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FUGAS | Público N.º 10.512 | Sábado 2 Fevereiro 2019

A Bauhaus faz
100 anos, viva
a Bauhaus!
Alemanha

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2 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Semana de lazer
Mais sugestões em lazer.publico.pt

Homenagens em
fronteiras, jardins
e selos, para saborear
até ao caroço.
Sílvia Pereira

Contrabandistas a monte Boca doce e romântica


Melhor dizendo, a Montalegre. Aqui culmina Os paladares que se cuidem. Os corações
o périplo dos “contrabandistas” do Teatro também. Matosinhos tem sugestões
da Garagem, depois de terem passado por para fazer água na boca a qualquer
Bragança, Vinhais e Lisboa. E não cobram um “chocoólico”. E, mais uma vez, serve-as
tostão. Falamos de Contrabando, a 96.ª criação mesmo a tempo do dia de São Valentim.
da companhia, com texto e encenação de Carlos A Festa do Chocolate apetrecha-se
J. Pessoa. E se falamos em tostões em vez de de bombons, brigadeiros, bombocas,
cêntimos, é porque a trama remete para as tabletes, bolos, gaufres, cacau quente...
décadas de 1960 e 70, quando o termo ainda era Para não enjoar, nem tudo é doce: há
usado nas transacções de quem movimentava variações amargas, salgadas e até
mercadoria ilegalmente na fronteira de Trás-os- apimentadas. A diversidade passa também
Montes com Espanha. A peça nasce de histórias No jardim de Sophia por formatos, texturas e misturas com
verdadeiras, de depoimentos de pessoas que outros ingredientes. A par dos expositores,
viveram essa época, de testemunhos dos que Para Sophia de Mello Breyner Andresen, há espaços de degustação, oficinas para
pertenceram a (ou contactaram com) esse o Jardim Botânico do Porto foi fonte de crianças e show cookings.
“povo heróico”, nas palavras de J. Pessoa, que inspiração. Mas foi, primeiro, uma casa
se dedicou à actividade “para poder dar uma onde cresceu, quando os proprietários MATOSINHOS Jardins da Biblioteca
vida melhor aos filhos”. Daí que retrate “as eram os seus avós. Agora, a propósito do Municipal Florbela Espanca
dificuldades, a miséria, mas também a grandeza, centenário do nascimento da escritora De 2 a 17 de Fevereiro. Segunda a quinta,
ousadia e a coragem” e encerre uma “lição de portuense, o jardim dedica-lhe uma das 12h às 23h; sexta, das 12h às 24h;
liberdade e superação”. exposição. Pour ma Sophie convida a sábado, das 11h às 24h; domingo,
descobri-la através da sua biblioteca das 11h às 23h.
MONTALEGRE Multiusos pessoal – ou melhor, de uma selecção de Grátis
Dia 2 de Fevereiro, às 21h30. nados por
mais 300 livros, muitos deles assinados
Grátis a, como
outros grandes vultos da literatura,
oram
Torga, Saramago ou Bessa-Luís. Foram
recolhidos e escolhidos por Martim m Sousa
ante as
Tavares, neto de Sophia. “Foi durante
férias de Verão que me interessei pela
mecei
primeira vez por esses livros, e comecei
a constatar que muitos deles estavam
vam
assinados, alguns contendo mesmo mo
dedicatórias belíssimas”, conta, “ee aqui
começou a nascer a ideia de fazerr algo
com eles”. O resultado está numa mistura r
ra
de arquivo, fotografia e instalação,
o, em
que entram também ensaios, traduções,
uçõess,
notas, recortes, correspondência e outros
documentos do espólio pessoal de e Sophia,
muitos deles inéditos. Oxana Ianin,n, artista
responsável pela concepção da exposição,
xposição,
descreve-a como “algo íntimo mass
l
respeitador, pois revela a poeta vista pelos
que a admiravam e conheciam”. “Acho
que atingimos um formato que é íntimo
sem ser devassador”, acrescenta, “e que
poderá permitir ler Sophia através dos seus
leitores”.

PORTO Jardim Botânico


(Galeria da Biodiversidade)
Até 22 de Fevereiro.
Terça a domingo, das 10h às 18h.
Grátis
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 3

FUGAS N.º 973 Foto de capa: LOOK Bildagentur der Fotografen FICHA TÉCNICA Direcção Manuel Carvalho Edição Sandra Silva Costa
Edição fotográfica Nelson Garrido Directora de Arte Sónia Matos Designers Joana Lima
e José Soares Infografia Cátia Mendonça, Célia Rodrigues, José Alves e Francisco Lopes
Secretariado Lucinda Vasconcelos Fugas Rua Júlio Dinis, 270, Bloco A, 3.º 4050-318 Porto.
Tel.: 226151000. E-mail: fugas@publico.pt. www.publico.pt/fugas

Música no caroço O bísaro é rei


Rezam as crónicas que Bruno Nogueira, Desde o início dos anos 1980 que Vinhais
Nuno Markl e Filipe Melo juraram não voltar vem consolidando a reputação de
a Uma Nêspera no Cu. Mas, depois da capital do fumeiro, com uma feira cada
carreira “webisódica” e da versão ao vivo, vez mais concorrida em expositores e
ainda havia, afinal, sumo para espremer visitantes, movidos pela excelência dos
para mais uma aventura em palco. A produtos certificados da região. Na 39.ª
diferença está na música adicionada. edição da Feira do Fumeiro de Vinhais,
De resto, mesmo em forma de musical, a carne de porco de raça bísara torna
o caroço do projecto humorístico a ser rainha, mas há outras atracções:
é o mesmo: lançar os dilemas mais concursos, demonstrações culinárias,
desafiantes, inimagináveis, provocadores um espaço gourmet, chegas de touros,
e, definitivamente, não recomendáveis Filatelia atlética demonstrações equestres, artesanato Pátio das provas
a almas sensíveis, com convidados/ regional, um festival folclórico, exposições,
encurralados especiais a acompanhar. Jogos Olímpicos de Amesterdão, 1928. uma conferência e animação musical, com Menos de um mês depois de ter entrado
Campeonato do Mundo de Hóquei em destaque para o concerto de Anselmo para o top da revista norte-americana Wine
LISBOA Coliseu dos Recreios Patins, 1952. O que têm em comum, Ralph no sábado, às 22h. Enthusiast como um dos dez melhores
Dias 5, 6, 8 e 9 de Fevereiro, às 21h30. para além de serem competições destinos do mundo para o turismo de
Bilhetes de 10€ a 22€ internacionais? Terem sido registadas VINHAIS Parque Municipal de Feiras vinhos, Lisboa torna a montar uma
em selos – selos esses que fazem parte e Exposições montra com vista para esta e outra região
PORTO Coliseu da exposição O Desporto na Filatelia De 7 a 10 de Fevereiro. Quinta, das 14h demarcada: a da Península de Setúbal.
De 15 a 17 de Fevereiro, às 21h30. Portuguesa. Inaugurada em Portimão, no às 20h; sexta e sábado, das 10h às 24h; Chama-se Vinhos no Pátio e tem este ano
Bilhetes de 9,38€ a 20,64€ âmbito da sua programação enquanto domingo, das 10h às 20h. Programa como tema, precisamente, o enoturismo.
Cidade Europeia do Desporto 2019, reúne completo em www.cm-vinhais.pt. Entre brancos, tintos, espumantes,
exemplares produzidos ao longo de 120 Grátis rosés, aguardentes e moscatéis, mais
anos, pertencentes à colecção do Museu de 200 néctares são dados a provar por
Nacional do Desporto. Nestes selos está a produtores das duas regiões, que tanto
promessa de uma viagem pela história do trazem o timbre dos clássicos como novos
desporto, mas também do serviço postal lançamentos. A oferta, pensada para
(incluindo o ultramarino) e do próprio satisfazer simultaneamente conhecedores
país, na companhia de memórias das e curiosos, é complementada por
mais diversas modalidades c competições, degustações, petiscos, masterclasses e
instituições, equipas e perso
personalidades. dicas de especialistas. Tudo, garante a
organização, numa “atmosfera de partilha e
descontracção”.

LISBOA Praça do Comércio (Pátio da Galé)


PORTIM
PORTIMÃO Museu De 8 a 10 de Fevereiro. Sexta, das 18h
Munici
Municipal às 22h; sábado, das 15h às 22h; domingo,
Até 24 de Fevereiro. das 14h às 19h.
Terça,
Terça das 14h30 Bilhetes a 4€ (inclui copo de provas);
às 18
18h; quarta a masterclasses gratuitas
domingo,
domi das 10h (mediante inscrição)
às 18h
18h.
Grátis
Grá
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4 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Alemanha

Mies van der


Rohe na cidade
da seda
e do veludo
Krefeld é uma das principais cidades no itinerário
desenhado pela obra de um dos mais influentes
arquitectos do século XX. Agora que a Bauhaus faz
100 anos justifica, ainda mais, a visita. Krefeld não
é Berlim, não é Dessau, mas o moderno que tem
para mostrar também desafia. Lucinda Canelas

a De um lado um complexo de dorf, a capital deste estado alemão, - a Bauhaus, uma escola de artes,
edifícios técnico, com requisitos fica com outro cartão-de-visita deste design e arquitectura criada por
bem definidos e feito à medida das arquitecto que haveria de se mudar Gropius há precisamente 100 anos
exigências de uma fábrica de têx- para os Estados Unidos em 1938 pa- e que queria combinar as propostas
teis, sobretudo sedas, no começo ra fugir à crise económica e a Hitler das vanguardas com o saber fazer
do século XX. Do outro, duas casas e que é mais celebrado como autor tradicional, procurando transferir a
de família com um arrojo que ainda do Pavilhão de Barcelona (1928-29), excelência do produto manufactura-
hoje impressiona, pensadas para um do Edifício Seagram (um arranha- do para a produção industrial graças
estilo de vida novo, ainda que não céus de aço e vidro em Nova Iorque, a uma série de inovações tecnoló-
isento de uma boa dose de conser- completado em 1958), do Crown gicas, contando com artistas como
vadorismo. A uni-las dois proprie- Hall (sede da Faculdade de Arqui- Paul Klee e Vassily Kandinsky no seu
tários com dinheiro, os industriais tectura do Instituto de Tecnologia quadro de professores.
Hermann Lange e Josef Esters, e um de Chicago, 1950-56) ou da National “Mies pensava a arquitectura em galerias (a primeira em 1955, a públicos, mas também nos particu-
homem que viria a transformar-se Gallery de Berlim (1962-68). Um car- em todo o seu ambiente, em tudo segunda em 1981, ambas doadas à lares, teve períodos de grande pros-
numa das referências absolutas da tão-de-visita singular numa carreira o que a envolvia, não apenas no cidade pelas famílias dos dois em- peridade.
arquitectura e do design do século que começa ainda antes da Primeira papel. Pensava-a na relação com presários). “É por isso que estamos Fechadas para renovação até me-
XX, sinónimo, como Le Corbusier Guerra - cria o seu próprio atelier a maneira de viver das pessoas a aqui [Casa Lange] frente a esta jane- ados de Março, reabrem a 17 com
ou Walter Gropius, do movimento em 1912 - e que está centrado em quem se destinava, com a nature- la enorme e sentimos que o jardim o projecto Alternatives for Living.
moderno - Mies van der Rohe (1886- três projectos onde estão já conden- za, que é para ele importantíssima”, entra na sala e até se sentaria nos Plans for Haus Lange and Haus Es-
1969). sados muitos dos princípios orien- diz Sabine Sander-Fell, historiado- sofás se eles ainda aqui estivessem.” ters, uma exposição destinada a re-
Quem hoje visita a Fábrica Ver- tadores da obra revolucionária des- ra de arte e consultora do Museu As duas villas ficam num bairro visitar as suas origens e organizada
seidag e as Casas Lange e Esters em te homem que ficará para sempre de Arte de Krefeld (Kunstmuseen de moradias com espaços exteriores para integrar o programa do cente-
Krefeld, uma cidade da Renânia do associado a um dos mais arrojados Krefeld), cuja equipa programa es- desafogados, perto do centro des- nário da Bauhaus, que tem dezenas
Norte-Vestfália a 30km de Düssel- projectos pedagógicos do século XX tas duas casas hoje transformadas ta cidade que, nota-se nos edifícios e dezenas de actividades espalhadas
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 5

FLORIAN MONHEIM/BILDARCHIV-MONHEIM/ARCAIDIMAGES

por todo o país. Krefeld não podia pavilhão da Alemanha na Exposição promisso entre vontades e, por isso, que não abdica - o espaço do es- na Casa Esters mantêm o tamanho,
ficar de fora desta festa, já que é a Internacional de Barcelona [1929], há paredes amovíveis que permitem critório, reservado aos homens; mas o plano de vidro não é uno, está
segunda cidade da Alemanha, de- onde é muito mais radical na linha criar áreas maiores quando é preci- uma sala para a mulher rece- dividido por caixilhos. “Estas casas
pois de Berlim, com mais obras de do espaço livre. É claro que são edifí- so dar uma festa, mas também ou- ber.”, complementa Sander-Fell. são dois volumes cúbicos aparen-
Ludwig Mies van der Rohe, lembra a cios com objectivos diferentes, mas tras mais pequenas, como o escritó- Da rua vê-se bem que as duas temente muito simples, ao estilo
directora do museu, Katia Baudin. E aqui trabalhava para dois clientes rio de Lange, com grandes janelas casas formam um conjunto harmo- da Bauhaus, em que a cobertura de
isto sem contar com as que não che- que não o deixaram fazer exacta- viradas para a rua, ou a “sala das nioso, ainda que preservem a sua tijolo vermelho escuro, acastanha-
garam a sair do papel (como o Clube mente como queria”, acrescenta. senhoras”, recatadamente voltada autonomia. Lá dentro são diferentes do, funciona como uma pele sobre
de Golfe e os escritórios da fábrica Mies queria menos paredes e mais para o jardim. na disposição e até nalgumas solu- a estrutura de aço”, sintetiza a his-
que ficou conhecida como Versei- vidro, Lange e Esters espaços mais “Lange é mais arrojado do que ções técnicas. Na Casa Lange, por toriadora, chamando a atenção para
dag). “Mies faz estas casas pratica- pequenos e com porta. O que aca- Esters, mais moderno, mas é tam- exemplo, as enormes janelas são de os espaços amplos e comunicantes,
mente ao mesmo tempo que faz o bou por ser construído é um com- bém conservador. Há coisas de um vidro só, como numa montra; concebidos para circular. “Ca- c
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6 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Alemanha
FLORIAN MONHEIM/BILDARCHIV-MONHEIM/ARCAIDIMAGES

da uma destas casas é, no conceito, A Verseidag é nina de Berlim, em 1927, para a qual
um misto de vila tradicional, clás- a única fábrica criaram o Café Veludo e Seda, Mies
sica, e de arquitectura industrial. que Mies van der Rohe desenhou puxadores
Um misto de espaços mais abertos van der Rohe de porta e roupeiros, candeeiros e
e de outros mais contidos. Parecem tem no seu sofás, mesas extensíveis e elegantes
absolutamente contemporâneas e portfólio. Foi escrivaninhas.
têm 90 anos.” feita a pedido
A marca de Mies está claramente dos mesmos A única fábrica de Mies
lá, na simplicidade das formas, na industriais que
atenção aos detalhes, na qualida- lhe encomen- Lange e Esters eram adeptos do
de do espaço. Embora sejam refe- daram as villas trabalho da Bauhaus, dos artistas
ridas com frequência como obras na cidade: e arquitectos modernos e de Mies
do universo da Bauhaus, as mora- Herman em particular. Convidam-no para
dias familiares dos dois industriais Lange (casa desenhar as suas casas e a fábrica
incluem-se numa corrente mais nas páginas em Krefeld antes mesmo de ele vir
abrangente que surge em 1923 na anteriores) a assumir por um breve período
Alemanha da República de Weimar e Josef Esters (1930-1933) a direcção da mítica es-
(e que morre quando ela cai) como cola alemã que fechou por pressão
reacção aos excessos emotivos do do regime nazi.
expressionismo e que se estende à Os dois industriais contratavam
pintura, à escultura, à música, à li- professores e alunos da Bauhaus pa-
teratura e, claro, à arquitectura - a ra desenhar padrões para os tecidos
Nova Objectividade. Os princípios que depois produziam na fábrica
que defende - há nela um lado mais concebida pelo arquitecto alemão,
optimista próprio de um período um edifício que só há poucos anos
de pós-guerra, uma confiança nos começou a receber a atenção que
avanços da tecnologia aplicados à merece.
indústria, uma esperança no envol- A fábrica que ficou conhecida co-
vimento do colectivo na resolução mo Verseidag começou a ser dese-
de problemas sociais - são também nhada por volta de 1931 para a com-
postos em prática, talvez até de um panhia Vereinigte Seidenfabriken
modo mais radical, na Bauhaus. AG, que funcionava como um con-
Ambas defendem, no que à arqui- glomerado da indústria da seda na
tectura diz respeito, o espaço livre região, fundado nos anos 1920 por
e a ordem. Lange e Esters, dois amigos que já
“Nova Objectividade e Bauhaus trabalhavam no ramo, juntando as
confundem-se para os não espe- suas famílias a outras com poder - os
cialistas, misturam-se. É claro Kniffler e os Oetker.
que o rótulo da Bauhaus é sempre
mais forte por isso há uma tenta- “Aqui se vê ou Sol LeWitt, percebe de imediato
o quanto o arquitecto trabalhou o
rio - as que os clientes já tinham e as
que Mies desenhou em colaboração
Krefeld foi um dos mais importan-
tes centros para o têxtil alemão. No
ção de o colar. Mas tanto numa
como noutra é de moderno que como construído e a envolvente de forma
integrada.
com Lilly Reich (1885-1947), uma ar-
quitecta e designer alemã com quem
século XVIII, a aristocracia, os mem-
bros do alto clero e até os monarcas
estamos a falar”, diz a directo- As villas parecem estar colocadas manteve uma relação profissional e faziam compras na cidade, que se
ra do Museu de Arte de Krefeld. a arquitectura sobre um plinto, como se fossem es- pessoal durante 13 anos, até se mu- mantém apetecível, com cafés que
culturas, algo que certamente terá dar para os Estados Unidos (Reich convidam nas praças e jardins.
O jardim como quarto de Mies agradado a Lange, que veio a ser um
dos maiores coleccionadores de arte
foi a directora artística da participa-
ção alemã na feira de 1929 e foi ela
Hoje o complexo fabril criado por
Lange e Esters tem o nome de Lu-
Quem hoje passeia por estas duas
casas erguidas entre 1928 e 1930 -
é carregada da Alemanha do seu tempo, parti-
cularmente atento às vanguardas
quem colaborou na concepção, por
exemplo, da célebre Cadeira Barce-
dwig Mies van der Rohe Business
Park. Parte dos seus edifícios espera
os trabalhos começaram com um
dia de diferença e segundo o dese-
de detalhes alemã e francesa. “Nas traseiras, os
jardins, feitos em terraços, estão
lona MR90, uma das peças mais icó-
nicas da galáxia Mies).
ainda uma requalificação e a restan-
te, já remodelada, serve de sede a
nho de Mies, cuja primeira versão
é de 1927 - e pelos seus jardins com
de desenho e num plano dois metros abaixo do
das casas, o que dá ainda mais desta-
Já não há pinturas de Picasso, Lé-
ger ou Braque nas paredes, já não
pequenas e médias empresas que tra-
balham em tecnologia ou design.
grandes relvados, maravilhosos car-
valhos e esculturas contemporâne-
de construção”, que aos volumes construídos. Mies
parece desenhar cada terraço como
há livros arrumados nas estantes
discretas nem tapetes orientais no
Daniel Lohmann, arquitecto e
professor de História de Arquitec-
as de artistas como Richard Serra,
adicionadas ao conjunto graças ao
diz Daniel um quarto lá fora”, explica Sabine
Sander-Fell.
chão, mas é tentador imaginar co-
mo seria viver ali. Com Lilly Reich
tura na Universidade de Colónia, e
Norbert Hanenberg, professor de
programa de exposições e encomen-
das site specific do museu em que Lohmann Nas salas e quartos da Casa Lange
havia arte moderna e sul-americana
a seu lado, à semelhança do que
acontecera já na Die Mode der Da-
Design e Construção na Universida-
de de Ciências Aplicadas em Gießen,
já participaram também Yves Klein e uma mistura de peças de mobiliá- me, uma exposição de moda femi- têm vindo a estudar a fábrica c
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8 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Alemanha

Mies van der Rohe junto


à maquete do Instituto
de Tecnologia da Faculdade
de Arquitectura de Chicago,
Illinois. Em baixo, parte
da fachada da elegante casa
do industrial Hermann Lange

ARTHUR SIEGEL/THE LIFE IMAGES COLLECTION/GETTY


e os arquivos a ela referentes nos Mies não ter outra fábrica no seu niosa, deu indicações precisas sobre
últimos anos e acreditam que po- portefólio se pode explicar pela sua cada detalhe dos dois edifícios. “Ele
de ser vista como uma espécie de falta de interesse no “funcionalismo vai ao pormenor de marcar quais as
“elo perdido” entre o trabalho que puro”, garante que o arquitecto se janelas que devem abrir e as que não
Mies faz na Europa e o que faz nos manteve ligado à Verseidag até se devem. E essas janelas ainda hoje
Estados Unidos, desde o final da exilar nos Estados Unidos, servin- funcionam”, diz Lohmann, abrin-
década de 1930 até à sua morte. do como consultor em várias fases do uma delas. “Aqui se vê, embora
Andaram a vasculhar nos arqui- da construção. Lembra o professor mais subtilmente do que noutros
vos alemães e norte-americanos na que, com os nazis no poder, aves- projectos, como a sua arquitectura
tentativa de reconstituir o projecto sos ao moderno em todas as suas é carregada de detalhes de desenho
original desta que é a única fábrica declinações, eram cada vez menos e de construção”, uma arquitectura
que o arquitecto alemão desenhou as encomendas que recebia. “mais determinada pela selecção e
e o seu último grande projecto euro- A fábrica onde se tingiam as se- adequação dos materiais e menos
peu. Com os seus alunos têm vindo a das, colada ao HE, que está integral- por inovações construtivas”, como
fazer o levantamento exaustivo dos mente restaurado e ainda conserva escreve no ensaio que assina com
edifícios para distinguir as diversas o chão de madeira, as janelas e a Norbert Hanenberg e Christian Ra-
fases de construção e, assim, deter- extraordinária escadaria do projecto abe na revista que o Docomomo, co-
minar a extensão do envolvimento original, está ainda por restaurar. É mité internacional que se encarrega
de Mies no conjunto. agora um espaço vazio, muito amplo da documentação e conservação de
Até aqui, os que se têm dedicado a e cheio de luz, mesmo nos dias de edifícios do movimento moderno,
estudar a obra do arquitecto alemão Outono mais tristes. Mies, que não dedicou a Mies em Janeiro de 2017.
optaram por não prestar atenção à gostou nada de ver o atelier local Mies gostava que a estrutura de
fábrica de Krefeld, muito provavel- acrescentar ao HE a torre do reló- um edifício se revelasse - queria
mente porque, defende Lohmann, gio por achar que era pouco harmo- ver o aço, o cimento, o tijolo com
a sua autoria não era clara e porque MARK WOHLRAB/KUNSTMUSEEN KREFELD

os investigadores preferem “os seus


projectos de habitação espectacula-
res”. Antes do trabalho realizado pe-
los dois professores e os seus alunos
era difícil perceber que partes do
complexo tinham saído do estirador
de Mies e dos seus colaboradores,
e que partes tinham resultado do
contributo do atelier local, já que a
Verseidag dispunha de uma equipa
de arquitectos nos seus quadros.
A pesquisa nos arquivos, sobre-
tudo no do Museu de Arte Moderna
de Nova Iorque (MoMA), permitiu
perceber que Mies criou um plano
geral para o complexo que estabe-
lecia as linhas orientadoras e que
continuou a ser usado nas sucessi-
vas ampliações. À luz desse plano,
desenhou o Edifício HE, destinado à
linha de casacos para homem, “cui-
dadosamente planeado e executado
em dois andares em 1930-31, e de-
pois acrescentado em dois andares
pelos arquitectos locais em 1935”, e
o bloco dedicado ao tingimento das
sedas, “com uma cobertura que dei-
xa entrar a luz”. Mies esteve também
envolvido no projecto da fábrica do
outro lado da rua, não longe do HE,
e pelo menos na primeira fase da
central eléctrica, criando ainda o
edifício de escritórios destinado à
administração que ficaria por cons-
truir.
Lohmann, para quem o facto de
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 9

A Mina de Carvão de Zollverein,


em Essen, apresentada como
“a mais bonita do mundo”,
é hoje património mundial
e está transformada num
grande centro de cultura e lazer

CORTESIA: BANITA TRAVEL/ANITA DEMIANOWICZ


que era construído. Dispensava o
ornamental e, sempre que lhe pe-
diam que falasse da sua obra, fazia
questão de dizer que tentara apenas
que a sua arquitectura servisse uma
sociedade tecnológica. “Procurei
manter tudo razoável e claro, [pro-
curei] fazer uma arquitectura que
qualquer um pudesse executar.”
“Mies gosta de mostrar os mate-
riais que usou, tem orgulho neles”,
diz Norbert Hanenberg. Os seus
alunos tinham de ter noção dos
princípios básicos da construção
em madeira, pedra, tijolo, cimen-
to e aço antes de se atreverem, se-
quer, a desenhar. Tudo começava
nos materiais, dizia, e tudo o que
um arquitecto tinha de fazer era sa-
ber usá-los.
Na Fábrica Verseidag, o edifício
para tingimento das sedas, por
exemplo, tem um estreito rodapé
em que o tijolo está à vista. “Foi
cuidadosamente desenhado pelo
escritório de Mies para que pareça
alinhado com a superfície rebocada
da fachada. Parece insinuar que o
edifício é uma construção em tijolo
rebocado. Mas os edifícios têm uma
estrutura em aço, inteiramente. (.)
Os materiais das fachadas foram es-
colhidos para criar a tão desejada
harmonia entre o gesso branco, a ba-
se de tijolo e janelas de aço elegan-
tes”, acrescenta Daniel Lohmann.
Mies, que chegou a ser presiden-
te da associação alemã de artesãos, CARSTEN JANSSEN
prezava os métodos de trabalho
tradicionais, o cuidado deposita- Cem anos de Bauhaus
Um aniversário,
do em cada objecto pelo artífice
experiente, qualquer que fosse a
sua área de trabalho. Fascinavam-

muitos roteiros
no os avanços da tecnologia e da
indústria, é claro, mas os charu-
tos que fumava e os elegantes fa-
tos que vestia eram feitos à mão.
Krefeld é uma cidade que sempre
soube, como ele, dar valor ao traba-
lho manual e que nos últimos anos a Nasceu no pós-Primeira Guerra Bauhaus permanece intocada. En-
tem vindo a investir na recuperação como resposta a um expressionis- quanto escola criada pelo arquitec-
da obra do mais influente dos arqui- mo em decadência num mundo to Walter Gropius a 1 de Abril de
tectos alemães do século XX. Nela em transformação e a precisar, 1919, com artistas como Paul Klee,
há uma fábrica e duas villas que nos naturalmente, de optimismo e de Josef Albers e László Moholy-Nagy
falam de Mies van der Rohe e que, ordem. Propunha-se cruzar as ar- entre os seus professores, durou
este ano, falam também da Bauhaus tes, combinar a tecnologia com o apenas 14 anos — a chegada dos na-
e de (quase) tudo o que quis a arqui- saber fazer tradicional, contaminar zis ao poder em 1933 ditaram-lhe o
tectura moderna. a indústria com a qualidade do pro- fim —, mas como sinónimo do mo- bre a arte, a arquitectura, o design, A Alemanha está a celebrá-la em
duto feito por mãos experientes e derno perpetuou-se. O seu gesto de a fotografia e as artes performativas dezenas de exposições, espectácu-
A Fugas viajou a convite atentas ao detalhe. Passaram 100 ruptura, o novo modo de vida que passaram a ser referências difíceis los e roteiros especiais, com para-
do Turismo Alemão anos e a aura experimentalista da propunha e o olhar que lançou so- de contornar. gem obrigatória nas cidades c
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10 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Alemanha

Conhecido como Jardim


Italiano, este é um dos bairros
de renda acessível que
Haesler projectou para Celle

CORTESIA: CELLE TOURISMUS UND MARKETING

Josef e Anni Albers, dois dos


artistas da Bauhaus que se
refugiaram nos Estados Unidos,
aqui fotografados na Alemanha
em 1927-8

que lhe serviram de sede entre 1919


e 1933 - Weimar, Dessau, Berlim - e
grama de exposições vai mostrar o
quotidiano da escola, a forma como A Bauhaus de acordo com os princípios da
Nova Objectividade, projectou
com outras mais surpreendentes. as suas actividades eram divulga-
das e o papel que nela tiveram as nasceu no em Celle nos anos 1920 e 30
três conjuntos residenciais
mulheres. em que, tirando partido
Weimar e Dessau,
dois museus novos
pós-Primeira das modernas técnicas de
Celle, a cidade construção com recurso
Estas duas cidades tomaram o cen-
tenário como pretexto para inau-
de Otto Haesler Guerra num a estruturas de aço e a
revestimentos e outros
gurar novos museus dedicados à
escola que nos pôs a pensar que o
Festejar o centenário da Bauhaus
permite celebrar a arquitectura mo-
mundo em materiais de produção
industrial, reduziu drasti-
moderno tanto podia ser uma uto-
pia, como algo de muito concreto,
derna no geral, divulgando a obra
de figuras mais discretas, quando
transformação camente os custos e aumentou a
qualidade das casas, dando respos-
materializável em casas, berços,
candeeiros, cadeiras ou tabuleiros
comparadas com Gropius ou Mies
van der Rohe. Otto Haesler é uma
e a precisar, ta às necessidades da Alemanha do
pós-Primeira Guerra.
de xadrez. O de Weimar, um pro-
jecto da arquitecta Heike Hanada,
delas. Sob o mote O Barroco Encon-
tra a Bauhaus, Celle, cidade da Bai-
naturalmente, Em Maio, esta cidade que é tam-
bém famosa pelas suas casas cente-
abre a 6 de Abril com uma expo-
sição que inclui 1000 peças saídas
xa Saxónia a 120km de Hamburgo,
propõe visitas guiadas a algumas
de optimismo e nárias em madeira e tijolo, pelo seu
palácio com uma magnífica capela
da mais antiga das colecções de
objectos da Bauhaus, em que estão
das principais obras de Haesler, que
ali começou a trabalhar na constru- de ordem renascentista e pela criação de ca-
valos, reabre o Museu Haesler, que
representados Klee, Marcel Breuer ção de moradias com uma lingua- tem estado fechado para remode-
ou Marianne Brandt. O de Dessau, gem tradicional para os mais ricos, lação, e dá início a um extenso
local do mítico edifício-sede de Gro- e que acabaria por se notabilizar, programa de conferências e
pius e da sua Casa dos Mestres, uma sobretudo, pelos bairros de rendas visitas guiadas que procura
colónia de artistas onde viviam e acessíveis e pela escola primária dar a este arquitecto nascido
trabalhavam os seus professores, é que ainda hoje funciona. em Munique a atenção que
inaugurado a 9 de Setembro. O pro- Este arquitecto, que trabalhou o seu trabalho merece.
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 11

DR

Os objectos deste plano


estão entre os mais icónicos
dos muitos que foram
produzidos na esfera
CORTESIA: THE JOSEF AND ANNI ALBERS FOUNDATION da Bauhaus, directa ou
um projecto começado por Edu- indirectamente: o bule de
ard Werner e finalizado por Walter chá de Marianne Brandt, a
Gropius e Adolf Meyer, também é cadeira Barcelona de Mies
visitável e o seu refeitório, bem ilu- van der Rohe e o candeeiro
minado, está aberto a quem vem de secretária de Carl Jakob
de fora. Jucker

A Bauhaus também
se dança
O Museu LWL, em Münster, associa-
se ao centenário com uma exposi-
ção (A Bauhaus e a América. Expe-
riências com Luz e Movimento) e um
espectáculo que propõem, até 3 de
Março, colocar o foco sobre os ar-
tistas e arquitectos que, depois de
encerrada a escola em 1933, em vir-
tude da pressão sobre ela exercida
pelos nacional-socialistas no poder,
se exilaram nos Estados Unidos, on-
de continuaram a trabalhar.
Pegando no palco como labora-
tório e território fértil para o cruza-
mento de artes e saberes que está
na génese da Bauhaus, a equipa do
museu foi à procura de obras na
A mina mais bonita dança, na performance ou no ci-
do mundo nema em que o experimentalismo Para salvar as palavras
Entre os roteiros da arquitectu-
tenha tornado evidente a influên-
cia dos artistas e dos princípios da do esquecimento Tento salvar
ra moderna que o Turismo Ale- escola alemã nos EUA. Uma influ- do esquecimento
mão promove neste centenário da ência que, a partir dos anos 1950, e do uso indevido
Bauhaus, há vários edifícios ou con- faz o caminho inverso e se impõe algumas palavras
juntos classificados como patrimó- na produção europeia, escrevem os da língua portuguesa
nio mundial. Aqui destacamos dois: curadores desta exposição que con-
a Mina de Carvão de Zollverein, em ta com empréstimos de importan-
Essen, construída entre 1926 e 1932 tes museus internacionais, como o
e hoje transformada num complexo Centro Georges Pompidou (Paris) e
com museus, galerias e espaços de a Tate Modern (Londres), e que in-
conferência e concertos; e a Fábrica clui trabalhos de Josef Albers, Lász-
Fagus (1911-1913), em Alfeld, que há ló Moholy-Nagy, Robert Rauschen-
mais de 100 anos produz formas e berg, Barbara Morgan, John Cage,
moldes para sapatos. James Turrell, Merce Cunningham,
A mina, construída com a efi- Lucinda Childs e, claro, Oskar Sch-
ciência em mente e usando os lemmer, o homem a quem se deve
equipamentos mais evoluídos do o Ballet Triádico.
arranque do século XX, é sempre MESH (2 e 3 de Fevereiro; 9 e 10
apresentada como a mais bonita do de Março), uma criação da dupla
mundo graças ao Poço 12, aberto de coreógrafos Matthias Markstein/
em 1932. Funcionou até 1986 e é Isaac Spencer e da cenógrafa Nora
hoje um centro de cultura e lazer, Maria Bräuer, associa-se à exposi-
com intervenções do arquitecto ção para explorar o impacto que a
holandês Rem Koolhaas. A fábrica Bauhaus teve na dança moderna
onde ainda trabalham 350 pessoas, americana. p3.publico.pt/palavradeaurelio
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12 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019


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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 13

Protagonista
FOTOS: NUNO FERREIRA SANTOS
integrada na freguesia de Santa entusiasma são as lendas, os ditos
Mara Gonçalves Maria Maior. Era “o antigo Colégio
dos Meninos Órfãos”, fundado por
populares e os mistérios sobre
a capital. Mas tem de refrear as
?
a Quantas vezes caminhamos D. Catarina em meados do século pesquisas por uns tempos. “Ando
pelas ruas sem repararmos nas XVI para “acolher 30 meninos de muito atarefada com a escola.” Resposta rápida
fachadas que flanqueiam o passeio, rua e dar-lhes formação religiosa Aos 59 anos, Helena frequenta o Conte-nos uma história
sem nos perguntarmos pelas suas para servirem, mais tarde, como segundo ano da licenciatura em de infância.
histórias e porquês? Helena Aguiar missionários além-mar”. Pintura, na Faculdade de Belas Já foi há tanto tempo! [Ri-se]
nunca foi assim. Talvez por ter Uma das visitas guiadas que Artes. O que “queria mesmo” era Vivíamos na Mouraria e o castelo
nascido e crescido na Mouraria, Helena fez naquele primeiro Verão estudar História, mas o processo de São Jorge era o meu parque
“bairro maldito de Lisboa” mas do “Conta-me Histórias, Lisboa” de inscrição revelou-se demasiado infantil. Íamos para lá apanhar
“muito antigo”, Helena sempre passou por ali. Mas cedo desistiu burocrático. Avançou para pintura, pinhões e depois vínhamos a
andou de olhos colados aos de organizar passeios. “De repente, área em que tinha concluído o 12.º casa para parti-los e comê-los,
pormenores esculpidos nos o grupo começou a crescer e já ano. “Desde sempre que pintei com as mãos todas sujas. E
edifícios, a querer saber o que andava nas 20 pessoas, tornava-se um bocadinho, mas os afazeres brincávamos aos reis, rainhas
eram. Intrigavam-lhe os palácios, muito cansativo”, diz para justificar também não deixam.” e princesas. Púnhamo-nos em
“aquelas portas todas do castelo o cancelamento dos percursos Quando era mais nova, Helena cima dos canhões e eram os
de São Jorge”, a igreja “lá ao com a chegada do Inverno. “Não queria ir estudar para o liceu nossos cavalos.
lado”, sempre fechada. “Até a voltei a fazer mas a qualquer mas acabou por fazer o curso de Conte-nos uma lenda de Lisboa.
junta de freguesia era num sítio altura posso retomar.” Até porque comercial - “ainda sou do tempo Pode ser o dito “fazer tijolo”?
muito bonito e eu achava aquilo agora os conhecimentos sobre em que tinha de fazer o que a Depois do terramoto de 1755,
muito estranho. Como é que uma Lisboa “já começam a ser um mãe e o pai mandavam”. Toda a teve de fazer-se tijolo à pressa
junta de freguesia podia estar bocadinho mais”. E porque, se vida trabalhou em contabilidade. para a reconstrução [de Lisboa]
instalada num edifício assim? E eu há coisa que lhe crispa a voz, são Concluiu o ensino secundário à e esse tijolo era feito entre a
perguntava em miúda e ninguém guias e turistas. “Deviam pô-los noite mas, “divorciada e com uma Mouraria e o Intendente, onde
sabia”, recorda. a saber um bocadinho mais de filha”, não podia dar-se ao luxo de era a zona das olarias. Há pouco
A idade foi avançando e a História, porque Lisboa não é só deixar o emprego para ter aulas tempo descobriram que havia lá
curiosidade multiplicava as dúvidas pastéis de Belém e Jerónimos”, durante o dia. “Agora depois de um cemitério. No meio daquele
sem que conseguisse descobrir critica. “Estamos aqui há 5000 velha deu-me para isto, podia ser barro haveria, por isso, muitos
as respostas. Até que, numa anos e é por mérito próprio, há para pior”, graceja. ossinhos pequeninos. De modo
feira do livro, Helena encontrou que mostrar uma certa dignidade.” Um fóssil, a “bíblia dos É em frente à Faculdade de que as nossas casas pombalinas,
em promoção o Dicionário da Lisboa, defende, “não é uma olisipógrafos” e alguns Belas Artes que nos sentamos além do tijolo, têm muito
História de Lisboa, um “monstro Disneylândia”. dos trabalhos feitos na a conversar, antes de as aulas defunto enfiado na parede. [Ri-
enorme”, considerado “a bíblia Na Mouraria da infância, onde licenciatura em Pintura começarem. E sobre o edifício se] Por isso é que ainda hoje
dos olisipógrafos”. De repente, parecia que todos se chamavam de fachada amarela há “tanto se diz quando alguém morre:
preenchia o vazio que tantas Manuel - “Era muito engraçado se dá a conhecer, mais azo se dá a para contar” que Helena tem um “Coitado, esse já está a fazer
perguntas tinham deixado durante porque era o senhor Manuel que desapareçam”, comenta, ao dossier repleto com tudo aquilo tijolo”.
a infância. Os prédios ganhavam das bananas, o da mercearia, o lembrar-se dos painéis de azulejos que tem conseguido encontrar. Conte-nos a história
finalmente vida, com muitos sapateiro. Só num dos talhos havia que foram sendo retirados de Era ali o antigo Convento de São de um lisboeta.
enredos, lendas e personagens um senhor Onofre”, ri-se -, as fachadas e nichos ao longo dos Francisco, fundado antes de Lisboa O barão de Quintela,
históricas. Nunca mais parou. Atrás portas não se trancavam, o castelo anos. ser capital do país, há mais de 800 conde de Farrobo, era uma
de um livro vinha sempre outro, de São Jorge servia de palco às Às vezes, os nomes das anos. O edifício ainda guarda “uma pessoa inteligentíssima,
mais os artigos de jornais e de brincadeiras e só quando a vizinha personagens ou dos palácios cisterna, única em Lisboa, que se extraordinária em termos
revistas, guardados em dossiers. já não dava conta do recado é que não lhe saem à primeira, mas as pensa ser uma das poucas coisas de empreendedorismo e de
Foi para dar arrumo a tudo o se chamava o médico. Agora, “são histórias sucedem-se, recheadas de que restam do início da construção negócios e muito dedicado às
que tinha acumulado ao longo só hostels”, compara. “Continua pormenores. “Vamos lá ver se me do convento”. “Com a extinção das artes. Foi um dos fundadores
dos anos que criou a “Conta-me a ser bairro, mas já não há aquela lembro de tudo. Acho que a página ordens religiosas, aqui se juntaram dos teatros de São Carlos e do
Histórias, Lisboa”. A página no interacção.” já sabe mais do que eu”, ri-se. O as obras de arte dos outros Thalia. E gostava tanto de música
Facebook começou como um A atitude dos alfacinhas também entusiasmo nunca desarma. Entre mosteiros e conventos para não e de desenvolver a capacidade
“arquivozinho”, seguido por mudou nos últimos anos. “Antes um cigarro e outro, vai desfiando serem saqueados”, conta ainda. artística nas outras pessoas
“meia dúzia de amigos e família”. as pessoas eram muito simpáticas sempre mais um conto, uma Foi esse acervo, acrescenta, que que criou uma orquestra com
Quatro anos depois, soma mais comigo. Eu batia-lhes à porta particularidade sobre um edifício, deu origem, em parte, ao Museu os empregados da casa. Era
de mil publicações e quase 23 a perguntar se me deixavam o novelo biográfico de uma figura Nacional de Arte Antiga. uma pessoa extraordinária, com
mil seguidores. O espírito do entrar para ver alguma coisa que histórica. “Vou-me apaixonando Por mais que se acumulem os uma cultura fora do normal, e a
projecto continua o mesmo: eu sabia que lá havia e diziam pelos segredos que Lisboa guarda”, trabalhos da faculdade - e as boas gente só fala dele por causa das
divulgar aquilo que Helena tem sempre que sim. Agora já não é resume às tantas. Nisso a cidade notas, assegura orgulhosa -, Helena grandes festas que dava, de dia
aprendido sobre Lisboa, com assim.” Os pátios estão trancados, não é avarenta: “A gente abre um confessa que anda “sempre a ler e dias, e que deram origem à
muitos pormenores que “a maior os restaurantes apinhados, os buraco no chão para arranjar um é coisas sobre Lisboa”. Disse-lhe expressão “farrobodó”.
parte das pessoas não conhece lisboetas desconfiados. Aqueles cano e encontra coisas romanas, um dia o professor de História
nem sabe onde ir procurar”. pormenores interessantes mas muralhas, esqueletos.” Há sempre de Arte: “Só se ama aquilo que se
Como a história do edifício onde mais escondidos acabam por ficar mais para saber e descobrir. “É conhece”. E, para Helena, não há
ficava a tal junta de freguesia, apenas para segredo de alguns. interessantíssimo.” paixão maior do que a cidade onde
do Socorro, entretanto extinta e “Até porque, às vezes, quanto mais Ultimamente, aquilo que mais a nasceu.

Helena Aguiar
A contadora de histórias sobre a História de Lisboa
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14 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Club Med Les Arcs Panorama

A montanha
é uma força
maior que nos
gela e fascina

Quando um resort se aninha a


1750 metros de altitude, em plenos
Alpes franceses, sabemos que são
as montanhas que mais ordenam.
De Inverno, dão esqui a rodos.
De Verão, o melhor queijo. O novo
Club Med Les Arcs Panorama
promete refúgio para todo o ano.
Mara Gonçalves

a Não vale a pena resistir, o filme e Fanny, o casal amigo das persona- Mas as paisagens são em tudo se- luvas, casaco fechado até ao queixo relação em crise, nós subimos na
não nos sai da cabeça. À janela, o ce- gens principais de Força Maior, a ca- melhantes. As panorâmicas geladas, e aí vamos nós, do quente da sala tensão do medo de quem esquia
nário vai-se transfigurando como sli- minho do mesmo destino: um resort o branco que se impõe a todos os dos cacifos ao frio soalheiro, meia pela primeira vez. De manhã, dois
des a passar ao ritmo da sonolência: em plenos Alpes franceses. sentidos, o silêncio opaco, como dúzia de passos são suficientes pa- dedos de neve chegavam para en-
pequenas vilas charmosas com as Não haverá avalanches (só pensa- se a neve fosse capaz de sugar até ra chegarmos aos graus negativos contrões e quedas. Agora querem
suas igrejas de pináculo, chalets de remos nelas quando passarmos por o mínimo ruído, o contraste que (as temperaturas mínimas hão-de que descemos aquela colina toda -
telhado inclinado, um lago imenso. uma placa de aviso numa curva da se pressente entre o quente cá de bater os -11ºC). Logo ali, um túnel minúscula, ridícula, até nos porem
As encostas ainda sobem negras, ro- estrada - não que seja comum, mas dentro e o frio lá de fora. O esqui, o com passadeira rolante e o filme a uns esquis e pedirem para deslizar-
chosas, mas lá ao fundo já se anun- a probabilidade não é zero) nem te- esqui, o esqui. voltar-nos à memória. Se na pelícu- mos por ali abaixo, Mont Blanc da
ciam alguns picos nevados. É como remos discussões profundas sobre a Pranchas nos pés, botas grossas la de Ruben Östlund a lentidão do nossa inexperiência e, confessemos,
se fôssemos no autocarro com Matt ética do instinto de sobrevivência. que nos apertam os ossos, capacete, trajecto alimenta a tensão de uma fraca aptidão.
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 15

MANUEL ROBERTO

para a inauguração, em meados de


Dezembro. É a 17.ª unidade hoteleira
do grupo nos Alpes franceses; 21.ª
se incluirmos as vizinhas monta-
nhas italianas e suíças. O edifício,
com vista privilegiada sobre o vale
de Tarentaise a partir das varandas
principais, surge em camadas ondu-
ladas, a lembrar Le Corbusier, como
se dançasse com as florestas de pi-
nheiros e abetos cobertos de neve
que se vêem para lá das janelas. No
interior, perpassam as formas orgâ-
Estamos no nicas e a natureza insinua-se em si-
segundo lhuetas de árvores e de animais das
maior domínio montanhas; o uso das madeiras, do
esquiável mármore de Savoy, dos cobres e das
de França, cores quentes torna tudo aconche-
Paradiski. gante sem cimentar o contraste en-
O pico mais tre o dentro e o fora.
alto sobe a O check-in é feito no colo de uma
3750 metros das poltronas do hall de entrada: é
o recepcionista que se aproxima de
tablet na mão e tudo é tratado ali.
Se tiver alugado o material de es-
qui ou snowboard de antemão, já
o deverá ter pronto no cacifo do ski
room - basta aproximar a pulseira
para abrir a porta (do cacifo ou do
quarto). Um pouco mais à frente, fi-
ca a boutique e o bar, com um lounge
enorme e um palco para os espectá-
culos que decorrem à noite.
Quanto a restaurantes, existem
três. No espaço principal, La Pier-
re Blanche, todas as refeições são
servidas em regime de buffet, com
vários pratos finalizados pelo cozi-
nheiro no momento do pedido. Já
o 1790 Gourmet Lounge oferece re-
Mas os instrutores estão confian- para abrandar a marcha e a tentar, nos a levantar e a dar coragem para canso que é ter logo ali o ski room, feições leves ao almoço e um menu
tes e de ar descontraído, por isso tudo por tudo, não tirar os olhos do a próxima descida. E, como em chão abençoada porta para um éden de degustação ao jantar, com uma
deixamo-nos convencer. Miúdos caminho imaginado, porque senão fofo não cai nódoa negra, o corpo aquecido com café à disposição. ilha de bar e uma carta de vinhos
que nos dão pela cintura já nos ul- é certo que os esquis vão ganhar vai pedindo mais, que a satisfação caprichada. A pensar nas famílias, o
trapassam como se nada fosse e nós vontade própria e embater onde daqueles segundos em que tivemos Um refúgio depois do esqui Bread&Co é um dos conceitos mais
- grupo de jornalistas feitos, vindos não queríamos. Corpos alheios, tudo controlado é superior a qual- recentes: aqui são as crianças que
de Portugal, do Brasil, do México, redes de protecção, casca do túnel quer humilhação. Descontando os dias de viagem, pa- convidam os pais para jantar, que
do Reino Unido - a caminhar como rolante, conseguiremos ir contra Duas aulas para principiantes, ra lá e para cá, estaremos dois dias escolhem a comida e que ainda aju-
pinguins no gelo, a deslizar em fila tudo. E, no entanto, em terreno de num único dia, não dará para muito completos no Club Med Les Arcs dam na confecção da refeição, num
indiana, entre o pavor e o riso des- aprendizes ninguém leva a mal. Há mais do que ver o bichinho do esqui Panorama, integrados numa comi- ambiente interactivo.
controlado, a treinar vês invertidos sempre uma mão pronta a ajudar- nascer entre quedas e sentir o des- tiva que encheu de mundo o resort Quatro clubes garantem a c
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16 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Club Med Les Arcs Panorama


MANUEL ROBERTO

Sobem rios
de teleféricos
para depois
descerem,
em grupos
coloridos,
dezenas de
esquiadores

supervisão e o entretenimento dos ski room ao teleférico mais próximo


miúdos, dos quatro meses aos 17 são dois minutos a esquiar, segundo
anos (Baby, Petit, Mini e Passworld, dados do resort. A pista mais pró-
consoante a faixa etária), incluindo xima é azul.
áreas de brincar, mas também um
ski room reservado, um “jardim de Descer à vila do queijo
neve” e piscina interior aquecida.
Mas os crescidos que não se apo- Resolvidos a deixar o esqui para um
quentem: o spa tem piscina interior regresso, aproveitámos a manhã
e exterior, ambas aquecidas, assim para descer até à cidade. É sábado,
como um jacuzzi na varanda, além dia de mercado de rua, e as bancas
de salas de tratamentos, sauna e gi- enchem-se de roupas, CD e muitas
násio. hortaliças, queijos e enchidos pro-
Para quem já conhece o conceito duzidos na região. Numa enorme
do Club Med, a maior novidade tal- frigideira, cozinham-se caracoletas
vez seja o Le Belvédère, uma área com molho verde. A rua principal
cinco tridentes no interior de um do pequeno centro histórico está
resort de quatro tridentes (a versão fechada ao trânsito, concentrando
Club Med para as habituais estrelas). a maioria dos cafés, restaurantes e
O espaço é reservado a quem fica lojas de souvenirs. Numa das espla-
hospedado numa das 24 suítes da nadas, um DJ anima a manhã e há
Exclusive Collection e integra servi- quem arrisque um pé de dança ou
ço de concierge, um lounge com bar um trautear de cabeça ao ritmo da
e um largo terraço com jacuzzi. música electrónica francesa que sai
das colunas de som.
Subir às montanhas No fim da rua, próximo da gare
de comboios e de autocarros, fica
A promessa de subirmos ao topo a loja da cooperativa de lacticínios
da Aguille Rouge, o pico mais alto de Haute Tarentaise. Até 1991, era
da estância (marca 3250 metros de neste edifício que produziam o quei-
altitude), pareceu-nos uma boa al- jo mais famoso da região, o Beau-
ternativa para conhecermos aquilo fort, com denominação de origem
que andávamos a perder, de esquis protegida. Mas a fábrica mudou-se
inexperientes presos à babugem ge- entretanto para umas instalações
lada junto ao resort. Ao segundo dia, maiores à saída da vila. É lá que Gil-
deixámos a espuma e fomos ver as les, um dos trabalhadores, recebe o
ondas grandes, já no conforto es- grupo para uma visita guiada (são
tático das botas de montanha. Só gratuitas, decorrendo de manhã, en-
se esqueceram de nos avisar que tre as 9h30 e as 11h30, embora haja
o autocarro não iria galgar até ao quem confesse existir a intenção de
topo. A avaliar pelo número de cal- te anterior tinha feito estragos no sis- rir-se à nossa direita e, em frente, É o primeiro dia da temporada terminá-las).
ças de ganga, não fomos os únicos tema e um helicóptero continuava lá um vale de neve fofa e pinheiros a e já o funicular que liga a cidade A cooperativa une 52 produtores
a imaginar um passeio no conforto no alto em operações. Alternativa? descer até ao Monte Branco, bem lá de Bourg Saint-Maurice à estância da região e aqui chegam, todos os
do veículo aquecido, saída para uns Caminhar uns bons 40 minutos en- ao fundo, com o pico mergulhado de Les Arcs (1600) anunciava um dias, dezenas de litros de leite, num
minutos de contemplação, mil foto- tre pistas e seguir noutro teleférico numa nuvem fina e espessa, sinal dia cheio nas pistas de esqui. Só total de oito milhões por ano. É só
grafias e regresso. até outro ponto alto. de que irá nevar durante a noite, para abrir o apetite aos mais expe- nas cubas que vemos na sala lá em
Mas a estrada termina aos 2000 As vistas hão-de compensar o frio aponta-nos um dos instrutores. À rientes: são três as estâncias que baixo que o leite fresco da noite an-
metros de altitude. E só junto ao - até porque o que ele não congela nossa volta, sobem rios de teleféri- compõem o domínio esquiável de terior é misturado com o leite, ainda
teleférico que nos levaria à Aguil- transforma em conversa animada. cos para depois descerem, em gru- Paradiski, num total de 264 pistas, morno, colhido durante a manhã.
le Rouge é que constatamos que se Daqui vêem-se os principais picos pos coloridos, dezenas e dezenas de 425 quilómetros distribuídos por Cada cuba tem capacidade para qua-
mantém encerrado - o nevão da noi- da estância, com a Aguille Rouge a esquiadores. percursos para todos os níveis. Do tro mil litros de leite, o que resultará
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 17

DR

Les Arcs Panorama Tanto o aeroporto de


i Arc 1600
73700 Bourg Saint
Genebra (Suíça) como
o de Lyon (França)
Maurice ficam a cerca de 2h30 de carro
Savoie - França do resort. Também é possível
Tel.: +33 4 79 41 77 00 chegar de comboio até Bourg
www.clubmed.pt/r/Les-Arcs- Saint Maurice e depois subir no
Panorama/w funicular até Arcs 1600. O resort
É composto por 433 quartos fica à distância de cinco minutos
(duplos, comunicantes e de carro.
familiares, divididos pelas
categorias: superior, deluxe Paradiski
e suítes - estas localizadas no O resort Les Arcs
espaço exclusivo Le Belvédère), Panorama integra a
três restaurantes, bar, sala, spa, estância de esqui Arc 1600,
CLUB MED ARCS PANORAMA
quatro kids clubs, ski room, duas parte de uma das maiores

O edifício surge salas de reuniões e loja.


Preços: a partir de 2113€ (Março)
áreas esquiáveis do mundo e
a segunda maior em França,
por pessoa, mínimo de sete Paradiski. São 307 hectares
em camadas noites. Encerra em Maio e reabre de neve, 425 quilómetros de
em Junho para a temporada de pistas: 12 verdes, 137 azuis, 79
onduladas, Verão (a partir de 1046€). vermelhas e 36 pretas (num total
Inclui: estadia, refeições, de 264 pistas); cerca de 70%
a lembrar bebidas, kids club dos quatro aos
17 anos (o serviço para crianças
acima dos dois mil metros de
altitude. O pico mais alto de todo
Le Corbusier, com menos de quatro anos é
pago), forfait (seis dias) e aulas
o domínio sobe a 3250 metros
de altura.
como se de esqui ou de snowboard (cinco
dias). É possível reservar com
paradiski.com

dançasse com voos e transfer incluídos.


Informação adicional: as aulas,
Coopérative Laitière de Haute
Tarentaise
as florestas em grupo, são divididas de
acordo com o nível de cada
Rue des Colombières
73700 Bourg Saint Maurice
hóspede e podem ser iniciadas Tel.: +33 4 79 07 08 28 (fábrica)
ENRIC VIVES-RUBIO
no dia a seguir à chegada, não E-mail: contact@
topo, no mês seguinte. No final do estando disponíveis aos fins- fromagebeaufort.com
Verão, vão descendo por fases tam- de-semana; a primeira aula para Loja: Rond-point de la Gare; +33
O Beaufort bém, até recolherem aos estábulos principiantes decorre sempre à 4 79 07 04 47
é o queijo por volta de Outubro.” No Inverno, segunda-feira. É possível alugar www.fromagebeaufort.fr
mais famoso alimentam-se de fardos de palha. material no resort.
da região Voltamos, por momentos, ao co-
ração das pistas de esqui. Se olhar-
mos com atenção, vamos desco-
brindo, aqui e ali, pequenas casas BÉLGICA
de pedra por entre a neve, algumas
LUX.
soterradas até ao primeiro andar.
Uma delas, aponta a guia, é uma
minúscula capela, com uma cruz Paris

discreta sobre o telhado. Muitas fo-


ram entretanto transformadas em
em oito queijos de 40 kg cada, vai pelo menos duas vezes por semana. casas de veraneio, mas outrora era
debitando Gilles, entre o francês e Quase toda a produção é vendida na ali que os pastores ficavam durante
o inglês. região e em algumas lojas espalha- os meses de Verão, era ali que as SUÍÇA
FRANÇA
Seguem-se processos consecuti- das pelo país. vacas eram ordenhadas nessa altura OCEANO Monte Branco
vos de 24 horas: prensa, arrefeci- Já na sala de provas, falam-nos de e, por vezes, era ali que se fazia o ATLÂNTICO

mento e imersão em água salgada, um outro pormenor: há diferenças queijo também. Bourg Saint Maurice
para começarem a ganhar aquela de sabor entre os queijos produzi- Partimos, com os olhos lavados ITÁLIA
crosta característica. Vão depois dos no Verão e aqueles produzidos em branco, a imaginar se reconhe-
para a cave, onde nos encontramos no Inverno. Os primeiros são “mais ceríamos estas montanhas daqui
agora. Corredores e corredores de macios e frutados”, os de Inverno a uns meses, quando quase tudo Mónaco

prateleiras de queijos enormes, “mais secos”; fruto da alimentação o que agora vemos tiver derretido ESPANHA
redondos e achatados, que outro do gado nas diferentes estações. No em verdes, flores e riachos, com bo- Andorra Mar Mediterrâneo
funcionário da fábrica, empoleira- Verão, a neve cede e as montanhas vinos plácidos onde agora descem
do numa empilhadora, vai virando transformam-se em prados fron- esquiadores a alta velocidade. 105 km

à mão. Entre cinco meses a um ano, dosos. “As vacas saem em Junho e Córsega
cerca de 21 mil queijos são virados, depois vão subindo por fases, a ca- A Fugas viajou a convite
salgados e esfregados manualmente da dois ou três dias, até atingirem o do Club Med
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18 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Passeio

Arcos de Valdevez,
uma porta para
o barroco e para
o Alto Minho

a Ester Campos anda a ver coisas


Foi “onde Portugal se fez”, diz o slogan de Arcos que antes lhe haviam passado des-
tava muito má. Lembro-me de uma
missa, ainda com o senhor padre

de Valdevez. É onde agora se procura resgatar percebidas.


- Nunca tinha visto estes púlpitos.
João. Um homem começou a dizer
“isto não tem jeito nenhum, está tu-

o estilo barroco num território onde a quantidade - Mas já estavam.


- E as paredes, tão brancas... En-
do a cair, vou mandar fazer obras”.
Agora brilha tanto que Ester Cam-

não abunda, mas a qualidade tem momentos tão, as minhas bodas de ouro foram
aqui, conheço bem a igreja. Mas há
pos não consegue conter a sua sur-
presa.

interessantes. Como na Igreja do Espírito Santo, quatro anos que não entrava aqui...
Nuno Soares é o interlocutor - e
- E foi à sacristia?
- Olhe, também mandei rezar aqui

feita Centro de Interpretação do Barroco. não podia ser melhor. Afinal, o ar-
queólogo, chefe da Divisão de Desen-
uma missa pela minha mãe e fui lá
pagar. Era bonita, até o disse ao pa-

Andreia Marques Pereira (texto) volvimento Sociocultural e director


da Casa das Artes de Arcos de Valde-
dre João. Mas nunca tinha visto as
imagens.

e Nelson Garrido ( fotos) vez, conhece bem a transformação


da Igreja do Espírito Santo nos últi-
Estamos bem no extremo do pro-
montório sobre o rio Vez, na Igreja
mos anos, acompanhou-a. Estava a do Espírito Santo, é verdade; mas es-
caminho de ser ruína. tamos também no novíssimo Centro
- Eu costumava vir aqui à missa, Interpretativo do Barroco (CIB). E
moro aqui perto. Mas, realmente, es- embora o título oficial seja, por ago-
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 19

A Igreja do Espírito
Santo é sede do
Centro Interpretativo
do Barroco;
na foto principal,
a Igreja Matriz

i
Rota do Barroco
A Rota do Barroco foi concebida
para ser realizada de forma
autónoma, por isso o melhor
é descarregar a aplicação
(disponível para Android e iOS):
O Barroco no Alto Minho. O
que não dispensa da passagem
pela casa de partida, o Centro
Interpretativo do Barroco -
Igreja do Espírito Santo, no
Jardim dos Centenários, em
Arcos de Valdevez. Também
no jardim vale a pena visitar
a Casa das Artes, antiga
Casa do Terreiro, construída
na segunda metade do século
XVIII e mantendo muitas
das características da
arquitectura civil barroca
do Norte de Portugal.

ra, apenas este, podemos dizer que testante, não surpreende que seja - A 2 de Fevereiro há bênção do (servido pela bonança do ouro brasi- tros três ecrãs, mais pequenos, cada
é uma porta para o barroco no Alto nos edifícios religiosos que o barro- bispo, leiro); contudo, este de que falamos qual fazendo o enquadramento do
Minho. Afinal, este CIB é também a co marca mais o “gosto” da época. como dona Ester já sabe. Mas este é virtual, um holograma, Asinhas de barroco em três vertentes (sempre
primeira das “estações do tempo” São igrejas, capelas e santuários a que é provavelmente um dos mais seu nome. acompanhadas por cronograma, por
que a Comunidade Intermunicipal grande maioria dos 40 pontos de icónicos representantes da arte bar- E já iremos a ele, a imagem de mar- vezes com elementos multimédia): a
(CIM) do Alto Minho está a promo- visita identificados para esta Rota roca no Alto Minho adoptou quase ca desta igreja-centro-interpretativo sociedade e o pensamento, a cultu-
ver para promover e dinamizar o do Barroco do Alto Minho (possível completamente a nova roupa de cen- que está servida da tecnologia mais ra e a arte e o próprio monumento
património histórico e cultural da embrião para uma rota para o Norte tro interpretativo e de espaço cultu- recente para nos levar ao passado. É onde nos encontramos, imóvel de
região - dez concelhos, dez estações do país), muitos deles produto do ral (a inauguração, a 15 de Dezembro, ela que nos pode levar por toda a rota interesse público.
(ou seja, centros interpretativos), afã de várias confrarias que se fo- contou com um concerto de piano - literalmente, fazendo uso da app ou Para explorar a igreja do Espírito
dez percursos de visita. ram instalando na zona - sobra quase do maestro Rui Massena - “a acús- de QR Codes, que permitem a qual- Santo, quem chega tem à sua dispo-
Em Arcos de Valdevez, a porta uma mão cheia de casas senhoriais tica é extraordinária”, nota Nuno quer visitante lançar-se no território sição tablets (25) e óculos de realida-
cronológica abre-se para o barro- numa região muito ligada a elas (a Soares - e outros momentos já estão com “guia”; ou virtualmente, no ecrã de aumentada (HoloLens, dois pares
co “não pela quantidade, mas pela antiga nobreza portuguesa tem ra- programados). As “homilias” agora gigante que quase nos recebe. Mapa apenas, “são caríssimos”, cinco mil
qualidade”, sublinha Nuno Soares ízes profundas nesta região Entre- são de história e o “sacerdote” é um interactivo, podemos descobrir to- euros cada) que vão debitando o
(ainda que a quantidade não seja Douro-e-Minho). putto, um “anjinho barroco” - mais dos os pontos aqui, ler uma nota in- conteúdo de forma moderada e su-
displicente: este é o maior concelho Entremos, então, na Igreja do Espí- apropriado não poderia ser, eles es- trodutória, abrir para mais informa- cinta. Com um ou outro, os círculos
da região). E, sendo este um estilo rito Santo feita CIB - ainda se mantêm tão por todo o lado, na decoração, ção, ver fotografias (incluindo 360º) dourados no chão marcam o X: é daí
artístico que surgiu nos países cató- três momentos religiosos por ano, talha dourada abundante como mar- e as direcções, saber a distância e o que podemos apontar o tablet ou o
licos como resposta à reforma pro- que em 2019 serão quatro, ca do esplendor barroco português tempo de viagem. Do outro lado, ou- nosso olhar (se estamos com os c
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20 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Passeio

Igrejas, capelas
e santuários
constituem
a maioria
dos pontos
da Rota
do Barroco
do Alto Minho

óculos) para os vários elementos da num nicho por cima do arcaz de pau
igreja que vão surgir com um pon- preto, do lado oposto ao que resta
to branco e deixar que o Asinhas das cadeiras do cabido, trazidas do
se aproxime de nós e descreva o coro alto - o espaldar é tratado como
que vemos (que também surge em se fora um biombo, com arte chinoi-
texto). Uma das experiências mais se retratando cenas frívolas (namo-
interessantes é ver o retábulo-mor rados, caçadores), numa moldura
erguer-se diante dos nossos olhos, onde os putti abundam - eles estão
peça a peça, mas dona Ester igno- por todo o lado, não só na realidade
ra a sugestão de Nuno Soares para aumentada.
experimentar. Nem os funcionários
da Edigma, a empresa responsável Igreja Matriz
pela tecnologia, que circulam ora de
tablet ora de óculos fazendo updates Quase cem anos separam a Igreja
ao sistema, lhe suscitam curiosidade. do Espírito Santo e a Matriz (São
Está sem tempo, diz, mas não resiste Salvador), quase lado a lado - en-
a comparações. tre elas, o Jardim dos Centenários,
- A [Igreja] matriz é bonita, mas uma varanda sobre o rio, a praia
não tão bonita... Bem, cada uma tem fluvial e, na outra margem, o So-
o seu encanto, a sua beleza. lar do Requeijo (não está na rota,
Vamos descobri-lo na Rota do Bar- mas poderia estar: neste momen-
roco que não sai de Arcos de Valde- to, aguarda a sua conversão num
vez, “onde Portugal se fez”, diz o slo- hotel boutique). De origem medie-
gan da vila. Quatro igrejas, um solar val, a Matriz sofreu obras ao lon-
e a porta aberta para o resto do Alto go de várias décadas até o final do
Minho - barroco. século XVIII, quando o barroco já
se aproximava do seu final, o gran-
Igreja do Espírito Santo de bang que foi o rococó. Este está
plasmado no templo, nas capelas
Fixemo-nos, então, finalmente laterais, sobretudo na do Calvário,
“apenas” na beleza da Igreja do do lado da Epístola. Concentrado
Espírito Santo, concluída em 1681 de talha dourada, que começa na
(mas com a frontaria neoclássica do abóbada de caixotão, explode no
século XIX), considerada um dos altar, uma peça apenas, feito de co-
tesouros do barroco português, bri- res de arte portuguesa barroca. O elegante, os altares devidamente or- cheio de curvas e ilusões. “É um dos lunas torças (espiraladas, a simular
lhante no branco das suas paredes. restauro das peças foi minimalista, namentados, mas é o retábulo-mor melhores a nível nacional”, conta Nu- movimento e dramatismo tão caros
Há uma certa austeridade que não “tirar lixo, limpar bichos, estabili- que concentra, inevitavelmente, a no Soares. E é raro ter chegado até ao barroco) que emolduram o sa-
esperávamos num templo barroco, zar”, nada foi acrescentado - sur- atenção no templo de apenas uma hoje quase intocado. “Em toda a es- crário, ele próprio com miniaturas
acentuada pelo granito que debrua preendemo-nos com as pinturas, nave encabeçada pela capela-mor trutura houve apenas uma modifica- das mesmas colunas, profusão de
interior e exterior, mas percebere- cores vivas: “Ninguém as tinha to- (uma torre sineira ergue-se adossa- ção, na zona do sacrário”, continua, anjos, folhas, cachos, num borda-
mos que é o melhor cenário para cado, são pintadas directamente da à fachada principal), exemplo da “o original tinha um Pentecostes tri- do intrincado - que se apazigua na
fazer resplandecer a talha doura- na madeira. Os artistas são locais, tradição arquitectónica maneirista dimensional”. Este pode ser visto na Última Ceia esculpida no frontal de
da, que reveste retábulos, altares são básicas, populares, mas muito (a transição entre o Renascimento sacristia (uma intensidade ingénua altar, ricamente pintada.
e púlpitos, e as pinturas - entre es- bonitas”, nota Nuno Soares. e o Barroco): imponência dourada nas figuras onde o Espírito Santo é Esta capela é também especial vis-
tes, alguns dos melhores exempla- Os púlpitos são de uma majestade em trabalho escultórico meândrico, representado como línguas de fogo), ta do exterior, para onde abre um
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 21

Na página ao lado,
Igreja da Lapa; à esquerda
e em baixo, Igreja
da Misericórdia; à direita,
Igreja do Espírito Santo

característica do barroco, como estes autorização para nele rezar missa.


acompanham o movimento do dia: Com o retábulo de talha dourada, es-
a luz entra de todos os pontos cardi- te altar, que surge em simetria total
nais (e jorra lá do alto) - e e há mais com o portal, é um dos indicadores
espaços vazios do que na matriz. Tal- mais óbvios do barroco do templo
vez seja esta ausência e a presença - “É um barroco mais clássico”, con-
de pilastras que sublima a decoração, sidera Nuno Soares -, cujo interior é
onde abunda a policromia que aqui claro, como que depurado, sobres-
divide o protagonismo com o doura- saindo os tectos pintados e os retá-
do na talha e simula, por exemplo, bulos brancos debruados a dourado
mármores. O trompe l’oleil é um re- (uma “simplicidade” mais ao gosto
curso estilístico constante neste tem- neoclássico). “Em termos de arte não
plo onde a capela-mor é minúscula e é tão superlativo [quanto os anterio-
o altar mais “parece um órgão, mas res]”, confessa Nuno Soares.
a hierarquia está aqui toda”. “Só a
escala é diferente”, assinala Nuno So- Casa da Ponte
ares. O aspecto ilusório condiz com
os tiques cénicos do barroco. Pertence ao roteiro do barroco e é
propriedade privada. Aqui funciona
Igreja da Misericórdia um turismo rural mas, diz-nos Nuno
Soares, as proprietárias normalmente
O pequeno largo em torno do cru- permitem visitas. Não testamos a sua
zeiro do século setecentista costuma hospitalidade, ficamo-nos pela facha-
encher-se no terceiro fim-de-semana da do solar setecentista, comprida, à
de Setembro para a Romaria da Nos- face da rua estreita, casas adossadas
sa Senhora da Porta. Esta está a mirar imediatamente antes. Não há grandes
o espaço granítico do seu altar inusi- lampejos decorativos que exibam o
tado, por cima do pórtico da igreja. seu berço barroco a olhares leigos
Dizem que na capela original, datada como o nosso: as janelas do rés-do-
altar com uma representação de um Igreja da Lapa (data aproximada da sua construção) de 1595, a mesma da fundação da Ir- chão (com gradeamento) replicam-se
calvário - “É algo muito da contra- não abundava, ergue-se a Igreja da mandade da Misericórdia em Arcos no primeiro andar, o piso nobre, em
reforma: se não entras na igreja, a Desembocamos na fachada lateral da Lapa pequena e de uma graciosidade de Valdevez, uma imagem da Senho- molduras de granito simples, sendo
igreja vem até ti”. Está normalmente Igreja da Lapa com a certeza de que que parece mantida pela sua insus- ra da Misericórdia ocupava um nicho que a porta, elemento central no nível
fechada, porta chapeada na lateral estamos a ver algo diferente - mesmo tentável leveza. sobre o portal. O povo começou a térreo, é substituída por uma peque-
do edifício feito de vários volumes que não saibamos imediatamente o Esta sensação tê-la-emos mais ple- referir-se-lhe como senhora da Por- na varanda no nível superior. É nes-
que se foram anexando ao corpo quê. Entramos pela porta principal, namente no interior do templo oval, ta e, então, na reformulação a que a te seguimento vertical que a fachada
principal - cruz latina para feições antes afastamo-nos para ter noção encimado por uma cúpula, mas no igreja foi sujeita no século XVIII - da- tem a sua excentricidade, uma espé-
rectilíneas que se “agitam” quan- do espaço, porque esta igreja não exterior a volumetria desigual que do o avançado estado de degradação cie de frontão ogival, onde sobressai
do se estendem à torre sineira, em respira, resvés que está com as ru- se adapta aos condicionalismos do da sua sacristia, rezam as crónicas, o brasão, de tamanho respeitável.
pilastras com fogaréus no remate e as que a demarcam. “Tudo confluía terreno (com, por exemplo, a torre os responsáveis decidiram não só É considerado um exemplar co-
frontão contracurvado. No interior, aqui, tudo conflui aqui”, reflecte sineira nas traseiras, junto à capela- recuperá-la como dar uma nova fa- mum das casas do Norte do país no
destaque ainda para a presença de Nuno Soares - a vila medieval, a vila mor, “como nos Clérigos”, sublinha chada à igreja: de uma assentada, o século XVIII - em ambiente urbano
uma porção de azulejos setecentis- contemporânea. E, então, bem no Nuno Soares) já a faz pressentir. A conjunto ganhou uma nova cara bar- (o que significa, por exemplo, que a
tas originais e para o grande arco do centro de Arcos de Valdevez, onde o luminosidade é espantosa - não só roca (a “moda” da época) - abriu-se escadaria, por constrangimentos de
triunfo dourado. espaço já em meados do século XVIII tem várias janelas e janelões, como é um altar no frontispício e obteve-se espaço, se encontra no interior).
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22 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Livros
DR
leitores, os segredos de alguns dos
pratos mais populares, das caldeira-
das dos pescadores (cada uma com
a sua particularidade), às sopas de
peixe, massadas, papas de milho,
guisados, passando pela canja de
conquilhas, o grão guisado com ba-
calhau ou os carapaus alimados.
Num dos capítulos aprendemos
sobre as artes da pesca, ouvindo,
entre muitos outros, Manuel Maria
Preto explicar que “a pesca tem o
seu preceito, aquilo vai da isca e de
saber iscar”. Se se enterra a isca toda
no anzol “ele não pesca, porque não
bandeia”. Além disso, é preciso saber
preparar um isco, como o do choco
congelado com anis, que é assim por-
que “o peixe gosta de doce”.
Há, como não podia deixar de
ser, um capítulo dedicado apenas
à pesca do atum e à importância
que este animal tem desde sem-
pre para o Algarve. Nele se fala das
campanhas e do que era a vida nu-
ma armação de atum. E, sempre
guiados por Maria Manuel e pelas
muitas pessoas com as quais ela se
cruza (são 36 testemunhos recolhi-
dos sobretudo junto a algarvios), va-
mos pelas lotas e pelos mercados
para perceber como se comercia-
liza hoje o peixe. “Aí, na fronteira
entre o mar e a terra, os mercados
fervilham de pessoas, de peixes e o
mar faz-se presente” e, escreve, é
através da observação dos merca-
dos que “percebemos melhor que o

Um livro com as vozes mar não tem fronteiras”, porque os


peixes que ali se vendem “chegam
de perto ou de águas distantes”.

que o mar nos traz


Por fim - correspondendo a uma
preocupação que a autora tem em
todos os seus trabalhos, a da ligação
à actualidade e o olhar para o futuro
-, quase a encerrar o livro (que inclui
ainda um glossário e uma muito útil
de de ouvir - e de nos fazer ouvir Se essa vida era difícil, mais difí- listagem dos peixes e mariscos, com
Alexandra Prado Coelho - as tais vozes que contam histórias cil, quase impensável, era a dos que um pequeno texto sobre cada um)
de hoje mas sobretudo histórias de partiam para longe, para a pesca do encontramos as “vozes da moder-
a Esta é uma paisagem, de mar, de um passado que, se não for regista- bacalhau - e houve muitos pescado- nidade”, dois chefs, Bertílio Gomes
ria, de lagoas, de salinas, da qual se do, corre o risco de ser esquecido. res algarvios que o fizeram entre os (com quem Valagão já tinha colabo-
erguem vozes. Quando nos pomos à É assim que entramos, por exem- séculos XIX e XX, sobretudo homens rado na obra anterior) e o austríaco
escuta - e neste caso fazemo-lo com plo, nos barcos dos pescadores, pa- da Fuzeta. Maria Manuel Valagão Dieter Koschina, do hotel boutique
a ajuda de Maria Manuel Valagão, Ní- ra sentirmos o cheiro das caldeira- mergulhou também nesse “mundo Vila Joya, no Algarve. E também Pe-
dia Braz e do fotógrafo Vasco Célio, das. “Caldeirávamos sempre o pei- de lembranças”: “Ausências, hora dro Bastos, da empresa de comer-
autores de Vidas e Vozes do Mar e do xe a bordo do barco”, conta, num da saudade, ir à Nossa Senhora do cialização de peixe Nutrifresco, que
Peixe - conseguimos ouvir as vozes dos muitos relatos reproduzidos no Livramento, vila de amêijoas, roupa é uma das pessoas que mais sabe
dos homens e mulheres que falam livro, o Ti Manelinho Guerra, “re- a olear nas açoteias, cheiro a óleo, sobre o peixe da região e que mais
dessa existência em comunhão com cordando os seus inícios de vida gorpelhas do bacalhau, comboio- tem feito para que o conheçamos
um mar que lhes dá o alimento mas de pescador na ria Formosa, em correio, partida, novenas na igreja, melhor e para que o consumamos
que lhes pode tirar a vida. frente a Olhão ou na costa”. “Era rezar o terço, pedir uma boa viagem de forma sustentável.
Depois do livro Algarve Mediterrâ- peixe cozido, era peixe guisado. e agradecer à Nossa Senhora do Car- Essa é, aliás, uma preocupação
nico, Maria Manuel Valagão volta a [.] Era o que apanhávamos, ou um mo, esperar regresso, caiação da ca- dos autores que atravessa todo o li-
concentrar-se no mesmo território, chocozito ou algum linguado. Mas sa, afofar colchões.”. vro. No futuro ainda teremos estes
o Algarve, para esta obra na qual não havia tomate nem nada disso. Mas nem só de “pescas lembra- peixes? E ainda teremos este mar?
explora, a partir de vários pontos
de vista, as relações dos homens
Depois com o caldo é que se fazia
o xerém, que é papas de milho,
i das” se faz este livro. As “vozes”
trazem-nos também o saber ligado
Alerta Maria Manuel Valagão sobre o
mar que se “faz presente” nos mer-
com o mar e o peixe. O grande ri- porque não havia mais nada, nem à conservação do peixe, desde as cados: “Pressentimo-lo imenso, ao
gor do seu trabalho de investigação, arroz nem massa, a fome estava em Vidas e Vozes técnicas mais tradicionais de seca longe e ao perto. Imaginamos um
aqui com a cumplicidade de Nídia monte. Íamos para a terra no outro do Mar e do Peixe ao sol ou com sal, até aos métodos mar aberto e luminoso, e este fascí-
Braz, professora da Escola Supe- dia. Dormíamos no mar ou ao pé Maria Manuel Valagão, mais sofisticados da indústria con- nio, esta tanta claridade, este tanto
rior de Saúde da Universidade do do farol, pois não havia os barcos Nídia Braz, Vasco Célio serveira que tanta importância teve sol, são enevoados pelo sentimento
Algarve, junta-se a uma capacida- que há hoje.” Tinta da China; 31,41€ no Algarve. E partilham connosco, de o sabermos ameaçado.”.
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 23

Fugas dos leitores


Os textos, acompanhados preferencialmente por uma foto,
devem ser enviados para fugas@publico.pt. Os relatos devem ter cerca
de 3000 caracteres. A Fugas reserva-se o direito de seleccionar e eventualmente
reduzir os textos, bem como adaptá-los às suas regras estilísticas. Os melhores textos,
publicados nesta página, são premiados com um dos produtos vendidos juntamente
com o PÚBLICO. Mais informações em www.publico.pt/fugas

Nova Deli, uma capital do século XXI


a Já estive na capital indiana inúmeros cinemas de Bollywood com muitas zonas à superfície. #fugadoviajante
inúmeras vezes, quase sempre na com 3D, templos em quase todas Eu aventurei-me a andar de Esta tag diz-lhe alguma coisa? A Fugas (@fugaspublico) está à procura
zona de Paharganj, junto à estação as esquinas. Alguns mais recentes, metro de noite e em plenas horas das melhores fotos de viagem. Siga a conta e partilhe os melhores
de Nova Deli, a área low cost da outros que remontam ao tempo de ponta e esta é, sem dúvida, instantâneos das suas férias com a #fugadoviajante
cidade, muito conhecida pelos do Mahbarata, como é o caso do mais uma experiência típica
backpackers. Esta é uma área templo de Hanuman, um dos indiana, com milhares de pessoas
bem confusa, literalmente um mais antigos deste país, que se confinadas a um espaço fechado.
caos visual, olfactivo e auditivo estima remontar a 3000 a.C. Pisar Se não quiserem vivenciar esta
com vários restaurantes e darbas um templo destes é como entrar experiência, basta evitarem as
(restaurantes de rua), inúmeros numa máquina do tempo. Ouvir horas de ponta.
vendedores ambulantes, poluição, os mantras, tocar nas paredes Deli pode ser visitada com
milhares de pessoas, mulheres onde biliões de mãos já o fizeram algum ritmo em três a quatro
de saris coloridíssimos, homens e pisar com os pés descalços um dias. Há muito de interessante
com turbantes, cheiro forte chão onde já caminhou tanta a ver nesta cidade imponente,
de especiarias, javalis, porcos, gente, tantos mestres e homens histórica, moderna e fascinante.
cabras, camelos, vacas e cães que santos é quase como obter um Até chegarmos à actual
circulam nas ruas juntamente estado samádico com direito a um capital, existiram oito cidades
com carros, motos, bicicletas e bilhete pré-nirvânico. na sua história. Deli assistiu
riquexós (tuk tuks). A última vez que tinha estado ao nascimento e à morte de
Chegar directamente do em Deli foi há 12 anos. Agora, vários impérios, que sempre
Ocidente a esta zona de Deli fico muito feliz por notar uma deixaram marcas arqueológicas
pode ser um enorme contraste. enorme diferença na cidade, e arquitectónicas, possíveis de
Este choque pode ser tão grande desde a organização à limpeza. se visitarem actualmente. Por
que pode surgir logo um certo Esta é uma enorme cidade, onde isso, a cidade é formada por um
arrependimento de termos habitam cerca de 18 milhões de conglomerado de oito cidades que
vindo para a Índia, mas nada habitantes. A minha sugestão para viveram numa roda gigante de
que uma boa noite de sono não a conhecer é recorrer ao metro, ascensão e queda. São elas: Qila
possa transformar. Por vezes, que fica muito mais em conta do Rai Pitora, construída em 1180;
há quem se baseie nas primeiras que os riquexós ou táxis. Pode-se Siri, a segunda cidade, construída
impressões que tem dos lugares, comprar um bilhete para o dia por Muhammad Khilji em 1303;
das pessoas, das situações. Na todo e usá-lo em todas as linhas, Tughuqabad, erguida entre 1321
Índia, tudo nos parece sair ao à excepção da linha laranja, de e 1325; Jahanpanah, construída
contrário. E provavelmente as acesso ao aeroporto. O metro é por Muhammad bin Tughluq @leonelcepa_ph “Num domingo de sol, peguei na minha câmara
primeiras impressões aqui serão limpo e bem organizado, uma vez entre 1325 e 1351, para conectar e combinei com um amigo irmos explorar a nossa cidade, Vila do
negras e assustadoras, mas se que o nome das estações coincide Qila Rai Pitora e Siri; Kotla Firoz Conde. Fomos até uma das margens do rio Ave, onde existe uma
tivermos alguma paciência tudo se muitas vezes com os principais Shah, construída por Firuz Shah azenha – considerada património pela Câmara Municipal de Vila
transformará. lugares turísticos. Tughluq entre 1351 e 1388, muito do Conde. Explorámos esse sítio e estivemos face ao rio. Ficámos
A capital é uma cidade em É bem interessante observar perto de Old Delhi; Purana Qila, admirados com a vista e a perspectiva do Mosteiro de Santa Clara.
pleno desenvolvimento e com as pessoas com os seus trajes a sexta cidade, construída por Uma imagem que tinha de aproveitar.”
uma enorme potencialidade. Há asiáticos e alguns religiosos, sikhs, Sher Shah Suri e Dinpanah, surgiu
enormes avenidas arborizadas, monges, árabes, ou mulheres com Humayun em torno de
ruínas de cidades medievais, com os seus vestidos tradicionais, 1500; Shahjahanabad, a sétima,
palácios, mausoléus e ao mesmo cabeças tapadas com os seus construída pelo imperador mogol
tempo prédios modernos, lenços, mas todos num frenesim Shah Jahan entre 1638 e 1649. A
restaurantes giratórios em prédios típico das estações das cidades cidade incluía o Forte Vermelho
de 25 andares, plasmas enormes modernas. O metro é, a maior de Deli, construída quando a
no meio de algumas ruas, parte das vezes, subterrâneo, mas capital do Império Mogol foi
KAMAL KISHORE/REUTERS
transferida de Agra para Deli.
Nova Deli é a oitava e actual
cidade, que une e inclui todas as
anteriores.
Aqui seguem as sugestões de
visita à capital em quatro dias.
Fica a nota que a maioria destes
lugares estão fechados à segunda-
feira. No fundo, podemos dividir
Deli em três grandes áreas:
Connaught Place e arredores:
prédios do governo, museu
de Gandhi e vários templos e
mausoléus interessantes; Old
Delhi: mercados antigos, Forte
Vermelho, Mesquita Jama Masid;
mais longe do centro, no Sul da
cidade, está o templo de Lotus, o
Qutub Minar e o templo dos Hare
Krishna ISKCON. @magtanny Uma breve paragem na “terra de nuestros hermanos”
Rui Bizarro resultou numa vista que “não tem preço”.
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24 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Hotel da Fábrica

Do som dos teares


ao silêncio
da montanha

Durante décadas, viveu ao ritmo das máquinas.


Agora, é um verdadeiro templo de sossego, com
vistas privilegiadas para a serra da Estrela.
A antiga unidade da Ecolã, em Manteigas,
transformou-se em hotel e é também uma espécie
de museu. Maria José Santana
a Contrariamente ao que aconte- junta-se uma boa dose de conforto, a história não só da Ecolã como tam-
ceu a algumas das suas congéneres, espaços generosos e sossego absolu- bém das outras indústrias têxteis da
a antiga unidade têxtil da Quinta de to. A aposta recaiu numa decoração zona. O hóspede irá deparar-se, por
Santa Clara, em Manteigas, viria a fe- simples, que coloca em evidência exemplo, com uma prensa manual
char portas por uma boa causa: era as grandes estrelas da casa: a lã e o de lã, uma antiga máquina de trico-
preciso crescer e, para isso, urgia burel. Afinal, foram elas a razão de tar, uma revistadeira (mesa na qual
mudar para um espaço mais gene- ser da fábrica criada em 1925 e que, a operadora verifica a existência de
roso. Foi desactivada em 2012 mas o apesar de ter mudado de instalações, defeitos no tecido que sai do tear) ou
seu proprietário, João Clara, teimou continua a laborar (Ecolã). uma mesa de enrolar.
em não a deixar largada ao aban- Os números das habitações (16 As memórias do passado estão,
dono - era ali que estava a história quartos e duas suítes) são apre- igualmente, presentes numa das
da família, protagonizada por três sentados de forma recortada num suítes da unidade hoteleira - cada
gerações, no ramo da produção de quadrado de burel, tecido artesanal uma delas tem uma área de 50 me-
lã. Requalificou-a e transformou-a que está presente, também, nas ca- tros quadrados. Foi baptizada com
num hotel, que também é uma es- beceiras das camas, nos sofás, nas o nome Mattos Cunha, para perpe-
pécie de museu das indústrias de mantas e até nas bandejas de ameni- tuar no tempo o nome e a memória
lanifícios da serra da Estrela. E o seu ties das casas de banho. Também o daquela que foi a primeira fábrica
nome nem podia ser outro: Hotel pequeno-almoço é servido em bases de lanifícios de Manteigas. Além do
da Fábrica. individuais feitas a partir do tecido nome, a habitação exibe também um
Ainda está a receber os seus pri- artesanal, 100% lã de ovelha, desde armário original da antiga unidade, quem quiser ficar a conhecer ainda sala de estar, em mezzaninne, com
meiros hóspedes - a unidade abriu sempre associado à serra da Estrela doado pela família Mattos Cunha ao mais pormenores, há o convite para uma grande janela para a montanha.
portas no passado mês de Dezembro e aos seus pastores. Hotel da Fábrica. fazer uma visita (gratuita) às actu- Começa no piso inferior, na sala de
-, mas há já créditos que ninguém lhe Nas áreas comuns do hotel, a gran- Destaque também para a existên- ais instalações da Ecolã, não muito pequenos-almoços, o que ajuda a
tira: a vista para a montanha (pintada de tónica da decoração é a evocação cia, em cada quarto, de uma foto- longe dali. Já lá vamos. Por ora, os que, no Hotel da Fábrica, o início
de branco, em tempo de frio) e a hos- do passado. Algumas das máquinas grafia alusiva a uma fase do ciclo da holofotes estão direccionados para de cada manhã seja vivido de for-
pitalidade com que recebe aqueles que outrora asseguravam a produção lã, desde o rebanho no prado, pas- o Hotel da Fábrica. ma especial. À beleza da paisagem,
que procuram abrigo dentro das suas que era feita naquela fábrica viraram sando pela preparação da tosquia Uma das principais áreas comuns junta-se, depois, a variedade de pro-
paredes. A estas duas características, peças decorativas, ajudando a contar até chegar ao tecido burel. E para da unidade hoteleira reside numa dutos servidos no buffet: pão fresco,
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 25

FOTOS: DR

i
Hotel da Fábrica
Quinta de Santa Clara
6260-162 Manteigas
Tel.: 275 982 420
E-mail: hoteldafabrica@hotmail.com
Preços: a partir de 85 euros

Paragem Serradalto cluir a visita às actuais instalações cial da marca que já conta com lojas
Rua 1.º de Maio da Ecolã, certificada como unidade próprias em Lisboa e no Porto. É a
6260-101 Manteigas produtiva artesanal. partir da unidade de Manteigas que
Tel.: 275 981 151 No seu interior, irá descobrir co- fazem a fiação, tecelagem e a produ-
mo se produzem as mantas, peças ção final (corte e costura) de cada
Ecolã de vestuário e acessórios da mar- peça de vestuário ou acessório que
Amieiros Verdes ca, num processo que começa lo- segue para vários pontos do país e
6260-028 Manteigas go na fase da tosquia. Acontece em também para além-fronteiras.
Tel.: 275 981 653 Abril ou Maio, e de cada ovelha sa~o Os artigos em burel vão estando
extrai?dos cerca de seis quilos de lã. cada vez mais na moda, mas mui-
“Depois, vai para lavar e perde em tos desconhecerão que este tecido,
média 50% do peso”, conta João Cla- 100% la~ de ovelha, “é usado des-
ra, proprietário da marca. É ele o de a Idade Média pelos pastores”,
rosto da terceira geração da unidade aponta João Clara. O que o torna
industrial criada em 1925 e a aposta, tão especial? Uma seque^ncia de
garante, continua a centrar-se num operac?o~es especi?ficas no pro-
processo produtivo tradicional. E cesso de fabrico. “A la~, apo?s ter
com uma base ecológica e susten- sido tosquiada, lavada, fiada, urdi-
tável. “O tear mais moderno que te- da no o?rga~o e tecida no tear, e?
bolo caseiro, fruta, iogurtes, café, gem linfática, passando pela biodi- Se o tempo não permitir gran- mos aqui é dos anos 60 [do século pisada numa ma?quina designada
chá, sem esquecer essas delícias da nâmica (cabeça), com preços a partir des passeios de carro ou a pé, tem passado]”, realça, apontando para por pisa~o, que bate e escalda a la~
Estrela: queijo da serra, requeijão e de 25 euros e até um máximo de 50 sempre a (boa) opção de aproveitar as máquinas dos anos 1930 ali insta- transformando o tecido em burel,
compotas caseiras. euros. Um conjunto de opções espe- o centro de Manteigas, vila que in- ladas (e ainda em funcionamento). tornando-o mais apertado, resisten-
À espera dos hóspedes está tam- cialmente recomendado a quem faz tegra a rede Aldeias de Montanha, Trabalham ali 22 pessoas, sendo te e impermea?vel”, desvenddam os
bém uma piscina interior aquecida, questão de aproveitar uma viagem e onde pode degustar alguns dos de realçar “o interesse que alguns responsáveis da marca.
sauna e um espaço de massagens. até à serra da Estrela para palmilhar melhores sabores da Estrela e tes- jovens estão a demonstrar por esta
A lista de tratamentos vai desde as os seus trilhos de natureza ou para temunhar o acolhimento das suas indústria”, destaca, por seu turno, A Fugas esteve alojada
massagens de relaxamento à drena- praticar desportos de neve. gentes. O roteiro deve também in- António Costa, da direcção comer- a convite do Hotel da Fábrica
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26 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Porto Antigo

A felicidade
pode saber
a anho assado
no forno

no enquadramento único da
Crítica confluência dos rios que há uns
anos foi criado o Hotel Porto
Antigo. A piscina sobre as águas da
José Augusto Moreira baía, o ancoradouro para barcos
de recreio e o amplo terraço com
Num enquadramento laranjeiras e limoeiros que lhes
está adjacente são chamarizes mais
único e inesquecível,
que suficiente.
apetece pedir um pouco É neste enquadramento que
mais da culinária está o restaurante da unidade
e produtos da região hoteleira, paredes de vidro
e ampla sala em ambiente
a Pode-se recorrer ao barco, que romântico e informal. À sala Serpa
há um ancoradouro próprio, mas Pinto, como foi designada, acresce
o normal é serpentear encosta em tempo quente o convidativo
abaixo até ao nível das águas terraço. A decoração elegante
para se chegar a Porto Antigo, prima pela sobriedade, tudo
no concelho de Cinfães. É aí que em tons claros para absorver e
as águas revoltas do Bestança se potenciar a luminosidade e o
amansam no Douro, formando reflexo das águas que entram pelas
uma ampla e serena baía que vidraças.
se alonga depois em direcção Mesas cobertas com mantel em
à barragem de Carrapatelo. O algodão, serviço de louças e copos
rio Douro é por aqui (como em igualmente elegantes e sóbrios e
muitos outros trechos) um cenário adequados à função. Há um menu
de encantamento. Um enorme diário que procura reflectir a oferta
espelho a reflectir os humores do de mercado e de temporada e uma
universo, as cores da natureza, o carta fixa que às receitas regionais
céu, as nuvens e o brilho do sol. junta propostas mais fora da caixa.
Apetece ficar sem tempo! Massas e mariscos sobretudo,
Porto Antigo é, como o nome aquilo que muitas vezes se associa
indica, um ancestral aglomerado a inspiração mediterrânica. A regra
de casas, um lugar onde o tempo é que aos domingos seja proposto
ensinou as gentes e os animais um almoço buffet.
a conviver com o nível da água. O anho e o cabrito assados
E foi a partir de um centenário no forno são as especialidades
casarão de granito implantado regionais por excelência, mas
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 27

FOTOS: ADRIANO MIRANDA

i
Restaurante Porto Antigo
Hotel Porto Antigo
Rua do Cais, 675
4690-423 Porto Antigo,
Cinfães,
Tel.: 255 56150 / 913 021 734
www.hotelportoantigo.com/
www.facebook.com/
HotelPortoAntigo
Aberto todos os dias
Estacionamento
e ancoradouro próprios

também a lampreia à bordalesa origem, genuínos, e apurados de O anho excessivo, como era, parece mesmo assim com propostas
para a temporada que agora se sabor, incluindo as tripas, mesmo assado (foto à previdente que a presença do sensatas que procuram abarcar a
inicia, os bacalhaus ou a carne que prejudicadas por terem sido esquerda) condimento seja descrita na lista oferta por todas as regiões. Pelo
arouquesa constam da oferta servidas frias. é um dos ou prevenida pelo serviço. lugar, e porque estamos no coração
regular do restaurante. Da carta, sensações pratos A felicidade chegou mesmo da região da casta Avesso, mais
Como propostas do dia, a contraditórias com o “Linguini imperdíveis à mesa com o “Anho assado no duas ou três propostas a juntar à
“sugestão do chefe” limitava-se nero com mexilhões” (12,90€), que saem forno” (12,90€). Assadeira em dupla da carta parecem ajustadas e
por ocasião da visita da Fugas a um numa cativante apresentação e da cozinha barro composta com pedacinhos justificarem-se.
creme de legumes (2,50€); tábua confecção culinária exemplar, mas de Paula de costelas, barriga, lombo e coxa Com um serviço cordial e
regional (4,50€) como entrada; com o complemento dos bivalves a Espanhol do infante caprino com a gordura simpático e num enquadramento
esparguete à bolonhesa (8,90); expor em demasia o longo tempo ainda a regurgitar. Batatinhas único e inesquecível, também
paelha à Porto Antigo (12,90); e de congelação e a resistir de forma louras e impregnadas da gordura pelo anho assado no forno bem
anho assado no forno (12,90). elástica à mastigação. Uma pena, saborosa que se soltava das carnes, se recomenda a viagem até este
Preços para doses individuais e a já que a massa, cozida no ponto e o complemento do arroz de paraíso na margem esquerda do
duplicar por cada outro comensal. correcto, untuosa e com tomate forno seco e impregnado pela Douro. Mas sabe a pouco, quando
A par da “trilogia de sobremesas” seco, estava uma delícia. mesma gordura. A essência do se tem um cenário, condições e
(4,50€), também uma intrusa De muito bom trato culinário lugar absorvida em sabor e aromas envolvente tão inspiradores.
“francesinha à Porto Antigo” também os “Nacos de bacalhau únicos e inesquecíveis, num trato Quanto à cozinha, a chef Paula
(4,50€). com arroz caldoso” (12,50€), com culinário deveras exemplar. Espanhol mostra competência
Convidativa a “tábua regional” os cortes (três) do lombo alto fritos Valente também a “Trilogia de e um claro domínio das artes
(4,50€), com chouriça sanguínea, em polme, secos, crocantes e a sobremesas” (4,50€), com tarte de culinárias, mas é também evidente
rissol de carne, bolinho de deixarem-se decompor em lascas nata, torta de laranja e bavaroise o fosso de qualidade quando
bacalhau, alheira (tudo em húmidas e saborosas. Arroz com de ananás. Todas muito bem na mesa estão os produtos de
porções mínimas), e ainda fatia de molho de tomate compacto e executadas, mas mesmo assim origem local ou os que vêm de
presunto com cubos de melão e sabor intenso, com o acrescento com destaque para elegância e outras paragens. E esta é (ainda)
uma tigelinha de tripas com feijão. de pimento verde e condimento consistência da torta de laranja. mais uma razão a apontar para
Com excepção do bolinho (flácido de cominhos que acabavam por Tal como o menu, também a um assumir pleno da vocação de
e sensaborão), produtos de boa dominar sabor e aromas. Sendo carta de vinhos é contida, mas cozinha regional.
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28 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Vinhos

Vinho, um bom anestésico


para as desgraças do país

MARTIN HENRIK
ao bolso de umas quantas famílias
Elogio do vinho e empresas, muitas com sede e
casa em Lisboa.
É o país que temos. O
mesmo país que paga colossais
imparidades da banca sem
resmungar muito. O caso da Caixa
Geral de Depósitos é de criar
úlceras no estômago, de tanta
revolta, porque muitos dos que
Pedro Garcias não pagaram os empréstimos,
obrigando os restantes
a Todo o governo que se preze (o portugueses a subvencioná-
actual, os anteriores e certamente los, continuam por aí a exibir
os futuros) elege a dinamização empresas e uma vida de luxo. A
do interior como um dos grandes um cidadão que deixe de pagar
desígnios nacionais. Não há um empréstimo de 30 ou 40 mil
campanha eleitoral que esqueça euros é-lhe logo penhorada a casa e
o assunto e não há mandato que todos os bens que tiver; a Berardos,
não comece com promessas Finos e outros que tais, aceitam-se
de grandes investimentos nas descontos exorbitantes nas dívidas.
regiões desfavorecidas. Incautos, O que é que esta crónica tem a
até mesmo os melhores e mais ver com vinho? Nada e tudo. Tudo
credíveis jornalistas acreditam que porque para podermos enfrentar
“agora é que vai ser”. e conviver com tanta miséria
Os anos vão passando e o país precisamos de uma boa dose de
continua a adornar para o litoral, anestesia - e o vinho é um dos
enquanto a “província” se vai não convence ninguém. Não mapa dos pagamentos feitos no melhores anestésicos que existem.
esvaziando e envelhecendo. Tenho somos nós que andamos sempre a ano passado pelo Instituto de E depois porque alguns dos
um primo transmontano que reage pedir mais convergência e coesão Financiamento da Agricultura empresários que nos obrigaram
bem a isto, questionando assim a à União Europeia? Quanto mais e Pescas. São números que a colocar dinheiro na CGD, no
corte: “Estorvamos? Vejam lá, se investirmos no litoral, mais gente dizem respeito a subsídios e ex-BES, no Banif e no BPN são
estivermos a mais pedimos a outro
país que fique connosco!”.
vamos atrair para lá. Ou seja,
esvaziamos ainda mais o interior
apoios ao investimento. Sabem
qual foi o segundo distrito que Alguns dos conhecidos produtores de vinho,
a quem continuamos a prestar
Recentemente, António Costa e o
seu ministro mais descaradamente
e aumentamos os problemas
das grandes cidades, obrigando,
mais dinheiro recebeu? Lisboa,
pois claro. Foram 136 milhões empresários vassalagem e a avaliar os seus
“extraordinários” vinhos.
propagandístico, Pedro Marques, depois, a mais investimentos para de euros. Só Beja recebeu um Como é possível que Joe Berardo
apresentaram na Assembleia da os resolver. Por outro lado, com pouco mais: 151,6 milhões. Em que nos tenha prejudicado tanto o banco
República o Programa Nacional menos gente no interior, torna- terceiro lugar surge Évora, com público e continue a ser dono da
de Investimentos para a próxima
década. No total, são cerca de
se fácil justificar o encerramento
de serviços públicos, e sem
118,5 milhões de euros. Em
contrapartida, com muitos mais
obrigaram Aliança e a desfrutar do Palácio
da Bacalhôa? Por que razão a CGD
20 mil milhões de euros que
o Estado se propõe gastar em
serviços públicos só mesmo os
mais teimosos quererão ficar no
agricultores, Viseu recebeu 57,8
milhões de euros, Vila Real 73
a colocar não toma possa desses activos? E
podia dizer o mesmo de Joaquim
infraestruturas até 2030. Mas já
foram ver no mapa os lugares
interior. É um ciclo vicioso que
nunca mais acabará.
milhões, Guarda 60 milhões,
Castelo Branco 50 milhões e
dinheiro Coimbra, da Dão Sul, que deixou
uma dívida enorme no BPN, ou de
onde vai ser investido todo esse
dinheiro? Tirando um ou outro
Confesso que, genericamente,
até simpatizo com a geringonça.
Bragança 93 milhões de euros.
O grosso do dinheiro recebido
na CGD, Manuel Fino, outro da lista negra
da CGD e que continua a brincar
projecto, a esmagadora maioria
dos investimentos concentra-se ao
Quando o actual Governo
criou a Unidade de Missão
por Lisboa diz respeito ao
chamado Pedido Único, que
no ex-BES, aos vinhos no Alentejo. Não
estará na hora de quem escreve
longo do litoral. Uma década que
deveria ser de convergência vai
para a Valorização do Interior
ainda acreditei que pudesse
engloba vários subsídios de
apoio à exploração e também
no Banif sobre vinhos ter um assomo de
dignidade e começar a olhar para
acentuar ainda mais a divergência
territorial do país. Como é que este
mudar alguma coisa. Mas já se
percebeu que o legado vai ser
ao pagamento de direitos
adquiridos. São apoios que e no BPN são esses produtores com o mesmo
espírito crítico de quem olha
programa não mereceu uma onda
de indignação no país? Como é
igualmente um desastre. Reduzir
as portagens numa ou noutra
beneficiam, sobretudo, as
explorações maiores, com conhecidos para um qualquer criminoso,
denunciando-os ou ignorando-os?
possível que os deputados eleitos
nos círculos do interior - pelo
estrada não passa de um placebo.
Para se perceber melhor a
impacto visível nas zonas de
latifúndio alentejano - daí que produtores Se continuarmos a ir às provas
da Bacalhôa e a escrever sobre os
menos estes - continuem calados?
A teoria de que os investimentos
imparável divergência territorial
do país e a forma como o
os milhões recebidos por Évora
e Beja, dois distritos do interior, de vinho seus vinhos, não estaremos a ser
cúmplices de Joe Berardo? Com o
devem privilegiar os lugares onde dinheiro público é aplicado, devam ser relativizados, uma vez dinheiro dos outros, quem é que
há mais gente e mais negócios já não há nada como olhar para o que o grosso do dinheiro só chega não faz bons vinhos?
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 29

Os vinhos aqui apresentados são, na sua maioria, novidades que chegaram recentemente
ao mercado. A Fugas recebeu amostras dos produtores e provou-as de acordo com os
seus critérios editoriais. As amostras podem ser enviadas para a seguinte morada:
Fugas - Vinhos em Prova, Rua Júlio Dinis, n.º 270, Bloco A, 3.º 4050-318 Porto

55 a 70 71 a 85 86 a 94 95 a 100

96 Quando 92 94
Quinta dos Carvalhais
Único 2015
mostra o seu Mirabilis Grande Reserva
Branco 2017
Ex-aequo 2015
Quinta do Monte d’Oiro,
Sogrape, Avintes
Castas: Touriga Nacional
melhor, Quinta Nova de Nossa Senhora
do Carmo, Covas do Douro
Freixial de Cima
Graduação: 13,5% vol
(88%), Alfrocheiro (6%),
outras castas (6%) o Dão é único Graduação: 14% vol
Região: Douro
Região: Lisboa
Preço: 56€
Graduação: 14,5% vol Preço: 42€
Região: Dão a Na viragem do século XIX para O lançamento de um ex-
Preço: 80€ o século XX, a região do Dão não Nem sempre se sabe por onde aequo é por definição um
existia no mapa dos grandes vinhos começar com este branco. acontecimento. Por ser um vinho
de Portugal. Excepto para os espe- Talvez o melhor seja primeiro de escassa produção. Por ser o
cialistas como Cincinato da Costa, olhar o todo, esquecer as partes topo de gama do Monte d’Oiro
que no seu Portugal Vinícola consi- e constatar que em causa está da família Bento dos Santos. E
derava o Dão como “uma das regiões um vinho de irresistível prazer. por ser sempre um vinho de uma
privilegiadas em todo o país, pelas Pela atractividade do aroma, classe inconfundível. Resultado
condições especiais do seu clima e com fruta generosa, notas de de um lote de Syrah com 25%
dos seus terrenos” que dão origem ervas secas e um preciso toque de Touriga Nacional, este tinto
a vinhos “em tudo semelhantes aos resinoso da madeira a dar impressiona pela precisão,
bons vinhos de Borgonha”. Eram vi- complexidade. Pelas sensações pelo apuramento do seu perfil
nhos, escreveu Cincinato, “capitosos que deixa na boca, onde o seu clássico e pela extraordinária
e aromáticos, de longa vida e segura volume, a sua fruta, acidez vocação gastronómica. O seu
Proposta conservação”, que “se podem pôr a e mineralidade deixam um tanino polido, a especiaria
da semana par das melhores lavras da Cote d’Or, rasto de grande intensidade e no final de prova torna-o já
tão preciosas, tão completas são as frescura. Proveniente de vinhas muito atraente, mas este é um
suas qualidades.” Vale a pena pro- velhas dos planaltos durienses, daqueles vinhos que precisa de
var o Único de Carvalhais e perceber o Mirabilis é uma experiência mais alguns anos para mostrar o
como estas palavras estão actuais. irrecusável. M.C. que é: um belíssimo vinho. M.C.
Quando o Dão mostra o seu me-
lhor, é praticamente inigualável.
Porque se complexidade aromáti-
ca, tanino de qualidade, volume de
boca ou complexidade são atributos
que se encontram em muitas regi- 92 93
ões nacionais, nenhuma como o Dão
consegue exibir elegância em estado
puro. É isso que este Único mani- Cartuxa Branco Paulo Laureano
festa. A originalidade aromática da de Curtimenta 2016 Alfrocheiro 2015
Touriga do Dão destaca-se pela sua Fundação Eugénio de Almeida Paulo Laureano Vinus
harmonia. A polidez do tanino e o Évora Vidigueira
seu volume de boca proporcionam Castas: Arinto, Roupeiro, Castas: Alfrocheiro
uma prova intensa e longa. A fruta Fernão Pires, Trincadeira Graduação: 14,5%
vermelha, as notas florais, as espe- das Pratas e Malvasia Rei Região: Alentejo
ciarias e um ligeiro toque de menta Graduação: 13,5% vol Preço: 18,50€
obrigam-nos a mastigar o vinho pa- Região: Alentejo
ra melhor o saborear. Todas estas Preço: 39€
componentes se conjugam, se equi-
libram e complementam. Sendo sem
dúvida um grande vinho criado por Lote de campo de uma vinha A casta Alfrocheiro tem o
Beatriz Cabral de Almeida, o Único velha com castas como seu solar no Dão, mas é uma
é também um vinho com a alma, o Arinto, Roupeiro, Fernão Pires, variedade que encaixa bem
carácter e a originalidade do Dão. Trincadeira das Pratas e Malvasia no Alentejo, onde tem vinho
Depois de 2005 e 2009, o Único Rei. Depois de esmagadas a ganhar importância. Precisa
regressa com a colheita de 2015 (5746 levemente, as uvas fermentaram de calor e de bastante trabalho
garrafas). Toda a enologia, desde a se- com curtimenta completa (com na vinha para amadurecer
lecção das uvas ao trabalho do lagar películas e graínhas) em inox sem problemas, mas origina
ou à escolha e evolução em madeira durante 29 dias. É um branco com vinhos admiráveis, cheios de
se focaram na produção de um topo notas de frutos secos e um pouco fruta suculenta, garra tânica
de gama. Não foi em vão — o resulta- de mel. Maduro, tem uma textura e frescura ácida. É o caso
do é magnífico. O Único é um tinto untuosa e alguma rugosidade deste Paulo Laureano, um tinto
que não deixa ninguém indiferen- tânica, que lhe dá austeridade, potente e pungente, que deixa
te. Tão bom que dá um enorme pra- graça e até amplitude, marca na boca e na memória.
zer até sem comida. Mais uma mão compensando a acidez baixa. Muito bom. P.G.
cheia de anos na garrafa e este tinto Pede comidas mais gordas
ficará ainda mais aprimorado. M.C. e salgadas. Um belo branco. P.G.
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30 | FUGAS | Sábado, 2 de Fevereiro de 2019

Zénite Bar Galeria


FOTOS: NUNO FERREIRA SANTOS

lucro com isso e cederem o espaço três meses, o Zénite, dizem-nos, já

O bar que Patrícia Guimarães


a Em Arroios, há uma casa que é
gratuitamente. “A parte cultural é to-
talmente oferecida. Os copos, não!”,
refere Ester, entre sorrisos.
conta com vizinhos que se tornaram
amigos e clientes que são frequen-
tadores assíduos. Talvez seja por

é um palco
tanto um bar quanto uma casa de Nascidas na vila de Pataias, cres- proporem eventos tão diversificados
artistas e uma galeria de arte. Eis o ceram entre a Marinha Grande e a quanto o público que atraem. Todos
Zénite Bar Galeria, que quer ser um Nazaré, e a ligação de ambas às artes os meses mudam a exposição da ga-
espaço de partilha, tanto artística, aconteceu muito por culpa do avô, leria e a semana passa-se com algu-

para artistas como de copos e petiscos.


O nome Zénite, curiosamente,
nasceu de uma história duplamen-
te musical: deve tudo tanto a uns
que recordam como um homem cul-
to que gostava de complementar a
arte com um bom copo, isto é, prati-
camente o conceito da nova casa das
mas noites com motes diferentes:
as quartas são dedicadas ao stand-
up comedy - em colaboração com a
escola Bang Produções; às quintas é
bilhetes para um concerto dos U2 irmãs. O avô era “um bon vivant”, re- dia de quizz; as sextas e/ou sábados
como ao local onde se realizou o sume Ana Paula. E são muitos “bon são dias de concertos; aos domin-
dito concerto. Estávamos em 1987 vivants” que as irmãs querem na sua gos, há as Leituras de A a Zénite,
e uma das proprietárias deste re- nova casa. onde qualquer pessoa é incentivada
cém-aberto bar alfacinha, Ana Pau- Não é em vão que o Zénite não tem a partilhar obras, poemas ou textos
la Carmo, queria muito ir ver um só “Bar” como apelido - tem também de sua autoria.
espectáculo da banda irlandesa à Galeria. É que a parte de galeria de Para breve, poderá ser possível
célebre arena de concertos Le Zé- arte está também muito destacada. encontrar outras actividades no ca-
nith - em Paris, onde vivia. O desejo É aqui que entra Mariana Sousa, a lendário Zénite, já que, adiantam as
foi concretizado e esse momento, curadora da galeria, responsável por proprietárias, estão a planear aco-
mais de três décadas depois, está descobrir artistas e organizar as ex- lher espectáculos de cabaret ou dar
no baptismo da casa, que Ana Pau- posições. destaque aos jogos de tabuleiro.
la abriu em conjunto com a irmã, Já nas artes maiores do bar manda Para quem quiser mostrar as suas
i Ester Figueiredo.
O nascimento do Zénite, explicam
a barmaid Petra Araújo, que assina
e cria os cocktails de autor que es-
artes - seja na galeria, a expor tra-
balhos, ou a actuar -, basta entrar
as irmãs, surgiu “da vontade de fa- tão em destaque na carta. Casos do em contacto com o Zénite e fazer a
Zénite Bar Galeria zer algo diferente e com significa- White Zénite (gin, rum, lima, clara proposta. As irmãs, garantem-nos,
Rua Passos Manuel, 116A, Lisboa do”. “Frustradas” com a profissão de ovo; 6€), o Zénite (gin, sumo de estão sempre receptivas a novas pro-
Tel.: 213 540 605 que exerciam, ambas professoras de laranja, xarope de canela; 7€) ou postas e iniciativas. “Queremos que
Facebook: https://www. Português e Francês, sentiram que o Sweet Zénite (tequila Patron XO os artistas se sintam grandes e que o
facebook.com/zenitebargaleria/ “era mais do que altura” de avan- Café, chocolate quente, chantilly ou seu trabalho seja visto e valorizado”,
Instagram: https:// çarem para um projecto diferente. natas; 8€). Para além de cafés, bati- resumem.
www.instagram.com/ Como sempre estiveram ligadas às dos, cerveja e vinho, o bar também Entre os copos, os petiscos e as
zenitebargaleria/ artes, decidiram abrir um espaço on- oferece torradas e tostas (dos 2€ aos artes, uma coisa é certa: os grandes
De terça-feira a domingo de jovens artistas, de qualquer área, 5€) e ainda tábuas de carnes, queijos motes da casa são, acima de tudo, o
das 17h à 1h30 pudessem mostrar o seu trabalho. (6€) ou mistas (7€) para acompanhar. convívio e a troca de ideias. Texto
(encerra à segunda-feira) A filosofia? Não obterem qualquer Com as portas abertas apenas há editado por Luís J. Santos
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Sábado, 2 de Fevereiro de 2019 | FUGAS | 31

O gato das botas

Antes de usar sal e pimenta,


pense se não ficará melhor
a maravilhosa pimenta moída
dos Açores
A pimenta moída é usada em Todas as pimentas moídas pimenta da Dona Pimentinha tem
quase todos os pratos da cozinha são boas. Só se distinguem pela mais sal do que a Corisca.
açoriana - e fica sempre bem. É quantidade de sal e pelo picante. Mas atenção: todas são salgadas
salgada porque usa-se a pimenta Há várias marcas, mas são para não ser preciso pôr sal.
moída para salgar, em vez do sal. todas da mesma qualidade e do Durante muitos anos não usei
Talvez a maneira mais correcta de
compreender a pimenta moída
mesmo preço: é um exemplo de
honestidade, profissionalismo e A pimenta pimenta moída por ser salgada de
mais. Isto porque também estava a

Miguel Esteves Cardoso


seja como um combinado de sal,
pimenta e um piquinho. É um
generosidade.
A marca de que eu mais gostei da terra é um usar sal. Desde que percebi que se
usa pimenta moída em vez de sal
tempero exímio, obrigatório. foi da Corisca. Um frasco de nunca mais quis outra coisa.
a A primeira coisa a dizer sobre Tenho passado os últimos três vidro com 380 gramas custa 2,35 molho admira- Das maneiras mais deliciosas
a pimenta da terra é que se trata meses a provar - e a dar a provar euros na Mercearia dos Açores. de usar pimenta moída é com
de um condimento de primeira
qualidade, como o sal. Como
- marcas diferentes de pimentas
da terra. Comprei-as todas online
Os açorianos não perdem tempo
a fazer garrafinhas pífias como as
velmente queijinhos frescos. No continente
pomos sal e pimenta. Nos
compreenderá qualquer açoriano,
estou a referir-me à terminologia
na excelentíssima Mercearia dos
Açores, que recomendo sem
do Tabasco e quejandos para fazer
render o peixe.
simples: Açores põem pimenta moída.
Experimente e logo verá quem tem
e à gastronomia da ilha de São
Miguel. As outras ilhas dos
reservas.
É lá que compro queijos
O frasco mais pequeno que
vendem tem 200 gramas e custa
só contém razão.
A marca Quintal dos Açores tem
Açores têm tradições igualmente
interessantes - mas diferentes.
maravilhosos de todas as ilhas
açorianas e, como luxo, por 95
1,90 euros. Dá para um mês inteiro
de temperos. O formato não é para
o pimento uma pimenta da terra picante que
é “para o queijo” (2,50 euros). Fica
Nós no continente temos o
hábito de falar de picantes e muitos
cêntimos por litro e meio, a muito
mineralizada Água Gloria Patri
ser giro e poder ser levado à mesa:
é para temperar tudo.
triturado e sal. muito bem mas, lá está, também
serve para temperar outros pratos.
de nós somos fãs de piripíris muito
picantes. Cada restaurante tem
da Serra do Trigo, em São Miguel.
Uma das maravilhas da Mercearia
Outra marca muito boa - a Dona
Pimentinha - vende um balde de
Não precisa Ao fim destas experiências todas
considero que a pimenta moída é
um picante caseiro para poder ter
o prazer monótono de avisar os
dos Açores é poder procurar
iguarias por ilha. Como não me
4,30 quilos por 16,50 euros. Para
além de ser uma pechincha, o de mais nada uma alternativa ao sal e pimenta
que é saborosa, bonita e cheia de
clientes a terem cuidado. canso de dizer, não há ilha que não grafismo é muito bonito e o balde vivacidade.
Como portugueses, levámos a tenha queijos de chorar por mais. embeleza qualquer cozinha. A Que mais se pode pedir?
malagueta de Moçambique para GETTY IMAGES
a Índia e, entre os nórdicos que
gostam de frango assado, somos
celebrados como os pioneiros do
peri-peri chicken.
A pimenta da terra é mais ou
menos picante conforme o número
de sementes que for incluído. Trata-
se de um molho admiravelmente
simples: só contém o pimento
triturado e sal. Não precisa de mais
nada. Não precisa, por exemplo,
do vinagre, óleo ou álcool que
prejudica os picantes mais
conhecidos do mundo.
A pimenta da terra é um
molho que se faz facilmente em
casa, desde que se tenham os
pimentos necessários. No entanto,
as pimentas açorianas que são
comercialmente produzidas são
todas simplicíssimas, não contendo
quaisquer porcarias.
É uma afectação continental falar
de pimenta da terra. Os fabricantes
com simplicidade e bom gosto
vendem-na como pimenta moída,
que é o que é. No continente
seria pimento moído. Mas como
tem o efeito da pimenta - sendo
ligeiramente picante e muito
aumentativa do sabor dos alimentos
- faz sentido chamar-lhe pimenta.
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