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AB SABER 1969 Um Conceito de Geomorfologia
AB SABER 1969 Um Conceito de Geomorfologia
18. GEOMOFOLOGIA
São Paulo, 1969.
Se é que uma paisagem tropical não evolui a partir de uma estaca zero, completamente
despida de solos e de vegetação, mas sim evolui ou se modifica a partir de toda a sua
riqueza superficial de produtos de intemperismo, de solos e de cobertura vegetal, é
evidente que seu relevo atual comporta um saldo de interferência que somente poder ser
compreendido à de uma investigação minuciosa dos seus depósitos superficiais. Na
realidade, custou muito para se compreender que as bases rochosas da paisagem
respondem apenas por uma certa ossatura topográfica, e, que, na realidade são os
processos morfoclimáticos sucessivos que realmente modelam e criam feições próprias
do relevo. Mais difícil ainda foi entender que conforme o clima e as variações
climáticas é o comportamento superficial das bases litológicas da paisagem. Na
verdade, as rochas poder se revestir de um máximo de regolitos por intemperismo
químico (como é o caso do domínio dos “mares de morros”), mas frente a outros tipos
de clima ou épocas de mudanças climáticas podem sofre descarnações parciais ou
extensivas de seus mantos de decomposição, de seus solos e de sua cobertura vegetal.
Isto para não fala nas correlações estreitas existentes no interior de cada domínio
morfoclimático entre as feições erosivas, as feições residuais e as feições deposicionais.
Quer nos parecer, entretanto, que o setor mais difícil da pesquisa geomorfológica diz
respeito à compreensão da dinâmica em processo, ou seja, o estudo propriamente dito
da fisiologia da paisagem. Muito embora as bases das ciências da Terra tenham sido
assentadas na observação dos processos atuais – entendidos como chaves para a
interpretação dos processos pretéritos – o que se conhece efetivamente sobre a fisiologia
global dos diversos tipos de paisagem ainda deixa muito a desejar.
É compreensivo, até certo ponto, a dificuldade de se levar a bom termo, esse tipo de
pesquisa. Se é que o estudo da estrutura superficial da paisagem pode ser realizado a
qualquer momento através de pesquisas rotineiras de geologia de superfície, os estudos
sobre a fisiologia da paisagem têm que se pautar por séries de informes prolongados,
obtidos em todos os tipos de tempo mais representativos para a área e incluindo
observações realizadas em momentos críticos para a atividade morfogênica. Em muitos
aspectos as observações sobre a epiderme da paisagem constituem modalidades de
pesquisa, em grande parte aparentadas com as técnicas da geologia de superfície,
através das quais observam fatos estáticos (cortes, afloramentos, solos superpostos),
visando compreender a dinâmica do passado recente. No caso a situação é estática e
pode ser estudada em qualquer tempo; a preocupação é a de entender uma paleo
dinâmica a custa de fatos, todos dominantemente dedutivos. Enquanto que as pesquisas
sobre a morfologia da paisagem são modalidades de pesquisa em situações
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efetivamente dinâmicas. Por isso mesmo pressupõe recursos técnicos, equipamentos
locados, análises demoradas e observações de processos em plena atividade tais como:
no momento da chuva, em todos os tipos de precipitações, períodos de cheias, durante
as vazantes, no decorrer de todas as estações, épocas de grandes distúrbios climáticos, e
até mesmo em eventuais ocasiões de incidência de processos espasmódicos. Além do
que inclui investigação sobre as ações biogênicas, sobre o trabalho dos lençóis d’água
superficiais, sobre as atividades das águas de infiltração, sobre as diversas modalidades
de movimentos coletivos do solo, e as múltiplas ações físicas, químicas, biológicas da
pedogênese. Na categoria de verdadeiro corolário inclui o conhecimento do ciclo
hidrológico, com o detalhamento dos fatos hidrodinâmicos, assim como, uma pequena
atitude de correlação entre os fatos ditos areolares e lineares da dinâmica da paisagem.
Evidentemente não é dado a todo pesquisador a abordagem analítica de tais complexos
de ações morfológicas, pedogênicas e hidrodinâmicas de ação integrada na natureza.
Entretanto, a consciência desses fatos, em termos de filosofia das ciências, já constituiu
um bom ponto de partida para o ingresso nessa nova faixa de pesquisa.
Raros tem sido os estudos sobre a fisiologia das paisagens intertropicais brasileiras. Isto
porque haveria que se dispor de recursos técnicos, pessoal categorizado, equipamentos e
bases de pesquisa, que não são muito simples de serem reunidos ou obtidos e postos a
funcionar a contendo. Acresce a isso, o fato de tais pesquisas, nas raras vezes que foram
realizadas, terem sido conduzidas a melhores resultados – ainda que sob uma ótica
muito parcial - nos trabalhos dos pedólogos, ecologias e hidrogeólogos. Tal fato talvez
esteja a indicar que os estudos de fisiologia de paisagem, ainda que essenciais para os
estudos dos geomorfologistas, somente possam ser esclarecidos à custa de pesquisas
marcadamente interdisciplinares. Espera-se que um dia, as equipes de elementos
realmente interessados, possam se organizar.
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Alguns dos compartimentos que foram essenciais para retenção de grandes massas de
detritos finos (Bacia de São Paulo, Bacia de Taubaté), ficaram sujeitos, durante quase
todo o Quartenário, a fases alternadas de erosão fluvial e de pedimentação restrita,
respectivamente associada a processos areolares de mamelonização e de plainação
lateral restrita. Foram tais acontecimento que responderam por uma nova
compartimentação superimposta a outra mais antiga e maior. Note-se que esta
compartimentação quartenária é de caráter forçadamente menor, em escala, e, de
∗
Neste vasto conjunto de áreas denudadas, onde a evacuação de sedimentos para áreas distantes foi a
regra, destaca-se um caso de retenção local, que por isso mesmo tem grande importância em termos de
paleoclimatologia, tectônica residual e geomorfogênese: a Bacia de Rio Claro.
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aspecto geral nitidamente embutida, já que se localiza no interior daqueles vales e
alvéolos que responderam pelo próprio re-entalhamento dos vastos plainos regionais
oriundos de pediplanação ou da tectônica neogênica.
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Somente nos últimos anos, em alguns raros estudos, de maior perspicácia, vem se
esboçando a discussão dos efeitos mais prováveis das flutuações climáticas
intertropicais, assim como, sobre as interferências sucessivas entre processos de
mamelonização, terraceamento e pedimentação. Com decorrência dessa preocupação
pela sequência dos processos morfogenéticos modernos é que surgiram algumas
contribuições isoladas, e de maior valor científico, a respeito do Quartenário de
diferentes parcelas do território brasileiro. Trata-se de estudos pioneiros, ainda muito
fragmentários, realizados por especialistas de diversas formações científicas. O
importante a assinalar, entretanto, é que, um ou outro de tais estudos, vem sendo
realizados com total conhecimento das ciências da Terra, constituindo uma boa
contribuição brasileira ao conhecimento dos paleoclimas e da evolução geomorfológica
das regiões intertropicais (Bigarella).
Acreditamos que os estudos sobre o Quartenário serão certamente aqueles que maiores
oportunidades terão para realizar uma integração dos conhecimentos de geociências
sobre o território brasileiro. Isto porque, além de se tratar de investigações de forte valor
interdisciplinar, trata-se de estudos básicos do mais alto interesse para o
desenvolvimento da geologia e da geomorfologia geral dos países intertropicais. Nesse
sentido, uma nova fase de verdadeiros estudos sobre os processos atuais poderá ter
implicações diretas para a própria revisão de alguns velhos princípios e conceitos da
geodinâmica, firmados alhures (noutro lugar), através da ótica parcial de observações
realizadas em regiões climatobotânicas totalmente diferentes. Acreditamos mesmo que
dos estudos sobre o Quartenário, precedidos nas últimas décadas na África, no Brasil e
em Madagascar, está por se esboçar uma retomada mais objetiva e válida dos princípios
do atualismo.
Por seu turno, tais estudos são procedidos através de técnicas predominantemente
geológicas – superposição de solos, contacto entre formações recentes, depósitos de
vertentes, depósitos aluviais, crostas duras – porém, sempre, dirigidos segundo a ótica
integradora da geomorfologia regional. Não será nunca o estudo do depósito pelo
depósito que interessará a Geomorfologia, mas sim o estudo do depósito na qualidade
de escombro de um processo que criou uma ou mais feições geomórficas (erosivas,
residuais ou deposicionais). E, ainda que tais feições tenham sido remodeladas ou semi-
apagadas, ou mesmo praticamente eliminados pelos processos morfoclimáticos
ultrainteriores, ou seus escombros – inclusos descontinuamente na estrutura superficial
das paisagens – terão o valor objetivo de uma correlação a ser historicamente registrada.
Tais episódios sendo predominantemente relacionados às flutuações paleoclimáticas
sucessivas do Quartenário, dão prioridade total aos estudos dos depósitos modernos
para a realização de uma Geomorfologia verdadeiramente científica. Na realidade nunca
poderá haver uma pesquisa uma boa pesquisa de Geomorfologia sem um bom estudo
sobre o Quartenário regional, assim como jamais poderá existir um bom estudo de
geologia do Quartenário sem boas bases geomorfológicas.
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