são os aspectos
Amarelo Otimismo positivos da proposta em questão, positivos dessa solução
incluindo seu valor agregado e proposta?
demais benefícios.
Visa a analisar todos os aspectos
negativos da decisão, seus perigos
e dificuldades, isto é, o que pode
dar errado. Exige que os membros
pensem de forma cautelosa e Quais são os aspectos
Preto Crítica conservadora. É especialmente negativos ou fragilidades
importante, já que permite identificar dessa proposta?
riscos, eliminar pontos fracos ou
preparar planos de contingência,
tornando os planos de ação mais
resistentes a adversidades.

(Continua)
52

Cor do Perguntas típicas a serem


chapéu Foco Explicação realizadas

Representa os sentimentos e
intuições sobre uma determinada
proposta. Quando usam este
chapéu, os membros devem
Como me sinto em relação a
Vermelho Emoções analisar o problema a partir de
essa proposta?
suas reações viscerais e emoções,
compartilhando seu apreço,
temor, afeto e palpites sem
qualquer justificativa racional.
Concentra-se na criação de
novas possibilidades, alternativas
e ideias à proposta vigente
ou ao problema em questão.
Ao colocarem esse chapéu,
Quais são as novas
os membros devem se sentir
alternativas ou ideias “fora
Verde Criatividade à vontade para expressarem
da caixa” para resolver esse
pensamentos abstratos e dúvidas
problema?
genéricas, sem recebimento
de críticas. É o momento de
maior oportunidade para o
desenvolvimento de soluções
criativas.
É usado para gerenciar todo o
processo, devendo ser colocado
apenas pelo moderador da
reunião. Trata-se do mecanismo
de controle que assegura que
as diretrizes do método serão
seguidas e os objetivos da reunião
alcançados. Possui liberdade
para indicar a sequência dos
chapéus a serem utilizados. Como O método foi executado
exemplo, ao perceber que a corretamente?
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Azul Controle
reunião entrou em um momento Os objetivos da reunião foram
de baixa intensidade, devido atendidos?
à ausência de ideias, pode
redirecionar o grupo para usar o
chapéu verde. Quando perceber
que são necessários planos de
contingência, pode demandar o
chapéu preto etc. Ao final, deve
assegurar que o grupo chegue a
uma conclusão objetiva sobre o
problema em questão.

Tabela 2.9 – Aprimorando o processo decisório: a técnica dos “seis chapéus


pensantes”

A técnica dos seis chapéus pensantes começa e termina pelo moderador, o qual,
diferentemente dos demais membros, permanece “com o chapéu azul” o tempo
todo, de forma a assegurar que o processo seja executado corretamente.
53

Cada chapéu pode ser usado por um tempo indeterminado. A exceção ocorre
com o chapéu vermelho, que deve ser usado por poucos segundos de forma
de capturar a reação instintiva ou visceral do grupo, e não um julgamento es-
truturado.
A sequência de chapéus a serem usados depende do tema abordado e das ca-
racterísticas dos participantes. Cada chapéu pode ser usado quantas vezes forem
consideradas necessárias. Apesar de não haver sequência única, existem algumas
mais populares. O exemplo a seguir descreve uma sequência usual.
O moderador abre a discussão solicitando que todos utilizem, metaforicamente,
o chapéu branco. Isso permite que todos fiquem nivelados em relação às informa-
ções objetivas existentes, desenvolvendo-se uma visão compartilhada da questão.
Uma vez que o problema tenha sido bem definido e as informações apresentadas,
utiliza-se o chapéu vermelho, para que, então, os participantes possam expressar
seus sentimentos sobre a questão.
Na sequência, usa-se o chapéu verde, a fim de fomentar a elaboração de alter-
nativas para resolver o problema ou para melhorar a proposta em avaliação. Após

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


a geração das ideias, os participantes colocariam o chapéu amarelo, visando a
identificar seus benefícios potenciais para a organização.
Identificados os aspectos positivos, partir-se-ia então para o chapéu preto, per-
mitindo aos membros se concentrarem nas fragilidades e aspectos negativos do curso
de ação proposto. Após o chapéu preto, o verde pode voltar a ser utilizado, a fim de
gerar soluções para superar os aspectos negativos identificados.
Antes do encerramento, as pessoas voltam ao chapéu vermelho, expressando
seu grau de conforto sobre as questões discutidas e o curso de ação priorizado pelo
grupo. Ao final, após analisar a questão sob diversas facetas, o moderador, com o
chapéu azul, faz a conclusão, elencando as decisões tomadas pelo grupo e demais
informações relevantes.
A técnica dos seis chapéus pensantes possui diversas vantagens para a organização.
Como todos se concentram conjuntamente em um aspecto do pensamento, o grupo
tende a ser mais colaborativo do que em uma situação na qual uma pessoa poderia
reagir de forma emotiva (chapéu vermelho), ao mesmo tempo em que outra tentaria
ser mais objetiva (chapéu branco) e uma terceira seria mais crítica dos pontos que
emergem da discussão (chapéu preto).
O método, portanto, permite desmembrar o pensamento, deixando o grupo mais
sintonizado e seguro de que avaliou todos os elementos importantes da matéria.
Para o líder, o processo e o resultado são de extrema importância, pois se chega a
decisões mais bem fundamentadas, explorando todos os pensamentos e sentimentos
que passaram pelos membros, o que leva o grupo e as pessoas a se tornarem mais
colaborativas.
54

2.3.5  Técnicas decisórias: resumo

As técnicas decisórias apresentadas devem ser utilizadas pelas lideranças como


moderação. Elas são especialmente úteis para decisões complexas que envolvem as-
pectos estratégicos ou para aquelas matérias que necessitam de maior criatividade,
não devendo, portanto, ser usadas para decisões rotineiras.
Tendo em vista as evidências científicas de que os grupos que utilizam esses
métodos em geral chegam a decisões de qualidade bem superior do que as dos
grupos convencionais, você e as demais lideranças deveriam considerar seriamente
implantar algumas dessas inovações decisórias como forma de aprimorar a gover-
nança de sua organização.
É importante destacar ainda que uma boa decisão é diferente de um resultado
de sorte: como todas as decisões embutem alguma incerteza sobre o futuro, é fun-
damental que o processo decisório seja continuamente trabalhado nas organizações,
aumentando, assim, a probabilidade de alcançar bons resultados.
Inovar e evoluir continuamente são mantras de qualquer organização de sucesso.
Como as decisões constituem o elemento central de qualquer empresa, deve-se
tentar inovar também neste aspecto, indo além da zona de conforto do consenso
passivo. Não há custos relevantes em se tentar, e os benefícios potenciais para as
companhias – maior eficácia e valor agregado dos órgãos de governança – são
imensos.

2.4  Fatores psicológicos que levam ao descumprimento


das regras
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Além de melhorar a qualidade das decisões tomadas na alta gestão, a boa gover-
nança possui outro objetivo central: criar um ambiente no qual as pessoas desejem
voluntariamente cumprir as regras. Logo, um aspecto chave para qualquer líder é
entender, em profundidade, o que leva as pessoas a descumprir as políticas e normas
de suas organizações.
A abordagem tradicional sobre o assunto é simplista. Basicamente, ela parte do
pressuposto de que as pessoas tendem a burlar as regras caso o ganho decorrente da
atitude desonesta se mostre superior ao seu “custo”, computado pela probabilidade
de ser pego multiplicada pela penalidade potencial. Em outras palavras, parte-se da
premissa de que as pessoas analisam racionalmente e a todo instante se vale a pena
atuar dentro das regras, optando então por cumpri-las ou não.
Diversos estudos recentes, baseados em experimentos com seres humanos,
mostram que essa é uma visão extremamente limitada, senão totalmente errada.
55

A propensão das pessoas a agir desonestamente, na verdade, depende bem mais


de fatores psicológicos do que do risco de ser identificado e da penalidade
aplicável.
No geral, esses trabalhos chegam à conclusão que nossa disposição em burlar as
regras depende fundamentalmente da capacidade de racionalizarmos nossas ações,
isto é, de criarmos para nós mesmos alguma estória mental que mantenha nossa
autoimagem positiva, mesmo após uma ação desonesta. Com isso, conseguiríamos
o melhor dos mundos: um ganho pessoal decorrente de ações antiéticas – o aspecto
econômico – e a manutenção de uma visão moralmente positiva de nós mesmos – o
aspecto psicológico.
Um experimento interessante sobre os motivadores psicológicos da desonestidade
ilustra essa conclusão. Nele, um grupo de voluntários recebia uma folha com 20
“matrizes de tarefas” semelhantes à tabela a seguir:

1,26 4,57 2,49 2,84 7,53 3,48 5,62 1,19 6,17

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


3,41 9,24 7,48 6,12 5,39 4,56 9,34 3,53 2,44
2,52 6,34 8,64 1,93 9,37 3,88 7,61 4,82 8,81

Tabela 2.10 – Fatores psicológicos associados à desonestidade:


exemplos de matrizes de tarefas

O objetivo era “resolver” o máximo possível de matrizes em 5 minutos, isto


é, encontrar dois números em cada matriz que, somados, resultassem em 10 (na
primeira matriz da esquerda, por exemplo, os números seriam 2,52 e 7,48).
Ao final, os voluntários receberiam US$0,50 por matriz certa, podendo auferir,
portanto, uma remuneração máxima US$10 em caso de solução das 20 matrizes. No
experimento inicial – denominado “condição de controle” – não havia possibilidade
de desonestidade. Ao final dos 5 minutos, as pessoas simplesmente entregavam
suas folhas para o pesquisador, que conferia as respostas e pagava a quantia devida.
Nesta situação, as pessoas se mostraram capazes de resolver em média 4 matrizes,
recebendo US$2 pela participação.
Na sequência, os pesquisadores criaram uma variante – denominada “máquina
de trituração”. Nela, ao final dos 5 minutos, as pessoas deveriam triturar suas folhas
de respostas em uma máquina colocada no canto da sala, para só então informar
verbalmente ao pesquisador quantas matrizes haviam resolvido. Qual foi o resultado
geral desta variante?
Bom, a média geral de soluções corretas “subiu” de 4 para 6 matrizes. Especifi-
camente, os pesquisadores observaram que a grande maioria das pessoas passou a
reportar um número superior de matrizes respondidas. Logo, o aumento da média
geral não decorreu da fraude de algumas pessoas específicas – que poderiam afirmar
56

ter resolvido um número elevado de matrizes, como 18, 19 ou 20 –, mas sim de


pequenas ações desonestas por parte de quase todos os participantes, que passaram
a mentir “um pouquinho”.9
Apesar do resultado aparentemente decepcionante em relação ao comporta-
mento humano, há uma conclusão positiva que não pode passar despercebida.
Caso a abordagem tradicional estivesse certa – isto é, se todos pensassem apenas
em maximizar seus ganhos financeiros a partir de uma análise custo-benefício de
suas ações desonestas –, então as pessoas deveriam afirmar ter respondido todas a
matrizes, de forma a receber os US$10 de prêmio máximo (tendo em vista que não
havia qualquer “custo” decorrente de sua ação desonesta).
Por que as pessoas não agiram dessa forma? Basicamente, porque seria difícil,
senão impossível, continuar a ter uma autoimagem positiva delas mesmas após
uma desonestidade extrema como essa. Por outro lado, o aumento de 4 para 6
matrizes corretas, apesar de também constituir uma ação desonesta, é algo mais fácil
de justificar para si mesmos. Por exemplo, as pessoas poderiam criar estórias para
si mesmas do tipo “no primeiro minuto do teste não estava concentrada porque
havia barulho, mas eu sei que normalmente resolveria 6 matrizes...” ou “no final
do teste já havia identificado a resposta de outras matrizes, só não tive tempo de
assinalá-las...”.
Para reforçar seu argumento central, os pesquisadores realizaram então
uma nova variante do estudo, denominada “máquina de trituração com mais
dinheiro”. Nela, manteve-se a resposta verbal dos participantes após a trituração
da folha de respostas. Adicionalmente, os pesquisadores aumentaram o prêmio a
ser pago por matriz correta, variando de US$1, US$2, US$5 e, para um último
grupo de voluntários, US$10. Se a abordagem tradicional estivesse correta,
Governança corporativa: o essencial para líderes 

então as pessoas deveriam passar a afirmar ter resolvido um número ainda maior
de matrizes, haja vista que o benefício da ação desonesta havia aumentando,
enquanto seu custo teria ficado no mesmo patamar da variante anterior. O que
aconteceu?
Basicamente, os resultados se mantiveram inalterados. Na verdade, observou-se
inclusive uma ligeira redução do número de matrizes “corretas” para o grupo final
que recebeu US$10, com a média geral decrescendo para pouco menos que 6
matrizes.
De acordo com os pesquisadores, isso ocorreu porque, ao receberem US$10
por matriz correta, tornou-se mais difícil para as pessoas mentir e, ao mesmo
tempo, continuar a manter seu senso de integridade. Em resumo, tornou-se um
comportamento mais difícil de ignorar ou racionalizar.
Outros trabalhos simularam atividades tipicamente propensas a alguma desones-
tidade, tais como o preenchimento de formulários de viagens ou declarações de
imposto de renda. Ao final, os pesquisadores concluíram que as pessoas em geral se
57

sentem confortáveis em trapacear “só um pouquinho” – isto é, algo em torno de 15


a 20% do montante envolvido –, dificilmente indo além desse patamar em função
de seus “freios morais”.10
Além dessa conclusão geral, os trabalhos recentes constataram que ao menos
sete fatores psicológicos específicos aumentam a chance das pessoas agirem desones-
tamente. São eles:

# Fator Explicação
O desgaste devido ao estresse, falta de sono etc.
1 Exaustão mental
aumenta a chance das pessoas burlar as regras.
As ações desonestas são mais fáceis de justificar
quando vistas como forma de compensação por
2 Sentimento de vingança
pessoas que se sentem prejudicadas ou injustiçadas
pela organização.
Cometer pequenos atos ilegais – como utilizar
Atos ilegais cometidos
3 produtos falsificados11 – aumenta a chance das
previamente
pessoas agirem desonestamente.

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


Viver em uma cultura que fomenta atitudes
Convívio com cultura que antiéticas, incluindo a exposição a um
4
fomenta a desonestidade comportamento inadequado por líderes e pares,
aumenta a frequência das ações desonestas.
Uma personalidade mais criativa aumenta
a capacidade do indivíduo racionalizar seu
5 Criatividade
comportamento, levando a um aumento da
desonestidade.
Distanciamento de A propensão a burlar regras aumenta na medida
6 referências monetárias em que o benefício do infrator se distancia de um
explícitas ganho em dinheiro vivo.12
A propensão a descumprir as regras aumenta
Pares se beneficiando de quando as pessoas acreditam que seus atos
7
nossas ações desonestos irão, de alguma forma, beneficiar a
organização ou terceiros pelos quais sentem empatia.

Tabela 2.11 – Fatores psicológicos que aumentam a chance das pessoas


burlarem as regras

Há uma vasta literatura que demonstra, portanto, que o ganho econômico pes-
soal e a probabilidade de ser penalizado influenciam muito menos o comportamento
humano do que poder-se-ia esperar.
Como resultado, a abordagem tradicional adotada pelas empresas para a ques-
tão dos controles internos – em geral baseada no aumento do monitoramento e
das penalidades potenciais como únicos elementos para evitar comportamentos
indesejados – deve ser revista pelas principais lideranças, passando a levar, em
consideração, os fatores psicológicos que podem aumentar a chance das pessoas
descumprirem as políticas da organização.
58

2.5  A importância do líder para ativar a consciência


das pessoas e promover o interesse coletivo
nas organizações

Os colaboradores e executivos terão interesse em cumprir as regras volun-


tariamente desde que acreditem que agindo desta forma estarão fazendo o
melhor não apenas para a organização, como também para si mesmos e para
a sociedade no longo prazo. As principais lideranças possuem um papel-chave
neste processo, já que cabe a elas “ativar” a consciência das pessoas neste
sentido.
Apesar de parecer uma afirmação óbvia para muitos, esse é um tema pouco
abordado na governança corporativa. De acordo com a visão tradicional sobre
o tema, cada pessoa procura maximizar o seu resultado pessoal no seu dia a dia
corporativo – mesmo que em detrimento do resultado coletivo.
Como consequência, conselhos independentes, auditorias e sistemas de
remuneração – entre outros mecanismos – seriam os elementos centrais para
alinhar interesses e fazer com que as pessoas deixassem de agir pensando apenas
em si.
No jargão técnico, a visão tradicional parte da premissa de que agimos como
“homo economicus”, isto é, que procuramos a todo instante maximizar nosso ganho
individual de forma racional e egoísta.13 Entretanto, essa visão – assim como todos
os modelos da teoria econômica – é obviamente uma simplificação da realidade,
com severas limitações.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Os seres humanos nem sempre agem de acordo com a premissa do homo econo-
micus. Ao contrário, não são raras as situações do cotidiano, por exemplo, em que
as pessoas sacrificam seu tempo, dinheiro ou conhecimento para ajudar os outros,
bem como deixam de burlar regras quando isso lhes poderia conferir vantagens. O
homo economicus não agiria assim.
Na verdade, centenas de experimentos recentes realizados com pessoas em
situações reais têm demonstrado, de forma surpreendente que, na maior parte
do tempo, temos uma tendência a agir de forma cooperativa e visando ao me-
lhor resultado coletivo. A busca incessante e exclusiva pelo melhor resultado
individual, algo preconizado pela visão tradicional, tende a ser mais uma
exceção quase que patológica do que uma regra do comportamento humano.
Três experimentos, aplicados em diferentes países ao longo dos últimos anos,
corroboram essa afirmação: o “jogo da confiança”, o “jogo do ultimato” e o “jogo do
ditador”. Todos esses trabalhos, apresentados no quadro abaixo, envolvem voluntários
estranhos entre si, colocados em salas diferentes de forma a não terem qualquer contato.
59

Resultado Resultados obtidos


esperado do homo com pessoas reais –
Experimento Descrição economicus homo sapiens

O indivíduo A recebe uma


soma de dinheiro (Ex.: US$20) A cooperação tende
e decide quanto deseja dar a surpreendentemente
Como não há
para B. Ele pode, inclusive, prevalecer nesse
qualquer garantia
optar por ficar com todo o jogo. Em média, as
de retorno nem
dinheiro e deixar o experimento pessoas A doam
reciprocidade, o
neste instante. O valor que A cerca de metade
homo economicus
Jogo da eventualmente decidir dar de seu montante
não daria coisa
Confiança para B é, então, triplicado pelos inicial para B. E as
alguma para o
organizadores do jogo. Após pessoas B retribuem
outro participante,
receber o triplo do montante a generosidade,
estivesse ele
enviado por A, o indivíduo B devolvendo para A um
atuando como
tem a oportunidade de retornar pouco mais (cerca de
indivíduo A ou B.
quanto dinheiro desejar para 30%) do que haviam
A, ou simplesmente ficar com recebido.
tudo.
Dois voluntários interagem a Caso o indivíduo A As pesquisas mostram
fim de decidir sobre a partilha agisse como homo que, em média, os
de uma certa quantia (Ex.: economicus, ele indivíduos A tendem a

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


US$50). O indivíduo A propõe sempre deveria propor oferecer uma divisão
inicialmente quanto deste uma quantia máxima justa da quantia inicial
montante inicial deveria ficar para si e mínima para (na maioria das vezes,
com ele e quanto deve ser o indivíduo B (Ex.: cerca de 50% para
dado para B. O indivíduo B US$49 para si e US$1 cada). O resultado
deve decidir então se aceita para B). Se B, por sua mais interessante,
Jogo do ou não a proposta de A. Caso vez, agisse como entretanto, ocorre
Ultimato B a rejeite, ambos os indivíduos homo economicus, com os indivíduos B,
deixam o experimento sem ele deveria aceitar que tendem a rejeitar
receber coisa alguma. Se B qualquer oferta ofertas inferiores a
a aceitar, então a quantia proposta por A, haja 20% da quantia total,
é dividida de acordo com vista que sair do jogo preferindo se sacrificar
a proporção definida por A. com qualquer quantia economicamente e
O jogo é realizado apenas (mesmo que mínima) sair sem coisa alguma
uma vez, evitando qualquer é racionalmente do que aceitar uma
possibilidade de reciprocidade melhor do que sair sem proposta vista como
futura entre ambos. coisa alguma. “injusta”.
De forma
Trata-se de uma variante
surpreendente,
do jogo do ultimato. Nele,
entretanto, as pessoas A
o indivíduo designado
Naturalmente, caso doam, em média, cerca
aleatoriamente como A
o indivíduo A se de 20% do montante
recebe uma quantia (Ex.:
comporte como recebido (doações
US$50) e decide se quer dar
Jogo do homo economicus, de 50% também
algo para o indivíduo B ou não.
Ditador ele deveria ficar não são incomuns),
Caso opte por ficar com tudo,
com toda a quantia, sacrificando-se
o experimento é simplesmente
não compartilhando voluntariamente a fim
encerrado. Cabe a B, neste
coisa alguma com B. de proporcionar alguma
caso, apenas se sujeitar às
recompensa a B por sua
decisões de A (daí o nome
disposição em participar
do jogo).
do experimento.

Tabela 2.12 – Muito além do homo economicus: resultados de trabalhos


recentes
60

Além da forte evidência de que a maioria das pessoas prefere cooperar e partilhar
parte de seus ganhos, alguns estudos recentes no campo da neurociência mostram
que as pessoas inclusive sentem prazer ao fazer isso. Logo, as pesquisas têm revelado
um comportamento orientado para o próximo, que decorre do que nossa consciência
acredita ser “justo” socialmente. A ideia de que nos comportamos como homo
economicus, portanto, pode ser útil para alguns modelos teóricos, porém é limitada
e frequentemente incorreta quando confrontada com a realidade.
De forma interessante para a temática da governança, esses trabalhos mostram
ainda que o peso da consciência nas decisões varia em função das circunstâncias,
bem como que as pessoas podem ter um comportamento mais orientado para o
grupo, caso seja criado um contexto social adequado. Tudo depende de termos nossa
consciência “ativada”.
Os experimentos mostram que existem três fatores principais relacionados ao
contexto social que ativam a consciência das pessoas, induzindo a um comporta-
mento mais cooperativo e orientado para o interesse coletivo:

a) As instruções e os exemplos das lideranças.


b) A reciprocidade, isto é, a expectativa de como os outros agiriam nas mesmas
circunstâncias.
c) A empatia, ou a percepção real dos efeitos de suas ações sobre terceiros.

O primeiro fator, provavelmente o mais importante de todos, se relaciona à


nossa tendência a obedecer às pessoas percebidas como lideranças. Isso pode levar
tanto a comportamentos positivos e orientados para o bem coletivo quanto a uma
lealdade cega, com resultados desastrosos. O famoso experimento com choques
Governança corporativa: o essencial para líderes 

elétricos de Stanley Milgram, detalhado no apêndice ao final deste capítulo, mostra


como pessoas comuns podem ser levadas a cometer atos violentos para com terceiros
em função da obediência excessiva a lideranças. Para você e as demais lideranças,
os resultados desse experimento reforçam a máxima do “tone at the top”14, isto é,
de como seu comportamento tenderá a ser replicado em toda a organização, o que
aumenta sua responsabilidade.
O segundo fator se relaciona com nossa propensão inata de imitarmos nossos
pares e de agirmos de acordo com o comportamento do grupo ao qual pertencemos.
Se estivermos em um ambiente onde as pessoas doam seu tempo e recursos para
ajudar terceiros, temos uma tendência de fazer o mesmo. Se estivermos em um
ambiente agressivo, onde acreditamos que a solidariedade é baixa, nos sentiremos
mais à vontade para perseguir nosso bem estar pessoal a qualquer custo, negando o
apoio a terceiros sem contrapartida.
O terceiro fator, por sua vez, diz respeito à empatia em relação ao próximo.
Quanto mais sentirmos o impacto de nossas ações sobre terceiros, mais essa percepção
61

influenciará nossas ações. A distância física é um fator que naturalmente diminui


nossa empatia para com terceiros. Se um executivo, por exemplo, tiver contato cons-
tante com acionistas, cuja qualidade de vida depende dos dividendos da companhia,
ele provavelmente terá menos predisposição à fraude do que se visualizar o acionista
como um ente anônimo que opera diariamente atrás de um computador e pelo qual
não possui qualquer empatia.
As descobertas dessas pesquisas recentes possuem uma implicação clara para as
lideranças empresariais: a boa governança deve passar a ser vista não apenas sob a
ótica dos mecanismos de incentivo e controle – baseada na premissa equivocada
do homo economicus –, mas também pela ativação contínua da consciência dos
colaboradores e executivos.
Práticas de governança que reforçam o peso da consciência nas atitudes diárias
devem, portanto, ser fomentadas, tais como:

a) A realização periódica de ações de conscientização, capitaneadas presencial-


mente pelas principais lideranças da empresa de forma a sinalizar os padrões

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


de conduta esperados na organização.
b) A disseminação de exemplos práticos de decisões tomadas em prol do grupo
por gestores envolvidos em dilemas éticos.
c) A promoção de encontros periódicos dos administradores com os stakeholders,
a fim de que percebam mais profundamente os impactos causados por suas
decisões.

Esses trabalhos também deixam claro que planos de remuneração demasiada-


mente agressivos devem ser evitados, já que a ênfase atual nos incentivos materiais
como solução de governança pode, na verdade, ajudar a suprimir a consciência
das pessoas, piorando os problemas em vez de mitigá-los.15 Em outras palavras, a
criação de um ambiente no qual as pessoas são incentivadas a pensar apenas em si
e a competir a qualquer custo tende apenas a piorar a situação da organização e da
sociedade como um todo.
Um exemplo neste sentido foi observado nos jogos da confiança e do ditador
citados anteriormente: constatou-se que os alunos de MBA e os economistas tendem
a ser bem menos cooperativos nesses jogos, provavelmente por terem sido dou-
trinados a pensar exclusivamente sob a ótica econômica nessas situações (inclusive
sendo convencidos a pensar que o foco exclusivo no ganho pessoal seria o modo
“certo” de agir nessa situação).
Apesar dessas evidências, muitas lideranças se concentram, de forma errônea, em
criar um ambiente com excessiva competição interna, em vez de procurarem promo-
ver um ambiente de maior coesão e cooperação entre executivos e colaboradores. Os
dois casos práticos apresentados a seguir ilustram os perigos desse estilo de gestão.
62

Os perigos do excesso de competição interna – 1:


O Caso Enron

Extrato do livro The Smartest Guys in the Room: The


Amazing Rise and Scandalous Fall of Enron.

O CEO (chief executive officer) da Enron, Jeffrey Skilling, possuía uma


visão darwinista da vida e de como o mundo funcionava. Ele era famoso por
dizer que o dinheiro era a única coisa que motivava as pessoas. Um dos seus
livros preferidos era O Gene Egoísta de Richard Dawkins, que afirma que
a natureza humana é dirigida pela ganância e competição com o objetivo
exclusivo de passar nossos genes para gerações futuras.
Na Enron, Skilling implantou um sistema de gestão que visava a liberar
o que ele acreditava ser o instinto natural das pessoas, ligado à “sobrevivência
dos mais aptos”. Uma das consequências foi a implantação de um sistema
de avaliação anual de desempenho denominado PRC (Performance Review
Committee) na companhia. Esse sistema exigia que as pessoas fossem avaliadas
por uma nota de 1 (melhor) a 5 (pior) com base nos votos das outras pessoas
com quem trabalhavam. Ao final do processo, no mínimo 10% das pessoas
deveriam ser classificadas como 5 e demitidas da empresa.
Para Skilling, esse método brutal de “avaliar e jogar fora” era o “principal
processo interno da Enron”. Ainda segundo o CEO, “nossa cultura é mesmo dura
e muito agressiva”. A visão do líder começou a permear toda a organização. Em
uma entrevista, um trader da empresa afirmava com orgulho: “Se eu tivesse que
Governança corporativa: o essencial para líderes 

pisar no pescoço de alguém para alcançar minha meta e dobrar minha remune-
ração, pode ter certeza que eu faria isso. Era assim que as pessoas trabalhavam lá.”
Na prática, o PRC se tornou viciado. Visando a obter boas avaliações,
muitos executivos começaram a produzir lucros fictícios e a fazer acordos
com pares em função de relações pessoais para obtenção de boas notas. Ao
invés de meritocracia, o processo de avaliação criou um ambiente politizado
e com excessiva competição interna, beirando a paranoia em algumas áreas.
O desfecho da Enron é conhecido por todos: a companhia foi à falência
em 2001, após a descoberta de várias operações engenhosas para inflacionar
os resultados e, com isso, permitir o alcance das metas e o exercício de opções
de ações milionárias por seus executivos.

Fonte: McLEAN, Bethany, ELKIND, Peter. 2004. The Smartest Guys in the Room: The Amazing
Rise and Scandalous Fall of Enron. Penguin Books. 440p.
63

Os perigos do excesso de competição interna – 2:


O Caso Sears

Extrato da reportagem da Bloomberg Businessweek de


11/07/2013 “At Sears, Eddie Lampert’s Warring Division
Models Adds to the Troubles.”

Todo o ano, os presidentes das unidades de negócios da Sears fazem uma


peregrinação até a sede da companhia, nas vizinhanças de Chicago, para pedir
recursos ao presidente do conselho e CEO (Chief Executive Officer) da compa-
nhia Eddie Lampert, um gestor de fundos hedge bilionário que vive de forma
reclusa em uma mansão de US$40 milhões na Flórida. Após as apresentações,
Lampert define os orçamentos e a distribuição dos recursos para investimentos
de cada unidade de negócios no próximo exercício. O detalhe é que ele participa
da reunião por videoconferência. Como não gosta de voar, o CEO só vai à

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


empresa uma ou duas vezes por ano e raramente encontra as pessoas.
Lampert adquiriu o controle acionário (55% das ações) da Sears em 2005.
Durante esse período, passaram pela companhia quatro CEOs diferentes,
enquanto Lampert ocupava o cargo de presidente do conselho. Na prática,
era ele quem sempre tomava as decisões mais relevantes. Em maio de 2013,
após as tentativas fracassadas, ele assumiu também o cargo de CEO.
Desde 2008, ele resolveu separar a Sears em 30 unidades de negócio
totalmente independentes, cada uma com seu próprio presidente, conselho
de administração e demonstrações financeiras. A companhia, portanto, foi
transformada em um conjunto de unidades de negócio autônomas que
competem entre si por receitas e recursos para investimentos.
Lampert acredita que o modelo de competição interna extrema gerará o
melhor resultado para a companhia: “Se os principais executivos agirem de
forma egoísta, então dirigirão suas unidades de forma racional, aumentando
o resultado financeiro geral.”
Na prática, entretanto, essa forma de governança tem-se mostrado ex-
tremamente danosa. As unidades de negócios se voltaram umas contra as
outras. O negócio tem sido devastado por brigas internas na medida em
que as unidades disputam, ferozmente, os escassos recursos financeiros e
os espaços nas lojas. De acordo com um dos executivos entrevistados pela
Bloomberg, o modelo criou uma cultura de “guerra de tribos”. “Se você é de
outra unidade, então estamos em duas empresas concorrentes. A cooperação
e a colaboração simplesmente não existem.”

(Continua)
64

O novo modelo, que privilegia as pessoas que pensam apenas em si


mesmas, criou facções rivais, com impacto negativo para a organização
como um todo. Cada unidade de negócios passou a pensar apenas no
seu lucro, deixando de pensar no resultado coletivo da companhia como
um todo. “Começaram a acontecer verdadeiras guerras por busca de es-
paço nas lojas. Ninguém se disponibiliza a fazer sacrifícios, tais como
reduzir preços a fim de aumentar o movimento de clientes nas lojas, o
que beneficiaria outras unidades.” A competição interna chegou a tal
ponto que os executivos começaram a colocar protetores de tela em seus
laptops para que as pessoas de outras unidades não vissem seus materiais
durante as reuniões.
Para o CEO Lampert, esse modelo gerará mais dados para análise, os
quais poderão ser utilizados para utilizar de forma mais eficiente os recursos
da companhia. Para isso, o CEO contratou o estatístico Paul DePodesta,
famoso por ter sido retratado no filme Moneyball, e o economista Steven
Levitt, autor do livro Freakonomics. Deve-se destacar que, além de não ter
experiência no varejo, Lampert preferiu contratar executivos nas áreas de
finanças e tecnologia para dirigir a Sears.
Até o momento, o resultado desse modelo de governança tem sido desas-
troso. Desde a aquisição em 2005, o faturamento da Sears caiu de US$49,1
bilhões para US$39,9 bilhões. As ações despencaram 64% e o caixa alcançou
o menor patamar em 10 anos. Para completar, menos de 1% do faturamento
tem sido alocado para investimentos, uma proporção 3 a 4 vezes menor do
que os investimentos dos rivais do setor.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Fonte: Bloomberg Businessweek: <http://www.businessweek.com/articles/2013-07-11/


at-sears-eddie-lamperts-warring-divisions-model-adds-to-the-troubles>. Acesso em
08/04/2014.

Os casos Enron e Sears deixam claro como o foco excessivo na competição in-
terna entre colaboradores e executivos pode gerar sérios efeitos colaterais negativos.
Além de criar um ambiente interno paranoico, esses exemplos causaram enorme
destruição de valor para os acionistas e stakeholders dessas companhias.
Em grande medida, o foco na competição em detrimento da cooperação –
atualmente muito comum nas organizações – deriva de um entendimento errado
das lideranças em relação ao conceito de seleção natural proposto por Darwin.
Para alguns líderes, a promoção da competição interna seria a forma de assegurar o
melhor resultado para o negócio, já que, em tese, levaria à “sobrevivência dos mais
65

aptos” na organização e à máxima eficiência econômica. Na verdade, inúmeras pes-


quisas recentes mostram que é a capacidade de cooperação, e não a de competição,
que atua como fator-chave para o sucesso evolutivo de grupos e populações.16
Trazido para a esfera empresarial, esses resultados reforçam a tese de que as em-
presas com maior cooperação interna são as que prosperarão ao longo do tempo, e
não aquelas com foco na promoção da competição extrema entre seus membros. O
próprio Darwin reconheceu isto, conforme trecho de seu livro The Descent of Man:

“There can be no doubt that the tribe including many members who are always ready
to give aid to each other, and to sacrifice themselves for the common good, would be
victorious over other tribes. And this would be natural selection.”17
Charles Darwin. The Descent of Man, 1871.

A consciência e o comportamento cooperativo, portanto, são forças impor-


tantes que levam as pessoas a cumprirem as regras voluntariamente, compor-
tamentos que devem ser cultivados pelas lideranças interessadas na governança

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


para valer.
Cabe a você e aos demais líderes criarem um contexto social mais propício à
ativação da consciência das pessoas, deixando de se concentrar exclusivamente em
controles e incentivos: é mais barato e tende a gerar menos fraudes e decisões des-
truidoras de valor.
Tendo em vista os diversos escândalos apresentados no capítulo inicial, fica claro
que as organizações simplesmente não podem se dar ao luxo de ignorar o papel da
consciência na promoção da boa governança empresarial.18

2.6  Conclusão: como assegurar a perenidade


da boa governança na sua organização?

Neste capítulo, mostramos como a literatura tradicional sobre governança – com


foco na implantação de mecanismos de incentivo e controle a fim de induzir com-
portamentos – parte da premissa de que agimos como homo economicus. Em outras
palavras, que sempre:

a) Tomamos decisões racionalmente perfeitas.


b) Pensamos exclusivamente em maximizar seus ganhos pessoais.
c) Estamos interessados em burlar as regras caso o benefício esperado da ati-
tude desonesta seja maior do que a penalidade aplicável multiplicada pela
probabilidade de ser pego.
66

A simplificação do homo economicus é uma premissa longe da realidade. Centenas


de trabalhos recentes, descritos ao longo das seções anteriores, mostram que o com-
portamento humano é muito mais complexo, dependendo de questões psicológicas,
sociais e biológicas. A tabela abaixo apresenta um comparativo resumido entre a visão
simplista do homo economicus que norteia a abordagem atual sobre governança e os
resultados das centenas de pesquisas recentes em diferentes áreas do conhecimento
que refutam essa visão.

Visão tradicional: governança corporativa como mero conjunto de mecanismos de incentivo


e controle que visam a fazer que com os agentes (administradores) tomem decisões no melhor
interesse dos principais (acionistas)
Origem: redução na natureza humana ao conceito de homo economicus
Premissa (visão tradicional) Realidade (evidências de trabalhos recentes)
Estamos sujeitos a inúmeros vieses cognitivos, os
1. Sempre tomamos decisões racionalmente
quais nos levam a tomar decisões irracionais,
perfeitas.
tanto individualmente quanto coletivamente.
As pessoas, em geral, agem de forma
2. Pensamos exclusivamente em maximizar cooperativa e desinteressada, deixando de
nossos ganhos pessoais. maximizar seus resultados pessoais em prol de
outras pessoas.
3. Estamos sempre interessados em burlar
Fatores psicológicos são muito mais importantes
regras caso a penalidade potencial
para nossa decisão de agir desonestamente
multiplicada pela probabilidade de ser
do que a probabilidade de ser pego ou a
pego seja menor do que o benefício
penalidade.
esperado de uma atitude desonesta.
Resultado: necessidade de uma nova abordagem para a governança corporativa, que privilegie
a diminuição dos vieses cognitivos nas decisões, a conscientização das pessoas, a cooperação e
o foco no melhor resultado coletivo de longo prazo.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Tabela 2.13 – Abordagem tradicional para a governança vs. abordagem emergente

É necessário ter uma visão mais ampla da boa governança, que tenha como
objetivo criar um contexto organizacional no qual as pessoas desejem de fato agir
no melhor interesse de longo prazo da organização. Nessa nova abordagem, os
mecanismos de incentivo e controle tradicionais continuam a ser importantes, porém
não devem ser aceitos como suficientes para assegurar empresas bem governadas.
Como resultado, você e as demais lideranças devem procurar incessantemente:19

a) Melhorar o processo decisório, reduzindo os vieses cognitivos por meio de


um sistema de contrapesos efetivo.
b) Compreender melhor os fatores psicológicos que levam ao descumprimento
das regras, de forma a reduzir sua probabilidade de ocorrência.
c) Criar um contexto social que ative continuamente a consciência das pessoas, de
forma a promover comportamentos cooperativos e orientados para o longo prazo.
67

O resultado desse processo serão empresas mais bem governadas, isto é, aquelas
cujas decisões são tomadas no seu melhor interesse de longo prazo e nas quais as
pessoas cumprem as regras e se comportam de forma ética, com impactos positivos
para toda a comunidade.
A consideração explícita dos aspectos humanos e psicológicos, como força
relevante para a boa governança, deve, em última instância, mudar a forma como
o tema é percebido pela maioria das pessoas.
Governança corporativa deve passar a ser vista como um conceito multidimensio-
nal, cujo atendimento pleno depende do contexto social criado por suas lideranças,
da efetividade dos mecanismos de incentivo e controle implantados e das práticas
adotadas para com seus acionistas e demais stakeholders.

Apêndice: Os riscos da obediência irrefletida


a lideranças

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


Os seres humanos possuem uma forte tendência a replicar comportamentos e a
obedecer às pessoas percebidas como lideranças. Isso pode levar a comportamentos
orientados para o bem comum, ou até mesmo “heroicos” em certas situações. Por
outro lado, a lealdade cega a lideranças pode levar a comportamentos irrefletidos,
com consequências desastrosas paras as pessoas envolvidas e para as organizações e
sociedade em geral.
O famoso experimento com choques elétricos realizado pelo cientista Stanley
Milgram, na década de 1960, é o melhor exemplo de nossa tendência inata de
obedecermos a autoridades de forma irracional em certas circunstâncias.

O experimento de Milgram

Após a Segunda Guerra Mundial, ocorreram os famosos julgamentos de Nu-


remberg. Neles, o principal argumento de defesa utilizado pelos nazistas era de
que estavam apenas “cumprindo ordens”. Muitos psicólogos ficaram intrigados
em explicar como pessoas civilizadas e bem educadas como os alemães podiam ter
cometido tantas atrocidades.
Em 1961, Stanley Milgram, então pesquisador de Yale, começou uma série de
testes a fim de investigar se o contexto no qual as pessoas estavam inseridas poderia le-
vá-las a uma obediência cega a lideranças, mesmo que isto infligisse danos a inocentes.
A ideia era simples: chamava-se um voluntário da comunidade por meio de um
anúncio de jornal para participar de um experimento, em troca de uma remuneração
68

de US$5. Ao chegar, o voluntário era apresentado a um “cientista” e a outro “mem-


bro da comunidade” (na verdade, ambos atores). O voluntário era informado de que
participaria de um estudo para investigar o efeito das punições sobre a capacidade
de memorização.
Um dos participantes deveria atuar como “professor” e o outro como o “aluno”.
O sorteio era manipulado, de forma que os voluntários sempre se tornavam os
“professores”. O ator, portanto, era sempre o “aluno” do experimento. Na sequência,
o voluntário (o “professor”) e o cientista atavam o ator (o “aluno”) a uma máquina
de eletrochoque (vide Figura 2.1 a seguir, da esquerda para a direita: voluntário,
ator e cientista de jaleco).
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Figura 2.1 – Experimento de Milgram:


implicações importantes para a boa governança.

O ator-aluno era submetido a um teste de memória aplicado pelo voluntário-pro-


fessor. A cada erro do ator, o voluntário deveria aplicar um choque em ordem cres-
cente de intensidade, com incrementos de 15V, iniciando em 45V até o hipotético
limite de 450V. Para comprovar a veracidade dos choques, o “cientista” aplicava um
pequeno choque de 45V no voluntário antes do experimento.
A máquina possuía uma escala de voltagem com legendas indicando seu respectivo
perigo, indo de “carga leve” para choques de 45V a “potencialmente letal” para choques
superiores a 400V. O ator possuía um roteiro bem definido. A partir de 75V, deveria
emitir gritos cada vez mais intensos de dor. Aos 120V, deveria começar a reclamar ex-
plicitamente. A partir de 150V, deveria dizer que seu coração estava incomodando-o e
que gostaria de ser libertado. Aos 225V, deveria começar a chutar a fina parede que o
separava do voluntário. Aos 345V, quando a legenda da máquina apontava “choques de
69

extrema intensidade”, deveria emitir grunhidos agonizantes de dor. Aos 405V, finalmen-
te, quando a legenda da máquina apontava “potencialmente letal”, o ator deveria parar
de responder. Neste momento, o “cientista” deveria dizer ao voluntário que a ausência
de respostas deveria ser interpretada como resposta errada, solicitando a continuidade
dos choques. Aos 450V, carga elétrica máxima e mortal, o estudo seria interrompido.
Caso o voluntário manifestasse interesse em deixar o experimento, o “cientista”
deveria incitá-lo a prosseguir por meio de quatro frases, nesta ordem: i) “por favor,
continue”; ii) “o experimento requer que você continue”; iii) “é absolutamente essen-
cial que você continue”; e, iv) “você não possui outra escolha, você deve ir adiante”.
Se o voluntário continuasse a manifestar o interesse em deixar o experimento, o
teste era então interrompido.
Antes de realizar a pesquisa, Milgram acreditava que o nível de obediência nos
Estados Unidos – um país com tradição democrática e de maior questionamento –
seria substancialmente inferior ao que poderia ser obtido na Alemanha ou em outros
países que, a seu ver, tinham maior herança autoritária. Ele submeteu o esboço do
projeto de pesquisa a diversos psicólogos. Todos acreditavam que os voluntários

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


iriam se recusar a obedecer ao cientista até o final. Em média, os experts estimaram
que as pessoas parariam por volta dos 140V e que apenas um a cada mil voluntários
aplicaria o choque letal de 450V.
Os resultados foram chocantes: 26 dos 40 participantes (65%) infligiram cho-
ques até o limite de 450V, e nenhum voluntário desistiu antes dos 300V! A maioria
das pessoas, portanto, aplicaria um choque letal em um desconhecido apenas
em função de um pedido de uma autoridade científica, sem que a vítima tivesse
cometido qualquer delito relevante. A remuneração para participar do experimento
era paga antecipadamente e não dependia da magnitude do choque aplicado nem
do interesse do voluntário em continuar.
Os estudos de Milgram foram replicados por outros pesquisadores em diversos
contextos e lugares – tais como Alemanha, Itália, África do Sul e Austrália –, todos
com resultados qualitativamente similares. Homens e mulheres apresentam taxas
similares de obediência, embora as mulheres apresentem níveis superiores de estresse
durante os experimentos. Apesar de muito divulgados nas décadas de 1960 e 1970,
os resultados caíram em um relativo esquecimento após comitês éticos de pesquisa
terem banido novas replicações, no início da década de 1980, devido a potenciais
problemas psicológicos nos envolvidos.20
Após a realização de diversas variantes do teste original,21 Milgram concluiu que
temos uma natureza intrinsecamente ligada à lealdade, que nos impele a obedecer
à autoridade em determinadas circunstâncias. O pesquisador acreditava que isto
advinha de uma base genética, ligada aos nossos primórdios, quando grupos de
hominídeos hierarquicamente formados sob o comando de “machos-alfa” possuíam
maior chance de sobrevivência.
70

Segundo Milgram, passamos por uma espécie de “transferência do agente”,


deixando de lado a racionalidade e nossos valores morais a fim de satisfazer as ex-
pectativas de lealdade da liderança em prol de um melhor resultado para o grupo.
Em outras palavras, suspendemos nossa autonomia e simplesmente nos tornamos
instrumentos dos outros. Nas palavras do pesquisador: “A pessoa passa a se sentir
responsável apenas perante sua autoridade, e não mais perante o teor de suas ações
que a autoridade prescreve.”
As pessoas entrevistadas pelo pesquisador, após os testes, demonstravam inclusive
sentir certa satisfação em agir com lealdade perante a liderança. Ao perguntar por que
haviam se comportado como tal, a maioria dos voluntários simplesmente respondia
que havia “dado sua palavra” ou que sentiam certo “dever de lealdade” para com o
cientista. Segundo Milgram, “a vasta maioria (84%) dos participantes se mostrou
contente ou muito contente em ter participado do estudo, e muitos disseram que
os psicólogos deveriam conduzir mais estudos desta natureza.”²²

Implicações do experimento
para a governança corporativa

Os resultados do experimento possuem implicações óbvias para a governança


empresarial, já que demonstram uma natureza humana de subserviência a pessoas
percebidas como autoridades legítimas. Como exemplo, a lealdade excessiva de
executivos ou conselheiros a uma liderança empresarial considerada de sucesso, seja
ela um CEO poderoso, um empreendedor de sucesso ou um acionista controlador,
pode acarretar prejuízos significativos às organizações. Esse problema pode inclusive
Governança corporativa: o essencial para líderes 

ser maior do que aquele decorrente da baixa lealdade das pessoas a fim de maximizar
seu ganho pessoal, alvo de praticamente toda a literatura sobre o tema.
No caso dos conselhos, é possível que conselheiros sintam certo sentimento
positivo decorrente da lealdade para com o líder da empresa, muitas vezes com
décadas no comando da organização. É possível também que diversos escândalos
empresariais como Enron, Parmalat etc. se devam, ao menos em parte, à lealdade
excessiva de conselheiros encantados com CEOs e empreendedores que representavam
uma liderança carismática e inquestionável. Nessas situações, os conselheiros podem
simplesmente ter confiado suas decisões nas mãos do líder inconteste – muitas vezes
talentoso e teatral. Afinal, a quem deve haver maior sentimento de lealdade: a um
indivíduo próximo e que se dedica integralmente à organização ou a um ente abstrato
e anônimo chamado acionista que – em tese – aparece uma vez ao ano nas assem-
bleias gerais? Embora a Lei prescreva o dever de lealdade para com a companhia, os
aspectos humanos inatos e a pressão pela lealdade ao grupo podem levar as pessoas
a aceitarem caminhos catastróficos para a organização.
71

Tendo em vista os potenciais problemas decorrentes da lealdade irrefletida, que


mecanismos poderiam ser empregados para mitigá-los?
O próprio experimento de Milgram fornece uma pista para sua solução. O
cientista observou que a taxa de obediência caía drasticamente em função de três
parâmetros:

a) A proximidade em relação à autoridade: a distância do cientista em relação


ao voluntário e a distância do voluntário em relação ao ator.
b) A discordância entre pares: a existência de visões dissonantes entre dois ou
mais “professores”.
c) A presença de uma autoridade rival.

Em relação à proximidade, Milgram simulou uma variação na qual o cientista dava


ordens por telefone de outra sala. Neste caso, a taxa de obediência até o choque letal
caía para apenas 21%. Alguns voluntários chegavam a aplicar choques menores do que
o determinado, enquanto outros afirmavam aplicar os choques quando na verdade não

Capítulo 2 O fator humano como chave para a boa governança empresarial 


os aplicavam (curiosamente, quando o cientista retornava à sala, os voluntários voltavam
a aplicar os choques). Milgram concluiu que “os voluntários parecem ser capazes de
resistir mais facilmente às ordens do cientista quando não têm que confrontá-lo frente
a frente... a presença física da figura da autoridade é uma força importante”.
Em relação ao segundo aspecto, introduziu-se uma variante com três “professores”,
sendo um deles o voluntário da comunidade e os dois outros atores. Ao chegar a 150V,
o primeiro ator alegava discordância do método, retirando-se do experimento. Ao
alcançar 210V, o segundo ator também deixava o experimento, deixando o voluntário
sozinho. Neste caso, apesar da ordem do cientista para que ele fosse adiante, as taxas de
obediência até o choque final caiu para cerca de 30%. Milgram observou que “os efeitos
da dissonância de pares são muito impressionantes, minando a autoridade do cientista”.
A terceira variante gerou os resultados mais interessantes. Nela, havia dois
cientistas com roupas idênticas, da mesma idade e altura. Ao chegar a 150V, um
deles passava a discordar do outro, alegando que o estudo não deveria prosseguir. De
forma impressionante, a taxa de obediência após 150V caiu para 0%! Logo, quando
inseridos no meio de uma discussão entre duas autoridades rivais, os voluntários
recobravam a racionalidade, deixando de aplicar choque elétricos na vítima. Mil-
gram observou que “nenhum indivíduo optou por continuar aplicar os choques,
e o experimento foi totalmente interrompido. Autoridades com visões diferentes
claramente fomentam o pensamento independente nas pessoas sujeitas a elas.”
As variantes dos estudos de Milgram reforçam a importância de alguns mecanismos
de governança para os conselhos de administração. Em relação à questão da proximidade,
a realização de reuniões regulares sem presença de executivos e a instalação de comitês do
conselho apenas com membros independentes deixaria os conselheiros mais livres para
72

exercer seu livre arbítrio. Com isso, visões dissonantes não seriam recebidas como atos de
“deslealdade” para com o líder empresarial. Reforça-se também a necessidade de maior
proximidade entre conselheiros e acionistas, via assembleias ou encontros regulares. Na
medida em que os conselheiros percebessem o “acionista” como um ente menos abstrato e
anônimo, passariam a ter uma propensão maior a levar em consideração seus interesses (de
forma similar à redução da obediência quando os voluntários ficavam próximos do ator).
Em relação à discordância entre pares, reforça-se a necessidade de uma proporção
maior de conselheiros de fato independentes, levando em consideração não apenas
eventuais laços financeiros, mas principalmente potenciais laços pessoais com
executivos e controladores.
Finalmente, tem-se a questão central da presença de uma liderança inde-
pendente no conselho que sirva de contrapeso ao líder da empresa. Esta figura
poderia representar uma autoridade rival positiva, induzindo a debates mais
ricos e críticos.
Os experimentos de Milgram mostram como a governança corporativa deve ser
vista não apenas como um conjunto de mecanismos para aumentar a lealdade das
pessoas para com a organização, como também para evitar os problemas decorrentes
da lealdade excessiva a figuras poderosas nas organizações.
Governança corporativa: o essencial para líderes 
Capítulo 3
Quais são os elementos centrais
de um bom modelo de governança?

No capítulo anterior, mostramos como a compreensão das motivações e limitações


humanas constitui o elemento central para a criação de um contexto organizacional que
fomente a boa governança no dia a dia.
O foco no fator humano, por sua vez, deve ser complementado por um bom “modelo
de governança”, isto é por uma infraestrutura composta por órgãos, áreas e regras que
proporcionem um sistema efetivo de pesos e contrapesos na organização.
Entre os principais elementos de um bom modelo de governança, destacam-se
a assembleia de acionistas ou de sócios, o conselho de administração, os comitês do
conselho, a diretoria executiva, os comitês de gestão, a secretaria de governança ou
do conselho, e as áreas de controle – gestão de riscos, compliance e controles internos. A
figura a seguir apresenta um modelo genérico de governança recomendado pelos códigos
de boas práticas.
74

Figura 3.1 – Modelo genérico de governança corporativa.

Ao longo deste capítulo, detalharemos cada elemento do modelo de governança


acima.

3.1  Assembleia de Acionistas ou Reunião de Sócios


Governança corporativa: o essencial para líderes 

A assembleia de acionistas ou de sócios é a instância decisória máxima da so-


ciedade. Ela tem poder para decidir sobre todos os negócios relativos ao objeto da
companhia, bem como tomar as resoluções que julgar convenientes para sua prote-
ção. Dentre suas competências previstas nos arts. 121 e 132 da Lei das Sociedades
por Ações1, destacam-se a:

• Eleição e destituição dos conselheiros de administração e fiscal (quando ins-


talado).2
• Aprovação da remuneração proposta para os administradores.
• Análise das contas dos administradores e deliberação sobre as demonstrações
financeiras do exercício.3
• Deliberação sobre operações de reestruturação societária (tais como transforma-
ção, fusão, incorporação e cisão), e sobre a dissolução e liquidação da sociedade.
• Deliberação sobre a destinação do lucro do exercício e distribuição de dividendos.
75

• Autorização para emissão de debêntures.


• Aprovação de aumento ou redução do capital social.
• Deliberação sobre a avaliação de bens a serem usados na formação do capital
social.
• Alteração do estatuto ou contrato social.

Dentro das boas práticas de governança, o principal desafio é tornar a assembleia


de acionistas um evento “vivo”, com participação ativa de todos os sócios. Isso é
particularmente importante, naturalmente, para as companhias que possuem um
número substancial de acionistas, notadamente as de capital aberto.
Há várias recomendações neste sentido. Para começar, a administração deve preparar
o chamado “manual de assembleia”, documento no qual são apresentados os funda-
mentos que justificam o posicionamento dos administradores em relação às propostas
submetidas aos acionistas. Em geral, esses documentos contêm modelos de procuração
para permitir que os acionistas possam votar por meio de terceiros, caso não possam

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


comparecer à assembleia. No dia da assembleia, é importante que todos os diretores
e conselheiros estejam presentes, ficando à disposição para quaisquer esclarecimentos
que se façam necessários. Algumas empresas, por exemplo, chegam a preparar uma
programação completa de dia inteiro para os acionistas, incluindo apresentações de
unidades de negócios por diretores, visitas às instalações e sessões para debate de temas
específicos. No exterior, algumas companhias inclusive transmitem suas assembleias
via Internet. Tudo para estimular a participação dos sócios e fazer com que esse evento
se torne um momento de reflexão organizacional com potencial para agregar valor.

3.2  Conselho de Administração

O conselho de administração é o órgão central de governança da empresa.


Enquanto cabe aos executivos se concentrar nas decisões diárias e no curto prazo,
cabe ao conselho fazer uma leitura correta do ambiente externo e pensar no longo
prazo da organização.
O conselho deve também atuar como um contrapeso da gestão, de forma
a certificar que as “perguntas difíceis” sejam feitas de forma independente e
qualificada, algo particularmente importante nas empresas com uma liderança
forte e inquestionável – tais como aquelas dirigidas por empreendedores. Um
bom conselho deve verificar, por exemplo, se a gestão atua dentro de todos os
regramentos exigidos, sem gerar passivos futuros ocultos para a organização. A
relação com a gestão é uma tarefa delicada que deve ser trabalhada continua-
mente. Além de supervisionar ativamente a direção, cabe também ao conselho
76

manter um relacionamento franco e cordial com os executivos, inclusive para fins


de aconselhamento e recebimento de informações de qualidade sobre o negócio.
Nas empresas com base acionária mais ampla e acionistas distantes do dia a
dia, o conselho possui importância adicional ao monitorar a gestão e mitigar as
inevitáveis situações envolvendo conflitos de interesses. Já nas empresas com elevada
concentração acionária, o conselho deve fazer prevalecer o interesse da companhia
e de todos os acionistas, e não apenas aquele de seu acionista majoritário ou bloco
de controle.
Em última instância, o conselho tem como grande missão atuar como um
guardião dos valores da organização, promovendo a criação sustentável de valor de
forma a assegurar sua perenidade e sucesso no longo prazo.

O conselho no processo decisório da alta gestão:

O processo decisório da alta gestão pode ser dividido em quatro etapas: 1)


geração de propostas ou oportunidades de negócios; 2) avaliação e escolha das
propostas a serem implantadas; 3) execução das propostas aprovadas; e, 4) moni-
toramento dos resultados alcançados, com definição de recompensas ou punições.
O conselho se insere neste processo a fim de evitar que uma única pessoa
seja responsável por gerar propostas, aprová-las, implementá-las e avaliar seus
resultados – algo que, mais cedo ou mais tarde, levaria a decisões potencialmente
desastrosas.
Especificamente, cabe ao conselho analisar, de forma independente, as propostas
geradas e, ao final, estabelecer as devidas recompensas ou punições com base nos
Governança corporativa: o essencial para líderes 

resultados obtidos. Aos executivos, por sua vez, cabe identificar as oportunidades
de negócios e – uma vez submetidas ao crivo do conselho – implantá-las. A figura
a seguir descreve o papel do conselho de administração no processo decisório da
alta gestão.

O papel do conselho de acordo com a Lei

Embora o conselho de administração seja obrigatório apenas para companhias


de capital aberto e sociedades de economia mista, recomenda-se fortemente que a
lideranças fomentem a criação do conselho de administração em suas organizações,
como forma de aprimorar seu processo decisório e modelo de governança. Em caso
de constituição nas sociedades anônimas fechadas, o conselho deverá atender aos
requisitos estabelecidos pela Lei das Sociedades por Ações.4 Em seu art. 142, a lei
estabelece as seguintes competências para o órgão:
77

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


Figura 3.2 – O papel do conselho de administração no processo decisório
da alta gestão.
Fonte: Adaptado de Fama, Eugene e Jensen, Michael. “Separation of Ownership
and Control”. Journal of Law and Economics. 1983.

I. Fixar a orientação geral dos negócios da companhia;


II. Eleger e destituir os diretores da companhia e fixar-lhes as atribuições,
observado o que a respeito dispuser o estatuto;
III.   Fiscalizar a gestão dos diretores, examinar, a qualquer tempo, os livros e
papéis da companhia, solicitar informações sobre contratos celebrados ou
em via de celebração, e quaisquer outros atos;
IV.  Convocar a assembleia-geral quando julgar conveniente;
V. Manifestar-se sobre o relatório da administração e as contas da diretoria;
VI.   Manifestar-se previamente sobre atos ou contratos, quando o estatuto
assim o exigir;
VII. Deliberar, quando autorizado pelo estatuto, sobre a emissão de ações ou
de bônus de subscrição;
78

VIII. Autorizar, se o estatuto não dispuser em contrário, a alienação de bens do


ativo não circulante, a constituição de ônus reais e a prestação de garantias
a obrigações de terceiros;
IX.  Escolher e destituir os auditores independentes, se houver.

A lei, portanto, atribui ao conselho um papel estratégico (inciso I), de monito-


ramento e seleção de executivos (incisos II e III), de deliberação sobre a estrutura
de capital da companhia (incisos VII e VIII), e de relacionamento com os auditores
independentes (incisos VII). Ela também deixa claro, em seu art. 140, que o conse-
lho é um órgão de deliberação colegiada (e não individual). Logo, não deve haver
qualquer hierarquia ou peso diferenciado entre os votos dos conselheiros de adminis-
tração, incluindo seu presidente.

O papel do conselho de acordo com as melhores


práticas de governança

O papel do conselho, dentro das boas práticas de governança, vai muito além
das exigências legais. No Brasil, o órgão era percebido inicialmente como um fórum
de discussão de questões frouxamente definidas como “estratégicas”. Já no exterior,
notadamente nos países anglo-saxões, enfatizava-se o monitoramento dos executivos
como grande atribuição do conselho. Como o passar dos anos, o papel do conse-
lho ampliou-se em todo o mundo, passando a contemplar duas outras dimensões
relevantes – a qualidade das informações divulgadas para os públicos externos e a
formulação e cumprimento das políticas corporativas.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

O resultado do processo de ampliação dos papéis do conselho é que há atualmen-


te uma expectativa social muito grande em relação ao órgão. De um lado, espera-se
que o conselho se dedique às atividades de controle, via monitoramento da gestão e
geração de relatórios de qualidade para os públicos externos. Do outro, espera-se que
os conselhos contribuam de forma efetiva para melhorar o desempenho do negócio,
por meio da tomada das decisões estratégicas e da aprovação e acompanhamento das
políticas corporativas. A figura a seguir descreve as dimensões de atuação do conselho
de administração de acordo com as boas práticas de governança, detalhando suas
atividades dentro de cada uma delas.
Conforme observado na figura acima, o conselho deve dividir seu tempo entre
atividades de controle e a tomada de decisões a fim de melhorar o desempenho
do negócio. A divisão ideal entre controle e desempenho dependerá naturalmente do
perfil de cada negócio e do estágio de vida da empresa. O importante é que o conse-
lho não perca de vista os múltiplos papéis que dele se espera atualmente, nem que
se concentre excessivamente em apenas uma dimensão de atuação.
79

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


Figura 3.3 – Dimensões de atuação do conselho de administração de acordo
com as boas práticas.
Fonte: Adaptado de Tricker, Bob. Corporate Governance: Principles, Policies and
Practices. Oxford University Press. 2009.

# Temas-chave Um conselho de administração efetivo deve:


Assegurar que a organização adote a estratégia
1 Estratégia
adequada.
Assegurar que os executivos identifiquem e respondam,
2 Gestão de riscos
de forma apropriada, aos riscos aos quais está exposta.
Zelar para que os valores e princípios éticos estejam
3 Caráter ético na alta gestão sempre presentes no dia a dia e nas decisões de
negócios.
Assegurar que a empresa adote métricas adequadas
4 Avaliação de desempenho
para avaliação de desempenho.
Avaliar, em profundidade, as premissas adotadas em
5 Investimentos matérias relativas a aquisições e projetos de inves-
timento.
Promover um sistema de incentivos adequado, plano
6 Remuneração e Sucessão
sucessório de lideranças e ambiente meritocrático.
Assegurar que as informações financeiras e não
Transparência e Comunica-
7 financeiras para os públicos externos sejam de elevada
ção
qualidade.

Tabela 3.1 – Sete objetivos centrais de um conselho efetivo


80

Para alguns críticos, o aumento da expectativa de atuação dos conselhos é simples-


mente irrealista, tendo em vista que o órgão em geral se reúne de 6 a 12 vezes por ano
e que a maioria dos conselheiros dedica um baixo número de horas à organização.
Independentemente deste debate, é consenso, sob a ótica das boas práticas de
governança, que um conselho de administração efetivo deve perseguir ao menos
sete objetivos centrais, descritos na tabela a seguir:

Qualificações desejáveis de um bom conselheiro

Um conselheiro “ideal” deve possuir quatro atributos principais: independência in-


telectual, qualificação técnica, tempo para se envolver com a organização e integridade.
O primeiro atributo diz respeito à capacidade do conselheiro colocar o interesse
da empresa sempre em primeiro lugar, mesmo em situações nas quais haja conflito
entre o interesse coletivo da sociedade e os interesses particulares de acionistas con-
troladores, executivos ou mesmo o seu interesse pessoal.
O segundo atributo se refere à qualificação. De acordo com o Código de Me-
lhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC5, o conselheiro deve: i) ser
capaz de ler e entender relatórios gerenciais, contábeis e financeiros; ii) ter noções
de legislação societária; iii) compreender o perfil de risco e o setor de atuação da
organização; iv) ter ciência das melhores práticas de governança; e, v) ter visão
estratégica. Um bom conselheiro deve ter conhecimentos sólidos sobre decisões
de investimento, financiamento, avaliação de desempenho e estratégia, temas que
tendem a ocupar a maior parte da pauta do órgão. Do contrário, sua contribuição
se tornará limitada a questões pontuais de sua especialidade.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

A disponibilidade de tempo constitui o terceiro atributo-chave. Trata-se de um


requisito essencial, haja vista que, sem tempo – por mais brilhante e bem intencionado
que a pessoa seja –, simplesmente não será possível atuar de forma adequada como
conselheiro. É a disponibilidade de tempo que permite a um conselheiro se envolver em
profundidade com a organização. Do contrário, ele ou ela corre o risco de se tornar um
mero “frequentador de reuniões”, dependente das informações e da visão (muitas vezes
tendenciosa) de executivos para sua tomada de decisão. O tempo ideal para a atuação
como conselheiro variará em decorrência de três aspectos principais: as características
da empresa (porte, complexidade das operações, período organizacional de estabilidade
ou transição); o momento do mercado (situação macroeconômica e do setor da em-
presa, ameaça de crises financeiras etc.); e, o papel a ser desempenhado pelo conselho
da empresa em questão (mais intrusivo e monitorador ou mais focado em questões
externas e estratégicas). Como ordem de grandeza, em geral, os conselheiros tendem a
dedicar 20 a 30 dias de trabalho ao ano no exercício de suas funções.
O último atributo, não menos importante, diz respeito à integridade. Tendo em
vista que um dos papéis-chave dos conselhos é estabelecer o chamado “tom ético na alta
81

gestão”, é essencial que os conselheiros sejam exemplares neste quesito. O alinhamento


pleno aos valores da organização, incluindo seu código de conduta, e a capacidade de
analisar os impactos das ações da empresa sobre terceiros (inclusive do ponto de vista
ético), deve naturalmente constituir uma exigência para a eleição dos conselheiros.
Além dos atributos centrais apresentados, merecem destaque outras qualificações
desejáveis de um bom conselheiro, tais como: a experiência como executivo de alta
gestão; a experiência como membro de outros conselhos; a expertise em alguma área
específica de conhecimento útil para a empresa; e, a capacidade de trabalho em equipe.

O conselheiro independente: um personagem


fundamental na governança corporativa

Os conselheiros são categorizados como internos, externos ou independentes. Os


internos são aqueles que atuam simultaneamente como executivos, tais como o

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


próprio diretor-presidente.6 Os externos são aqueles que não são executivos, mas
que possuem alguma relação substancial com eles (tais como laços de parentesco) ou
com os acionistas controladores da empresa, não podendo ser caracterizados como
independentes. Já os independentes são aqueles cujo único vínculo relevante com
a companhia deriva de sua atuação como conselheiro.7
Por não estarem, em tese, sujeitos a conflitos de interesses substanciais, os conse-
lheiros independentes são considerados os mais bem posicionados para tomar decisões
imparciais visando ao melhor interesse de longo prazo da companhia. Como resultado,
a figura do “conselheiro independente” se tornou peça fundamental do movimento da
governança corporativa, e todos os códigos de boas práticas recomendam uma substancial
proporção de independentes nos conselhos (idealmente compondo a maioria do órgão).
Além da ausência de conflitos de interesses, o conselheiro independente é con-
siderado especialmente útil por:

• Poder sustentar suas posições de maneira objetiva, sem compromissos com


stakeholders ou acionistas específicos.
• Trazer uma visão externa descontaminada de fatores emocionais.
• Aportar conhecimento em áreas específicas de interesse da empresa.
• Ampliar a rede de contatos da empresa.
• Contribuir para o processo de aprimoramento das práticas de governança.
• Privilegiar estratégias de médio e longo prazos.

Deve-se destacar, entretanto, que a ausência de vínculos formais com a gestão e com
os controladores não assegura, necessariamente, uma postura independente do conse-
lheiro. Ao menos três outros aspectos devem ser levados em consideração para avaliar
sua independência de fato: a) o tempo no cargo como “conselheiro independente”;
82

b) a existência de relacionamento social prévio com o diretor-presidente ou o acionista


controlador e c) a relevância da manutenção de um bom círculo social para o sucesso
da carreira do conselheiro.
Conselheiros há muito tempo no cargo, que possuam relações sociais com a lideran-
ça da empresa, ou que dependam crucialmente de redes sociais para sua sobrevivência
(algo obviamente característico dos consultores profissionais), tendem a evitar conflitos
com a gestão, minando sua efetividade como conselheiro independente nas situações
onde algum confronto se torna necessário. É importante, portanto, avaliar periodi-
camente a independência dos conselheiros de forma qualitativa, de forma a sempre
contar com conselheiros genuinamente – e não apenas formalmente – independentes.

O presidente do conselho de administração

O presidente do conselho possui um papel fundamental para a eficácia e o bom


funcionamento do órgão. É ele quem deve assegurar que os temas relevantes estejam
presentes na pauta, que os conselheiros recebam informações precisas, completas e em
tempo adequado para as deliberações, e que todos participem ativamente a fim de con-
tribuir ao máximo para a organização. Apesar de não possuir mais poderes que os demais
conselheiros do ponto de vista legal, o presidente deve exercer a liderança do conselho
a fim de assegurar sua independência da gestão diária. Cabe a ele ainda proporcionar a
devida prestação de contas para os acionistas, incluindo a abertura de um canal contínuo
para comunicação. Dentre suas principais atribuições, o presidente do conselho deve:

a) Organizar e coordenar a pauta e a agenda das reuniões do conselho;


b) Assegurar que os conselheiros recebam informações completas e com a
Governança corporativa: o essencial para líderes 

antecedência necessária sobre os itens da pauta;


c) Presidir as reuniões, conduzindo-as de forma a assegurar oportunidades iguais
a todos os conselheiros nos debates;
d) Assegurar que as reuniões mantenham o foco nos itens pautados;
e) Fomentar uma atmosfera de deliberação favorável, permitindo aos dissidentes
consignar votos contrários;
f ) Acompanhar a execução das deliberações e recomendações do conselho;
g) Promover um processo estruturado e regular de autoavaliação do conselho
como órgão colegiado, dos comitês e dos conselheiros individualmente;
h) Elaborar um calendário anual com as datas das assembleias gerais de acionis-
tas, convocá-las e presidi-las;
i) Elaborar o orçamento anual do conselho, submetendo-o posteriormente à
assembleia geral para deliberação;
j) Acompanhar as despesas do conselho vis-à-vis o orçamento do órgão;
83

k) Fornecer aconselhamento ao diretor-presidente quando solicitado;


l) Atuar como um “embaixador” da empresa, em harmonia com a representação
institucional do diretor-presidente.

Dada a importância do presidente e a necessidade de independência em relação à


gestão diária, é essencial que os cargos de diretor-presidente e presidente do conselho sejam
ocupados por pessoas diferentes e sem vínculos diretos entre si (Ex.: relações de parentesco).

3.3  Comitês do Conselho

Os comitês constituem outro elemento importante para aprimorar a atuação do


conselho. O objetivo desses órgãos é fazer com que conselheiros mais especializados
ou interessados em certas matérias tenham mais tempo para se aprofundar em

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


determinados temas, de forma a elaborar recomendações estruturadas para que
o conselho possa tomar decisões melhores. Tratam-se, portanto, de órgãos de as-
sessoramento ao conselho, sem caráter deliberativo. Como maneira de aumentar
a responsabilização e o comprometimento de seus membros, é importante que os
comitês sejam previstos formalmente no Estatuto Social.8
Outra questão importante diz respeito à sua composição. Como seu objetivo
é fazer que com os conselhos funcionem melhor, os comitês devem ser compostos
exclusivamente por conselheiros.9 Esta é a regra vigente em praticamente todo o
mundo, principalmente nos países anglo-saxões como Estados Unidos e Reino Unido.
Entretanto, desenvolveu-se, no Brasil, uma prática de indicar outros personagens
como membros de comitês do conselho, tais como diretores da própria empresa
ou até mesmo executivos que trabalham para aos acionistas controladores. Outra
situação recorrente é a contratação de especialistas externos para atuação nos comitês,
tais como contadores para comitês de auditoria ou consultores de recursos humanos
para comitês de remuneração. Em todos esses casos, ocorre um forte desalinhamento
em relação aos padrões internacionais.
No caso dos especialistas, uma alternativa seria contratá-los como consultores,
convidando-os para algumas reuniões quando necessário. Isso evitaria que sua
presença como membros efetivos ocasionasse uma implícita transferência de res-
ponsabilidade dos conselheiros para os membros externos especializados, uma visão
equivocada – tendo em vista a impossibilidade de delegação das atribuições do
conselho –, mas que tende a ocorrer.
Entre os comitês recomendados pelos códigos de boas práticas, quatro merecem
destaque: auditoria, remuneração, nomeação/governança corporativa e risco. A tabe-
la a seguir descreve as principais atribuições comumente associadas a cada um deles.
84

Comitê do Conselho Principais atribuições


Acompanhar o processo de elaboração das demonstrações financeiras,
incluindo a observância dos princípios contábeis e a supervisão dos
números divulgados ao mercado;
Conduzir o processo de seleção, acompanhamento e avaliação
periódica das atividades e da independência da auditoria externa;
Comitê de Auditoria Supervisionar e coordenar a auditoria interna, incluindo definição do seu
plano anual de trabalho;
Monitorar as situações envolvendo conflitos de interesses, incluindo as
transações com partes relacionadas; e,
Avaliar periódica e formalmente o sistema de controles internos,
emitindo opinião a respeito de sua eficácia.
Conduzir o processo de definição das metas financeiras e não financei-
ras do diretor-presidente e demais executivos-chave;
Elaborar proposta de política de remuneração10 da diretoria, vinculan-
do-a a resultados de curto, médio e longo prazos;
Avaliar periódica e formalmente o desempenho do diretor-presidente;
Comitê de
Supervisionar o planejamento sucessório das posições-chave da em-
Remuneração,
presa, principalmente dos cargos de direção;
Recursos Humanos
ou de Pessoas Coordenar o processo de seleção e indicação do diretor-presidente,11
além de opinar sobre o processo de seleção dos demais diretores;
Subsidiar o conselho nas decisões sobre políticas e normas de pessoas; e,
Supervisionar a eficácia do processo de atração e retenção de talentos
da organização, inclusive no que concerne a executivos com alto
potencial.
Recomendar a composição dos comitês de assessoramento do conselho;
Conduzir um processo formal e periódico de avaliação do conselho
como órgão, dos comitês de assessoramento e dos conselheiros
individualmente;
Recomendar ao conselho mudanças em seu tamanho, composição e
funcionamento, vis-à-vis as melhores práticas de governança;
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Comitê de
Nomeação e Coordenar o processo de seleção de conselheiros independentes,
Governança incluindo avaliação de potenciais candidatos;
Corporativa Zelar pelo cumprimento do código de ética e conduta, de forma a
assegurar que o negócio seja conduzido em conformidade com as leis
aplicáveis;
Acompanhar as atividades do canal de denúncias; e,
Zelar pela adoção das boas práticas de governança na organização,
analisando a eficácia de seus processos e possibilidades de melhoria.
Avaliar e aprimorar continuamente as práticas de gestão de riscos,
incluindo aqueles de natureza estratégica, operacional e de mercado;
Analisar, em conjunto com a Diretoria, os diversos tipos de riscos aos
quais a organização está exposta e os procedimentos adotados a fim
de minimizá-los;
Comitê de Risco
Supervisionar as atividades de compliance em relação aos riscos-críticos
identificados; e,
Avaliar os sistemas de controles internos relacionados aos aspectos
financeiros, contábeis, legais, operacionais, de mercado, ambientais
e de sucessão.

Tabela 3.2 – Principais atribuições dos comitês do conselho


de administração
85

Dentre os comitês expostos na tabela anterior, o comitê de auditoria recebe


destaque nas recomendações dos códigos de governança de todo mundo. Como
exemplo de sua relevância, sua criação faz parte dos requisitos para listagem
na bolsa de Nova York desde 1977, bem como se exige sua implantação pelas
companhias estrangeiras que desejem negociar seus papéis na bolsa norte-ame-
ricana. 12 No Brasil, a CVM 13 editou, no final de 2011, uma instrução que
permite a manutenção da mesma empresa de auditoria independente por até
dez anos, caso as companhias optem por implantar um comitê de auditoria
estatutário.14
Além dos comitês descritos na tabela, algumas empresas brasileiras optaram por
constituir comitês com outras finalidades ao longo dos últimos anos, tais como os de
estratégia, sustentabilidade, ética, finanças e investimentos. É importante enfatizar
que os comitês do conselho devem funcionar “para valer”, isto é, para agregar valor
à organização, não devendo ser criados apenas com o intuito de adequar a empresa
às recomendações prescritas pelos códigos de governança.

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


3.4  Conselho Fiscal

O conselho fiscal é um órgão previsto na legislação brasileira que pode ser


instalado a pedido de acionistas que representem um percentual mínimo das
ações.15 Seus membros são eleitos em assembleia geral, não possuindo qualquer
vínculo com os administradores nem relação hierárquica com os demais órgãos
da companhia.
Conforme sua própria denominação, o conselho fiscal possui atividades emi-
nentemente fiscalizatórias, sem poder para opinar sobre as decisões de negócios
tomadas pelos administradores em seu curso normal de ação. Entre suas atribuições
definidas pela lei, destacam-se a:

a) Fiscalização dos atos dos administradores e a verificação do cumprimento


dos seus deveres legais e estatutários;
b) Elaboração de um parecer sobre o relatório anual da administração;
c) Elaboração de uma opinião sobre determinadas propostas dos órgãos da
administração a serem submetidas à assembleia geral;
d) Análise e elaboração de uma opinião sobre as demonstrações financeiras
elaboradas pela companhia;
e) Denúncia aos órgãos de administração ou à assembleia geral dos erros, fraudes
ou crimes que descobrir.16
86

3.5  Diretoria Executiva

A diretoria tem como missão comandar as operações diárias da empresa visando a


assegurar sua perenidade e alcançar os objetivos estratégicos definidos pelo conselho
de administração. Cabe a ela representar a sociedade, zelar por seus valores e promover
o objeto social dentro das regras estabelecidas pelo estatuto e políticas internas.
Embora, geralmente, tenha como foco obter retorno financeiro para os acionis-
tas, a diretoria deve levar em consideração os interesses das demais partes interes-
sadas em suas decisões, bem como administrar as relações entre todos os públicos
de interesse da empresa. Os altos executivos devem liderar os colaboradores pelo
exemplo, criando um ambiente genuinamente ético e meritocrático na organização.
É essencial que haja coesão e ampla comunicação entre os líderes de cada di-
retoria, evitando a formação de feudos. Apesar de terem autonomia para decisões
diárias de suas áreas, recomenda-se que as decisões mais importantes sejam tomadas
pela diretoria como órgão colegiado, de forma a assegurar um debate rico e a correta
mensuração dos impactos sobre as outras áreas da companhia. Entre as principais
atribuições da diretoria executiva como órgão, destacam-se:

a) Elaborar e propor iniciativas, planos de negócios, orçamento anual e políticas


para o conselho;
b) Prevenir situações sujeitas a conflito de interesses, fazendo prevalecer o in-
teresse da organização;
c) Realizar a contratação, dispensa e definição da remuneração dos níveis gerenciais;
d) Implementar um sistema periódico e estruturado de avaliação para os níveis
Governança corporativa: o essencial para líderes 

gerenciais;
e) Elaborar planos de sucessão para o corpo executivo;
f ) Administrar o nível de risco aceitável do negócio estabelecido pelo conselho,
identificando, mensurando e gerenciando os riscos, aos quais a empresa está
exposta;
g) Propor e implementar sistema de controles internos e de informação que
assegurem adequada confiabilidade de gestão, incluindo políticas e limites
de alçada;
h) Assegurar que as atividades empresariais sejam conduzidas de forma ética e
dentro da lei;
i) Respeitar as diretrizes de governança corporativa e as políticas corporativas,
assim como monitorar sua observância em toda a organização; e,
j) Prestar contas ao conselho de administração e à assembleia de acionistas ou
sócios.
87

O diretor-presidente possui, naturalmente, o papel de destaque na diretoria


executiva. É ele o responsável pela gestão diária da empresa e pela coordenação
dos diretores, além de atuar como elo entre a diretoria e o conselho e porta-voz
da organização. Em geral, o diretor-presidente possui ascendência sobre os demais
diretores, sendo o responsável por sua avaliação individual de desempenho e pela
indicação de novos diretores para apreciação pelo conselho.
O diretor-presidente também possui um papel-chave na construção da cultura
organizacional. Como principal ponto de referência para todos os executivos e
colaboradores, ele deve liderar pelo exemplo e deixar claro as regras tácitas e explícitas
da organização.
Suas decisões e comportamentos enviam mensagens que reverberam a todo ins-
tante por toda a empresa. A forma como trata os projetos que não deram certo, por
exemplo, pode levar a uma cultura mais ou menos propensa ao risco.
De forma similar, a forma como trata as pessoas que priorizam os resulta-
dos financeiros em detrimento do cumprimento das regras pode levar a uma

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


cultura mais permissiva a atitudes antiéticas. Em última instância, o nível
de meritocracia, motivação e comprometimento das pessoas com o sucesso
coletivo da organização depende em grande medida da forma de liderança do
diretor-presidente.

3.6  Comitês de Gestão

Os comitês de gestão constituem outro elemento importante dentro de um bom


modelo de governança. Tratam-se de órgãos que visam a tomar decisões, a partir
de uma perspectiva multidisciplinar e interdepartamental, sobre temas-chave para
a empresa. Entre os comitês de gestão comumente implantados, destacam-se os
de estratégia, investimentos, novos negócios, novos produtos, ética e compliance,
marketing, política de preços, qualidade, tecnologia da informação, tributário etc.
Além de deliberar sobre temas de sua competência, os comitês de gestão são
úteis por facilitar o fluxo de informações entre diferentes áreas e por alimentar os
diretores com pareceres e pontos de vista sobre matérias a serem deliberadas pela
diretoria executiva.
É importante que os comitês de gestão funcionem de forma regular e formalizada
(incluindo o envio de pauta e documentação com antecedência, circulação de lista de
presença nas reuniões, elaboração de atas etc.), bem como que desenvolvam debates
aprofundados que levem a decisões genuinamente colegiadas.
Caso o diretor-presidente participe dos comitês, deve haver cuidado para que
ele ou ela não monopolize os debates e as decisões do órgão em função de sua
88

ascendência hierárquica sobre os demais membros. Idealmente, a fim de diminuir


sua influência sobre o grupo, ele ou ela deveria ser o último a emitir sua opinião.
Deve-se evitar um número muito elevado de participantes, sob pena dos comitês
adquirirem um caráter de “assembleia” em detrimento da qualidade e profundidade
das discussões entre os membros (em geral, recomenda-se que seja composto por
cinco a nove pessoas).
Assim como em qualquer grupo decisório, deve haver um coordenador res-
ponsável pela condução das reuniões e pelo funcionamento geral do órgão. Acima
de tudo, caberá ao coordenador incentivar o grupo a adotar um espírito crítico,
com espaço para visões e posicionamentos divergentes.
Deve-se também evitar que a maior parte da reunião seja consumida com apre-
sentação de informações (muitas vezes excessivamente detalhadas), em detrimento
do debate franco dos membros sobre temas relevantes.

3.7  Deveres fiduciários e responsabilidade


dos administradores

Independentemente do porte da organização e de sua forma de constituição


jurídica como capital aberto ou fechado, todos os membros de quaisquer órgãos
estatutários de sociedades anônimas – incluindo conselheiros, diretores e outros –
estão sujeitos a determinados deveres gerais e fiduciários estabelecidos em Lei das
sociedades por ações.17
Em primeiro lugar, tendo em vista que seus cargos lhes conferem um poder
Governança corporativa: o essencial para líderes 

irrenunciável, todos estão sujeitos ao chamado “poder-dever de agir”. Isto significa


que esses membros – denominados doravante de administradores – têm o dever
de agir em prol do interesse social quando as circunstâncias assim exigirem,
podendo ser punidos em caso de passividade e opção pelo não exercício de seu
poder.
Além do poder-dever, os administradores possuem outros deveres gerais, tais
como a obrigação de agir de boa-fé, de serem proativos, de colaborarem com os
pares para o interesse coletivo comum, e de se prepararem a fim de tomar decisões
bem informados.
Há ainda diversas vedações. Os administradores não podem, sob qualquer
hipótese, beneficiar determinados acionistas em detrimento de outros, nem tomar
decisões em matérias nas quais tiverem interesses conflitantes com os da sociedade.
Em relação a este último aspecto, vale a pena destacar o que diz o art. 156 da Lei: “É
vedado ao administrador intervir em qualquer operação social em que tiver interesse
conflitante com o da companhia, bem como na deliberação que a respeito tomarem
89

os demais administradores, cumprindo-lhe cientificá-los do seu impedimento e


fazer consignar, em ata de reunião do conselho de administração ou da diretoria, a
natureza e extensão do seu interesse.”
É vedado, ainda, aos administradores – a não ser em caso de autorização
prévia da assembleia ou conselho –, usar em proveito próprio bens ou serviços
da sociedade, receber de terceiros qualquer vantagem em razão do exercício do
cargo, tomar emprestado recursos ou bens da companhia, e praticar doações18 às
custas da empresa.
Além dos deveres gerais e vedações, a lei exige o cumprimento de três deveres
fiduciários fundamentais por todos os administradores: o dever de diligência, o dever
de lealdade e o dever de informar.
O dever de diligência exige que o administrador exerça suas funções e tome
decisões com zelo, cuidado e honestidade, como se estivesse cuidando de seu
próprio negócio. Logo, uma postura de passividade não se adequa à determinação
legal, que exige uma postura proativa, íntegra e cautelosa. Como exemplo, o

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


administrador não pode alegar desconhecer matérias relevantes para a organização
sob o pretexto de não terem sido levadas ao seu conhecimento. Sendo o assunto
relevante, cabe a ele se esforçar a fim de obter as informações necessárias. Im-
plicitamente, o dever de diligência impõe aos administradores, particularmente aos
conselheiros que não atuam no dia a dia da empresa, a necessidade de dedicarem
tempo adequado ao cargo, de serem assíduos e ativos nas reuniões, de acompa-
nharem o desenvolvimento de temas críticos e de questionarem criticamente
as propostas apresentadas. O administrador, em suma, deve tomar decisões de
maneira informada e refletida, evitando se sujeitar a interesses conflitantes com
os da organização.
O dever de lealdade requer que o administrador seja leal acima de tudo à compa-
nhia, agindo sempre no melhor interesse da sociedade, inclusive nas situações em
que existirem outros interesses particulares envolvidos – tais como o seu interesse
pessoal, de familiares ou de acionistas que o elegeram. O dever de lealdade proíbe
que o administrador utilize quaisquer oportunidades de negócios da empresa em
proveito próprio ou de terceiros, incluindo a aquisição, para revenda com lucro, de
bem que a organização pretenda adquirir. Este dever fiduciário requer ainda sigilo em
relação a qualquer informação que ainda não tenha sido divulgada para os públicos
externos, incluindo, naturalmente, a vedação à negociação de papéis da companhia
quando de posse de informações privilegiadas.
O dever de informar, mais aplicável às companhias de capital aberto, exige
transparência do administrador em relação ao número de ações e outros valores
mobiliários da companhia de que seja titular, bem como requer que os acionistas
sejam informados acerca de quaisquer negociações de títulos da companhia reali-
zadas pelo administrador. Cabe ainda, dentro do dever de informar, a obrigação
90

de comunicar, imediatamente, ao mercado, fatos relevantes que possam impactar


o valor percebido da companhia.

Responsabilidade dos Administradores

Compreender os potenciais passivos legais aos quais se está sujeito é um tema


fundamental para qualquer administrador. Afinal de contas, até que ponto suas
decisões ou omissões podem levar a uma responsabilização do ponto de vista pessoal,
incluindo multas, congelamento de bens, suspensões profissionais ou mesmo prisão?
Em primeiro lugar, conforme o art. 158 da Lei das Sociedades por Ações,
o administrador não responde pessoalmente pelos atos regulares de gestão,
isto é, pela conduta nos limites de suas atribuições e sem violação da lei ou ao
previsto no estatuto19: “O administrador não é pessoalmente responsável pelas
obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de
gestão.” Logo, os prejuízos decorrentes dos atos regulares de gestão serão sempre
imputados à pessoa jurídica, que responderá sozinha, sem direito de regresso
contra o administrador.20
Além disso, o § 1° do mesmo artigo deixa claro que o administrador não
será responsável por ações ilícitas de terceiros, a não ser quando for conivente
ou contribuir para a prática do ato. Nos termos da lei: “O administrador não
é responsável por atos ilícitos de outros administradores, salvo se com eles for
conivente, se negligenciar em descobri-los ou se, deles tendo conhecimento, deixar
de agir para impedir a sua prática.” Vale ainda destacar a frase final do mesmo
parágrafo, a qual reitera a importância do administrador registrar formalmente
Governança corporativa: o essencial para líderes 

sua divergência como forma de se eximir totalmente de quaisquer passivos decor-


rentes de decisões tomadas por órgãos colegiados: “Exime-se de responsabilidade
o administrador dissidente que faça consignar sua divergência em ata de reunião
do órgão de administração ou, não sendo possível, dela dê ciência imediata e por
escrito ao órgão da administração, no conselho fiscal, se em funcionamento, ou
à assembleia geral.”
O administrador, entretanto, não está completamente imune de passivos
pessoais. Diversas são as esferas nas quais seu patrimônio pessoal pode ser
envolvido.
Os incisos I e II do art. 158 da lei determinam que ele responderá, “civilmente,
pelos prejuízos que causar, quando proceder: dentro de suas atribuições ou poderes,
com culpa ou dolo; com violação da lei ou do estatuto”, isto é, por atos ultra vires,
que estejam fora de seu escopo de atuação ou que tenham sido praticados com
imprudência, imperícia ou negligência. Ademais, o § 2° do mesmo artigo deixa
claro os riscos decorrentes da omissão dos administradores no cumprimento de
91

seus deveres fiduciários: “Os administradores são solidariamente responsáveis pelos


prejuízos causados em virtude do não cumprimento dos deveres impostos por lei
para assegurar o funcionamento normal da companhia, ainda que, pelo estatuto,
tais deveres não caibam a todos eles.”21
Além da Lei das Sociedades por Ações, o Código Civil22, aplicável a todos os
outros tipos societários23 com destaque para as empresas limitadas, também contém
previsões a respeito da responsabilização dos administradores. No § 2° do art.
1.013, o Código estabelece que “Responde por perdas e danos perante a sociedade
o administrador que realizar operações, sabendo ou devendo saber que estava agindo
em desacordo com a maioria.” Já o art. 1.016 institui que “os administradores res-
pondem solidariamente perante a sociedade e os terceiros prejudicados, por culpa
no desempenho de suas funções”. Por fim, há ainda o art. 1.107, caput, segundo o
qual “o administrador que, sem consentimento escrito dos sócios, aplicar créditos
ou bens sociais em proveito próprio ou de terceiros, terá de restituí-los à sociedade, ou
pagar o equivalente, com todos os lucros resultantes, e, se houver prejuízo, por ele

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


também responderá”.
Além da responsabilidade civil, descrita nos parágrafos anteriores, os adminis-
tradores podem ser responsabilizados nas esferas administrativa ou criminal. No
caso da esfera administrativa, os órgãos reguladores das companhias abertas (CVM
– Comissão de Valores Mobiliários), instituições financeiras (Banco Central) ou
de seguradoras e entidades abertas de previdência complementar (SUSEP – Su-
perintendência de Seguros Privados), podem aplicar penalidades que variam de
advertências e multas até a suspensão ou inabilitação para o exercício do cargo por
período indeterminado.
Na esfera criminal, há diversas previsões legais a respeito da responsabilização
dos administradores. Primeiramente, o art. 177 do Código Penal 24 prevê pena
de reclusão de um a quatro anos ao administrador que “promover a fundação de
sociedade por ações, fazendo, em prospecto ou em comunicação ao público ou
à assembleia, afirmação falsa sobre a constituição da sociedade, ou ocultando
fraudulentamente fato a ela relativo”.25 O § 1° do mesmo artigo detalha ainda
diversas outras situações nas quais a mesma pena é aplicável, incluindo aquela
na qual o diretor ou gerente utilizam recursos da sociedade em proveito próprio,
sem prévia autorização dos acionistas (inciso III) ou que distribuem dividendos
ou lucros fictícios (inciso VI).
Já os arts. 135 e 137 do Código Tributário Nacional26 preveem responsabilidade
pessoal dos diretores, gerentes ou outros representantes de pessoas jurídicas “pelos
créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com
excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos”, assim como
quando ocorrerem infrações “conceituadas por lei como crimes ou contravenções
(...) e que decorram direta e exclusivamente de dolo específico”.27
92

Como os líderes podem mitigar seus potenciais


passivos pessoais

Conforme observado no tópico anterior, não é tarefa fácil ser um administrador


de empresas, particularmente conselheiro ou diretor estatutário. Há muitos riscos
envolvidos, incluindo a possibilidade de responsabilização pessoal nas esferas civil,
administrativa e penal. Abaixo, seguem quatro sugestões úteis a fim de minimizar
os riscos de quaisquer problemas legais. Segui-las é uma forma de você não apenas
evitar passivos futuros, como também ter noites de sono tranquilas durante e após
seu mandato:

1. Compreenda a organização em profundidade antes de tomar posse: ana-


lise os documentos-chave da empresa e outros materiais relevantes de
forma a avaliar os riscos aos quais estará sujeito. Entre os documentos
a serem lidos, destacam-se: acordo de acionistas, estatuto ou contrato
social, políticas corporativas (gestão financeira, investimentos, controles
internos, gestão de riscos etc.), atas das últimas assembleias e reuniões
do conselho, regimentos internos dos órgãos de governança, código de
ética, relatórios anuais, planos de negócios e organogramas, pareceres do
auditor independente e da auditoria interna, sistema de gestão de riscos,
contingências judiciais ambientais, tributárias e trabalhistas, questões
pendentes envolvendo ministério público, tribunal de contas etc. Em
alguns casos, pode ser melhor evitar assumir cargos em sociedades sujeitas
a um risco legal excessivo.
2. Solicite a contratação de um seguro de responsabilidade civil de adminis-
Governança corporativa: o essencial para líderes 

tradores (conhecido como “seguro D&O – Directors and Officers”): o seguro


D&O tem se tornado cada vez mais um pré-requisito para atuação na
alta gestão. Podem ser incluídos, como segurados, não apenas os adminis-
tradores, mas também gerentes e outras pessoas com poder de gestão
para representar a empresa perante terceiros. As principais coberturas
contemplam: débitos tributários, trabalhistas e previdenciários da em-
presa, reclamações de credores contra os segurados, processos movidos
pela própria empresa ou por acionistas contra os segurados, cobertura das
despesas de defesa em processos relativos a possível ato doloso ou culposo
do segurado, reclamações decorrentes da desconsideração da personalidade
jurídica, processos de natureza administrativa de órgãos governamentais
contra os segurados, reclamações em virtude de erros e omissões em serviços
prestados pela empresa etc. A cobertura pode ser extensiva a cônjuges,
herdeiros e representantes legais dos administradores. Por outro lado,
as principais exclusões do seguro D&O são, em geral, as seguintes: atos
93

dolosos, processos criminais, reclamações pré-existentes no momento da


contratação, liquidação, falência ou recuperação judicial, e oferta pública
de valores mobiliários.28
3. Tenha uma conduta ativa no exercício do cargo, procurando deixar evi-
dências deste comportamento: registre sua presença em todas as reuniões
que participar. Antes de deliberar sobre temas críticos para a empresa, ve-
rifique as informações recebidas junto a diferentes fontes. Jamais dependa
exclusivamente de uma única fonte – tais como o diretor-presidente ou o
diretor de determinada área – para formar sua visão sobre matérias mais
relevantes. Converse com os auditores internos e externos regularmente,
bem como com pessoas de diferentes níveis hierárquicos, de forma a
avaliar continuamente o clima ético e o sistema de controles internos da
empresa.
4. Caso possua visão divergente da maioria, faça consignar formalmente
seu voto contrário em ata: para afastar sua responsabilidade em decisões

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


tomadas pelo órgão colegiado que fizer parte, exija o registro em ata de sua
discordância quanto ao teor da deliberação, fundamentando os motivos de
sua divergência. Em caso de recusa, comunique à assembleia de acionistas e
ao órgão regulador seu posicionamento e, se for o caso, o não cumprimento
dos deveres legais dos responsáveis pela deliberação.

3.8  Secretaria de governança ou do conselho


de administração

O secretário de governança, em alguns casos denominado secretário do conselho


ou da companhia, é um elemento fundamental para o funcionamento do modelo
de governança. É ele ou ela quem deve assegurar que as práticas e procedimentos
estabelecidos para os órgãos decisórios ou de assessoramento – conselho, diretoria,
comitês etc. – estão sendo cumpridos adequadamente e revisados periodicamente.
Cabe ao secretário auxiliar os presidentes e coordenadores de comitês em tudo o
que for necessário para o bom funcionamento dos órgãos de governança, incluindo
as atividades exigidas antes, durante e após as reuniões. O secretário também atua
como interface entre os diversos elementos que compõem o sistema de governança
da empresa, proporcionando um bom fluxo de informações entre os órgãos. Isso
pode evitar, por exemplo, a duplicação de debates em diferentes fóruns e a tomada
de decisões fora das alçadas estabelecidas. Entre as atribuições do secretário de
governança, destacam-se:
94

Atribuições do secretário de governança ou do conselho de administração


Auxiliar os coordenadores e presidentes dos órgãos de governança na organização da pauta
das reuniões;
Preparar a convocação das reuniões, dando conhecimento aos membros – e eventuais
participantes externos convidados – do local, data, horário e ordem do dia;
Enviar os materiais pertinentes às reuniões a todos os membros, verificando o efetivo recebimento
pelos destinatários;
Auxiliar na organização das reuniões, incluindo as questões relativas à logística de transporte,
refeições e hospedagem dos membros (caso necessário);
Secretariar as reuniões, apoiando os presidentes dos órgãos em sua condução;
Coletar as assinaturas de todos os membros durante as reuniões (lista de presença), incluindo
a consignação da presença de eventuais convidados;
Elaborar as atas das reuniões, encaminhando-as a todos os membros;
Disponibilizar a ata e a lista de presença para a área jurídica, acompanhando o arquivamento,
se necessário, das deliberações tomadas nos órgãos competentes;
Administrar o calendário anual das reuniões dos órgãos de governança, incluindo a agenda
anual de temas a serem debatidos;
Atender às demandas dos membros dos órgãos de governança, incluindo a busca por
informações adicionais que se façam necessárias para deliberações;
Auxiliar os presidentes e coordenadores dos órgãos na realização da autoavaliação anual
de desempenho do órgão;
Administrar as informações disponibilizadas em um portal de governança da empresa.

Tabela 3.3 – Secretaria de governança: rol de atribuições

Conforme observado pelo rol de suas atribuições, o secretário atua como um


verdadeiro guardião do bom funcionamento da alta gestão e das boas práticas
de governança, fiscalizando sua aplicação no dia a dia. Tendo em vista seu papel
Governança corporativa: o essencial para líderes 

crítico para a organização, é fundamental que o secretário tenha um perfil que


inclua maturidade pessoal, elevada organização profissional e independência
intelectual.

3.9  Gestão de riscos

O velho adágio diz que “sem risco, não há retorno”. Como qualquer decisão com
consequências futuras envolve incertezas, todas as empresas estão continuamente
expostas aos mais diferentes tipos de riscos.29
O objetivo das lideranças não deve, portanto, ser a eliminação dos riscos, mas sim
a criação de um processo interno que permita administrar as incertezas do ambiente
empresarial. Ao tomar ciência dos riscos aos quais a organização está sujeita e do
seu potencial impacto, a alta gestão passará a se concentrar não apenas na geração
95

de retorno financeiro, mas, principalmente, na obtenção de um retorno adequado


ao nível de risco incorrido.
Nos últimos anos, cresceu enormemente em todo o mundo, a importância
da “gestão de riscos” como uma das principais responsabilidades dos líderes em-
presariais.30 Há diversas definições e documentos de referência sobre o tema. No
Brasil, merece destaque o “Guia de Orientação para Gerenciamento de Riscos
Corporativos”31 do IBGC. No exterior, merecem destaque as recomendações do
COSO II32 e da ISO 3100033. A tabela a seguir resume a visão desses documentos
em relação ao tema.

Documento Definição da Gestão de Riscos Empresariais


“Processo desenhado para identificar e responder a
eventos que possam afetar os objetivos estratégicos da
organização.
“Guia de Orientação para

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


Gerenciamento de Riscos Suas diretrizes devem ser estabelecidas pelo conselho
Corporativos” – de administração e as ações decorrentes devem ser
implementadas pelos gestores, com o objetivo de prover,
IBGC
com razoável segurança, a realização das metas da
organização a partir de um adequado alinhamento da
estratégia com o seu apetite a riscos.”
“Processo, dirigido pelo conselho de administração,
diretoria ou outros executivos, aplicado em um contexto
estratégico e em toda a empresa, com o objetivo
“Enterprise Risk Management” – de identificar potenciais eventos que possam afetar
COSO II a entidade, bem como gerenciar o risco dentro do
apetite a riscos definido, de forma a promover segurança
razoável em relação ao alcance dos objetivos
organizacionais.”
“Abordagem para assegurar que a empresa está lidando
com todos os seus riscos; conjunto de expectativas entre
gestão, acionistas e conselho acerca dos riscos que a
“Risk Management: empresa irá ou não assumir; conjunto de métodos para
Principles and Guidelines on evitar situações que possam resultar em perdas fora do limite
Implementation” de tolerância da empresa; método para mudar o foco da
empresa de ‘custo/benefício’ para ‘risco/retorno’; forma de
ISO 31000 ajudar o conselho e a diretoria a cumprir com uma de suas
responsabilidades fundamentais; e, uma linguagem para
comunicar os esforços da empresa a fim de se enquadrar
em um perfil de risco adequado.”

Tabela 3.4 – A gestão de riscos segundo os documentos de referência

De acordo com a tabela anterior, gerenciar os riscos empresariais constitui um pro-


cesso de reflexão sistemática e estruturada a fim de identificar, avaliar e responder aos
eventos que possam afetar os objetivos estratégicos da organização. É uma forma de
a alta administração mostrar – por meio do levantamento preventivo, listagem dos
96

riscos, aos quais a sociedade está exposta, e definição das medidas para sua mitigação –
que está cumprindo um de seus papéis fundamentais. Trata-se, portanto, de uma
filosofia de gestão com foco explícito na administração integrada dos diferentes riscos
aos quais a empresa está sujeita.

Doze etapas para implantar um processo efetivo


de gestão de riscos em sua organização

Uma vez compreendido seu conceito, o próximo passo consiste em implantar


um processo efetivo de gestão de riscos na organização. Esse trabalho, aplicável a
empresas de qualquer porte, pode ser resumido em 12 etapas:

1.  Definição do grau de apetite e da tolerância a riscos


da organização

O primeiro passo consiste em uma reflexão da alta gestão a fim de definir os


limites de risco aos quais a empresa estará sujeita. É fundamental definir o grau de
“apetite a riscos” da organização, isto é, o total de risco que os acionistas estarão
dispostos a aceitar para perseguir os objetivos estratégicos definidos. O apetite a
riscos possui relação direta com a estratégia e com a forma pela qual a empresa
atua no mercado. Como exemplo, se a sociedade possuir metas estratégicas agres-
sivas, então ela deve estar disposta a ter um apetite a riscos compatível. Deve-se
também definir claramente a chamada “tolerância a riscos” da organização, isto é,
Governança corporativa: o essencial para líderes 

o nível de volatilidade que a empresa estará disposta a aceitar nos seus indicadores
de desempenho.
Esta etapa inicial, fundamental para o sucesso da gestão de riscos, deve ser
resultado de um debate profundo e estruturado entre as principais lideranças. Nele,
devem ser feitas perguntas do tipo:

Que nível de risco estamos dispostos a aceitar na busca por nossos objetivos?
Nossos acionistas querem um negócio de alto risco e alto retorno ou preferem
um negócio mais conservador, com fluxos de caixa mais estáveis?
Como desejamos ser percebidos pelo mercado em relação aos riscos de nosso
negócio, inclusive em relação ao risco de crédito?
Quanta volatilidade estamos dispostos a aceitar no nosso lucro líquido, incluindo
os impactos sobre o pagamento de dividendos?
Estamos preparados para aceitar prejuízos financeiros pontuais mais vul-
tosos?
97

2.  Identificação dos principais riscos aos quais


a organização está exposta e classificação de acordo
com sua natureza
A próxima atividade compreende o levantamento dos principais riscos internos
e externos aos quais a empresa está exposta, classificando-os de acordo com sua
natureza. Há muitas categorizações possíveis para os riscos. Em geral, eles podem
ser tipificados como estratégicos, operacionais ou financeiros. Os riscos estratégicos
são aqueles que derivam de mudanças no ambiente de negócios ou de decisões es-
tratégicas tomadas pelas lideranças. Os riscos operacionais são aqueles enfrentados
no dia a dia da organização, geralmente associados às pessoas e aos sistemas de in-
formação e controle. Os riscos financeiros, por sua vez, correspondem a mudanças
macroeconômicas ou a problemas que possam afetar a solvência da empresa. A tabela
a seguir detalha cada um deles.

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


Natureza do Risco Categorias Exemplos de riscos
Risco de mudança no Mudança de leis e de programas
ambiente regulatório governamentais, mudanças tributárias.
Entrada de novos concorrentes, alianças
Risco de mudança no
entre concorrentes, acirramento da
ambiente competitivo
guerra de preços.
Problemas com aquisições, falha na
Risco de perda de valor
implantação de grandes projetos,
com investimentos ou novos
problema no desenvolvimento de novos
negócios
negócios.
Risco de mudança no Perda de mercado por falta de inovação
ambiente tecnológico tecnológica, obsolescência tecnológica.
Riscos Estratégicos
Redução na confiabilidade de fornece-
Mudanças no dores ou parceiros, mudanças estraté-
comportamento dos gicas ou acionárias nos fornecedores,
stakeholders mudanças de hábitos de consumo dos
clientes.
Veiculação de notícias negativas sobre
Risco de imagem ou
a empresa, escândalos na mídia, redes
reputacionais
sociais, internet.
Divulgação de informações erradas,
Risco de divulgação de
incompletas ou divulgadas por meios de
informações externas
comunicação inadequados.
Risco de concentração na Falta de diversificação de fornecedores
terceirização de produtos e serviços.
Situações em que os serviços prestados
Risco de terceirização e por terceiros ou parceiros não atinjam os
parcerias requisitos de qualidade esperados ou não
sejam entregues nas datas previstas.

(Continua)
98

Natureza do Risco Categorias Exemplos de riscos


Inobservância, violação ou interpretação
Risco de conformidade
indevida de regulamentos e normas
interna
internas.
Desastres naturais, atentados, greves e
Risco de eventos externos
outros eventos independentes da ação
ou catástrofes
da organização.
Ações não intencionais de pessoas
envolvidas em negócios da empresa,
Risco de falha humana
omissão, distração, negligência ou falta
de qualificação profissional.
Adulteração de controles,
descumprimento intencional de normas,
Risco de fraude
desvio de valores, divulgação proposital
de informações erradas.
Remoção ou perda inesperada de
Risco de indisponibilidade
pessoa-chave de uma posição, sem
de pessoal especializado
substituto imediato.
Riscos
Inadequação da estrutura física, logística
Operacionais Risco de infraestrutura
e tecnológica.
Risco de infraestrutura de Inadequação da estrutura de pessoal
pessoas insuficiente para realizar as atividades.
Ausência de integridade ou falha na
Risco da informação
autenticidade das informações.
Falhas ou inadequação em aspectos
Risco de sistema
lógicos de tecnologia da informação.
Risco de segurança da Quebra de sigilo ou acesso indevido às
informação informações.
Inadequação de contrato, interpretação
Risco contratual das cláusulas e conformidade com a
legislação pertinente.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Risco de contencioso Ações ajuizadas pela empresa ou contra ela.


Inobservância, violação ou interpretação
Risco de conformidade
indevida de leis, regulamentações e
externa
editais de licitação.
Possibilidade da contraparte de uma
Risco de crédito operação não honrar seus compromissos
financeiros.
Incapacidade de saldar seus
compromissos nos prazos acordados ou
Risco de liquidez perdas decorrentes da necessidade de
Riscos Financeiros
venda imediata de ativos para quitar
obrigações.
Movimento adverso no preço de mercado
dos ativos e passivos da empresa, incluin-
Risco de mercado
do mudanças nas taxas de juros, petróleo,
câmbio etc.

Tabela 3.5 – Principais tipos de riscos empresariais


99

O processo de identificação dos riscos aos quais a empresa está sujeita pode ser
feito por meio de entrevistas, questionários, seminários e análise de eventos pas-
sados.

3.  Avaliação dos riscos com base em sua probabilidade


de ocorrência e magnitude do impacto

Uma vez identificados os riscos, a próxima fase consiste em avaliá-los a fim


de definir aqueles considerados prioritários para gestão. Os riscos são geralmente
avaliados com base em dois parâmetros: sua probabilidade de ocorrência e seu
impacto potencial sobre a organização.
Uma prática comum é atribuir uma nota de 1 a 5, em ordem crescente, para
ambos os parâmetros. No caso da probabilidade de ocorrência, os riscos podem
ser classificados como remoto (1), pouco provável (2), possível (3), provável (4)

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


ou praticamente certo (5). No caso da magnitude do impacto, os riscos podem
ser classificados como de impacto insignificante (1), baixo (2), moderado (3), alto
(4) e catastrófico (5). A multiplicação da probabilidade pelo impacto potencial
indicará o nível de priorização do risco para a organização. Em geral, riscos com
pontuação acima de 15 são considerados de alta prioridade. Os com pontuação
de 6 a 15 são considerados de média prioridade, e aqueles com pontuação de 1 a 5
são considerados de baixa prioridade. Esta análise pode ser traduzida visualmente
por meio da construção da chamada matriz de riscos da empresa, conforme a
figura a seguir.

Figura 3.4 – Exemplo de matriz de riscos.


100

4.  Definição do tratamento a ser dado aos principais riscos


do negócio

Após elencar os riscos prioritários, deve-se definir o tratamento a ser conferido


a cada um deles. Há quatro alternativas. Em um extremo, caso o risco seja consi-
derado excessivo em relação ao seu retorno esperado ou desalinhado dos objetivos
organizacionais, pode-se simplesmente optar por evitá-lo. Neste caso, pode-se optar
pela descontinuidade de produtos, venda de unidades de negócios, contratação de
seguro etc.
Em outro extremo, caso o risco faça parte das competências essenciais da empresa
e possua retorno adequado em relação ao risco incorrido, pode-se optar simples-
mente por aceitá-lo. Neste caso, devem-se criar indicadores para seu monitoramento
contínuo (maiores detalhes adiante), bem como procurar adotar proteções (hedges)
naturais – tais como exportações para contrabalançar insumos importados – a fim
de minimizá-lo.
As duas outras alternativas consistem em reduzir a exposição ao risco ou
em compartilhá-lo. No primeiro caso, pode-se optar pela diversificação das
atividades e imposição de limites operacionais. No caso do compartilhamento,
podem-se realizar parcerias, terceirizar ou celebrar contratos que proporcionem
hedge financeiro por meio de derivativos. Em todos os casos, é importante
definir faixas de tolerância quantitativas e qualitativas a serem observadas e
monitoradas.

5.  Estruturação organizacional da área de gestão


Governança corporativa: o essencial para líderes 

de riscos

As atividades de gestão de riscos devem ser coordenadas por uma estrutura


organizacional mínima. Primeiramente, é fundamental que as lideranças do primeiro
escalão se envolvam ativamente com o tema.
Uma prática comum é criar um comitê de risco, órgão responsável em última
instância pela implementação da gestão de riscos na empresa. Idealmente, esse
comitê deve ser composto pelo diretor-presidente, diretor financeiro, gestor de
riscos e principais executivos responsáveis pelos riscos nas unidades de negócios.
Entre as atribuições típicas desse comitê, destacam-se: a) a identificação, avaliação
e monitoramento contínuo dos principais riscos organizacionais; b) a integração da
gestão de riscos ao processo de decisão cotidiano, incluindo ações de aculturamento;
c) a proposição de diretrizes e da estratégia corporativa para a gestão de riscos; d) a
aprovação dos procedimentos para administração dos riscos; e) a elaboração de um
relatório anual sobre as atividades de gerenciamento de riscos e f ) a comunicação
sistemática junto ao conselho de administração.
101

Assim como todos os demais órgãos de governança, é fundamental a dedicação de


tempo e a participação ativa de todos os membros – principalmente os diretores – a
fim de assegurar o bom funcionamento do comitê. Reuniões mensais e apresentações
no mínimo trimestrais ao conselho de administração são práticas bem-vindas.
Outro elemento organizacional central é a figura do gestor de risco. Em alguns
casos, dependendo do porte da organização e da complexidade de seus riscos, este
profissional adquire status de diretor, sendo conhecido no mercado como chief risk
officer (CRO).
Trata-se de um profissional dedicado integralmente ao processo de gerencia-
mento de riscos da empresa. Cabe a ele, entre outras atividades: a) avaliar de forma
contínua e estruturada os riscos mais relevantes da organização e seu impacto no
fluxo de caixa; b) estimar o efeito de novos investimentos no perfil de risco da em-
presa; c) promover eventos e treinamentos a fim de disseminar a cultura de riscos
na organização; d) centralizar informações e comunicação sobre o tema e e) elaborar
relatórios periódicos para o comitê de risco e para o conselho contendo análises

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


qualitativas e quantitativas dos riscos identificados.
Conforme mencionado no início deste capítulo, o conselho também possui um
papel-chave para assegurar um gerenciamento efetivo dos riscos organizacionais.
Cabe a ele supervisionar continuamente as iniciativas dos executivos relativas ao
tema, bem como verificar o cumprimento da política de gestão de riscos (detalhada
no item a seguir). Em alguns casos, pode-se inclusive constituir um comitê de
risco no âmbito do conselho, o qual deverá naturalmente ter papel distinto e com-
plementar ao comitê de riscos da gestão.

6.  Elaboração dos procedimentos de controle


para os principais riscos identificados

A elaboração de procedimentos de controle é uma atividade central na implan-


tação da gestão de riscos. Seu objetivo é assegurar respostas organizacionais efetivas
aos riscos considerados críticos para o negócio, minimizando sua probabilidade de
ocorrência e possíveis impactos.
Entre outras coisas, deve-se: identificar as áreas e processos da empresa corres-
pondentes a cada risco crítico; definir os responsáveis pelo gerenciamento dos
riscos; criar modelos de documentos (templates) a serem adotados e mecanismos
de tecnologia da informação (TI) para seu monitoramento; estabelecer regras para
revisão periódica e auditoria dos riscos; e, determinar os procedimentos a serem
deflagrados (políticas e planos de contingência) em caso da ocorrência de eventos
de risco.
Ao final, a alta gestão deve ser capaz de responder positivamente a perguntas do
tipo: Temos controles adequados para mensurar nossa exposição? Nossos relatórios
102

gerenciais facilitam a identificação, mitigação e monitoramento dos riscos? Nossos


sistemas de TI são adequados?

7.  Definição de um conjunto de indicadores-chave


de risco (KRIs – Key Risk Indicators)

Tão importante quanto possuir planos de contingência em caso de materialização


dos riscos, é dispor de um painel de controle com indicadores que sinalizem de
forma antecipada às lideranças a iminência da concretização dos principais riscos
organizacionais. Esses indicadores são chamados de indicadores-chave de risco
(KRIs – Key Risk Indicators).34 Seu objetivo é permitir aos executivos atuarem de
forma proativa em relação aos riscos, antecipando-se a eles.35

8.  Elaboração da política de gestão de riscos

As diretrizes relativas ao gerenciamento dos riscos da organização devem ser


formalizadas em uma “política de gestão de riscos”. Trata-se de um documento
recomendado pelos principais códigos de governança, já que permite ao mercado
entender as diretrizes da empresa em relação ao tema. Entre os aspectos a serem
considerados na sua elaboração, destacam-se: a) o racional da organização para
administração dos riscos; b) a relação entre os objetivos estratégicos da empresa
e sua política de gestão de riscos; c) a estrutura organizacional e os responsáveis
pelas etapas do processo de gestão de riscos; d) a estrutura conceitual e os processos
Governança corporativa: o essencial para líderes 

utilizados para a gestão dos riscos; e) os limites para as operações com derivativos
e outros instrumentos de administração dos riscos; f ) a classificação dos riscos e a
matriz de riscos da empresa; g) os parâmetros para avaliação do desempenho da
área de gestão de riscos; h) a forma de reporte periódico da área e suas interfaces
com diretoria e conselho; i) os mecanismos a fim de assegurar o aculturamento
interno e a revisão periódica dos processos de gestão de riscos. É fundamental que
o conselho não apenas aprove essa política, mas que supervisione ativamente seu
cumprimento pela diretoria.

9.  Realização de ações de aculturamento


e conscientização

É fundamental realizar treinamentos e outras ações de aculturamento a fim


de criar uma cultura orientada a riscos na organização. Afinal, de nada adiantará
103

todo o mapeamento e formalização dos riscos se as pessoas na ponta – executivos


e funcionários – não compreenderem plenamente o tema e sua importância para
o sucesso da empresa.
Trata-se de um processo contínuo de conscientização, que visa não apenas a
comunicar o conjunto de políticas e procedimentos relativo à gestão de riscos, mas,
principalmente, enfatizar sua relação com os valores da empresa e com o alcance
dos objetivos estratégicos.
Especificamente, o programa de aculturamento deve ter entre seus objetivos:
a comunicação da visão da empresa sobre a gestão de riscos para todos os escalões
da organização, com linguagem adequada a cada público; a construção de um
pensamento orientado a risco em toda a organização, a fim de fazer que todos
pensem em como identificar riscos, avaliar seus impactos e responder aos riscos
em suas áreas de atuação; e a promoção de um pensamento integrado em relação
aos riscos (Ex.: impacto dos riscos de uma área sobre as atividades e resultados
de outra).

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


10.  Incorporação da gestão de riscos na avaliação
de desempenho e remuneração dos executivos

A gestão de riscos deve ser entendida como uma reponsabilidade de cada execu-
tivo da empresa, e não apenas da área dedicada ao tema. Cabe ao gestor de riscos,
na verdade, proporcionar expertise sobre o tema e assegurar que a agenda da gestão
de riscos está sendo levada adiante de forma estruturada pela organização. Não
cabe unicamente a ele, naturalmente, administrar os riscos do negócio. Para que
todos se sintam responsáveis pela administração dos riscos, é necessário ir além
das atividades de aculturamento. Idealmente, questões relativas à gestão de riscos
devem ser atreladas à avaliação de desempenho dos executivos, com impactos sobre
sua remuneração e perspectivas de promoção de carreira. Isso pode ser feito, por
exemplo, por meio da criação de indicadores de retorno ajustado ao risco, ou pela
avaliação da conformidade do executivo em relação ao grau de apetite e tolerância
a risco definido.

11.  Definição da forma de registro e auditoria


das práticas de gestão de riscos

Durante a implantação, deve-se criar um repositório central com o objetivo de


registrar as atividades do processo de gestão de riscos. Além de decidir sobre o sistema
de informática a ser adotado (há diversos programas dedicados ao gerenciamento de
104

riscos no mercado), deve-se deliberar sobre outros aspectos, tais como os níveis
de acesso, período de retenção dos documentos etc.
Outro aspecto importante é determinar a forma de auditoria ou due diligence
independente da política e das práticas de gestão de riscos. Nesse caso, o objetivo
é verificar se os procedimentos estão sendo cumpridos, se as pessoas estão de fato
cientes das questões relacionadas ao risco nas suas unidades, e se os riscos estão den-
tro dos limites de tolerância definidos pelas políticas da empresa. Adicionalmente,
a matriz de riscos da empresa pode ser utilizada como um elemento na definição
do plano da auditoria interna, levando a uma auditoria com foco nos riscos críticos
da organização.

12.  Elaboração de relatórios periódicos


para a alta gestão

A etapa final consiste na criação de relatórios a serem submetidos periodica-


mente para a diretoria e conselho de administração. Além do reporte para a alta
gestão, recomenda-se que a área ou comitê de riscos elabore um relatório anual de
desempenho de suas atividades, a ser apresentado aos acionistas e demais públicos
de interesse da empresa. O relatório pode ser incluído no Relatório Anual, bem
como disponibilizado na área de relações com investidores do website corporativo.

Benefícios da gestão de riscos e fatores críticos para


seu sucesso
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Há diversos benefícios a serem colhidos pelos líderes que se dedicarem a


promover a implantação de um sistema de gestão de riscos para valer em suas
organizações. Antes de mais nada, trata-se de uma oportunidade de conhecer
melhor os riscos aos quais a sociedade está exposta, permitindo que se identifique
mais rapidamente as oportunidades e ameaças. Além de diminuir a probabilidade
de surpresas negativas, o estabelecimento de uma cultura orientada a riscos permite
a consideração explícita e estruturada das incertezas nas iniciativas de negócio,
o que tende a levar a melhores decisões. Ao final, gera-se maior conforto para
conselheiros e executivos, proteção da reputação da empresa e maior confiança
junto aos stakeholders.
É importante enfatizar, entretanto, que a gestão de riscos só proporcionará esses
benefícios se a lideranças de fato acreditarem que isso agrega valor ao negócio. O
tema não deve ser visto como algo frio e burocrático, mas como um item funda-
mental para o sucesso da organização. Entre os fatores críticos para o sucesso da
implantação da gestão de riscos, destacam-se:
105

a) O comprometimento pessoal dos conselheiros e dos principais executivos da


organização;
b) A participação ativa dos líderes das unidades de negócio;
c) O foco incessante nas atividades de aculturamento e conscientização;
d) A alocação de recursos humanos e tecnológicos adequados;
e) A obrigatoriedade da consideração dos riscos na avaliação de novos negócios
e projetos;
f ) A incorporação das atividades de gestão de riscos nos processos de trabalho
existentes, evitando procedimentos distantes das atividades diárias;
g) A vinculação da gestão de riscos ao processo de planejamento estratégico.

3.10  A importância das áreas de controle


e dos controles internos

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


As áreas de controle são um elemento central a fim de evitar surpresas
desagradáveis e ajudar a promover a boa governança. Isso é particularmente
importante na medida em que a empresa cresce e adquire maior complexidade
organizacional. Apesar do relativo consenso geral em relação a esta afirmação,
muitas empresas continuam a possuir áreas de controle deficientes. Esse paradoxo
acontece devido a dois motivos principais: os custos envolvidos e a percepção
de sucesso do negócio.
Em relação ao primeiro aspecto, é preciso deixar claro que é caro, sem
dúvida, implantar uma infraestrutura adequada de controles. Uma pesquisa
realizada nos Estados Unidos, por exemplo, estimou que, para cada U$1 bilhão
de faturamento, as empresas gastam US$6 milhões apenas em atividades de
compliance.36
Por outro lado, as evidências mostram que é bem mais caro optar por não in-
vestir nos controles. Na mesma pesquisa, constatou-se que cada falha relevante de
conformidade ocorrida com as empresas da amostra resultou em um prejuízo de
cerca de US$81 milhões, valor suficiente para arcar com os custos de compliance
durante 14 anos. É importante destacar que esse montante não inclui perdas ex-
tremas decorrentes de falhas nos controles, tais como as ocorridas com a BP no caso
do vazamento de petróleo em 2009 (prejuízos da ordem de US$42 bilhões até o
momento), com a Societé Générale no caso em que um operador realizou operações
acima de seus limites permitidos em 2008 (prejuízo de US$7 bilhões), e nos casos
envolvendo Sadia e Aracruz em 2008 (perdas de R$ 3,8 bilhões e R$ 6,0 bilhões,
respectivamente).
106

Em relação ao segundo motivo, é bem mais difícil pensar em controles quando


a organização cresce rápido e vem “dando certo”. Nesse momento, nossa tendência
é sempre nos concentrarmos na geração de receitas e nas novas oportunidades es-
tratégicas, deixando a questão dos controles em segundo plano.
O sucesso, portanto, pode ser considerado um dos maiores inimigos da atenção
aos controles, muitas vezes vistos como uma burocracia que toma tempo dos exe-
cutivos e gera custos para a companhia. Deve-se destacar, entretanto, que a análise
de grandes colapsos empresariais associados a problemas de governança deixa claro
que é exatamente na fase de alto crescimento e percepção de sucesso que as empresas
tendem a ficar expostas a graves crises. A tabela a seguir, por exemplo, descreve a
evolução da receita de algumas dessas empresas nos anos imediatamente anteriores
aos seus famosos colapsos.

Evolução da receita nos anos anteriores


Empresa aos problemas de governança

Enron 750% (1996-2000) ∼ 70% ao ano.


WorldCom 660% (1994-1999) ∼ 50% ao ano.
Sadia 48% (2006-2008) ∼ 22% ao ano.
Agrenco 103% (2004-2006) ∼ 43% ao ano.
Panamericano 116% (2004-2007) ∼ 29% ao ano.

Tabela 3.6  Crescimento da receita de empresas que passaram por problemas


de governança
Governança corporativa: o essencial para líderes 

A Tabela 3.6 ilustra o perigo de ocorrerem falhas graves nos controles em perío-


dos de forte crescimento, particularmente após aquisições de outras companhias ou
expansão geográfica para outras regiões e países. Quando a percepção de sucesso é
grande, a tendência à soberba e à sensação de invencibilidade muitas vezes leva os
gestores a “baixarem a guarda” em relação aos controles.
As brechas – incluindo a possibilidade de fraudes – tendem a ser bem maiores
quando a empresa cresce de forma acelerada e sem o devido acompanhamento dos
investimentos nas áreas de controle. Em uma analogia simples, possuir uma Ferrari
sem freios compatíveis com a velocidade do carro é uma receita para o desastre.

Controles Internos

De acordo com o COSO,37 principal referência sobre o tema, controles in-


ternos são “processos, implementados pelo conselho de administração, diretoria
107

e outras lideranças, desenhados a fim de proporcionar segurança razoável em


relação ao alcance dos objetivos operacionais, de reporte e de compliance da
empresa”.
Os objetivos operacionais dizem respeito à efetividade e eficiência das operações
da companhia, incluindo suas metas financeiras e operacionais, bem como a proteção
de ativos contra perdas. Os objetivos de reporte se referem aos relatórios financeiros e
não financeiros publicados pela empresa para seus públicos externos, os quais devem
ser confiáveis, tempestivos e transparentes. Os objetivos de compliance, por sua vez,
são aqueles que se referem à aderência da organização às leis e regulamentações a
ela aplicáveis.
Ainda de acordo com a entidade, os controles internos devem ser compostos
por cinco componentes inter-relacionados:

a) Ambiente de controle: conjunto de padrões, processos e estruturas que servem


de base para a implementação dos controles internos na organização. Exem-

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


plos: código de conduta e valores éticos; filosofia organizacional; estrutura
organizacional; tom ético das lideranças; atuação do conselho e do comitê
de auditoria;
b) Avaliação de riscos: processo dinâmico e iterativo para identificação e ava-
liação dos principais riscos do negócio a fim de alcançar os objetivos orga-
nizacionais;
c) Atividades de controle: ações estabelecidas por meio de políticas e procedi-
mentos que contribuem para assegurar que as diretrizes das lideranças, para
mitigação dos riscos, sejam implementadas adequadamente;
d) Informação e comunicação: a informação tempestiva e de qualidade é neces-
sária para monitorar o funcionamento dos outros componentes da estrutura
de controles internos. Já a comunicação constitui o processo contínuo e
sistemático de obter, fornecer e compartilhar toda informação necessária,
tanto para o público interno quanto para o público externo;
e) Monitoramento: consiste em avaliações contínuas ou periódicas e pontuais
dos componentes da estrutura de controles internos. As avaliações con-
tínuas, construídas no próprio processo de negócio em diferentes níveis
corporativos, fornecem informações imediatas. Já as avaliações periódicas,
tais como aquelas conduzidas por auditorias ou outros agentes, permitem,
ao conselho e à gestão, analisarem riscos ou temas específicos em maior
profundidade.

Há inúmeras modalidades de controles internos. A tabela a seguir descreve os


controles mais comuns implementados no ambiente empresarial:
108

Controle Interno Exemplo


Controle de entrada e saída de funcionários,
Acesso físico clientes e equipamentos em determinados espaços
da organização.
Controle do acesso e do alcance de funcionários ou clientes
Acesso lógico a arquivos eletrônicos e sistemas, bem como instruções e
treinamentos sobre os sistemas aos usuários autorizados.
Delimitação, conferida pela hierarquia ou órgãos de
governança, do campo de atuação do gestor em relação
Alçadas e limites
à aprovação de valores ou assunção de posições em nome
da empresa.
Necessidade de obtenção de assinatura, visto ou log no sis-
Autorizações eletrônicas
tema, para continuidade ou concretização de uma operação
ou manuais
ou transação.
Confronto de informações de origens distintas, com o intuito de
Conciliação
detectar eventuais inconsistências.
Proteção física de equipamentos, inventários, caixa e outros
Controle físico ativos. Contempla também sua contagem e comparação
periódica com o registro dos estoques.
Definição das responsabilidades acerca dos procedimentos da
Delimitação de
empresa, de forma a limitar a ação dos gestores. Não envolve
responsabilidades
valores.
Disponibilização Estabelecimento de um sistema de comunicação efetivo entre
e padronização as áreas, de maneira a assegurar que informações precisas
de informações cheguem a seu destino de forma tempestiva.
Formalização e testes de ações que visam a assegurar
Execução de plano a continuidade de operações que não podem ser
de contingência interrompidas, independentemente da ocorrência de
adversidades.
Realização de manutenção periódica, atualizada e
Manutenção de registros
organizada de registros.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Acompanhamento de atividade ou processo, com o


Monitoramento ou revisão objetivo de avaliar sua adequação às metas e benchmarks
de desempenho de desempenho. Pode ajudar a antecipar mudanças
que possam afetar negativamente a organização.
Formalização de normas internas a fim de padronizar
Normatização interna
e definir limites para a execução das atividades da empresa.
Processamento Verificação da precisão, integridade e autorização das
de informação transações.
Segregação Separação das responsabilidades relativas a atividades
de funções conflitantes, por meio de organograma ou regras.
Organização e manutenção de arquivos de segurança – back
Sistemas Informatizados ups, arquivos de log do sistema, plano de contingência, ações
antipirataria eletrônica etc.
Exercícios a fim de promover aculturamento ou transmitir
Treinamento conhecimento, ampliando a capacitação e a conscientização
interna.

(Continua)
109

Controle Interno Exemplo


Análise dos procedimentos relacionados aos processos
Validação de trabalho visando a validar as informações obtidas na
documentação de operações financeiras.

Tabela 3.7 – Principais modalidades de controles internos

Deve-se destacar que todos os executivos e colaboradores são responsáveis pela qua-
lidade dos controles internos da organização. Cabe a cada um gerar as informações
utilizadas nos sistemas de controles e atuar para que os controles funcionem de forma
efetiva. Em caso de descumprimento dos procedimentos e políticas estabelecidas,
todos são responsáveis por comunicar os problemas imediatamente para as áreas
competentes.

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


3.11  Compliance – em conformidade com as regras
do jogo

Uma expressão aparentemente complicada – mas que representa algo bastante


simples em sua essência – tomou corpo nos últimos anos no mundo empresarial: o
compliance. Trata-se da conformidade da organização a normas externas e internas,
tais como leis, regulamentações e políticas corporativas.
O compliance ganhou maior relevância com o advento da Lei Sarbanes-Oxley nos
Estados Unidos, em 2002, quando várias companhias globais passaram a criar áreas e
procedimentos para cumprir os requisitos da legislação. Com o tempo, muitas outras
regulamentações nacionais e internacionais – relativas a assuntos como corrupção,
lavagem de dinheiro, meio ambiente, insider trading, impostos etc. – começaram a
exigir programas específicos para essa finalidade.
No Brasil, a aprovação da Lei n. 12.846 em 2013, conhecida como Lei
anticorrupção, elevou de vez a importância da estruturação das atividades de
ética e compliance nas empresas como forma de reduzir passivos legais. A lei
determina que as companhias passam a ser responsáveis objetivamente por
atividades ilícitas, respondendo legalmente mesmo que a violação tenha ocorrido
sem intenção ou conhecimento de sua cúpula administrativa. Em seu art. 7°,
a lei prevê ainda que a existência de programas internos, a fim de assegurar
conformidade da companhia às normas, seja levada em consideração para fins
de redução das penas.38
110

Um caso emblemático ilustra a importância do compliance. Em 2008, a


Siemens – empresa alemã com ADRs (American Depositary Receipts 39) nego-
ciados na Bolsa de Nova York – foi acionada pelo Departamento de Justiça
norte-americano por infringir a Lei contra corrupção de agentes governamentais
estrangeiros (FCPA – Foreign Corrupt Practices Act). Segundo os promotores,
a companhia obtinha contratos públicos em países emergentes por meio do
pagamento de propinas, financiadas por fundos fantasmas não contabilizados em
seu balanço. Estima-se que, entre 2001 e 2008, a Siemens desembolsou cerca de
US$1,4 bilhão para ganhar contratos ilegalmente em todo o mundo,40 incluindo
licitações para obras do metrô no Estado de São Paulo, algo divulgado em 2013
pela própria companhia.41 O pagamento de propina, portanto, era visto como
parte integrante do seu modelo de negócios, sendo não apenas tolerado, como
incentivado.
Ao final, a Siemens pagou multas da ordem de US$1,6 bilhão aos reguladores nor-
te-americano e alemão. A empresa também se comprometeu a promover mudanças
estruturais, incluindo: a substituição de todos os seus executivos-chave (incluindo o
diretor-presidente); a realização de investigações internas independentes; e, a criação
de um programa amplo de compliance, totalizando cerca de US$1 bilhão adicional
em custos associados diretamente ao escândalo.
O que era mau exemplo se tornou padrão de referência. Atualmente, a Siemens
possui cerca de 600 funcionários dedicados em tempo integral ao compliance,
subordinados a um diretor-executivo de compliance (chief compliance officer).
Um programa baseado no tripé prevenir–detectar–solucionar foi implementado,
abarcando desde atividades educacionais contínuas até mecanismos independentes
para investigação de suspeitas de delitos. Métricas relativas ao compliance foram
Governança corporativa: o essencial para líderes 

incluídas na política de remuneração variável dos principais executivos. E, mais


importante que tudo, o assunto passou a ser o foco central do novo diretor-pre-
sidente. A delação premiada da companhia junto aos reguladores brasileiros em
2013 – sobre sua participação em um cartel para obras do metrô paulista – pode
ser resultado do processo interno de renovação de suas práticas de negócios e
atividades de compliance.
Apesar de sua importância, ainda são raras as empresas não financeiras que
contam com um programa estruturado de compliance que contemple ações de acul-
turamento e mecanismos de prevenção, detecção e solução de não conformidades
(as instituições financeiras tendem a ser mais avançadas em função de exigências
do Banco Central).
Há diversas formas de se aprimorar a conformidade da empresa aos regramentos
impostos interna e externamente. Abaixo, são apresentadas dez etapas úteis para a
adoção de práticas efetivas de compliance.
111

# Etapa Descrição
Seleção das regulamentações externas a serem
Identificação dos principais cumpridas pelo programa de compliance. Exemplo:
1
regramentos aplicáveis. normas do Bacen e CVM, Lei Sarbanes-Oxley, Lei
12.846/2013 (anticorrupção) etc.
Criação ou ajuste das diretrizes e políticas. Inclui
desde a criação de documentos abrangentes – tais
como código de ética e política para contribuições
políticas – até políticas com exemplos de atitudes
esperadas em situações do cotidiano – tais como
regras para relacionamento com agentes públicos
Elaboração das diretrizes, e consultores de negócio.
2
políticas e normas internas. É fundamental que as regras sejam criadas em
linguagem simples e de forma customizada à
realidade da organização. Ademais, as regras
devem ser bem construídas, isto é, integradas ao
processo diário de trabalho dos colaboradores e sem
burocracias desnecessárias (que tendem a levar ao
seu descumprimento).

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


Definição do executivo responsável pela centralização
das atividades de conformidade. Em alguns casos,
dependendo do porte da empresa e dos riscos
decorrentes de não conformidades, pode-se criar a
figura do diretor de compliance (chief compliance
officer). Inclui também a definição da composição,
Estruturação organizacional funcionamento e atribuições do comitê de compliance
3
da área de compliance. (caso a empresa opte por sua constituição), bem como
a forma de prestação de contas e reporte do gestor de
compliance e do comitê à diretoria e conselho.
É fundamental que sejam alocados recursos humanos,
financeiros e tecnológicos compatíveis com a
importância do tema para a empresa.
Identificação das áreas, funções e unidades sujeitas
a riscos mais relevantes de não conformidade,
levando em consideração a probabilidade de
Avaliação dos principais
ocorrência e os impactos para a organização. No
4 riscos e ameaças de não
caso de empresas que atuam junto ao setor público,
conformidade.
por exemplo, as pessoas envolvidas com o processo
licitatório representam naturalmente um risco crítico
de compliance para a organização.
Realização de treinamentos para executivos e
colaboradores visando a assegurar o entendimento
das políticas vigentes, importância para o sucesso de
longo prazo da organização, penalidades em caso de
descumprimento, e relação com os valores da empresa.
Implantação de ações de
Os agentes de compliance e executivos de unidades
5 treinamento, conscientização
consideradas críticas devem receber treinamento
e comunicação.
específico em maior profundidade.
Adicionalmente, a empresa deve estruturar um
canal de comunicação para esclarecimento
contínuo de dúvidas sobre políticas corporativas e
comportamentos desejados em situações específicas.

(Continua)
112

# Etapa Descrição
Criação de mecanismos para reporte de violações
por funcionários e outras partes interessadas. O canal
deve assegurar a proteção dos denunciantes, bem
Criação de canal de denúncias como investigações independentes das denúncias.
para reporte de violações
6 Deve-se também estruturar uma ouvidoria
por funcionários e outros
stakeholders. independente a fim de receber sugestões e críticas
dos clientes, bem como criar mecanismos a fim de
divulgar, voluntariamente, aos reguladores eventuais,
não conformidades relevantes identificadas.
Monitoramento periódico e Realização de auditorias e due diligence de
7 independente das práticas compliance independentes, principalmente nas
adotadas. atividades consideradas como de maior risco.
Registro e armazenamento da documentação
referente às atividades de compliance, tais como
treinamentos, atas de reuniões do comitê de
compliance, denúncias, investigações, auditorias,
Documentação de todas as punições etc.
8
atividades de compliance.
Inclui também o gerenciamento de todas as normas e
políticas em um repositório central que permita rápido
envio aos envolvidos em caso de atualização de
normas, políticas ou regulamentos.
Integração de questões relativas ao compliance
no processo de avaliação de desempenho dos
executivos, com impactos potenciais sobre a
remuneração e promoção na carreira. Como exemplo,
Incorporação do compliance
9 pode-se definir que eventuais não conformidades
na avaliação dos executivos.
relevantes podem resultar em um fator de desconto
na remuneração, ou mesmo inviabilizar a ascensão
organizacional por determinado período, ainda que o
executivo tenha alcançado suas metas financeiras.
Elaboração de relatórios baseados em medidas
objetivas a fim de permitir que a diretoria e
conselho monitorem o desempenho do programa
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Criação de indicadores para


de compliance. Entre os parâmetros a serem
10 avaliação do programa de
acompanhados, destaca-se: número de treinamentos
compliance.
realizados, número de denúncias, reporte de atitudes
suspeitas, resultados das investigações iniciadas,
punições de órgãos reguladores etc.

Tabela 3.8 – Dez etapas para colocar em prática um programa efetivo


de ética e compliance

Deve-se destacar, entretanto, que pouco valerá o investimento nas dez etapas acima
se as empresas interpretarem o compliance como um conjunto de regramentos frios e
distantes do dia a dia, a serem mantidos sob cuidado de escalões inferiores. A chave
para o sucesso, na verdade, é implantar uma cultura de confiança e integridade com
o engajamento direto da alta gestão, notadamente do diretor-presidente e demais
lideranças.
113

Cabe, às principais lideranças, enviar mensagens diretas e claras sobre a impor-


tância do compliance, de forma que se entenda que o cumprimento das políticas é
parte integrante do negócio e que desvios não serão tolerados. Se os colaboradores
observarem esse comportamento na hierarquia, compreenderão que a necessidade
de seguir as regras é real, e não apenas para satisfazer reguladores da porta para fora.
Outro ponto essencial é a formação de uma cultura de responsabilização pelas
decisões tomadas. A conformidade da empresa para com as regras precisa ser vista
como responsabilidade de cada um, e não da área de compliance, a qual deverá servir
basicamente para proporcionar orientação sobre o tema, centralizar informações e
levar essa agenda adiante na organização.
O papel do conselho de administração, em todo esse processo, é fundamental,
já que ele é o responsável, em última instância, pela aderência da empresa às leis e
demais normas. Entre outras tarefas, o conselho deve aprovar e revisar as políticas
corporativas relativas ao compliance, interagir direta e periodicamente com o res-
ponsável pela área, e monitorar o cumprimento do programa por meio de relatórios

Capítulo 3 Quais são os elementos centrais de um bom modelo de governança?  


com indicadores objetivos.
Nenhum programa de compliance será efetivo, portanto, sem o comprometi-
mento pessoal da alta gestão, particularmente do conselho de administração e da
diretoria executiva.
Apesar de constituir um grande desafio, a construção de um sistema eficaz de
compliance deve ser vista como uma oportunidade da organização assegurar um
padrão de excelência operacional, diminuir o risco de problemas reputacionais,
mitigar passivos legais e promover seus valores.
Diferentemente de várias ações de marketing social, frequentes atualmente,
porém em muitos casos vazias em substância, é a estruturação de um programa de
conformidade efetivo que representa um exemplo concreto do exercício da responsa-
bilidade corporativa. Afinal, se as empresas seguirem as regras de verdade, haverá um
desincentivo a infrações (evasão fiscal, corrupção e lavagem de dinheiro, por exemplo)
e, consequentemente, teremos uma sociedade mais meritocrática e desenvolvida.
Capítulo 4
Como implantar um bom modelo
de governança corporativa?

Os três primeiros capítulos deste livro se dedicaram a apresentar a governança corpora-


tiva sob o ponto de vista conceitual a partir de diversos exemplos. Agora, partimos para a
aplicação, isto é, para a implantação de um bom modelo de governança em sua organização.
O processo completo pode ser dividido em três grandes etapas: diagnóstico, criação de uma
agenda de governança, e formalização do novo modelo definido. Vamos a elas.

4.1  Análise da situação atual e identificação


das lacunas de governança

A primeira etapa visa a identificar os principais pontos críticos de governança de sua


organização. O diagnóstico pode ser feito por duas abordagens complementares: uma
quantitativa e outra qualitativa.
116

Do ponto de vista “quantitativo”, pode-se aplicar um indicador objetivo cons-


truído com base nas recomendações dos principais códigos de boas práticas a fim
de se identificar as principais lacunas ou desalinhamentos de governança. Isso
proporcionará uma compreensão estruturada do quanto sua organização já cami-
nhou em relação ao tema, bem como os próximos desafios a serem enfrentados na
jornada rumo a uma governança de excelência.
Do ponto de vista qualitativo, pode-se aprofundar o entendimento da situação da
organização por meio de entrevistas individuais com as lideranças sobre temas-chave
de governança. Como forma de obter uma leitura correta dos pontos críticos de
governança enfrentados atualmente, é fundamental assegurar o sigilo das opiniões
individuais manifestadas nessa etapa. Além disso, podem ser realizados benchmar-
kings em relação a pares selecionados ou a requisitos de organismos de referência do
mercado, tais como as exigências para listagem no Novo Mercado da bolsa de valores.
É com base nesse diagnóstico que se poderá, mais adiante, definir o novo modelo
e práticas de governança a serem implantadas.

Indicador objetivo baseado nos principais


códigos de governança

A primeira atividade do diagnóstico consiste em aplicar um questionário objetivo


e multidimensional de governança, o qual buscará verificar o nível de alinhamento
atual de sua organização, em relação às práticas recomendadas pelos principais
documentos de referência, tais como o código do IBGC no Brasil e as recomenda-
ções internacionais da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Econômico), ICGN (Rede Internacional de Governança Corporativa), e os códigos


de países como Estados Unidos, Inglaterra, França e Alemanha.1
A seguir, apresento um exemplo de indicador objetivo de governança. Tendo em
vista o caráter multidimensional do tema, o indicador é dividido em sete dimensões: 1)
conselho de administração e comitês do conselho; 2) diretoria executiva; 3) áreas de con-
troles – auditorias, gestão de riscos, compliance e controles internos; 4) ética e conflito de
interesses; 5) stakeholders e sustentabilidade; 6) transparência e 7) direitos dos acionistas.
Cada uma das dimensões comporta diversos tópicos que, por sua vez, podem
conter várias perguntas. A lista dos itens a serem considerados pode ser muito
extensa, variando em função do porte e da complexidade da empresa analisada.2
A seguir, apresento um exemplo composto por 100 perguntas binárias e objetivas.
O indicador pode ser utilizado por sua empresa como uma ferramenta de autoavaliação
contínua ao longo do tempo. Ele é construído de forma que cada resposta positiva
corresponda a uma prática recomendada pelos códigos de referência. Às perguntas
não aplicáveis à realidade atual da empresa, deve-se assinalar a opção “NA”.
117

Dimensão 1: conselho de administração e comitês


do conselho.

# Tópico Pergunta Sim Não NA


O conselho de administração se reúne
Frequência das
1 no mínimo 4 (quatro) vezes e no máximo
reuniões
15 (quinze) vezes por ano presencialmente?
A documentação relativa às reuniões do
Fluxo de
2 conselho é distribuída com no mínimo 7 (sete)
informações
dias corridos de antecedência?
A frequência média dos membros nas reuniões
Frequência dos
3 do conselho dos últimos dois anos tem sido
membros
superior a 80%?
O conselho conduz uma avaliação interna
periódica (no mínimo anual) a fim de
4 Independência
avaliar a independência efetiva de seus
conselheiros?
O conselho possui pelo menos 2 conselheiros
5 Independência
considerados independentes?
Número de O conselho possui de 5 a 11 conselheiros
6

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


membros titulares?
Caso o diretor-presidente faça parte
do conselho, os conselheiros se reúnem
7 Liderança periodicamente sem a presença de
quaisquer executivos (excluindo também o
diretor-presidente de tais reuniões)?
O diretor-presidente é de fato escolhido
pelo conselho como órgão colegiado,
8 Liderança
após manifestações individuais e votos dos
conselheiros?
O conselho possui um plano de sucessão
formal (por escrito) e atualizado do
9 Sucessão
diretor-presidente, incluindo possíveis soluções
para o curto, médio e longo prazos?
O conselho avalia periodicamente (no mínimo
Avaliação de
10 anualmente) e formalmente seu desempenho
Desempenho
como órgão?
Avaliação de O conselho realiza uma avaliação formal e no
11
Desempenho mínimo anual do diretor-presidente?
Os resultados da autoavaliação geram
planos de ação formais a fim de aprimorar o
Avaliação de
12 desempenho do órgão, cuja implementação
Desempenho
passa a ser de responsabilidade do presidente
do conselho?
O conselho possui pelo menos um conselheiro
com experiência relevante na área de
13 Diversidade
gerenciamento de riscos empresariais? (não
contabilizar conselheiros internos/executivos)

(Continua)
118

# Tópico Pergunta Sim Não NA


Há presença de pelo menos uma mulher no
14 Diversidade conselho de administração? (não contabilizar
conselheiros internos/executivos)
Todos os comitês possuem regimentos
Documentos &
15 internos especificando suas competências,
Políticas
composição e modus operandi?
A empresa possui diretrizes de governança
corporativa, contendo, entre outros temas:
Documentos &
16 modelo de governança, papéis e composição
Políticas
dos órgãos, principais práticas de governança
adotadas etc.?
Há um procedimento formal (comandado
17 Remuneração pelo conselho) para elaborar a política e os
pacotes de remuneração dos executivos?
Comitês do Todos os comitês são coordenados por
18
Conselho conselheiros titulares e independentes?
Comitês do Cada um dos comitês do conselho se reúnem
19
Conselho pelo menos 4 (quatro) vezes por ano?
O conselho possui um comitê de governança
corporativa ou similar dedicado, entre
Comitês do
20 outras tarefas, a assegurar a conformidade
Conselho
da empresa às práticas de governança
reportadas para o mercado?
O comitê de auditoria realiza autoavaliação
Comitê de
21 periódica (no mínimo anual) e formal do
Auditoria
desempenho individual de seus membros?
O comitê de auditoria é responsável por
Comitê de recomendar, ao conselho, a contratação,
22
Auditoria remuneração e substituição do auditor
independente?
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Comitê de A empresa possui comitê de remuneração ou


23
Remuneração recursos humanos?
O comitê é responsável por analisar a
Comitê de remuneração dos conselheiros e diretores,
24
Remuneração propondo ao Conselho os valores para o
exercício?
O secretário de governança ou do conselho
Secretário de
25 possui dedicação exclusiva para a função e se
Governança
subordina diretamente ao conselho?
119

Dimensão 2: diretoria executiva.

# Tópico Pergunta Sim Não NA


Seleção de O diretor-presidente indica os diretores para
1
Pessoas aprovação posterior pelo conselho?
Avaliação de É realizada uma avaliação em 360 graus entre
2
Desempenho os membros da diretoria executiva?
Os resultados da autoavaliação da diretoria
geram planos de ação formais com a
Avaliação de
3 finalidade de aprimorar o desempenho
Desempenho
do órgão cuja implementação é de
responsabilidade do diretor-presidente?
A empresa utiliza métrica de valor adicionado
Avaliação de
4 com base em uma medida de lucro
Desempenho
econômico para avaliação de desempenho?
A empresa possui um procedimento
transparente e formal implementado para
5 Remuneração desenvolver políticas de remuneração e para
definir pacotes de remuneração para os
executivos?
A remuneração dos executivos é atrelada

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


a alguma métrica de valor adicionado que
6 Remuneração
leva em conta o custo de oportunidade do
capital?
Os comitês de gestão (comitês de
investimento, riscos, marketing, financeiro,
Comitês de
7 ética etc.) possuem regimentos internos
Gestão
especificando suas atribuições, composição e
modus operandi?
A empresa realiza uma avaliação formal e
Comitês de periódica da atuação de seus comitês de
8
Gestão gestão, com a finalidade de aprimorar seu
funcionamento, eliminar comitês ociosos etc.?
Existem regras definindo papéis e
Documentos & responsabilidades — incluindo as alçadas
9
Políticas — dos diretores, superintendentes e outros
executivos seniores?
As decisões da diretoria são formalizadas em
10 Atas ata aprovada em até 3 (três) dias, incluindo
votos divergentes e discussões relevantes?
120

Dimensão 3: área de controles.

# Tópico Pergunta Sim Não NA


O conselho monitora, sistematicamente, a
Gerenciamento
1 implementação da política de gestão de
de Riscos
riscos e outros documentos relativos ao tema?
A diretoria possui um plano de ação formal
Gerenciamento
2 a fim de mitigar/lidar com os principais riscos
de Riscos
identificados na matriz de riscos?
O conselho é formalmente responsável
Gerenciamento pela definição do “apetite a riscos” ou nível
3
de Riscos de tolerância a riscos, em linha com sua
estratégia?
O conselho exige que a diretoria identifique
os principais riscos aos quais a empresa está
Gerenciamento exposta, apresente uma matriz de riscos
4
de Riscos contendo impactos e probabilidade de
ocorrência, e as medidas e procedimentos
adotados para sua prevenção ou mitigação?
Existe um comitê formal composto
Gerenciamento
5 por executivos seniores dedicado ao
de Riscos
gerenciamento de riscos?
A diretoria executiva revisa periodicamente
Controles (no mínimo anualmente) a eficácia
6
Internos dos sistemas de controles internos da
organização?
O conselho discute periodicamente (com
Controles
7 inclusão em pauta) a adequabilidade do
Internos
sistema de controles internos da empresa?
O responsável pela área de compliance se
8 Compliance reporta diretamente ao diretor-presidente,
conselho ou comitê do conselho?
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Existe um programa anual de compliance


9 Compliance estruturado, aprovado pelo conselho e em
curso na empresa?
São realizados treinamentos regulares
10 Compliance
relacionados ao programa de compliance?
Auditoria A empresa é auditada por uma firma de
11
Externa auditoria independente?
É realizada uma avaliação formal (por
Auditoria
12 escrito) e periódica dos trabalhos da auditoria
Externa
independente?
O conselho ou comitê de auditoria é o
Auditoria
13 responsável por avaliar formalmente os
Externa
trabalhos da auditoria independente?
Auditoria A auditoria interna se reporta diretamente ao
14
Interna comitê de auditoria ou ao conselho?
A área de auditoria interna possui
Auditoria
15 independência operacional e financeira em
Interna
relação à diretoria financeira?
121

Dimensão 4: ética e conflito de interesses.

# Tópico Pergunta Sim Não NA


Todos os colaboradores e executivos assinam
Código
um termo atestando a leitura e compreensão
1 de Ética e
do código de ética e conduta quando
Conduta
ingressaram na organização?
Existe um programa anual em curso a fim de
Código
assegurar a internalização do código de ética
2 de Ética e
ou conduta por todos os colaboradores e
Conduta
executivos?
A empresa possui um executivo designado
Código ou um comitê específico responsável pela
3 de Ética e verificação da conformidade e revisão
Conduta periódica do código de conduta, tais como
um comitê de ética e conduta?
O processo de investigação de denúncias
Canal de é normatizado, de forma a promover as
4
Denúncias apurações e as providências necessárias, bem
como evitar retaliações aos denunciantes?
O responsável pelo canal de denúncias

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


Canal de apresenta, regularmente, um relatório de
5
Denúncias resultados para o conselho de administração
ou algum comitê do conselho?
A empresa possui algum tipo de canal
específico publicamente disponível para
6 Ouvidoria
recebimento de reclamações de clientes e
outros stakeholders?
O processo de análise de reclamações de
clientes é normatizado e coordenado por um
7 Ouvidoria
ouvidor, de forma a promover as apurações e
as providências necessárias?
Existem regras escritas para o tratamento de
Transações transações com partes relacionadas e outras
8 com Partes situações com potencial conflito de interesses,
Relacionadas tais como uma política para transações com
partes relacionadas?
A empresa divulga um resumo factual das
transações com partes relacionadas do
Transações
período, incluindo, entre outros: natureza das
9 com Partes
transações; nome das contrapartes envolvidas
Relacionadas
e relacionamento com a empresa; montantes
envolvidos; prazo.
Existem regras claras para as doações de
Documentos &
10 campanha e/ou contribuições políticas?
Políticas
(política para contribuições políticas)
122

Dimensão 5: stakeholders e sustentabilidade.

# Tópico Pergunta Sim Não NA


A empresa cumpre todas as
1 Colaboradores
regulamentações e leis trabalhistas?
A empresa possui uma política não
2 Colaboradores discriminatória em relação a gênero, etnia,
idade, orientação sexual etc.?
A empresa tem ciência das práticas
trabalhistas de seus fornecedores-chave,
3 Colaboradores
questionando-os e solicitando evidências
a respeito?
A empresa analisa periodicamente e
4 Sustentabilidade formalmente o seu impacto social e
ambiental?
A empresa identifica e avalia de forma
5 Sustentabilidade estruturada os seus riscos (potenciais passivos)
socioambientais?
A empresa não sofreu algum tipo de punição
(multas, acordos etc.) por parte de governo
6 Sustentabilidade
ou outros reguladores nos últimos anos em
função de questões ambientais?
A empresa não sofreu qualquer tipo de
punição (multas etc.) por parte de governo
7 Colaboradores ou outros reguladores nos últimos anos em
função de questões trabalhistas relativas à
segurança no trabalho?
A empresa elabora e divulga balanço social
8 Sustentabilidade
ou relatório de sustentabilidade?
O conselho exige que a diretoria incorpore
explicitamente considerações de ordem
9 Sustentabilidade
Governança corporativa: o essencial para líderes 

social e ambiental na avaliação dos


negócios e das operações?
Documentos & A empresa possui e divulga publicamente
10
Políticas uma política de sustentabilidade?
123

Dimensão 6: transparência.

# Tópico Pergunta Sim Não NA


A empresa disponibiliza em seu website um
currículo completo e atualizado de seus
Conselho de
1 conselheiros, incluindo tempo no cargo e
Administração
posições atualmente ocupadas por eles em
outras empresas e entidades?
A empresa divulga, publicamente, a forma
Avaliação de
2 de avaliação de desempenho do conselho
Desempenho
e/ou de seus conselheiros individualmente?
A empresa divulga, claramente, sua
política de remuneração para executivos e
3 Remuneração conselheiros, incluindo as modalidades de
benefícios concedidos (bônus, remuneração
com ações, opções de ações etc.)?
A empresa divulga, publicamente, a
4 Remuneração remuneração mínima, média e máxima paga
à diretoria, conselho e comitês?
Comitês do Todos os regimentos internos dos comitês do
5
Conselho conselho são disponibilizados publicamente?

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


O comitê de auditoria disponibiliza,
Comitê de publicamente e periodicamente, um relatório
6
Auditoria com um resumo de suas atividades no
período?
O comitê de remuneração disponibiliza,
Comitê de publicamente e anualmente, um relatório
7
Remuneração com um resumo de suas atividades no
período?
A diretoria comenta publicamente (em
relatório anual ou similar) sua visão sobre o
Controles
8 grau de eficiência dos controles internos,
Internos
identificando eventuais imperfeições e
providências para corrigi-las?
A empresa disponibiliza publicamente
(em relatório anual ou similar) a opinião
Controles
9 dos auditores independentes acerca de
Internos
eventuais deficiências ou recomendações
sobre os controles internos?
A empresa divulga, publicamente, os
montantes pagos à auditoria independente,
Auditoria
10 inclusive a relação entre os honorários
Externa
pelos serviços de auditoria e os eventuais
pagamentos por outros serviços?
A empresa divulga, publicamente, a
existência de uma área de auditoria interna
11 Auditoria Interna
com breve descrição sobre sua composição,
atribuições e relação de subordinação?

(Continua)
124

# Tópico Pergunta Sim Não NA


O relatório anual contém uma seção
dedicada ao tema governança corporativa,
Relatório Anual
12 com apresentação clara do seu modelo
& Website RI
de governança? (órgãos, composição,
interfaces, papéis etc.)
A empresa elabora e divulga um
comparativo entre suas práticas de
Conformidade governança e as principais práticas
13 com Práticas recomendadas pelo código do IBGC
Recomendadas ou outro documento de referência em
governança? (grau de conformidade com o
código de governança local)
A empresa discorre sobre os motivos
Conformidade pelos quais não atende a algumas das
14 com Práticas práticas recomendadas pelo código do
Recomendadas IBGC? (explicação sobre os pontos de não
conformidade com código local)
O conselho de administração disponibiliza,
publicamente e periodicamente, um relatório
Funcionamento
15 com um resumo de suas atividades no
das reuniões
período, incluindo o número de reuniões e
datas?
O conselho divulga, publicamente, os critérios
adotados para avaliar a independência
Independência
16 dos conselheiros e a relação de conselheiros
do Conselho
considerados independentes após aplicação
desse critério?
A empresa possui uma política de distribuição
de dividendos disponível publicamente?
Documentos & (contendo, entre outros itens: periodicidade
17
Políticas dos pagamentos; parâmetro utilizado para
definição do montante; processo e instâncias
Governança corporativa: o essencial para líderes 

responsáveis pela proposição).


Documentos & A política para doações de campanha ou
18
Políticas políticas é divulgada publicamente?
A empresa descreve de forma clara em
seu website a estrutura societária do grupo
Estrutura de
19 econômico ao qual pertence, incluindo
Propriedade
relacionamentos entre os acionistas
(organograma societário)?
A empresa disponibiliza em seu website um
Estrutura
20 currículo completo e atualizado de seus
Organizacional
diretores, incluindo o tempo no cargo?
125

Dimensão 7: direitos dos acionistas.

# Tópico Pergunta Sim Não NA


A empresa não lança mão de mecanismos
Estrutura de para ampliar o poder de controle dos
1
Propriedade acionistas controladores? (ex.: estruturas
piramidais, ações sem direito a voto etc.)
A sociedade garante direitos de tag along
Aquisição de
2 para as ações ordinárias e preferenciais além
Controle
dos que são legalmente exigidos?
Aquisição de A retirada de algum sócio da sociedade
3
Controle obedece a critérios de valor econômico?
A empresa não adota poison pill (cláusulas
de proteção à dispersão acionária) com
Aquisição de
4 previsão de parâmetros de preço acima da
Controle
cotação de mercado das ações ou do valor
econômico da empresa?
Assembleia de
5 A empresa elabora manual de assembleia?
Acionistas
A empresa adota plataforma eletrônica
Assembleia de de forma a viabilizar o voto eletrônico nas

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


6
Acionistas assembleias de acionistas? (Sistema eletrônico
para a outorga de procuração de voto).
O estatuto prevê que assuntos não incluídos
Assembleia de
7 na convocação apenas poderão ser votados
Acionistas
caso haja presença de todos os sócios?
Caso a empresa possua acordo de
Acordo de
8 acionistas, ele não vincula ou restringe o
Acionistas
direito de voto de quaisquer conselheiros?
Caso a empresa possua acordo de
acionistas, ele não prevê a indicação de
Acordo de
9 quaisquer diretores da sociedade entre
Acionistas
os acionistas que compõem o bloco de
controle?
A empresa prevê a utilização de câmara
Mediação e de arbitragem para resolução de conflitos
10
Arbitragem societários entre acionistas e administradores,
e entre estes e a organização?

Tabela 4.1 – Modelo de indicador de governança corporativa

Após a aplicação do questionário completo, devemos analisar seus resultados de


forma agregada. Uma sugestão é calcular o percentual de conformidade em relação
às boas práticas em cada dimensão, atribuindo uma nota de 0 a 10 para cada uma
delas. Com base na pontuação de cada dimensão, obter-se-á, ao final, uma nota geral
de governança para a organização, cuja evolução poderá ser monitorada por meio da
aplicação periódica da ferramenta. A tabela a seguir ilustra como os resultados podem
ser compilados.
126
Governança corporativa: o essencial para líderes 

(1) (2) (3) (4) (5) (6) (7) (8)


Alinhamento em
Número de Questões Pontuação Pontuação Nota
Tópico Dimensão % Conformidade Relação às Práticas
por dimensão Aferida Máxima 0-10
Recomendadas
Conselho de
1 25 15 25 60% 6,0 Mediano
Administração
2 Diretoria Executiva 10 7 10 70% 7,0 Alto
3 Controles 15 3 15 20% 2,0 Muito Baixo
Ética e Conflito de
4 10 9 10 90% 9,0 Muito Alto
Interesses
Stakeholders e
5 10 3 10 30% 3,0 Baixo
Sustentabilidade
6 Transparência 20 8 20 40% 4,0 Baixo
Direitos dos
7 10 6 10 60% 6,0 Mediano
Acionistas
SOMA 100 51 100
Nota geral de governança: 5,3
Alinhamento geral em relação às melhores práticas: Mediano

Tabela 4.2 – Exemplo de análise dos resultados do indicador de governança


127

A tabela anterior exemplifica como o indicador objetivo de governança pode ser uti-
lizado como ferramenta de autoavaliação. A coluna 3 contém o número de questões de
cada dimensão de análise. A coluna 4 descreve a pontuação aferida pela organização em
cada dimensão. A coluna 5 descreve a pontuação máxima possível em cada dimensão.
As lideranças podem optar por estabelecer pesos diferentes para as questões em função
da relevância percebida de cada questão ou tópico (Ex.: pesos 3, 2 e 1 para as questões
de alta, média e baixa relevância, respectivamente). Neste caso, a pontuação máxima
(coluna 5) se tornaria diferente do número de questões por dimensão (coluna 3).
Por outro lado, caso opte-se por atribuir o mesmo peso às questões (todas valendo 1
ponto), então os valores da coluna 5 serão idênticos aos da coluna 3.
A coluna 6 (resultado da divisão da coluna 4 pela coluna 3), indica o grau de
conformidade da organização em relação a cada dimensão, enquanto a coluna 7
apresenta o mesmo resultado em uma nota de 0 a 10. A coluna 8 descreve o ali-
nhamento da empresa de forma qualitativa, com base nas seguintes faixas:
j 0 a 2 – alinhamento muito baixo
j 2,01 a 4 – alinhamento baixo

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


j 4,01 a 6 – alinhamento mediano
j 6,01 a 8 – alinhamento alto
j 8,01 a 10 – alinhamento muito alto
Ao final, pode-se calcular a nota geral da organização com base na média das
notas de cada dimensão. No exemplo, a empresa teria obtido nota 5,3, sendo clas-
sificada como mediana. Os resultados também podem ser analisados visualmente,
deixando mais claro os pontos fortes e fracos em relação às práticas recomendadas.
O gráfico a seguir mostra como isso pode ser feito.

Figura 4.1 – Gráfico ilustrativo com os resultados


do indicador objetivo de governança.
128

Aprofundamento do conhecimento
sobre a governança na organização

Apesar de sua utilidade como ferramenta objetiva de autoavaliação periódica,


o indicador de governança possui sérias limitações. Afinal de contas, conforme
enfatizado ao longo deste livro, a governança não deve ser entendida como uma
espécie check-list de práticas a serem cumpridas de maneira fria e desconectada do
dia a dia, com o mero objetivo de satisfazer regulações e passar uma boa imagem
externa. Nesse sentido, observamos, no primeiro capítulo, como a utilização da
governança como ferramenta de marketing pode na verdade ser um dos fatores que
levam a graves problemas empresariais.
É fundamental que você conscientize todas as demais lideranças de que a boa
governança vai muito além do check-list. Ela visa a fazer com que, de fato, as atitudes
dentro da empresa reflitam os princípios estabelecidos pela alta gestão. Como
resultado, ouvir as pessoas a fim de compreender o real funcionamento do modelo
de governança no dia a dia é fundamental para um correto diagnóstico da situação
da organização. Isso pode ser feito por meio de conversas individuais, sigilosas e
em profundidade, com as pessoas que fazem parte dos órgãos de governança e das
áreas de controle. O objetivo é avaliar a qualidade do atual processo decisório da
alta gestão, identificar os pontos críticos e capturar as percepções pessoais acerca da
organização e do seu modelo ideal de governança.
Há diversos temas relevantes que podem ser abordados junto aos integrantes dos
principais órgãos de governança nessas sessões, tais como: o funcionamento do conselho,
comitês e diretoria; a atuação das áreas de controle (gestão de riscos, auditorias, com-
pliance e controles internos); a qualidade – em termos de meritocracia, transparência e
Governança corporativa: o essencial para líderes 

formalização – dos sistemas de incentivo, avaliação de desempenho e sucessão de lide-


ranças; e, a percepção do nível de internalização das principais políticas da organização.
A tabela seguinte apresenta exemplos de questões a serem colocadas nas conversas
em profundidade junto às principais lideranças.

Tema Questões críticas de governança


Quais são os pontos fortes e fracos das práticas de governança da
organização em relação aos seguintes aspectos: funcionamento do conselho,
comitês e diretoria, relacionamento e fluxo de informações entre os órgãos,
Avaliação da transparência para os públicos internos e externos, prestação de contas,
qualidade gestão de riscos, controles internos, compliance, sistemas de remuneração,
geral das avaliação de desempenho, número de instâncias decisórias, questões de
práticas de sustentabilidade etc.?
governança
Como é o atual nível de compreensão e apoio dos conselheiros, diretores e
demais executivos acerca da importância da adoção das boas práticas de
governança?

(Continua)
129

Tema Questões críticas de governança


Como é o atual processo decisório na alta gestão (conselho, comitês do
conselho, diretoria e comitês de gestão) em relação a: separação clara
Avaliação de papéis; nível de agilidade; nível de centralização das decisões; nível de
do atual responsabilização pelas decisões tomadas (incluindo recompensas e eventuais
processo punições relativas aos resultados das decisões); consideração de conformidade
decisório da legal, regulatória e adequação a padrões éticos na tomada de decisões?
alta gestão
Como é o nível de prestação de contas dos executivos para o conselho? Eles
têm sido proativos e claros na apresentação dos assuntos de maior relevância?
Qual é a situação do conselho em relação a (o): composição; frequência,
duração e produtividade das reuniões; qualidade da pauta; antecedência
das informações enviadas; preparação dos conselheiros para as reuniões;
qualidade das apresentações da gestão; foco em questões estratégicas;
nível de profundidade e qualidade dos debates; clima entre os conselheiros;
acompanhamento das políticas de gestão de riscos, compliance e controles
Conselho de internos; relacionamento com os auditores internos e independentes;
Administração relacionamento com os stakeholders; efetividade do conselho na estratégia;
avaliação de desempenho do órgão e da diretoria; qualidade das atas e da
secretaria do órgão?
Qual é o nível de independência do conselho em relação aos acionistas
controladores e executivos?
Como é o nível de esclarecimento acerca dos papéis e responsabilidades

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


individuais dos conselheiros, particularmente em relação aos seus passivos legais?
O conselho possui os comitês necessários para seu adequado funcionamento?
Comitês do
Como você avalia os comitês do conselho em relação à: composição; atribuições
Conselho
e temas abordados; frequência das reuniões; e, geração de valor para a empresa?
Qual é a situação da diretoria quanto a (o): frequência, duração e
produtividade das reuniões; qualidade da pauta; foco em questões de maior
Diretoria relevância; nível de profundidade dos debates; clima entre os diretores;
Executiva qualidade dos registros; mescla de conhecimentos e experiências dos
membros; acompanhamento da gestão de riscos e dos controles internos;
avaliação de desempenho da diretoria e dos níveis gerenciais?
A organização gerencia seus riscos de forma estruturada e integrada? Os
principais riscos são identificados e avaliados (incluindo probabilidade de
ocorrência e impacto potencial), bem como são adotadas medidas para
sua mitigação? (contemplando não apenas riscos financeiros, mas também
reputacionais, estratégicos, legais etc.). O monitoramento do cumprimento da
política de gestão de riscos é adequado?
Qual é a qualidade dos controles internos em relação à organização e
monitoramento de um fluxo de informações tempestivas, corretas e completas
Controles:
sobre a sociedade, tais como as de natureza financeira, tributária, operacional,
Auditorias,
conformidade legal, e outras que apresentem fatores de risco importantes?
gestão
de riscos, Como se dão as atividades de compliance na organização? Existe um
controles programa de compliance em curso? Ele é efetivo?
internos, e Quem define o plano anual da auditoria interna? O comitê de auditoria ou
compliance conselho se relaciona sistematicamente com a auditoria interna? Houve troca
substancial na equipe de auditoria interna nos últimos anos?
A quantidade e a qualidade dos recursos (humanos, tecnológicos etc.)
disponíveis para as áreas de controle (gestão de riscos, compliance, controles
internos e auditoria interna) é satisfatória?
Os auditores independentes são avaliados formalmente ao término dos seus
trabalhos? Quem realiza a avaliação? A recontratação é feita apenas após
avaliação formal dos serviços de auditoria prestados?
(Continua)
130

Tema Questões críticas de governança


Conflito de Existem situações recorrentes de conflito de interesses na organização? Existem
interesses e regras claras para lidar com tais situações? Elas têm funcionado a contento?
transações Há regras claras para transações com partes relacionadas, visando a assegurar
com partes que sejam avaliadas de forma independente e feitas em condições de
relacionadas mercado?
Qual é o nível de transparência das informações financeiras e não financeiras
Transparência da organização em relação a temas como: conteúdo do Relatório Anual;
das apresentação clara do modelo de governança no website; informações ao
informações público sobre o plano estratégico e forma de gerenciamento dos riscos; divulgação
das práticas de governança adotadas; e, qualidade da internet e intranet?
Como é feita a definição das metas dos principais executivos, bem como
a avaliação do cumprimento das metas e atribuição de recompensas ou
punições? Este processo está bem estruturado e formalizado?
A remuneração dos executivos está adequadamente alinhada ao alcance de
Meritocracia: metas estratégicas e à geração de valor econômico pela empresa? O atual
sistema de sistema de remuneração leva a uma demasiada aversão ou propensão a riscos?
remuneração, Qual é o grau de influência dos diretores no processo decisório que abrange a
avaliação de definição de sua própria remuneração?
desempenho Como funciona o processo de avaliação da diretoria executiva como órgão? É
e sucessão anual, formal e conta com avaliações do diretor-presidente? Existe processo de
avaliação 360°?
Há um plano de sucessão, formal e sempre atualizado, do executivo principal
e de todas as outras pessoas-chave da sociedade? Quem elabora e
acompanha este plano?
Código O código de ética e conduta da organização é plenamente disseminado e
de Ética e internalizado pelas lideranças? Os valores, princípios e normas do código de
Conduta ética estão bem integrados nos processos e políticas da empresa?
Qual é a imagem da empresa perante os órgãos fiscalizadores e de regulação?
A alta gestão discute periodicamente possíveis mudanças na regulação que
Órgãos de podem afetar materialmente a empresa?
fiscalização e
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Como é feito o controle da elaboração, divulgação e atualização das políticas


regulação e normativos da empresa? Existe uma área responsável, há um prazo mínimo
de atualização desses documentos? Todos os processos críticos possuem
procedimentos formalizados?

Tabela 4.3 – Exemplos de questões a serem colocadas às lideranças


da organização

A reflexão das lideranças sobre as questões acima gerará um conjunto rico de in-
formações, o que propiciará uma avaliação correta dos pontos críticos de governança
de sua organização. É importante destacar que o objetivo desse processo não é con-
trapor de forma explícita visões individuais, mas sim identificar, de forma agregada,
os pontos de consenso e de dissonância na organização.
Tendo em vista a relevância e sensibilidade dos temas abordados, é fundamental
que o processo seja conduzido por uma pessoa com elevada senioridade, maturidade,
independência intelectual e ausência de agenda pessoal específica na organização.
131

Do contrário, corre-se o risco de o processo se politizar e perder sua credibilidade,


passando a gerar resistências internas. Naturalmente, muitas organizações optam
por realizar o diagnóstico com consultores externos de forma a aumentar a expertise
e independência da análise.

Benchmarkings em relação a pares selecionados


ou a organismos de referência do mercado

Além da construção e aplicação do indicador objetivo e das questões para re-


flexão propostas às lideranças, recomenda-se realizar uma comparação estruturada
entre o modelo de governança de sua organização e as práticas adotadas por pares
de mercado considerados avançados no tema. Esse benchmarking pode ser com-
plementado com um comparativo da situação atual em relação às recomendações ou
exigências de organismos reguladores ou de autorregulação, tais como os requisitos
para listagem no Novo Mercado da BM&FBovespa.

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


4.2  Criação de uma agenda de governança

A avaliação quantitativa e qualitativa de governança proporcionará uma visão


mais clara acerca das lacunas e pontos críticos a serem enfrentados. Com isso, você e
as demais lideranças poderão definir o que deverá ser implantado no curto, médio e
longo prazos. Esse processo de priorização resultará na criação da chamada “agenda
de governança”, documento que servirá como um norte para os líderes em relação
às iniciativas a serem desenvolvidas.3
A primeira atividade, na construção da agenda, consiste em uma análise qua-
litativa dos benefícios e custos associados à implantação das lacunas identificadas.
Em relação aos benefícios, você e as demais lideranças devem estimar os poten-
ciais ganhos, do ponto de vista organizacional, decorrentes da adoção das práticas a
fim de suprir cada lacuna identificada. Entre os aspectos a serem considerados nessa
avaliação, destacam-se: o aprimoramento das decisões na alta gestão, a diminuição
da probabilidade de ocorrência de fraudes, a maior clareza na separação de papéis,
a menor dependência de pessoas específicas etc. Deve-se levar em consideração
também os benefícios da adoção da prática em questão junto aos públicos externos,
o que pode contribuir para uma menor percepção de risco do negócio, redução do
custo de captação e aumento de valor da empresa.
Em relação aos custos, você e as demais lideranças devem considerar seus com-
ponentes explícitos e implícitos. Os custos explícitos dizem respeito aos gastos
pecuniários associados à adoção de cada prática de governança (Ex.: contratação de
132

conselheiros independentes, elaboração de relatório anual, estruturação da área


de relações com os investidores, análise dos impactos socioambientais, contratação de
secretário de governança, estruturação de área de risco, atualização do website para
melhorar a transparência junto aos stakeholders etc.).
Os custos implícitos, por sua vez, correspondem às resistências internas decor-
rentes de potenciais mudanças na forma como a empresa é governada. Entre os
custos implícitos a serem considerados, destacam-se a perda de controle absoluto
nas decisões, a resistência a novas visões externas (decorrente da entrada de inde-
pendentes, criação de comitês etc.), a menor chance de decisões arbitrárias, a maior
transparência perante concorrentes etc. Não por acaso, a maior resistência cultural
muitas vezes vem do próprio líder da organização, geralmente confortável com a
manutenção do status quo e com mudanças cosméticas de governança.
Ao final desse processo de estimativa de benefícios e custos da adoção de novas práticas,
as lideranças devem classificar as lacunas de governança em quatro grupos: 1) práticas com
alto benefício e baixo custo; 2) práticas com alto benefício e alto custo; 3) práticas com
baixo benefício e baixo custo; 4) práticas com baixo benefício e alto custo.
As práticas enquadradas no grupo 1 podem ser implantadas no curto prazo
(em até um ano). Aquelas classificadas nos grupos 2 e 3 podem ser implantadas
em um horizonte temporal de médio e longo prazo (de um a cinco anos e de cinco
a dez anos, respectivamente). Já aquelas alocadas no grupo 4 podem não fazer
parte da atual agenda de governança da organização. A figura a seguir resume os
quatro grupos por meio de uma matriz de benefícios vs. custos de novas práticas
de governança.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Figura 4.2 – Matriz benefícios vs. custos da adoção


de práticas para as lacunas identificadas.
133

A classificação das lacunas de governança nos quatro quadrantes deve ser feita
após devida reflexão e debate entre as lideranças, já que servirá para definir o nível
de priorização das mudanças a serem implantadas na organização.
Trata-se também de um processo de análise comparada entre as lacunas iden-
tificadas, já que o objetivo é alocar um número razoável de iniciativas dentro de
cada um dos quadrantes. Afinal, o exercício se tornaria de pouca utilidade caso,
por exemplo, as lideranças classificassem 95% das lacunas como de “alto benefício
e alto custo” para a organização.
A agenda de governança, produto final desse exercício, será resultado direto
da matriz acima. Nela, deverão ser definidas as novas práticas a serem adotadas, o
processo de implantação, prazos e os responsáveis por cada iniciativa.

4.3  Formalização do modelo de governança:


o essencial dos documentos corporativos

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


Conforme exposto no primeiro capítulo, a informalidade é inimiga da boa
governança. É fundamental, portanto, que as lideranças formalizem o novo modelo
e práticas de governança por meio da elaboração ou atualização dos documen-
tos-chave da organização. A definição de regras claras sobre os limites de atuação
e os procedimentos a serem seguidos pelos órgãos e pessoas permitirá então que o
novo sistema de governança possa começar a funcionar.
Esta seção detalha os seguintes documentos a serem criados ou atualizados
durante o processo de aprimoramento do modelo de governança de sua empresa:

a) Acordo de acionistas e reunião prévia;


b) Regimentos internos do conselho de administração e seus comitês, da dire-
toria executiva, do conselho fiscal e dos comitês de gestão;
c) Calendário anual de pautas do conselho;
d) Políticas sobre: transações com partes relacionadas e outras situações envolven-
do conflito de interesses; contribuições políticas; dividendos; gestão de riscos;
e) Código de ética e conduta; e,
f ) Diretrizes de governança corporativa.

Longe de constituírem uma “camisa de força” a ser seguida de forma irrefletida,


os exemplos de documentos apresentados a seguir devem servir como ponto de
partida para que as lideranças reflitam e desenvolvam seus próprios instrumentos,
tendo em vista as especificidades de suas organizações, incluindo estágio de vida,
complexidade das operações, porte, estratégia e perfil dos acionistas.
134

4.3.1  Acordo de acionistas e reunião prévia

O acordo de acionistas é um instrumento jurídico comumente utilizado nas


sociedades sob controle compartilhado, tanto as de capital aberto quanto fechado.4
Trata-se de um contrato constituído com o objetivo de regular os direitos políticos
e econômicos dos acionistas que fazem parte do chamado bloco de controle. Entre
os direitos políticos, usualmente observados nos acordos de acionistas, destacam-se:

j O direito de indicar membros para o conselho de administração e comitês


do conselho;
j A definição do processo de seleção e substituição do diretor-presidente e
demais membros da diretoria;
j O direito de auditores internos dos acionistas controladores realizarem
verificações periódicas in loco.

No que concerne aos direitos econômicos, os acordos de acionistas em geral


preveem o (a):

j Direito de preferência5 para a aquisição das ações dos participantes do acordo;


j Direito de venda conjunta de participação acionária em caso de venda do
controle da companhia (mecanismo conhecido no mercado como tag along);
j Previsão de saída parcial ou total após alcance de certas metas por meio de
diversos mecanismos, incluindo possibilidade de abertura de capital.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Os acordos de acionistas também podem prever cláusulas que exigem aprovação


de matérias consideradas mais relevantes por quórum qualificado no conselho de
administração. Em geral, exige-se aprovação por no mínimo dois terços dos conse-
lheiros em temas como:

j Aquisição de bens do ativo permanente, investimentos e celebração de con-


tratos em valor superior a determinado montante;
j Aprovação ou alteração de documentos como: regimentos internos, política
de gestão financeira, plano de negócios, orçamento, política de gestão de
riscos etc.;
j Criação ou outorga de planos de opção de compra e de venda de ações;
j Emissão de debêntures conversíveis em ações, ou de quaisquer outros valores
mobiliários conversíveis em ações;
j Participação no capital de outras sociedades ou formação de consórcio,
joint-venture etc.;
135

j Transações com partes relacionadas acima de determinado montante;


j Aprovação dos membros da diretoria executiva;
j Mudança na política de dividendos, recompra de ações, ou contratação de
mútuos;
j Definição de estratégias de planejamento fiscal;
j Aprovação para a transferência de tecnologias, marcas ou patentes.

Recomenda-se, ainda, a inclusão dos seguintes dispositivos considerados impor-


tantes nos acordos de acionistas:

j Previsão de mecanismos para solução de controvérsias entre acionistas, tais


como mediação e arbitragem, entre outros;
j Requisitos mínimos de qualificação técnica dos administradores a serem
indicados;
j Previsão da obrigatoriedade de instalação de comitês do conselho, tais como
o de auditoria; recursos humanos e governança, por exemplo;

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


j Cláusula determinando a abrangência do acordo de acionistas para as
sociedades sob controle direto ou indireto da empresa objeto do acordo;
j Cláusula de nulidade de alienação ou transferência de ações realizada em
desconformidade com as disposições do acordo de acionistas.

Reunião Prévia

Além do acordo de acionistas, é comum a utilização do mecanismo da reunião


prévia em empresas de controle compartilhado. Trata-se de um foro de decisão que
faz com que algumas matérias-chave – mesmo que formalmente de competência do
conselho de administração – sejam decididas por representantes de acionistas em
uma reunião separada (em geral, previamente às reuniões do conselho, daí seu nome).
Tendo em vista o possível esvaziamento do papel do conselho em caso de
utilização excessiva, o mecanismo da reunião prévia permanece um tema con-
troverso dentro das boas práticas de governança.6 O tema é ainda mais polêmico
tendo em vista que, de acordo com o § 8° do art. 118 da Lei das Sociedades por
Ações, o voto dos conselheiros, indicados pelos membros do bloco de controle, deve
ser desconsiderado caso seja contrário às determinações dos acionistas signatários
do acordo.
Independentemente do debate acerca dos impactos da reunião prévia, sobre a
qualidade da governança da organização, seu procedimento de convocação, ins-
talação e deliberação deve ser detalhado no acordo de acionistas.
136

Além disso, é importante que os representantes dos acionistas nas reuniões prévias
não sejam os próprios conselheiros da empresa, já que é necessário separar a atuação
como representante de acionistas – muitas vezes com um mandato específico a ser
cumprido – da atuação como administrador da companhia – que inclui a responsa-
bilidade legal de colocar o interesse coletivo da entidade sempre em primeiro lugar.

4.3.2  Regimentos Internos do Conselho de Administração


e de seus Comitês, da Diretoria Executiva, do Conselho
Fiscal e dos Comitês de Gestão

Os regimentos internos visam a disciplinar a composição, competências e o


funcionamento dos órgãos de governança, bem como suas interfaces. A tabela a
seguir descreve os temas usualmente contemplados em um regimento interno do
conselho de administração.

# Tema Conteúdo
Definição da missão do conselho na organização, tais como: o
equilíbrio dos interesses de todos os stakeholders, a criação sustentável
1 Missão
de valor de longo prazo, a proteção do patrimônio de todos os
acionistas etc.
Descrição do número de membros, prazo do mandato, número
mínimo de conselheiros independentes, critérios mínimos de
diversidade a serem atendidos, restrições aplicáveis para o exercício
2 Composição
do cargo (Ex.: número máximo de outros conselhos a serem
ocupados simultaneamente, impossibilidade de eleição para a
diretoria etc.).
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Respeito às previsões legais e estatuárias na definição das


competências, destacando-se entre os temas usualmente
considerados a:
Definição das diretrizes;
Aprovação das metas, orçamentos e planos plurianuais;
Seleção, avaliação, monitoramento, substituição e supervisão do plano
sucessório dos diretores;
Aprovação dos planos de investimento e financiamento, incluindo as
questões relativas à estrutura de capital;
3 Competência Supervisão e acompanhamento dos trabalhos dos auditores internos e
independentes;
Apresentação da proposta de distribuição de dividendos;
Supervisão dos controles internos e da política de gestão de riscos;
Deliberação sobre as transações com partes relacionadas e
administração das demais situações envolvendo conflitos de interesses;
Definição do sistema de remuneração dos executivos;
Manutenção dos valores e princípios éticos da empresa;
Manutenção e aprimoramento dos padrões de governança
corporativa.

(Continua)
137

# Tema Conteúdo
Descrição dos deveres a serem observados pelos conselheiros, em
complemento àqueles previstos em Lei, incluindo a necessidade de:
Comparecer às reuniões, previamente preparados, e delas participar
Deveres dos ativamente;
4
conselheiros
Manter reserva sobre toda e qualquer informação sigilosa da
organização;
Zelar pela adoção das boas práticas de governança.
Descrição das vedações dos conselheiros de administração, incluindo
proibição de:
Vedações aos Receber vantagens de terceiros em razão do exercício do cargo;
5
Conselheiros Usar oportunidades comerciais de que tenha conhecimento em razão
de seu cargo; e,
Omitir-se no exercício ou proteção de direitos da companhia.
Presidente do Apresentação do rol de atribuições do presidente do conselho (vide
6
Conselho item 3.2. para exemplo completo).
Substituição Definição da regra em caso de vacância do cargo de presidente do
8
dos Membros conselho, ou de ausência ou impedimento de qualquer conselheiro.
Definição do procedimento a ser observado pelos novos conselheiros a
Ingresso
fim de se familiarizarem plenamente com a organização. Pode incluir o

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


9 de Novos
recebimento de documentos-chave, visitas às instalações e realização
Membros
de reuniões com lideranças.
Frequência Descrição da frequência, local e duração das reuniões ordinárias, bem
10 e local das como dos procedimentos a serem observados para realização de
reuniões reuniões extraordinárias.
Descrição do procedimento a ser observado pelo presidente do
Convocação
conselho para a preparação da pauta das reuniões, forma de
11 e Pauta do
convocação dos membros e antecedência da documentação
Conselho
relativa às reuniões.
Definição do quórum mínimo para instalação das reuniões em
Instalação e
12 primeira e segunda convocação e descrição das outras formas de
Representação
participação dos conselheiros nas reuniões (Ex.: videoconferência).
Descrição dos responsáveis e do procedimento para a elaboração das
13 Atas
atas das reuniões, sua aprovação e formalização.
Critérios para a convocação de diretores e/ou colaboradores para
Presença de
14 assistir às reuniões e prestar esclarecimentos ou informações sobre as
Terceiros
matérias em apreciação.
Secretário de Apresentação do rol de atribuições do presidente do conselho (vide
15
Governança item sobre o tema no capítulo 3 para exemplo completo).
Votação e Definição da forma de votação e deliberação do conselho de
16
Deliberação administração, incluindo eventuais matérias que exijam quórum qualificado.
Comitês do Descrição dos comitês do conselho implantados pela empresa,
17
Conselho incluindo critérios para composição e rol de competências.
Inclusão de temas de caráter geral, tais como existência de seguro de
Disposições responsabilidade, formas para dirimir dúvidas sobre temas omissos no
18
Gerais regimento e mecanismos a serem observados para sua atualização
periódica.

Tabela 4.4 – Tópicos a constar do regimento interno do conselho de administração


138

O modelo de regimento interno do conselho descrito na tabela anterior pode ser


usado como base para a construção dos regimentos internos dos demais órgãos. Em
geral, os regimentos dos comitês de assessoramento, diretoria executiva e comitês
de gestão tendem a ser bem mais concisos do que o do conselho de administração.
A seguir, é apresentada uma sugestão de estrutura de regimento interno para os
outros órgãos de governança.

Regimento interno dos comitês Regimento interno Regimento interno


do conselho da diretoria executiva dos comitês de gestão

I. Finalidade do órgão; I. Missão da Diretoria; I. Finalidade;


II. Composição; II. Composição; II. Composição;
III. Reuniões: III. Substituição Temporária III. Reuniões:
a. Frequência; e Vacância da Diretoria; a. Frequência;
b. Convocação; IV. Escopo de Atuação; b. Pauta e Convocação;
c. Quórum de instalação; V. Competência da c. Quórum de instalação;
d. Local das reuniões; Diretoria; d. Procedimento para
e. Pauta das reuniões; VI. Responsabilidades do deliberação;
f. Posicionamento do órgão; Diretor-Presidente e e. Lista de presença e
g. Ata das reuniões. demais Diretores; ata.
IV. Convidados externos; VII. Requisitos exigidos aos IV. Representação em caso
V. Orçamento e consultas Diretores; de ausência do membro
externas a especialistas; VIII. Regras de titular;
VI. Atividades; Funcionamento; V. Convidados externos;
VII. Relatório anual; IX. Representação da VI. Relatório anual de
VIII. Introdução de novos Companhia; atividades.
membros ao Comitê. X. Disposições Gerais.

Tabela 4.5 – Estrutura proposta para o regimento interno dos demais órgãos
Governança corporativa: o essencial para líderes 

de governança

4.3.3  Calendário temático de pautas do conselho

O calendário temático de pautas do conselho visa a assegurar um espaço fixo na


agenda do órgão durante o ano para debater temas que – apesar de muitas vezes não
serem considerados urgentes – são essenciais para o bom governo da organização.
A figura a seguir ilustra como o calendário pode ser construído.
O calendário proporciona a construção de uma pauta fixa bem distribuída
de temas a serem abordados pelo conselho de administração. É importante
deixar também um espaço nas reuniões do órgão para uma pauta variável, a ser
composta pelos diversos temas urgentes do cotidiano que naturalmente surgirão
ao longo do ano.
139

Figura 4.3 – Exemplo ilustrativo de calendário temático de pautas do

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


conselho.

4.3.4  Política de dividendos ou de destinação


de resultados

É importante definir regras claras para a distribuição dos resultados aos acionis-
tas. Além de proporcionar maior previsibilidade a investidores e gestores, a definição
de uma política de dividendos diminui a chance de conflitos entre acionistas com
diferentes necessidades de caixa. Isso pode ocorrer não apenas em companhias
abertas, mas também com empresas familiares de capital fechado nas quais exis-
tam acionistas da família fora da gestão diária. A tabela a seguir descreve os temas
contemplados em uma política de distribuição de resultados.

# Tema Conteúdo
A companhia pode decidir distribuir dividendos
de acordo com o mínimo legal7 ou estabelecer
Parâmetro utilizado para outro parâmetro, como, por exemplo, um valor
1
definição do montante mínimo equivalente a um determinado
percentual do seu fluxo de caixa operacional
do período.
Definição da frequência de pagamentos (Ex.:
Frequência dos
2 anual, semestral etc.), bem como a forma
pagamentos
de desembolso.

(Continua)
140

# Tema Conteúdo
Forma de distribuição Definição se a distribuição será feita sob a forma
3
dos resultados de dividendos e/ou juros sobre capital próprio.
Descrição do processo para definição da destinação
de resultados.
Em geral, envolve uma proposta inicial da
diretoria, definição dos termos da proposta da
Processo e instâncias
administração pelo conselho e aprovação final
4 responsáveis pela
pelos acionistas.
proposição
Critérios como o planejamento estratégico da empresa,
planos de investimento, e a manutenção de seu equilíbrio
financeiro devem ser levados em consideração pela
administração.
Podem-se incluir ressalvas à política aprovada,
tais como a possibilidade da companhia de
declarar dividendos e/ou juros sobre capital
5 Ressalvas próprio inferiores ao mínimo estabelecido, quando
exigido por cláusulas restritivas em contratos
junto a credores ou por ocorrência de cenário
que ameace a saúde financeira da empresa.

Tabela 4.6 – Tópicos a constar da política de dividendos ou de destinação


de resultados

4.3.5  Política para transações com partes


relacionadas e conflito de interesses
Governança corporativa: o essencial para líderes 

A política para transações com partes relacionadas visa a assegurar que as de­
cisões – especialmente aquelas envolvendo potencial conflito de interesses – sejam
tomadas com base em parâmetros de mercado e no melhor interesse de longo prazo
da organização. A tabela a seguir descreve os temas usualmente contemplados em
uma política desta natureza.

# Tema Conteúdo
Definição da empresa para a expressão “partes
relacionadas”, tendo em vista as previsões legais. Entre os
principais exemplos de partes relacionadas, destacam-se
as empresas que respondem ao mesmo controle societário,
Definição de “partes
1 que possuem administradores comuns, ou pertencentes
relacionadas”
aos acionistas controladores. Incluem-se também, como
transações com partes relacionadas, as operações
realizadas diretamente com executivos, administradores e
acionistas controladores, incluindo seus familiares.
(Continua)
141

# Tema Conteúdo
Esclarecimento do que a organização entende como uma
situação envolvendo conflito de interesses. Como exemplo,
podem ser considerados potenciais conflitos de interesse as
situações nas quais os objetivos pessoais dos tomadores de
Definição de “situações
decisão possam, por qualquer razão, não estar alinhados
2 envolvendo conflito de
aos objetivos da empresa em determinadas matérias. É
interesses”
importante ainda deixar claro, na política, que a situação
de conflito de interesses é uma situação anterior à decisão,
existindo mesmo que não haja atos impróprios decorrentes
da atuação do indivíduo conflitado.
Estabelecimento das regras a serem observadas uma vez
constatadas matérias envolvendo partes relacionadas ou
interesses conflitantes.
Regras e procedimentos a
3 Além de determinar que essas operações sejam realizadas
serem seguidos
em condições de mercado, faz-se necessário descrever
o procedimento a ser observado pelos indivíduos
considerados conflitados na matéria em questão.
Órgão responsável
Definição dos órgãos responsáveis pela análise e
pela aprovação das
4 aprovação das transações com partes relacionadas e
transações com partes
outras matérias evolvendo conflito de interesses.
relacionadas

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


Definição da forma de registro, em geral via formalização
Registro e divulgação em ata, das matérias sujeitas a conflitos de interesses.
periódica das transações Devem-se registrar o nome do indivíduo conflitado; a
5
com partes relacionadas tipificação dos interesses secundários identificados que
realizadas caracterizaram o conflito de interesses; o registro de sua
saída durante a deliberação; e, a abstenção do indivíduo.
Descrição das penalidades aplicáveis em caso de
descumprimento do procedimento estabelecido pela
6 Violações à política
política, incluindo os casos nos quais o indivíduo conflitado
deixe de voluntariamente se manifestar impedido.
Estabelecimento dos mecanismos a fim de assegurar
Mecanismos para
a internalização e implantação da política junto aos
disseminação da política
7 colaboradores e executivos, bem como o papel
e garantia de sua
de supervisão do conselho a fim de assegurar seu
implementação
cumprimento.
Definição dos documentos a serem assinados pelos
administradores e executivos a fim de assegurar que os
Declaração anual e
8 mesmos receberam, leram e se comprometeram a seguir a
revisão periódica
política. Incluir a forma de revisão periódica e atualização
do documento.

Tabela 4.7 – Tópicos a constar da política para transações com partes


relacionadas
142

4.3.6  Política para contribuições políticas

A contribuição para campanhas políticas é um tema muito delicado no ambiente


empresarial, mas que deve ser tratado de forma transparente. Afinal de contas,
assim como outras decisões corporativas, a doações envolvem recursos de todos os
acionistas.
Dentro das boas práticas de governança, recomenda-se que as empresas elaborem
e divulguem políticas sobre o tema, bem como publiquem, de forma transparente,
todas as contribuições políticas realizadas no período, prestando contas aos seus
acionistas e demais partes interessadas.
Idealmente, as empresas deveriam divulgar, ao mercado, não apenas os montantes
financeiros envolvidos, mas também a lógica por trás dos seus desembolsos políticos,
isto é, a forma como as lideranças acreditam que criarão valor para o negócio. Todo
o processo de formulação e supervisão da política para contribuições políticas deve
ser conduzido pelo conselho de administração. Entre os principais temas a constar
desse documento, destacam-se:

a) A filosofia da empresa em relação às contribuições políticas;


b) As modalidades de doações: atividades de lobby, campanhas eleitorais etc.
c) As pessoas autorizadas a realizar contribuições e processo para aprovação;
d) Os limites para as contribuições;
e) A forma de divulgação periódica ao mercado;
f ) Os mecanismos para assegurar a internalização e cumprimento da política;
g) A forma de revisão periódica.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

4.3.7  Código de Ética e Conduta

O Código de Ética e Conduta, já presente em boa parte das organizações, busca


orientar executivos e colaboradores sobre como a organização espera que eles se
comportem e tomem decisões. É um documento essencial, tendo em vista que as
empresas atuam em ambientes cada vez mais complexos nos quais os aspectos éticos
e morais constituem elemento fundamental.
Embora os termos “Código Ética” e “Código Conduta” sejam usados como sinô-
nimos, há uma diferença entre eles. O primeiro possui um caráter mais abrangente,
tendo como objetivo descrever o comprometimento da organização junto aos seus
stakeholders. Já o código de conduta possui um foco mais restrito, visando a esclarecer
aos colaboradores quais são os comportamentos esperados e as regras específicas a
serem seguidas na organização. O código de ética e conduta deve contemplar, em
linguagem simples e objetiva, temas como:
143

Principais temas a serem contemplados no Código de Ética e Conduta


j Valores e princípios organizacionais.
j Padrões de conduta na relação com colaboradores: Ex.: critérios para contratação, respeito
entre funcionários e entre chefes e subordinados, assédio moral e sexual, discriminação no
ambiente de trabalho, segurança no trabalho, exploração do trabalho adulto ou infantil,
direitos humanos, canal de denúncias, nepotismo, comportamento da empresa nas
demissões, recebimento de presentes, uso de álcool e drogas etc.
j Padrões de conduta no relacionamento com o Estado: Ex.: cumprimento das leis, forma
de relacionamento com o poder público, regras contra suborno e corrupção, incentivo a
denúncias, política tributária, contribuições políticas, doações etc.
j Padrões de conduta no relacionamento com consumidores: Ex.: práticas de propaganda
e marketing, formas de tratamento de informações pessoais etc.
j Padrões de conduta no relacionamento com os acionistas: Ex. transações com partes
relacionadas, informações privilegiadas etc.
j Formas de relacionamento com a imprensa, concorrentes, sindicatos e outros representantes
de stakeholders.
j Consideração dos impactos ambientais da empresa e práticas de sustentabilidade.
j Regras socioambientais e trabalhistas a serem seguidas por parceiros de negócio, fornecedores
e empresas terceirizadas.
j Mecanismos para prevenção à lavagem de dinheiro e práticas antiterrorismo.
j Regras para a proteção do patrimônio da empresa: uso dos ativos, comunicação eletrônica,
utilização de equipamentos, acesso à Internet, redes sociais, propriedade intelectual etc.
j Formas de administração das situações envolvendo conflitos de interesses.

Capítulo 4 Como implantar um bom modelo de governança corporativa? 


Tabela 4.8 – Código de Ética e Conduta: principais temas a serem
considerados

Assim como as demais políticas corporativas, a implementação efetiva do código de


ética e conduta dependerá de uma postura exemplar das lideranças, bem como de sua
participação ativa na disseminação e na exigência de seu cumprimento pelos subordinados.
Recomenda-se a constituição de um comitê de ética ligado ao conselho com o
objetivo de fomentar a adoção do documento na organização. Além de promover ações
de aculturamento, este comitê pode ter, como atribuições, o recebimento e a análise
das denúncias de descumprimento do código, a proposição de sanções e a revisão
periódica do documento.

4.3.8  Diretrizes de governança corporativa

A elaboração de “diretrizes de governança” tem como objetivo apresentar, ao


mercado, em linguagem simples e de forma concisa, o modelo de governança da
organização e as principais práticas adotadas.
De certa forma, resume todos os documentos descritos anteriormente, apresen-
tando de maneira simples a governança vigente na empresa para os públicos externos.
A tabela a seguir descreve os temas que geralmente fazem parte desse documento.
144

# Tópico Conteúdo
Apresentação visual do modelo de governança
Modelo de governança
1 vigente na empresa, incluindo órgãos, papéis e
corporativa
interfaces.
Descrição das principais práticas de governança
Principais práticas de adotadas pela empresa em relação a aspectos como:
2
governança conselho de administração, comitês, áreas de controle
etc.
Descrição do processo de avaliação de desempenho
dos principais elementos de governança da empresa,
3 Avaliação de desempenho
incluindo: conselho de administração, diretoria,
diretor-presidente e comitês.
Transações com partes Descrição da forma como a organização lida com as
4 relacionadas e conflitos de matérias que envolvem partes relacionadas ou outras
interesse deliberações sujeitas a conflitos de interesses.
Exposição da forma pela qual a organização identifica,
5 Gestão de Riscos avalia e mitiga os principais riscos aos quais está sujeita,
incluindo a estrutura organizacional envolvida.
Apresentação dos principais elementos do programa
Compliance e Controles de compliance da empresa, incluindo a forma
6
Internos pela qual os controles internos são avaliados
periodicamente.
Descrição sucinta dos principais aspectos do Código
de Ética e Conduta da organização, incluindo a
7 Código de Ética e Conduta
forma pela qual a alta gestão procura assegurar sua
disseminação e cumprimento.
Apresentação dos canais existentes para recebimento
Canal de Denúncias e
8 de denúncias internas ou externas, reclamações e
Ouvidoria
sugestões de clientes.
Explicação sobre a forma de revisão das diretrizes,
Atualização das práticas de
9 políticas e práticas de governança, incluindo seus
Governança
responsáveis.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Tabela 4.9 – Tópicos a constar das diretrizes de governança corporativa


Capítulo 5
Como avaliar periodicamente a governança
de minha organização?

No capítulo 1, mostrei como a avaliação de desempenho é um dos princípios funda-


mentais da boa governança empresarial. Afinal, como se pode estabelecer um ambiente
ético, meritocrático e eficiente nas organizações sem que haja uma avaliação adequada
dos principais órgãos e pessoas que compõem o modelo de governança?
Apesar de sua inquestionável importância, poucas empresas brasileiras avaliam
formalmente sua alta gestão, particularmente o conselho de administração e o dire-
tor-presidente. Como exemplo, o Anuário 2013 da revista Capital Aberto, que analisa
as 100 companhias com maior liquidez da bolsa de valores brasileira, 1 mostrou que
apenas 27% delas afirmam realizar algum tipo de avaliação formal de seus conselheiros
individualmente.
Em um verdadeiro contrassenso, pode-se afirmar que, em nosso ambiente empresarial,
quanto mais alto o cargo ocupado, menor a probabilidade de a pessoa passar por um
processo de avaliação de desempenho rigoroso e imparcial.
146

A implantação de um sistema de avaliação formal e periódico proporciona


diversos benefícios, permitindo, entre outras coisas:

j Verificar se os órgãos de governança estão de fato exercendo seus papéis e


cumprindo os procedimentos definidos;
j Identificar os principais pontos para aprimoramento da eficácia, eficiência e
produtividade dos órgãos de governança;
j Avaliar se os órgãos de governança possuem a combinação adequada de perfis
pessoais e expertises profissionais;
j Fomentar o comportamento ético e a meritocracia (ao invés das relações
políticas) na organização;
j Melhorar o fluxo de informações e as interfaces do sistema de governança;
j Proporcionar um momento de reflexão estruturada (individual e conjunta)
das pessoas que compõem os principais órgãos da empresa;
j Identificar mudanças necessárias no modelo de governança e na atuação das
pessoas que ocupam os cargos-chave;
j Avaliar se o sistema de governança está de fato evoluindo ou não ao longo
do tempo;
j Aprimorar a prestação de contas para os públicos externos, aumentando
a credibilidade do modelo de governança junto aos investidores e outros
stakeholders.

Além dos diversos benefícios acima, a implantação de um processo formal de


avaliação de desempenho é especialmente útil quando a organização passa por um
Governança corporativa: o essencial para líderes 

processo de questionamento público sobre a qualidade do seu modelo de gover-


nança. A avaliação coletiva (dos órgãos) e individual (das pessoas que ocupam os
cargos-chave) deve ocorrer no mínimo anualmente e ser baseada em um modelo
estruturado que permita comparabilidade ao longo do tempo.2
O processo de avaliação pode ser desenvolvido e implementado por pessoas
da própria organização, em geral por um comitê ou pelo presidente do conselho,
ambos assessorados pela secretaria de governança. Outra opção é contratar um es-
pecialista externo, o qual poderá aportar metodologia, independência e objetividade
ao processo. Essa é uma opção especialmente útil para as empresas que sofreram
reformulação recente nos seus órgãos de governança (principalmente o conselho)
ou para aquelas que, em outro extremo, estão há muito tempo com um sistema
estático, composto pelas mesmas pessoas e órgãos.
Em alguns casos, pode-se optar por um processo híbrido, no qual o especialista
externo conduz a avaliação com base em uma metodologia da própria empresa. A
147

tabela a seguir apresenta as vantagens e desvantagens das três alternativas para o


processo de avaliação.

Formas de avaliação Característica Vantagem Desvantagem


Tendência a gerar Ausência de
A empresa formula menor resistência expertise e de
e implanta a interna em função independência para
Interna (“dentro de
metodologia de da ausência de recebimento e
casa”)
avaliação de elemento estranho tratamento das
desempenho. ao dia a dia da avaliações mais
organização. críticas.
Um especialista
Proporciona
externo recebe e A metodologia
imparcialidade
compila avaliações interna pode ser
Interna, facilitada por ao processo e, ao
elaboradas incompleta ou não
especialista externo mesmo tempo, pode
com base em abordar temas
mitigar resistências
metodologia da sensíveis importantes.
internas.

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


organização.
Um especialista
Proporciona Maior custo e
externo e
objetividade e potencial resistência
independente define
Externa assegura que os interna de alguns
a metodologia e
temas sensíveis serão membros da alta
realiza o processo de
tratados. gestão.
avaliação.

Tabela 5.1 – Formas de avaliar o desempenho do modelo de governança

Há diferentes metodologias possíveis para realizar a avaliação de desempenho.


Em geral, elas incluem elementos quantitativos – como o preenchimento de ques-
tionários objetivos – e qualitativos – tais como análises de reuniões dos órgãos de
governança por terceiros, entrevistas estruturadas com lideranças e debates coletivos
sobre temas críticos.
Independentemente da metodologia escolhida, é fundamental que o processo
seja formalizado e que, ao final, produza-se um documento com os principais
resultados das avaliações. É importante ainda que as pessoas e órgãos avaliados
recebam o devido feedback dos resultados, bem como que sejam definidos planos
de ação a fim de sanar as deficiências identificadas. O enfoque deve ser positivo,
no sentido de identificar oportunidades de aprimoramento e evitar a instalação
de um clima de animosidade. Recomenda-se também, como boa prática de go-
vernança, que a organização reporte, ao mercado, a forma pela qual avalia seu
sistema de governança, bem como proporcione exemplos de pontos identificados
para aprimoramento.
148

Este capítulo apresenta diversos questionários e perguntas úteis para a avaliação


de todo o sistema de governança corporativa. Especificamente, disponibilizamos
modelos para avaliar o desempenho do conselho de administração como órgão, dos
conselheiros individualmente, do presidente do conselho, do diretor-presidente, dos
comitês de gestão e da auditoria independente.
Esses modelos contêm exemplos de questões que podem servir como ponto de
partida para a avaliação dos órgãos de governança e do desempenho das pessoas
que o compõem. A aplicação do ferramental disponibilizado ajudará o sistema de
governança de sua organização a funcionar de forma mais efetiva, contribuindo
substancialmente para tornar o processo de avaliação mais objetivo de forma a
agregar valor ao negócio.

5.1  Avaliação do Conselho de Administração

Além dos benefícios apontados na seção anterior, a avaliação do conselho é


especialmente útil por permitir identificar lacunas no conselho a serem supridas
na seleção de novos conselheiros, bem como por proporcionar argumentos mais
objetivos na definição da reeleição ou não dos atuais membros.
O processo, em geral, ocorre por meio de autoavaliação dos próprios membros.
Em alguns casos, pode-se colher também as visões dos diretores (principalmente
do diretor-presidente) e do secretário de governança a respeito do funcionamento
do órgão.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

A avaliação pode se iniciar por meio da aplicação de um questionário estruturado.


O documento, preenchido de forma sigilosa (sem identificação do respondente),
deve ser encaminhado ao presidente do conselho e à secretaria de governança, em
geral responsáveis pela tabulação e análise dos resultados.3
Os resultados podem então ser apresentados aos conselheiros pelo presidente do
conselho, com debate sobre os principais resultados. Ao final dos debates, o conselho
deverá definir um plano de ação a fim de aprimorar seu desempenho.
A seguir, disponibilizo um questionário exemplificativo para o processo de
autoavaliação do conselho como órgão colegiado. Ele é dividido em sete dimensões
consideradas importantes para um bom conselho de administração:

1. Foco estratégico;
2. Motivação, envolvimento e alinhamento de interesses;
3. Postura independente;
4. Funcionamento das reuniões;
149

5. Composição e relações pessoais;


6. Fluxo de informações e comunicação; e,
7. Comitês do conselho.

O questionário é constituído por afirmações que podem ser contestadas


ou corroboradas por meio de uma escala de 1 a 5. Após o preenchimento
por todos, recomenda-se analisar a média, desvio-padrão, notas mínimas e
máximas obtidas. As questões com menor pontuação corresponderão àquelas
nas quais existe maior potencial para aprimoramento. As questões com maior
desvio-padrão serão aquelas nas quais existe maior divergência de opiniões entre
os membros, merecendo um debate específico sobre cada uma delas. Ao final de
cada assertiva, recomenda-se deixar um espaço para comentários qualitativos.
Idealmente, as afirmações com pontuação baixa (1 ou 2) deveriam ser acompa-
nhadas de justificativas.

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


Dimensão 1: foco estratégico.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão
O conselho é assertivo na fixação das diretrizes
1
estratégicas do negócio.
O conselho analisa periodicamente as principais
2 ameaças e oportunidades externas da empresa,
incluindo aquelas de médio e longo prazos.
O conselho supervisiona ativamente as práticas de
3
gestão de riscos.
O conselho monitora a efetividade do sistema de
4
controles internos.
O conselho avalia sistematicamente e com profundidade
5
o trabalho dos auditores internos e independentes.
O conselho verifica o cumprimento das principais
6
políticas da empresa.
O conselho avalia, em profundidade e de forma
7 estruturada, o desempenho do diretor-presidente,
incluindo aspectos não financeiros.
O conselho discute adequadamente o plano de
8 sucessão para as posições-chave da empresa,
incluindo a sucessão do diretor-presidente.
O conselho reavalia periodicamente o alinhamento das
 9 práticas de governança da empresa com as práticas
recomendadas pelo mercado.
O conselho consegue discutir todos os temas de sua
10
competência ao longo do ano.
150

Dimensão 2: motivação, envolvimento e alinhamento de interesses.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão
O grau de dedicação (tempo disponível) dos
1 conselheiros para o desempenho de suas
responsabilidades é adequado.
Os conselheiros se preparam adequadamente para
2 as reuniões. (Todos leem o material enviado com
antecedência).
O nível de absenteísmo nas reuniões é muito baixo. (Em
3
geral, todos os conselheiros estão presentes).
Os conselheiros demonstram interesse nos debates e
4
análise das matérias submetidas à deliberação.
Os conselheiros procuram acompanhar a organização
5 e os principais desdobramentos de seu mercado entre
as reuniões.
Todos os conselheiros aportam conhecimentos e
6
experiências valiosas.
O sistema de incentivos (remuneração ou outras formas
7
de benefícios) concedido aos conselheiros é adequado.
Além das reuniões, os conselheiros se reúnem
8 informalmente em outras ocasiões de forma a
promover integração e coesão entre si.
Os conselheiros procuram ativamente realizar contatos
9
externos que possam ajudar a organização.
Os conselheiros procuram se desenvolver
10 profissionalmente a fim de aprimorar sua atuação no
conselho.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Dimensão 3: postura independente.


4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente

# Questão
Há uma separação clara entre os papéis do conselho
1 e da diretoria, com alçadas e limites de atuação bem
definidos.
As expectativas e dúvidas do conselho são
2 comunicadas de maneira aberta e construtiva ao
diretor-presidente.
O conselho debate de forma franca com o
3 diretor-presidente os resultados de sua avaliação de
desempenho.

(Continua)
151

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão
O conselho analisa os resultados da avaliação de
4 desempenho dos membros da diretoria executiva
conduzida pelo diretor-presidente.
Os conselheiros colocam os interesses da empresa
5 sempre em primeiro lugar em suas análises e
posicionamentos.
Os debates têm sempre o foco em agregar valor à
6
organização.
O clima no conselho incentiva o pensamento crítico e
7
o debate, com espaço para dissonâncias.
O conselho toma decisões difíceis quando necessário,
8 mesmo que sejam contrárias aos interesses de
executivos e de alguns acionistas isoladamente.

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


Os votos dos conselheiros expressam convicção
9 fundamentada e preocupação estratégica, sem
interesses pessoais ou subjetivos.
Há um processo adequado para seleção de novos
10 conselheiros e diretores, sem interferência excessiva da
gestão.

Dimensão 4: funcionamento das reuniões.


4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente

# Questão
Pelo menos 50% do tempo das reuniões é gasto com
1 debates sobre questões de maior impacto, e não com
apresentações de executivos ou terceiros.
As apresentações realizadas são objetivas e com a
2
profundidade adequada.
3 Os temas são debatidos de forma estruturada.
4 Todos os conselheiros procuram contribuir nos debates.
As reuniões estimulam a participação de todos os
5
conselheiros.
Os debates são feitos em um bom nível, com espaço
6
para dissonâncias e posicionamentos críticos.
As reuniões do conselho ocorrem com uma frequência
7
adequada.
8 A pauta das reuniões é cumprida à risca.
9 As atas são elaboradas em tempo adequado.
10 Há um retorno adequado das pendências das reuniões.
152

Dimensão 5: composição e relações pessoais.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão
1 O conselho possui um número adequado de membros.
2 O conselho possui uma diversidade de gênero adequada.
O conselho possui uma diversidade de experiências
3
profissionais adequada.
Há diversidade adequada de formações acadêmicas
4
e expertise técnica.
O conselho possui uma diversidade adequada de
5
idade e tempo no cargo de seus membros.
Há uma renovação adequada e planejada dos
6
membros ao longo dos anos.
O conselho apresenta uma mescla adequada de
7
experiências profissionais e formações acadêmicas.
A cordialidade e o respeito predominam nas relações
8
entre os conselheiros.

Dimensão 6: fluxo de informações e comunicação.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão
Governança corporativa: o essencial para líderes 

O conselho recebe informações objetivas e concisas,


1 permitindo uma correta compreensão dos temas a
serem discutidos.
O conselho recebe o material de suporte para as
2
reuniões com antecedência adequada.
Os conselheiros dispõem de uma boa estrutura de apoio
3
para obtenção de informações adicionais necessárias.
Os executivos são prestativos no atendimento de
4
eventuais solicitações dos conselheiros.
A empresa fornece, aos conselheiros, informações
5 completas sobre os últimos desdobramentos no
ambiente regulatório.
Há um canal de comunicação adequado entre
6
conselheiros e diretores.
A secretaria do conselho agrega valor, contribuindo
7 na comunicação entre conselho e diretoria e no
acompanhamento de pendências.
O secretário de governança demonstrou a maturidade,
8 independência intelectual e motivação exigida para
o cargo.
153

Dimensão 7: comitês do Conselho.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão
O conselho possui os comitês necessários para seu
1
funcionamento adequado.
Os comitês se reportam ao conselho com frequência
2
apropriada.
Há um bom nível de esclarecimento acerca das
3
atividades e principais conclusões dos comitês.
O comitê de auditoria possui uma composição
4
adequada.
O comitê de auditoria se reúne com frequência
5
adequada.
O comitê de auditoria tem agregado valor para
6

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


a empresa.
O relatório de atividades do comitê de auditoria
7
é de boa qualidade.
O comitê de remuneração possui uma composição
8
adequada.

Tabela 5.2 – Modelo de autoavaliação de desempenho do conselho


como órgão

5.2  Avaliação individual dos conselheiros

Além da avaliação do conselho como órgão colegiado, deve-se avaliar o desempe-


nho individual dos conselheiros a fim de aferir a contribuição e o comprometimento
de cada um. O processo pode ser dividido em duas etapas. Inicialmente, os conse-
lheiros devem se autoavaliar por meio de um questionário construído a partir de
dimensões consideradas importantes para um bom desempenho de suas atribuições.
Na segunda etapa, os conselheiros são avaliados por seus pares.
Apresento, a seguir, um modelo baseado em quatro dimensões consideradas
relevantes para o bom exercício do cargo de conselheiro: 1) envolvimento com a
empresa; 2) postura independente e atuação nas reuniões; 3) relacionamento pessoal
e comunicação e 4) conhecimentos técnicos.
154

Dimensão 1: envolvimento com a empresa.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão:
Informo-me sobre os temas da pauta e leio os
1.1
documentos disponibilizados antes das reuniões.
1.2 Participo de todas as reuniões, com raras exceções.
Chego pontualmente às reuniões e sempre fico até o
1.3
final.
Dedico tempo adequado ao conselho de
1.4
administração.
Demonstro disposição em conhecer mais a fundo a
1.5 empresa, inclusive com disponibilidade para visitas às
operações e outras atividades.
Levo meu cargo de conselheiro bastante a sério
1.6 e trabalho continuamente para melhorar meu
desempenho no cargo.
Procuro acompanhar ativamente as notícias que
1.7
envolvem direta ou indiretamente a organização.
1.8 Tenho agregado valor ao conselho.

Dimensão 2: postura independente e atuação nas reuniões.


4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
Governança corporativa: o essencial para líderes 

# Questão:
Expresso minhas visões pessoais sobre os temas a serem
2.1
deliberados de forma justificada e independente.
Procuro agregar outras visões aos temas da pauta,
2.2 trazendo novas ideias sobre os temas a serem
debatidos.
Respeito o tempo de fala dos outros conselheiros e
2.3
exponho minhas ideias sem monopolizar o debate.
Quando necessário, sou firme em manter minha visão
2.4
pessoal sobre o tema, não resistindo a pressões de outros.
Quando mantenho minha visão divergente da maioria
2.5 após os debates, faço constar em ata o registro de
meu voto dissonante.
Mantenho o foco na reunião, sem me deixar distrair por
2.6
e-mails, telefonemas, acesso à internet etc.
2.7 Sou independente de acionistas específicos.
2.8 Sou independente dos executivos.
155

Dimensão 3: relacionamento pessoal e comunicação.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão:
Sou capaz de trabalhar bem com os outros
3.1
conselheiros e com os membros do corpo executivo.

Tenho demonstrado abertura em escutar as opiniões


3.2
dos outros.

Sou capaz de expressar minhas opiniões e sentimentos


3.3 de forma aberta e convincente, porém diplomática e
respeitosa.

Tenho uma boa relação com o secretário de


3.4
governança.

3.5 Tenho uma boa relação com os outros conselheiros.

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


3.6 Tenho uma boa relação com o diretor-presidente.

O meu comportamento tem gerado confiança mútua


3.7
e respeito junto aos demais conselheiros.

Procuro fazer o melhor para ajudar meus colegas de


3.8
conselho e executivos da empresa quando solicitado.

Dimensão 4: conhecimentos técnicos.


4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente

# Questão:
Sou capaz de analisar, em profundidade, os planos de
4.1 orçamento de capital e suas implicações de médio e
longo prazos.

Sou capaz de interpretar plenamente as


4.2
demonstrações financeiras da empresa.

Sou capaz de explicar a posição financeira da


4.3
empresa para outros, caso solicitado.

Sou capaz de avaliar a qualidade das operações e


4.4
dos serviços prestados por nossa empresa.

(Continua)
156

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão:
Sou capaz de analisar a fundo os planos para novos
4.5
produtos, serviços e tecnologias da companhia.

Sou capaz de contribuir substancialmente para o


4.6
planejamento estratégico da organização.

Sou capaz de aportar conhecimentos na área


4.7 de gestão de pessoas, incluindo mecanismos de
avaliação de desempenho e sucessão.

Sou capaz de explicar, a terceiros, a história, valores,


4.8 princípios e estrutura de governança de nossa
organização.

Tabela 5.3 – Modelo de autoavaliação individual dos conselheiros

Exemplos de questões abertas para autoavaliação


individual dos conselheiros:
 Identifique áreas ou temas nos quais você sente que é necessário se aprimorar
pessoalmente. Como a empresa pode lhe ajudar neste processo?
Governança corporativa: o essencial para líderes 

 Você considera que sua dedicação de tempo tem sido suficiente para o pleno
exercício do cargo? Quanto tempo você acredita que seria o ideal?
 Você se considera independente de interesses específicos de determinados acio-
nistas e dos executivos? Seus pontos de vista têm refletido esta independência?
 Você tem lidado adequadamente com situações envolvendo conflito de
interesses?
 Você se sente plenamente atualizado em relação às exigências do cargo e do
momento atual da empresa?

Na segunda etapa do processo de avaliação individual, os conselheiros devem


avaliar os demais colegas do conselho, um a um, a partir dos mesmos parâmetros
que fizeram sua autoavaliação. A tabela seguinte mostra como isso pode ser feito.
Assinale com um X sua avaliação sobre cada conselheiro da empresa.
 Utilize os seguintes critérios para pontuação: 1 – Muito abaixo das expectativas; 2 – Abaixo das expectativas;
3 – Atende às expectativas; 4 – Acima das expectativas; 5 – Muito acima das expectativas.
Conselheiro 1 Conselheiro 2 Conselheiro 3 Conselheiro 4
Tema 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
1.1 Preparação prévia para as reuniões.
1.2 Assiduidade nas reuniões.
1.3 Pontualidade e presença durante toda a reunião.
1.4 Dedicação geral de tempo para a empresa.
Disposição em conhecer mais a fundo da empresa,
1.5
inclusive com visita às instalações.
Seriedade no cargo e esforço para aprimoramento do
1.6
desempenho pessoal.
Acompanhamento de notícias sobre a empresa entre
1.7
as reuniões.
1.8 Agregação de valor ao conselho.
2.1 Qualidade e independência dos posicionamentos.
Aporte de visões diferentes ou novas informações
2.2
sobre os temas.
2.3 Respeito ao tempo de fala dos demais conselheiros.
Firmeza na manutenção de sua posição pessoal
2.4
quando necessário.
Disposição em manter sua convicção caso necessário,
2.5
inclusive via voto contrário.
Foco na reunião, sem utilização de e-mails, internet,
2.6
celular etc.
2.7 Independência de acionistas específicos.
2.8 Independência dos executivos.
Capacidade de trabalhar bem com conselheiros e
3.1
executivos.
3.2 Abertura para escutar as opiniões dos outros.
(Continua)

157
Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 
158
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Assinale com um X sua avaliação sobre cada conselheiro da empresa.


 Utilize os seguintes critérios para pontuação: 1 – Muito abaixo das expectativas; 2 – Abaixo das expectativas;
3 – Atende às expectativas; 4 – Acima das expectativas; 5 – Muito acima das expectativas.
Conselheiro 1 Conselheiro 2 Conselheiro 3 Conselheiro 4
Tema 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5
Capacidade de expressar as opiniões de forma
3.3
convincente, porém diplomática e respeitosa.
Qualidade do relacionamento com o secretário de
3.4
governança.
3.5 Qualidade do relacionamento com os outros conselheiros.
3.6 Qualidade do relacionamento com diretor-presidente.
Confiança e respeito gerado junto aos demais
3.7
conselheiros.
Disposição em ajudar os demais conselheiros e
3.8
executivos quando solicitado.
Conhecimentos manifestados na análise de projetos
4.1
de investimentos.
Conhecimentos manifestados na interpretação das
4.2
demonstrações financeiras.
Capacidade de explicar a posição financeira da
4.3
empresa para terceiros.
Capacidade de analisar a qualidade dos produtos e
4.4
serviços prestados pela empresa.
Conhecimentos manifestados na análise de planos
4.5
para novos negócios ou tecnologias.
Capacidade de contribuição em brainstorming de
4.6
planejamento estratégico.
Conhecimentos manifestados na área de gestão de
4.7
pessoas.
Capacidade de explicar a história, visão e valores da
4.8
empresa para terceiros.

Tabela 5.4 – Modelo para avaliação individual dos conselheiros por seus pares
Os resultados da avaliação individual podem ser analisados de duas formas com- 159
plementares. Uma opção é comparar a nota média do conselheiro em cada dimensão
— obtida a partir dos conceitos atribuídos por seus pares — com a pontuação média dos
demais colegas. Isso permite a ele ou ela visualizar as áreas em que se sobressai e aquelas em
que apresenta deficiência. A figura a seguir ilustra como isso pode ser feito graficamente.

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


Figura 5.1 – Avaliação do conselheiro vs avaliação agregada
dos conselheiros por dimensão.

A outra opção é confrontar a autoavaliação do conselheiro com o parecer que


seus pares fizeram sobre ele ou ela. Assim, vêm, à tona, as áreas em que sua opinião
sobre si mesmo converge ou diverge de forma mais pronunciada da visão alheia. O
figura a seguir mostra como isso pode ser feito.

Figura 5.2 – Autoavaliação vs. avaliação efetuada pelos demais


membros do conselho.
160

5.3  Avaliação do presidente do conselho

Dentre os conselheiros, merece destaque a atuação do presidente do órgão. É ele


ou ela, em última instância, que desempenha um papel crítico a fim de fazer com
que o conselho funcione da melhor forma.
Como resultado, o presidente do conselho deve passar por um processo de avalia-
ção que contemple não apenas os parâmetros contidos na avaliação dos conselheiros,
mas também outros aspectos considerados essenciais para seu bom desempenho,
tais como a forma de condução das reuniões, a qualidade do relacionamento com
a gestão, e a representatividade institucional.
Além de se autoavaliar, é importante que o presidente do conselho seja avaliado
por seus pares. Abaixo, disponibilizo um modelo exemplificativo de avaliação do
presidente com base em questões objetivo e perguntas abertas. Ao final do processo,
pode-se fazer uma comparação entre a avaliação dos conselheiros e a opinião do
presidente do conselho sobre si mesmo.

Dimensão 1: integridade e postura independente.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
Governança corporativa: o essencial para líderes 

# O Presidente do Conselho:
Age de forma independente de qualquer acionista
1
específico.

2 Age de forma independente da gestão.

Procurar assegurar que as decisões sejam tomadas


3 de forma objetiva e no melhor interesse de longo prazo
da organização.

4 Age de maneira imparcial.

5 É ético.

Comporta-se de forma consistente com os valores


6
e missão da organização.

Promove elevados padrões de conduta e governança


7
na organização.

Expõe seus pontos de vista com confiança,


8
independência e coragem.
161

Dimensão 2: condução das reuniões.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# O Presidente do conselho:
1 Define uma pauta adequada.
Procura assegurar que o conselho receba informações
3
de boa qualidade.
Assegura que as informações sejam enviadas com a
4
devida antecedência.
5 Gerencia bem o tempo durante as reuniões.
Procura encerrar rapidamente debates sobre questões
6
menores.
Encoraja o debate aberto e franco entre os
7
conselheiros.

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


Procura extrair ao máximo as contribuições de cada
8
conselheiro.
Procura estabelecer um debate crítico e, ao mesmo
9
tempo, construtivo.
Encoraja o espírito de equipe do conselho como órgão
10
colegiado.
Lida bem com temas sensíveis e matérias sujeitas a
11
conflitos de interesses.
12 Estabelece um processo decisório claro e estruturado.
Resume bem as diferentes visões dos conselheiros e as
13
decisões tomadas.
Assegura que a ata seja de qualidade e distribuída em
14
tampo adequado.
Assegura que as decisões do conselho sejam
15
implementadas corretamente.

Dimensão 3: relacionamento com a gestão e stakeholders.


4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente

# O Presidente do conselho:
1 Possui uma boa relação com os demais conselheiros.
Possui uma boa relação de trabalho com o
2
diretor-presidente.
Quando necessário, tece críticas construtivas ao
3
diretor-presidente.

(Continua)
162

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# O Presidente do conselho:
Não se envolve excessivamente com a gestão e
4
questões operacionais.
Trabalha para assegurar uma boa relação entre
5
conselho e diretoria.
Possui uma boa relação com os acionistas da
6
empresa.
Possui uma boa relação com outros
7
stakeholders-chave da organização.
Ajuda a organização por meio de sua rede de
8
contatos pessoais.
Contribui para promover uma imagem pública positiva
9
da empresa.
É muito respeitado e percebido como liderança no
10
ambiente empresarial.

Dimensão 4: estilo de liderança.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# O Presidente do conselho:
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Constitui um exemplo a ser seguido pelos demais


1
conselheiros.
2 Possui o apoio dos demais conselheiros.
Procura obter um feedback dos demais conselheiros
3 sobre como seu desempenho na presidência do
conselho pode ser melhorado.
Lidera o conselho no pleno cumprimento de suas
4
responsabilidades.
Promove um verdadeiro trabalho em equipe no
5
conselho.
Estabelece elevados padrões de ética e conduta
6
para si mesmo.
Entende plenamente o que é exigido no papel de
7
presidente do conselho.
Possui disposição para admitir erros que tenha
8
cometido ou deficiências.
9 Demonstra ser uma liderança efetiva do conselho.
Mostra desejo de prestar contas perante todos os
10
acionistas.
163

Dimensão 5: envolvimento com a empresa e contribuição pessoal.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# O Presidente do Conselho:
1 Dedica tempo suficiente ao cargo.

Permanece disponível aos conselheiros fora das


2
reuniões.

Prepara-se adequadamente para conduzir as


3
reuniões.

Participa de eventos e outras atividades organizadas


4
pela empresa.

Dedica tempo para entender, a fundo, o negócio


5
e o setor de atuação.

Procura conhecer outras pessoas da organização,

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


6
além dos diretores.

7 Aporta experiências relevantes para o conselho.

Consegue perceber implicações maiores para


8
a empresa dos temas em discussão.

Está sempre atualizado em relação às questões


9 de regulação e mercado que possam afetar
a organização.

Procura se reciclar profissionalmente e adquirir novos


10
conhecimentos.

Tabela 5.5 – Modelo para avaliação do Presidente do Conselho pelos demais


conselheiros

Questões abertas para avaliação do presidente do conselho:

 O presidente do conselho tem exercido liderança efetiva do conselho?


 O presidente do conselho se relaciona de forma adequada com os acionistas?
 O presidente se relaciona de forma adequada com os demais conselheiros?
 Quais são os principais pontos fortes do presidente do conselho de adminis-
tração? (Indique até cinco aspectos).
 Quais são as áreas que o presidente do conselho possui maior potencial para
aprimoramento? (Indique até cinco aspectos).
164

5.4  Avaliação do diretor-presidente

Tendo em vista seu papel central como líder da organização e como elo entre a
gestão diária e o conselho, é essencial que o diretor-presidente passe por um processo
abrangente de avaliação que vá muito além do alcance de metas financeiras.
Além de contribuir para uma boa prestação de contas aos acionistas, a avaliação
do diretor-presidente proporcionará, ao conselho, elementos mais objetivos para
a definição de sua remuneração variável, bem como para sua manutenção ou não
no cargo. Para o executivo, o processo de avaliação permitirá identificar áreas para
aprimoramento pessoal e lacunas no seu estilo de gestão, contribuindo para sua
evolução profissional.
A avaliação do diretor-presidente deve ser realizada anualmente pelo conse-
lho ou por um comitê específico do órgão, em geral o de recursos humanos ou
de governança corporativa, quando existentes. O responsável pela condução do
processo pode ser o presidente do conselho, um conselheiro independente (no caso
do diretor-presidente ser o próprio presidente do conselho), ou o coordenador do
comitê do conselho responsável pela avaliação.
Além dos aspectos objetivos, como o alcance das metas quantitativas (financeiras,
operacionais e estratégicas) definidas para o período, o processo de avaliação do
diretor-presidente deve contemplar elementos subjetivos associados a aspectos
como a qualidade da comunicação, comportamento ético, estilo de liderança,
confiabilidade, comprometimento, espírito de equipe, expertise, relacionamento
com o conselho, subordinados e stakeholders etc.
Atualmente, o processo de avaliação do diretor-presidente ainda está longe de
Governança corporativa: o essencial para líderes 

ser holístico na maioria das empresas. Ao contrário, em geral atribui-se um peso


muito grande ao alcance das metas financeiras e um peso muito pequeno a aspectos
qualitativos associados a questões como formação de lideranças, ética, satisfação dos
clientes etc. Como exemplo, a tabela a seguir apresenta os resultados de uma pes-
quisa realizada junto a 160 companhias norte-americanas em 2013 com o objetivo
de aferir como os diretores-presidentes são comumente avaliados.

Qual o peso de cada parâmetro na avaliação


# do seu diretor-presidente? Peso na avaliação
1 Resultados financeiros4
41%
2 Capacidade de implementação da estratégia 17%
3 Estilo de liderança 15%
4 Formação de lideranças internas e planejamento sucessório 5%
5 Qualidade dos produtos e dos serviços prestados 4%

(Continua)
165

Qual o peso de cada parâmetro na avaliação


# do seu diretor-presidente? Peso na avaliação
6 Satisfação dos clientes 4%
7 Capacidade de inovação 4%
8 Satisfação dos funcionários e rotatividade interna 3%
9 Segurança do trabalho 2%
10 Outros 5%

Tabela 5.6 – Aspectos levados em consideração na avaliação


do diretor-presidente

Conforme observado acima, questões relevantes para o sucesso do negócio,


como capacidade de inovação, satisfação dos clientes e planejamento sucessório
ainda tendem a pesar pouco na avaliação dos altos executivos.

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


Além disso, a mesma pesquisa concluiu – de forma preocupante para o longo
prazo das organizações – que os presidentes atualmente tendem a ter como
principais pontos fracos a capacidade de desenvolver talentos internamente,
proporcionar bom aconselhamento (mentoring) aos executivos, se relacionar
adequadamente com o conselho, ouvir e administrar conflitos de interesses. Por
outro lado, a pesquisa constatou, entre os principais pontos fortes dos direto-
res-presidentes, a capacidade de: tomar decisões, planejar, construir boas equipes,
e se comunicar.
Além do caráter multidimensional, a avaliação do diretor-presidente também
deve ser realizada em 360°. Isto é, deve-se considerar não apenas a opinião dos
conselheiros, mas também a dos demais diretores, subordinados diretos e pessoas
das áreas de controle. Em alguns casos, podem ser ouvidos até mesmo alguns pú-
blicos externos, como clientes-chave, fornecedores, parceiros de negócio e outros
representantes de stakeholders.
Tendo em vista que os conselheiros tendem a interagir com o diretor-presidente na
maior parte do tempo em reuniões de conselho – um ambiente naturalmente contro-
lado no qual o executivo pode muitas vezes procurar se comportar artificialmente –,
é importante que os conselheiros procurem observar como o diretor-presidente se
relaciona com os colegas de diretoria, subordinados e colaboradores.
Independentemente do método de avaliação escolhido, o conselho deve realizar
uma sessão específica destinada a avaliar o desempenho do diretor-presidente. Ao
final, os resultados devem ser apresentados, de forma franca, ao executivo como
uma opinião coletiva do órgão, e não de indivíduos específicos. Acima de tudo, é
fundamental que o processo de avaliação seja íntegro, objetivo e com espírito cons-
trutivo, evitando sua politização e perda de credibilidade.
166

Avaliação de desempenho do diretor-presidente:


A seguir, apresento duas formas alternativas e complementares para avaliar
o diretor-presidente. A primeira consiste em um questionário dividido em sete
dimensões relevantes para o bom desempenho da presidência da organização:

1. Estilo de liderança e dedicação;


2. Gestão de pessoas e sucessão;
3. Relacionamento com o conselho de administração;
4. Relacionamento com stakeholders e representatividade institucional;
5. Gestão diária e alcance das metas estratégicas;
6. Visão estratégica e capacidade decisória; e,
7. Ética, integridade e cumprimento das leis e normas.

Cada dimensão pode ser composta por diversas questões. Para cada uma delas,
os conselheiros devem atribuir uma nota de 1 a 10 ao diretor-presidente com base
nos seguintes parâmetros: 9 ou 10: excelente – o desempenho é claramente notável,
supera amplamente as expectativas; 7 ou 8: muito bom – o desempenho em geral
atende ou supera as expectativas; 5 ou 6: satisfatório – o desempenho é adequado,
atende às expectativas; 3 ou 4: precisa melhorar – o desempenho deixa de atender
a algumas expectativas relevantes; e, 1 ou 2: inaceitável – o desempenho é muito
abaixo do nível aceitável.

Dimensão 1: estilo de liderança e dedicação.


Governança corporativa: o essencial para líderes 

julgar este quesito


das expectativas

das expectativas

Não é possível
Muito abaixo

Muito acima
expectativas

expectativas

expectativas
Abaixo das

Acima das
Atende às

Dimensão 1: Estilo de liderança


e dedicação

# O diretor-presidente: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Possui um estilo de trabalho
1
aberto a críticas construtivas.
Atua com espírito de equipe
2
e de forma cooperativa.
Consegue criar um ambiente
3 com elevada motivação e
lealdade na organização.
Possui bom relacionamento
4 com os demais diretores e é
muito respeitado por eles.
(Continua)
167

julgar este quesito


das expectativas

das expectativas

Não é possível
Muito abaixo

Muito acima
expectativas

expectativas

expectativas
Abaixo das

Acima das
Atende às
Dimensão 1: Estilo de liderança
e dedicação

Demonstra iniciativa,
entusiasmo e persistência
5 necessária para alcançar
as metas estratégicas da
organização.
Proporciona o direcionamento
6 adequado e uma liderança
efetiva à organização.
Valoriza as pessoas e
7 demonstra preocupação
genuína com seu bem-estar.
Delega tarefas e

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


responsabilidades de forma
8 apropriada, evitando
centralização excessiva de
poder.
Procura obter um feedback
dos conselheiros e executivos
9 sobre como seu desempenho
e comportamento podem ser
melhorado.
Tem procurado evoluir
pessoalmente e
10 tecnicamente nas áreas
com maior potencial para
aprimoramento.

Dimensão 2: gestão de pessoas e sucessão.


julgar este quesito
das expectativas

das expectativas

Não é possível
Muito abaixo

Muito acima
expectativas

expectativas

expectativas
Abaixo das

Acima das
Atende às

Dimensão 2: Gestão de pessoas


e sucessão

# O diretor-presidente: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Coloca as pessoas certas nas
1
posições certas.
Vem preparando,
adequadamente,
2
pessoas para ocupar as
posições-chave da empresa.
Vem desenvolvendo um processo
3
estruturado para sua sucessão.

(Continua)
168

julgar este quesito


das expectativas

das expectativas

Não é possível
Muito abaixo

Muito acima
expectativas

expectativas

expectativas
Abaixo das

Acima das
Atende às
Dimensão 2: Gestão de pessoas
e sucessão

Faz com que os potenciais


candidatos aos cargos de
4
alta gestão tenham exposição
adequada ao conselho.
Comunica, de forma
apropriada, as questões
5
corporativas para executivos e
colaboradores.
Avalia, adequadamente, o
desempenho dos diretores e
6
dos executivos que trabalham
ao seu redor.
Estabelece recompensas e
7
punições de forma adequada.
Mantem um sistema de
8 remuneração apropriado para
o corpo gerencial.
Fomenta um ambiente
genuinamente meritocrático
9
– e não político – na
organização.
Incentiva a diversidade nos
10
quadros gerenciais.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Dimensão 3: relacionamento com o conselho de administração.


julgar este quesito
das expectativas

das expectativas

Não é possível
Muito abaixo

Muito acima
expectativas

expectativas

expectativas
Abaixo das

Acima das
Atende às

Dimensão 3: Relacionamento
com o conselho de administração

# O diretor-presidente: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Possui um bom
relacionamento de trabalho
1
com o conselho de
administração.
Atua de forma cooperativa e
2 demonstra vontade de prestar
contas ao conselho.

(Continua)
169

julgar este quesito


das expectativas

das expectativas

Não é possível
Muito abaixo

Muito acima
expectativas

expectativas

expectativas
Abaixo das

Acima das
Atende às
Dimensão 3: Relacionamento
com o conselho de administração

Está sempre disponível


para atender e ajudar
3 os conselheiros quando
necessário (dentro das regras
da organização).
Ajuda o presidente do
conselho a montar uma pauta
4
adequada para o órgão,
quando solicitado.
Possui papel essencial em
assegurar que o conselho
5 receba informações
de qualidade e com a

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


antecedência necessária.
Realiza apresentações para o
6 conselho de forma objetiva,
imparcial e profissional.
Apresenta seus pontos de vista
7 para o conselho de forma
bastante fundamentada.
Transmite segurança na
apresentação dos resultados
8
financeiros e situação
financeira da empresa.
Transmite segurança na
compreensão dos principais
9 riscos aos quais o negócio está
sujeito, incluindo as medidas
para mitigá-los.
Ajuda o conselho a tomar
10
decisões melhores.

Dimensão 4: relacionamento com stakeholders e representatividade institucional.


julgar este quesito
das expectativas

das expectativas

Não é possível
Muito abaixo

Muito acima
expectativas

expectativas

­ xpectativas
Abaixo das

Acima das
Atende às

Dimensão 4: Relacionamento
com stakeholders e representatividade
institucional
e

# O diretor-presidente: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Possui boa relação com os
clientes e fornecedores-chave
1
e parceiros de negócio da
empresa.
(Continua)
170

julgar este quesito


das expectativas

das expectativas

Não é possível
Muito abaixo

Muito acima
expectativas

expectativas

­ xpectativas
Abaixo das

Acima das
Atende às
Dimensão 4: Relacionamento
com stakeholders e representatividade
institucional

e
Possui boa relação com
reguladores e outros
2
representantes do poder
público.

Possui boa relação com


sindicatos e outras entidades
3
que representam os
colaboradores.

É reconhecido como uma


4 liderança no setor de
atividade da empresa.

Comunica-se
adequadamente com
5 a mídia, representantes
da comunidade e outros
stakeholders relevantes.

Apresenta, de forma clara,


os resultados financeiros e
6 perspectivas estratégicas
para analistas, investidores,
credores etc.

Consegue lidar
adequadamente com
Governança corporativa: o essencial para líderes 

as questões de relações
7
públicas, particularmente
temas delicados envolvendo
a empresa.

Tem encorajado ações no


sentido de promover elevados
8 padrões de responsabilidade
social e sustentabilidade da
empresa.

Possui imagem positiva


perante o mercado e
9
stakeholders-chave da
empresa.

Desenvolve contatos políticos


e de negócio úteis para
10 a empresa, inclusive na
construção de alianças e
acesso a capital.
171

Dimensão 5: visão estratégica e capacidade decisória.

julgar este quesito


das expectativas

das expectativas

Não é possível
Muito abaixo

Muito acima
expectativas

­ xpectativas

­ xpectativas
Abaixo das

Acima das
Atende às
Dimensão 5: Visão estratégica
e capacidade decisória

e
# O diretor-presidente: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Possui visão estratégica e
1 direcionamento claro para o
futuro da empresa.

Consegue pensar em
estratégias inovadoras e
2 criativas para enfrentar os
desafios estratégicos da
empresa.

Toma decisões no
momento certo (não é nem

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


3
excessivamente ágil, nem
lento para decidir).

Consegue criar uma cultura


que reforça a missão, valores
4
e princípios de governança
da empresa.

Consegue pensar, de forma


estratégica e a longo prazo,
5 não se concentrando
excessivamente em questões
menores do dia a dia.

Consegue transmitir,
adequadamente, a estratégia
6
da empresa para os escalões
inferiores.

É fundamental na
identificação das ameaças
7
e oportunidades externas da
empresa.

Compreende a importância
estratégica das áreas de
8
controle e aloca recursos
adequados a elas.

Toma boas decisões a


respeito das operações
9
diárias, produtos e serviços da
empresa.

Demonstra criatividade e
capacidade de inovação em
10
relação ao lançamento de
novos produtos e serviços.
172

Dimensão 6: gestão diária e alcance das metas estratégicas.

julgar este quesito


das expectativas

das expectativas

Não é possível
Muito abaixo

Muito acima
expectativas

­ xpectativas

­ xpectativas
Abaixo das

Acima das
Atende às
Dimensão 6: Gestão diária
e alcance das metas estratégicas

e
# O diretor-presidente: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Monitora o orçamento e os
indicadores operacionais de
1
forma a assegurar o alcance
das metas definidas.
Procura assegurar que as
estratégias da empresa e das
2
unidades de negócio estejam
sendo bem executadas.
Consegue converter os
objetivos estratégicos em
3 planos de negócio factíveis
de forma a proporcionar o
sucesso da organização.
Proporciona conforto ao
conselho em relação à
4
qualidade dos controles
internos da empresa.
Proporciona conforto ao
conselho em relação à
5
qualidade das práticas de
gestão de riscos.
Administra bem o dia a dia
6
do negócio.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Conseguiu alcançar as metas


7 financeiras definidas para o
exercício.
Conseguiu alcançar as metas
8 não financeiras definidas para
o exercício.
Assegura uma boa
percepção da empresa junto
9 aos clientes, inclusive por
meio do acompanhamento
das reclamações.
Tem sido capaz de manter
ou ampliar a participação
10
de mercado e vantagens
competitivas da empresa.
173

Dimensão 7: ética, integridade e cumprimento das leis e normas.

julgar este quesito


das expectativas

das expectativas

Não é possível
Muito abaixo

Muito acima
expectativas

­ xpectativas

­ xpectativas
Abaixo das

Acima das
Atende às
Dimensão 7: Ética, integridade
e cumprimento das leis e normas

e
# O diretor-presidente: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Age de forma consistente
1 com integridade e adesão
aos valores da organização.
Promove elevados padrões
2 de ética e integridade na
organização.
Cria um ambiente
organizacional que atrai
3 pessoas não apenas
talentosas, mas que possuem

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


um perfil íntegro.
Demonstra sensibilidade e
4
respeito pelos subordinados.
Administra os problemas de
5
forma profissional e imparcial.
Procura assegurar uma
boa prestação de contas
6
em todos os níveis da
organização.
Proporciona conforto ao
conselho em relação à
7 conformidade da empresa
com as leis e demais requisitos
legais.
Proporciona conforto ao
conselho em relação à
8
precisão das demonstrações
financeiras.
Assegura que as não
conformidades levantadas
9 pelas auditorias internas
e independentes sejam
sanadas.
Assegura que a empresa
10 envie todos os documentos
públicos exigidos no prazo.

Tabela 5.7 – Modelo para avaliação do diretor-presidente


174

A outra forma de avaliar o diretor-presidente consiste em um questionário no


qual os conselheiros devem posicionar sua atuação entre dois extremos, um positivo
e outro negativo, em uma escala de -5 a +5. Este questionário alternativo, composto
por 50 tópicos com foco nos aspectos comportamentais do executivo, poderá ser
utilizado como uma ferramenta complementar ao questionário anterior.

Avalie onde o diretor-presidente se encaixa em relação aos extremos abaixo:


# O diretor-presidente: -5 -4 -3 -2 -1 1 2 3 4 5 O diretor-presidente:
Não se comunica
Comunica-se bem
1 bem com o
com o conselho.
conselho.
Monopoliza
Discorre em tempo
demais o tempo
2 adequado nas
das reuniões do
reuniões.
conselho.
Submete materiais
Envia informações
confusos e
3 de boa qualidade
deficientes ao
ao conselho.
conselho.
É enviesado e
É imparcial em suas
4 parcial em suas
apresentações.
apresentações.
Transmite
Transmite segurança
5 insegurança e falta
ao conselho.
de domínio.
Tenta impor Respeita a agenda
6 sua agenda ao definida pelo
conselho. conselho.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Não possui visão Possui visão


7
estratégica. estratégica.
Apresenta sinais
8 questionáveis de É íntegro.
integridade.
Lida bem com
Não lida bem com
imprevistos,
9 imprevistos, falhas e
insucessos e
fracassos.
fracassos.
Sabe quando
É excessivamente
10 atuar de forma
autocrático.
democrática.
“Passa por cima” Dá espaço
11 dos demais adequado aos
diretores. demais diretores.
Impõe dificuldade
É o primeiro a
à obtenção de
12 ir atrás de mais
informações
informações.
adicionais.

(Continua)
175

Avalie onde o diretor-presidente se encaixa em relação aos extremos abaixo:


Não irá mudar sua Demonstra que
13 forma de atuar e pode mudar e
decidir. melhorar.
14 Não aprende mais. Aprende rápido.
Não admite ser Gosta de ser
15
contrariado. desafiado.
Perde o controle
É sempre equilibrado
16 emocional
emocionalmente.
facilmente.
Gosta de formar Gosta de formar
17
seguidores. líderes.
Tem muita
18 Está acomodado.
motivação.
Trabalha bem sob
19 É fraco sob pressão.
pressão.
Reconhece suas

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


Não reconhece suas deficiências e
20
deficiências. pontos para
aprimoramento.
Assume
Culpa os outros
responsabilidade
21 quando as coisas
pelos erros e
não dão certo.
fracassos.
É opaco e costuma
22 É honesto e franco.
atuar na surdina.
Desmotiva as
23 Motiva as pessoas.
pessoas.
Não dá ouvidos
É aberto para ouvir
24 a pontos de vista
visões diferentes.
diferentes.
Possui um ego
É humilde na dose
25 excessivamente
certa.
inflado.
É excessivamente
26 É cooperativo.
competitivo.
Prioriza
Enfatiza as questões
27 exclusivamente o
de ordem ética.
resultado financeiro.
Não enfatiza fazer Procura fazer o certo
28 o certo em temas quando lida com
delicados. temas delicados.
Pensa
Pensa no sucesso
excessivamente nos
29 de longo prazo do
resultados de curto
negócio.
prazo.
Não fala bem na
30 Fala bem na mídia.
mídia.

Tabela 5.8 – Ferramenta alternativa para avaliação do diretor-presidente


176

Além dos dois modelos de questionários disponibilizados, recomenda-se que os


conselheiros respondam a algumas questões abertas sobre a atuação do diretor-pre-
sidente, tais como:

 As metas vêm sendo alcançadas com a qualidade esperada do ponto de vista


de gestão? A que custo elas vêm sendo alcançadas? Quem está arcando com
esse custo?
 O diretor-presidente está lançando as bases para um crescimento futuro
sustentável da organização? Em que medida o desempenho depende de
circunstâncias do mercado?
 Que tipo de pessoa o diretor-presidente está contratando? Que perfil está
sendo priorizado? Ele ou ela está formando lideranças ou seguidores?
 Quais são os pontos fortes e fracos do diretor-presidente no que concerne
ao seu estilo de liderança, relacionamento pessoal e inteligência emocional?
 Quais devem ser as principais áreas para desenvolvimento pessoal do presidente
no próximo ano? Identifique áreas onde ele ou ela precisa de aprimoramento.

Após o preenchimento individual dos questionários e respostas às perguntas


abertas, o conselho deve se reunir em sessão específica e chegar a um consenso
sobre a opinião coletiva do órgão em relação à avaliação do diretor-presidente para
cada item. Essa avaliação deve ser registrada formalmente, inclusive com ata da
reunião em questão. O conselho deverá então se reunir com o diretor-presidente a
fim de apresentar seus resultados. O executivo deve ter oportunidade de expor seu
ponto de vista sobre a avaliação realizada, incluindo seus pontos de concordância
e discordância. Ao final, deve-se definir um plano de ação para os pontos críticos
Governança corporativa: o essencial para líderes 

identificados.
Outra possibilidade é o preenchimento dos questionários disponibilizados
pelo diretor-presidente como um mecanismo de autoavaliação. Neste caso, deve-se
comparar a visão coletiva dos conselheiros em relação ao diretor-presidente com
a opinião do executivo sobre si mesmo. Isso pode ser feito visualmente, de forma
similar ao gráfico para avaliação individual dos conselheiros ilustrado na Figura 5.2.

5.5  Avaliação da diretoria executiva e dos comitês de


gestão

Apesar de pouco abordados pela literatura sobre governança, é na diretoria


executiva como órgão colegiado e nos comitês de gestão que são tomadas decisões
cruciais para o bom andamento do negócio. Logo, é fundamental que esses órgãos
177

não apenas funcionem de acordo com determinados regramentos, mas que também
consigam criar um ambiente propício ao desenvolvimento de debates aprofundados
que levem a decisões ricas e colegiadas.
O modelo de avaliação, disponibilizado a seguir, abrange cinco dimensões de
análise: 1) características gerais do órgão; 2) qualidade do processo decisório; 3)
funcionamento das reuniões; 4) autoavaliação de cada membro e 5) coordenação. Ele
pode ser utilizado tanto para a diretoria executiva quanto para os comitês de gestão.
Para fins de simplificação, as questões foram construídas utilizando os comitês de
gestão como objeto de análise.5
Os resultados finais da avaliação dos comitês de gestão devem ser apresentados
para a diretoria executiva para ciência e identificação de pontos de melhoria. Assim
como no caso da avaliação do conselho, recomenda-se que as afirmações a seguir
sejam acompanhadas de espaço para comentários qualitativos por parte dos res-
pondentes.

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


Dimensão 1: características gerais.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

# Questão totalmente

Há clareza em relação ao objetivo e competências


1
do comitê.
O comitê possui a estrutura (administrativa, física,
2 tecnológica e de pessoal) necessária para a
consecução de seu objetivo.
3 O comitê possui um número adequado de membros.
A composição do comitê é fixa e restrita aos seus
4
membros oficiais.
O comitê apresenta diversidade adequada
5
de experiências profissionais.
As reuniões do comitê possuem regularidade definida
6
e ocorrem de acordo com o planejado.
As reuniões do comitê ocorrem com a frequência
7
adequada.
8 As reuniões do comitê possuem duração adequada.
A pauta das reuniões do comitê é adequada às suas
9
atribuições.
O comitê discute todos os temas de sua competência
10
ao longo do ano.
178

Dimensão 2: qualidade do processo decisório.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão
O processo decisório do comitê é bem estruturado e
1
de fácil entendimento.
As reuniões estimulam a participação de todos os
2
membros do comitê.
Os membros contribuem com o debate trazendo
3 informações novas ou relevantes sobre os temas a
serem discutidos.
Os debates sobre as matérias da pauta têm bom nível
4
técnico e conceitual.
Os debates são abertos, francos e transparentes, com
5
espaço para dissonâncias e posicionamentos críticos.
Os membros do comitê respeitam a ordem da fala
6 de cada um para que todos possam comunicar suas
visões sobre o tema.
O tempo é bem distribuído entre os membros, evitando
7
monopólio da fala por alguns.
A deliberação do comitê ocorre após a manifestação
8 individual e o posicionamento de todos os seus
membros, ocorrendo de forma colegiada.
Os votos dos membros do comitê expressam sua
9 convicção fundamentada, sem interesses pessoais ou
subjetivos.
As decisões tomadas pelo comitê são úteis e agregam
10
valor à empresa.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Dimensão 3: funcionamento das reuniões.


4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente

# Questão
Os membros se preparam adequadamente para as
1
reuniões.
2 Os membros do comitê têm sido assíduos às reuniões.
A participação de representantes no lugar dos
3
membros oficiais é rara.

(Continua)
179

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão
O material de suporte das reuniões tem a
4 profundidade adequada para a tomada de decisão
e é enviado com a antecedência devida.
As apresentações realizadas no âmbito do comitê são
5
claras, sucintas e têm a profundidade adequada.
O tempo de reunião do comitê é utilizado de forma
6
eficiente.
Circula-se lista de presença durante a reunião para
7 identificar a presença dos membros, bem como de
convidados excepcionais.
As atas são precisas e elaboradas imediatamente após
8
o término da reunião ou em até 3 (três) dias úteis.

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


Os posicionamentos dos membros constam de ata
9 formal, contendo decisões, discordância eventual
de membro, considerações e justificativas.
Um membro do comitê fica formalmente responsável
10 pelas decisões que precisam de acompanhamento
pós-reunião.

Dimensão 4: autoavaliação individual do membro.


4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente

# Questão
1 Eu participo assiduamente das reuniões.
Eu me informo sobre os temas da pauta e leio os
2
documentos disponibilizados antes das reuniões.
Eu procuro agregar outras visões aos temas da
3 pauta, trazendo novas ideias sobre os temas a serem
debatidos.
Eu expresso minhas visões pessoais sobre os temas a
4
serem deliberados de forma justificada.
Eu demonstro interesse nos debates e contribuo
5 efetivamente na análise das matérias submetidas à
deliberação.

(Continua)
180

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão
6 Eu dedico tempo adequado ao comitê.
Eu sinto que há liberdade para falar, mesmo que tenha
7 visões diferentes de pessoas com nível hierárquico
superior ao meu.
Eu respeito o tempo de fala dos outros membros do
8
comitê e evito monopolizar demais o debate.
9 Eu sinto que há respeito pelas minhas ideias.
10 Eu sinto que tenho agregado valor ao comitê.

Dimensão 5: coordenação.

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão
O coordenador conduz adequadamente as reuniões,
assegurando tempo adequado a todos os itens da
1
pauta e privilegiando questões mais relevantes para
a organização.
O coordenador incentiva a manifestação dos
2 membros sobre a pauta das reuniões, aceitando
sugestões de temas.
Governança corporativa: o essencial para líderes 

O coordenador fomenta um ambiente com


3 participação ativa de todos os membros, promovendo
um debate franco e cordial.
O coordenador assegura que todos os membros
4 tenham tempo adequado para expor suas razões,
evitando o monopólio da fala por alguns.
Quando necessário ao debate, o coordenador
5 convida pessoas externas cujas atuações sejam
pertinentes à pauta da reunião.
O coordenador não tem convidado pessoas externas
6 ao comitê em número excessivo ou sem justificativa
clara.
O coordenador encaminha, ao órgão superior
(diretoria ou conselho), questões que tenham
7
enfrentado divergência significativa de opiniões,
juntamente com suas respectivas justificativas.
O coordenador designa, no âmbito da reunião, o
8 responsável pelo acompanhamento de decisões
tomadas.

(Continua)
181

4 – Concordo

5 – Concordo
1 – Discordo

2 – Discordo

3 – Neutro
totalmente

totalmente
# Questão
O coordenador informa aos demais membros do
9 comitê o andamento das pendências de decisões
tomadas.
O coordenador exerce um papel valioso na liderança
10
do comitê.

Tabela 5.9 – Modelo para avaliação da diretoria executiva e dos comitês


de gestão

Além do questionário acima, recomenda-se que os membros reflitam sobre algu-

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


mas perguntas qualitativas com o objetivo de identificar outros aspectos relevantes
para aprimoramento do órgão, tais como:

Qual é sua opinião geral sobre o funcionamento do comitê no que concerne


aos seus pontos fortes e pontos para aprimoramento?


Você acredita que o atual processo decisório do comitê é adequado, sendo

fundamentado em debates ricos e francos entre seus membros?


No que se refere à composição do comitê, como você avalia: a diversidade,

a maturidade dos membros e a qualidade da fundamentação de seus pontos


de vista?
Você acredita haver comitês que deveriam ser criados, fundidos ou desativados?

Cite algumas sugestões a fim de aprimorar o valor agregado dos comitês de


gestão.

5.6  Avaliação da auditoria independente

A auditoria independente é considerada uma ferramenta de governança impor-


tante para os stakeholders da que não fazem parte do dia a dia da organização. Cabe
a ela, entre outras coisas, verificar, de forma independente, se as demonstrações
financeiras refletem adequadamente a realidade da empresa. Conforme recomendado
no Código de Melhores Práticas do IBGC, a auditoria independente só deverá ser
recontratada após realização de uma avaliação formal e documentada de sua in-
dependência e desempenho. Tendo em vista que o relacionamento com os auditores
182

é um direito e dever indelegável do conselho de administração, a avaliação deverá


ser feita anualmente pelo conselho ou, caso existente, pelo comitê de auditoria.
A seguir, disponibilizo um modelo de roteiro estruturado para avaliação do
desempenho e da independência da auditoria. Ele é baseado em cinco aspectos: 1)
qualidade da comunicação com o conselho de administração ou comitê de auditoria;
2) planejamento, remuneração e execução dos serviços; 3) escopo e resultado do
trabalho; 4) qualidade da equipe de auditoria e 5) independência. O questionário
é estruturado por meio de respostas binárias (“sim” ou “não”). Todas possuem um
espaço reservado para comentários. Recomenda-se que as respostas sejam acompa-
nhadas por justificativas, principalmente aquelas com respostas negativas.

Aspecto 1: qualidade da comunicação com o conselho de administração ou


comitê de auditoria.
# Questão Sim Não Comentários
Os auditores se reuniram com o conselho de
1 administração ou comitê de auditoria regularmente e
extraordinariamente quando solicitados?
Os auditores se mostraram sucintos e organizados em
2
suas apresentações?
Os relatórios escritos pelos auditores foram claros,
3
concisos e precisos?
As apresentações e demais comunicações dos
4 auditores com os conselheiros ou membros do comitê
de auditoria foram claras e consistentes?
Os auditores forneceram respostas completas nas
5 discussões com o conselho de administração ou
comitê de auditoria?
Governança corporativa: o essencial para líderes 

Os auditores discutiram adequadamente as questões


6 relativas à qualidade das demonstrações financeiras
(Ex.: aplicabilidade dos princípios contábeis)?
Os auditores apresentaram suas considerações aos
conselheiros ou membros do comitê de auditoria
7
sobre as práticas contábeis adotadas (Ex.: se eram
excessivamente conservadoras ou agressivas)?
Os auditores informaram aos conselheiros ou membros
8 do comitê de auditoria sobre eventuais casos de
discordância com os executivos?

Aspecto 2: planejamento, remuneração e execução dos serviços.


# Questão Sim Não Comentários
Os auditores cumpriram todas as exigências previstas
1
no seu contrato?
O nível de engajamento e participação do sócio
2
responsável foi adequado?
(Continua)
183

# Questão Sim Não Comentários


A auditoria proporcionou uma ampla avaliação
3 das operações da empresa, sem redundância e
desperdício de recursos?
Os auditores independentes concluíram seu trabalho
4
no prazo previsto?
Os membros da equipe de auditoria demonstraram
5 um alto nível de integridade no relacionamento com
o conselho ou comitê de auditoria?
As taxas cobradas pela auditoria foram razoáveis em
6 relação ao seu escopo de atuação? (Taxas muito
altas ou baixas podem sinalizar problemas).
Não houve incremento substancial nos custos com a
7 auditoria independente em relação ao orçado na sua
proposta de trabalho?

Aspecto 3: escopo e resultado do trabalho.


# Questão Sim Não Comentários

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


Os auditores apresentaram o escopo, natureza,
1 extensão, prazos e métodos dos seus serviços, de
forma clara, ao conselho ou comitê de auditoria?
O escopo dos serviços de auditoria se mostrou
2 apropriado para mitigar os principais riscos associados
à elaboração das demonstrações financeiras?
Em relação às unidades operacionais distantes
3 da sede da empresa (se houver), a cobertura da
auditoria independente se mostrou apropriada?
Todas as operações-chave da empresa foram
4
cobertas pela auditoria?
Os auditores forneceram conselhos úteis para o
5 aprimoramento do sistema de gestão de riscos,
incluindo riscos financeiros e operacionais?
Os auditores forneceram conselhos úteis para o
6 aprimoramento dos relatórios gerenciais de avaliação
de desempenho do negócio?
Os auditores independentes proporcionaram
7 observações construtivas sobre o sistema de controles
internos?
Os auditores apresentaram os resultados da sua
avaliação interna sobre a qualidade dos serviços
8
realizados, incluindo avaliação individual da equipe
de auditoria?

Aspecto 4: qualidade da equipe de auditoria.


# Questão Sim Não Comentários
Os auditores presentes às reuniões se mostraram
suficientemente seniores e conhecedores de
1
nossa empresa, representando adequadamente a
auditoria?

(Continua)
184

# Questão Sim Não Comentários


A expertise, formação pessoal e capacidade técnica
2 do sócio responsável e da equipe de auditoria se
mostraram adequados aos trabalhos exigidos?
Caso tenha havido mudanças na equipe de auditoria
3 desde a última auditoria ou durante o curso da atual,
houve uma transição adequada?
Os auditores possuem conhecimento suficiente do
4 setor, incluindo compreensão dos riscos que podem
afetar as demonstrações financeiras?
Os auditores possuem especialistas que auxiliam seu
5
processo de auditoria em temas específicos?

Aspecto 5: independência.
# Questão Sim Não Comentários
A auditoria possui boa reputação no mercado,
1 sem casos recentes de problemas relevantes de
governança em sociedades por eles auditadas?
Existe um relacionamento adequado entre os
2 auditores e os executivos da empresa – os gestores
não exercem influência sobre os auditores?
Os auditores são capazes e independentes
3 para levantar questões que poderiam refletir
negativamente na gestão?
Os auditores realizaram qualquer serviço de
consultoria significativo durante o período da
4
auditoria? (Caso positivo, especificar no campo
comentários).
Governança corporativa: o essencial para líderes 

A auditoria se mostrou suficientemente independente,


5 em termos do percentual recebido por seu trabalho
em relação ao seu faturamento total?
Algum sócio dos auditores independentes, não
participante da equipe de trabalho, nos procurou
6
a fim de obter um parecer de nossa organização
acerca da qualidade dos serviços prestados?
Os auditores descreveram ao comitê de auditoria seu
7 processo interno de forma a garantir a independência
de seus membros?
Os auditores possuíam livre acesso aos conselheiros ou
8 membros do comitê de auditoria, sem necessidade
de contato preliminar com os executivos?

Tabela 5.10 – Modelo para avaliação da auditoria independente


185

Além do preenchimento do questionário acima, o conselho de administração


ou comitê de auditoria deverá ouvir as opiniões dos executivos e das pessoas das
áreas de controle da empresa como forma de avaliar os trabalhos e a independência
dos auditores independentes de forma mais precisa. Entretanto, tendo em vista os
possíveis vieses e conflitos dos executivos em função do seu relacionamento com
os auditores, os conselheiros devem chegar às suas conclusões isoladamente, sendo os
responsáveis finais pela avaliação.
Caso a avaliação seja feita pelo comitê de auditoria, recomenda-se que os re-
sultados sejam apresentados a todo o conselho de administração, haja vista que a
recontratação ou substituição dos auditores é dever do conselho como órgão. Os
resultados também devem ser apresentados aos sócios responsáveis da auditoria in-
dependente, de maneira a informar o grau de satisfação da organização e aprimorar
a qualidade do trabalho executado em caso de recontratação.

Capítulo 5 Como avaliar periodicamente a governança de minha organização? 


Observações finais

Ao longo deste livro, procurei apresentar a governança corporativa de forma descom-


plicada e objetiva a fim de fazer com que o tema possa contribuir de maneira efetiva para
o sucesso de longo prazo de sua organização. Para concluir, gostaria de registrar cinco
mensagens que acredito serem as mais importantes a serem lembrados por você e as demais
lideranças. Vamos a elas:

a) A governança corporativa deve ser vista como um tema prioritário para o sucesso de
qualquer organização:
Independentemente do porte, finalidade ou tipo jurídico, todas as organizações
possuem uma estrutura de poder e precisam ser bem governadas. Logo, a gover-
nança corporativa é um tema a ser priorizado por todas as empresas que procuram
aumentar as chances de sobrevivência e sucesso no longo prazo, e não apenas por
companhias de grande porte ou de capital aberto.
188

b) A boa governança gera valor para os acionistas e demais partes interessadas da


organização:
A governança corporativa, quando adotada em sua essência, melhora a qua-
lidade das decisões tomadas e diminui a probabilidade de surgirem surpresas
negativas, o que aumenta o valor de longo prazo da organização. Além disso,
tendo em vista que a maioria das empresas sucumbe devido a problemas e
erros em sua alta gestão, a não adoção de bons padrões de governança pode
levar a enorme destruição de valor para todos os stakeholders.

c) A governança para valer depende de sólidos princípios e valores organizacionais,


os quais devem ser assegurados pelo compromisso irredutível de suas lideranças:
A boa governança depende de um alicerce firme para se estabelecer, o que
depende da definição de sólidos princípios e valores organizacionais. Na
ausência de princípios, a adoção de práticas de governança recomendadas
pelo mercado correrá um grande risco de se tornar um simples formalismo
ou mesmo uma peça de marketing. Cabe às lideranças, portanto, refletir em
profundidade sobre o propósito, valores e princípios da organização, bem
como criar mecanismos a fim de assegurar sua efetiva adoção.

d) O fator humano é o grande desafio para alcançar a boa governança empresarial:


As empresas são contextos sociais, nos quais as lideranças devem fazer com
que as pessoas desejem voluntariamente tomar as melhores decisões e cum-
prir as normas estabelecidas. Para isso, é necessário se aprofundar na com-
preensão dos aspectos psicológicos que afetam a qualidade das decisões e que
Governança corporativa: o essencial para líderes 

podem levar ao descumprimento das regras. O equacionamento de questões


intrinsecamente humanas nas organizações empresariais é a essência da boa
governança, algo que vai muito além da criação estática de órgãos, políticas
e outros regramentos. Ativar continuamente a consciência das pessoas de
forma a promover comportamentos cooperativos e orientados para o longo
prazo é, por isso, um elemento fundamental para a boa governança.

e) Cada organização deve estabelecer e trilhar a sua própria jornada de governança:


Não há uma receita mágica de governança a ser seguida. Você e as demais
lideranças devem identificar o modelo de governança mais adequado à
realidade de sua organização, bem como as práticas a serem adotadas. Ten-
do em vista que o alcance dos mais elevados padrões de governança é um
caminho a ser perseguido, deve-se criar um programa com novas práticas
a serem perseguidas no médio e longo prazos. A definição desta agenda de
governança deve ser resultado de um diagnóstico estruturado da situação
189

atual da organização, incluindo a identificação de lacunas e pontos críticos


de governança. Após as devidas formalizações, é necessário que as lideranças
avaliem o funcionamento do modelo de governança de forma estruturada,
imparcial e periódica.

A internalização das cinco mensagens acima pelas lideranças de sua organi-


zação fará com que todos percebam a governança corporativa como um tema
muito estimulante e nada burocrático, algo vivo e dinâmico, que depende da
dedicação incessante da alta gestão para de fato acontecer. Cabe a você, como
líder, promover a boa governança para valer. Ao agir desta forma, você contribuirá
decisivamente não apenas para o sucesso de sua organização, mas também para
um ambiente empresarial mais sadio e meritocrático, com impactos sociais e
econômicos muito positivos para nosso país.

Observações finais 
Referências

Capítulo 1

Literatura geral sobre governança corporativa:

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Capítulo 2

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