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1 - Introdução
1.1 - Resumo!
2 - Elementos gráficos
2.1 - Cronologia!
2.2 - Desenhos!
3 - Desenvolvimento
4 - Conclusão
" O ensaio seguinte é o resultado de um estudo crítico sobre a Capela de São João Batista
da Carrasqueira. O estudo centra-se em temas de arquitetura, analisados sobretudo através do
desenho. Para compreender o melhor possível o edifício em estudo foi necessário entender o
melhor possível o contexto em que se insere (3.1 - Estrutura urbana / Espaço público). O desenho
da capela é erudito, de planta central, e a geometria complexa, algo que não aparenta pelo
exterior. O estudo da planta e das suas proporções seria inevitável nesta obra de arquitetura (3.2
- Planta Centralizada). Como estudantes de arquitetura e não teóricos seria impossível continuar
o estudo das plantas, das suas relações e medidas sem considerar imediatamente o material que
compõe o edifício, não apenas na sua estrutura mas também nos detalhes (3.3 - Estrutura e
Materialidade). O interior da capela de São João Batista estabelece uma relação de opostos com
o seu volume exterior simples e puro. A geometria complexa das abobadas e cúpula está
totalmente revestida de pinturas murais, também abordadas neste ensaio pelo seu papel
arquitectónico no edifício como um todo (3.4 - Pintura Mural).!
" Por fim, após se levantar questões e sucessivas suposições nos quatro capítulos acima
referidos lança-se uma ultima teoria. Esta teoria tem tanto de ousado como de bem
argumentado, e levanta a hipótese de uma grande reconstrução levada a cabo após a destruição
de que a capela terá (possivelmente) sido alvo durante um sismo que abalou fortemente Vila
Viçosa (3.5 - O terramoto de 1755).!
" !
1.2 - Objeto e Tema
entrada seria de grande importância pois nela culmina o caminho vindo de Évora.!
" A sua situação estratégica no terreno anuncia ao longe a existência de um local
importante, merecedor de um objeto simbólico e marcante na paisagem, onde o programa
religioso passa a ser quase secundário ou um pretexto por detrás de uma intenção arquitetónica
de afirmação do lugar.!
" A ermida é construída em planta de cruz grega perceptível tanto no espaço interior como
apresenta os únicos três vãos do edifício: duas janelas e uma porta. Alinhado com a porta, no
adro, está o cruzeiro. O ornamento é praticamente inexistente pelo exterior reduzindo-se às
molduras em mármore dos vãos, cujas três padieiras apresentam uma cornija pouco complexa,
assim como a cornija que remata o volume de entrada, correspondente ao braço sul da planta
em cruz grega. Numa cota inferior à cornija um conjunto de gárgulas semicilíndricas rodeia o
edifício. A cobertura é inclinada e adapta-se de forma tosca, tanto ao perímetro exterior do
edifício como à cúpula central do seu interior. No cimo da cobertura foi colocado um zimbório
que marca o ponto central do edifício, assim como o campanário que contém o sino que está
colocado alinhado com a entrada diretamente por cima da cornija. Cada um dos braços da cruz
iluminado por uma das janelas viradas a sul e o braço este seria simétrico caso não tivesse a
escada de acesso ao púlpito, que pelo seu lugar destoante na simetria do espaço e forma
descuidada não será original. Todo o interior é coberto de frescos em tom laranja com episódios
referentes ao santo padroeiro. Nas paredes interiores opostas aos vãos encontram-se os três
altares, a meio o altar central alinhado com a porta e nas extremidades os altares secundários,
mais pequenos. O espaço central é de planta próxima ao quadrado e encimado por uma cúpula
semiesférica.!
1.3 - Objetivo, Método e Estrutura
" O presente trabalho desenvolve uma análise crítica referente à Capela de São João
Batista em Vila Viçosa. O método para a compreensão dos temas arquitetónicos inerentes ao
edifício é principalmente a interpretação de elementos gráficos produzidos pelo grupo. Por
acreditarmos que uma determinada intenção e linguagem arquitetónica só pode ser plenamente
compreendida tendo em conta o contexto em que se insere, ao longo do tempo, tentámos neste
ensaio cruzar os desenhos com a informação disponível acerca dos temas abordados, num
esforço para não tratar a Capela como um objeto isolado."A estrutura do ensaio revela ambas as
preocupações acima referidas, onde a ordem dos temas analisados vai do geral (Estrutura
Urbana) ao particular (Pintura Mural), culminando numa suposição elaborada pelo grupo referente
" Vila Viçosa, outrora Vale Viçoso e Callipole1 , situa-se no distrito de Évora, Alentejo, e é
atualmente um concelho candidato a Património Mundial da UNESCO. O primeiro foral da vila
data o ano de 1270 e fora concedido por D. Afonso III, quinto monarca de Portugal, documento
que seguiu os moldes do de Monsaraz, Estremoz e Santarém, atribuindo largas regalias a Vila
Viçosa.!
" Tomando a segunda metade do século XIII2 como ponto de partida desta investigação,
começa a doação de terrenos para a implantação de um convento dos Agostinhos que viria a ser
construído junto ao eixo Norte-Sul unindo Vila Viçosa a Borba e a Estremoz. Anos mais tarde, em
1290, por intermédio de D. Dinis, o castelo e a cerca medieval foram construídos no ponto mais
definição das ruas e das travessas existentes sendo que, no cruzamento destes dois eixos,
encontra-se a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, a Matriz, perante a qual (Poente) se
estende uma pequena praça quadrangular. Tendo em conta que a construção deste equipamento
religioso data o fim do século XVI e inícios do XVII, deduzimos que a respectiva praça, ou pelo
menos o seu desenho na planta de Nicolau de Langres, é também deste período. !
" Em Vila Viçosa, a construção do núcleo urbano medieval dentro da alcáçova evidencia um
1No século XVI, André de Resende, escritor e humanista português, a propósito da sua visita à corte dos duques de
Bragança, atribuiu a Vila Viçosa o nome Callipole em seu escrito “Antiguidades da Lusitânia”. Esta designação foi de tal
modo bem aceite pela corte que, ainda hoje, os habitantes de Vila Viçosa se chamam “calipolenses”.
2 TEIXEIRA C., Manuel, “É principalmente ao longo da fronteira terrestre que nos séculos XIII-XIV são fundadas várias
cidades novas com o objectivo de povoar os novos territórios e de os defender. O período fundamental deste processo
(…) decorre da segunda metade do século XIII ao final do primeiro quartel do século XIV”, in Callipole revista de cultura
n.º 12 – 2004, Câmara Municipal de Vila Viçosa, p. 210
cerca). A estrutura urbana intramuros era composta por quatro fiadas de quarteirões
rectangulares (em rigor trapezoidais), perpendiculares ao eixo principal. No total, portanto, eram
oito quarteirões que definiram três ruas longitudinais – uma central e duas laterais. Nas laterais
deste conjunto havia sido deixado um espaço para a construção de praças, porém, a praça –
dispositivo de organização espacial – não parece ter sido, segundo Manuel C. Teixeira, “um
elemento muito estruturante da composição urbana medieval portuguesa, surgindo na maioria
dos casos como espaço periférico à composição” e remata “as praças formais e centrais que
hoje vemos nas estruturas urbanas de origem medieval parecem-nos ter sido de desenvolvimento
posterior.”.4 !
" Parece-nos agora evidente que a regularidade do traçado é uma forte característica das
cidades medievais e este conceito traduz uma vontade expressa de racionalização, planeamento
do território5 e de construção de modelos que permitiram infraestruturar e povoar amplos
" Para além das intervenções intramuros, Vila Viçosa também se desenvolveu extramuros
sobre de um arrabalde contíguo na encosta Poente. Contexto e topografia revelaram-se, assim,
da vila uma ramificação de percursos “que organiza a direcção dos lugares centrais”.6 O primeiro
eixo determinou a orientação dos arruamentos estruturantes do arrabalde e o segundo organizou
melhor o espaço público constituindo referência para o ordenamento da expansão urbana da
longitudinais. Em nossa opinião, aquilo que determinou a forma desta malha urbana do arrabalde
foi a rua/estrada de Évora devido à sua posição geográfica e a facilidade de acessos que esta
proporcionava; pois, em torno da qual, se dispõem simetricamente os equipamentos de um e
5TEIXEIRA C., Manuel, “Esta noção de planeamento está associada à ideia de poder: o poder de planear e o poder de
dispor dos recursos necessários para impor a concretização do modelo planeado.”, op. cit., p. 211
6 OLIVEIRA, M. Marta, in Callipole revista de cultura n.º 12 – 2004, Câmara Municipal de Vila Viçosa, p. 226
outro lado. A disposição da malha evidencia rigor, geometria e (sobretudo) simetria, conceitos
e urbanístico português através de um plano de expansão que procurou modernizar a vila e fazer
face às exigências funcionais e administrativas decorrentes da época. Com a chegada de
numerosas famílias da nobreza a partir do segundo quartel do século XV, atraídas pela Casa de
Bragança, Vila Viçosa viu-se obrigada a repensar de forma ordenada o crescimento provocado
pelo movimento.!
" Ora, em Portugal, as transformações urbanas deste período traduzir-se-ão na reforma de
nova construção veio consolidar aquela área do tecido e urbano e enfatizar o eixo Norte-Sul.
Mais de um século depois, em 1630, a Casa de Bragança propõe aos Agostinhos que o edifício
monástico se vire para o paço oferecendo maior importância ao terreiro. A relação que daqui
resulta terá “facilitado a alteração da rua de Lisboa – eixo central do Arrabalde Medieval – que
continuaria a direito e passaria pela frente (agora as traseiras) do Convento dos Agostinhos”7 .
fronteira poente”.8 Estes percursos, que obedecem às cotas do terreno, convergem no largo
paroquial de São Bartolomeu, junto do Hospital do Espírito Santo e da sede da Misericórdia. "
diferença de lugares no tecido urbano. A norte encontrava-se a corte ducal, num lugar
ligeiramente mais alto, e a sul os bairros para os habitantes com menos posses financeiras. E
como é que isto se traduz na arquitectura? Através da diferença de medidas de ruas e de
que expôs a praça de Vila Viçosa na fronteira militar com Espanha, determinou-se no imediato a
ampliação do seu perímetro defensivo que passou a englobar “toda a povoação da cintura
mediévica”.10 O responsável do novo plano foi o general conde de Schomberg que lhe ampliou o
semelhantes constituíram uma posição de afirmação (solidária) por parte da Casa de Bragança.
Esta acção proporcionou uma significativa melhoria nas condições de higiene e salubridade dos
meios urbanos e valorizou a imagem do Ducado. Ao fundo da rua da Corredoura, junto ao largo
da Saboaria, já existia no tempo de D. João I (1569), uma fonte “monumental que dá nome ao
largo da Fonte Pequena, na transição para o adro do convento Agostinho.” Essa fonte, diz-se,
tratava-se de uma construção com “um pórtico de mais de cinco metros, com frontão-obelisco
piramidal”, com duas entradas laterais de mármore. Em anexo “havia um lavadouro e um chafariz
concelhio que corria ao longo da linha de casas, de planta rectangular, de mármore, com cerca
de um metro de altura, e no qual podiam beber mais de 200 (duzentos) animais sem
impedimento, centrado por um cavalo esculpido em mármore, jorrando água pelas narinas,
9OLIVEIRA, M. Marta, “A toponímia antiga confirma as diferenças dos lugares da vila: a Norte, as ruas dos Fidalgos,
das Cortes, a Sul, as ruas do Poço, das Vaqueiras, de Trás ou de Três, a rua de Fora.”, op. cit., p. 235
significativo que este equipamento teve na vila, dada a sua presença e escala monumental, e o
modo como surgiria no enfiamento visual das ruas que desembocavam no largo.12 Ainda durante
o período Quinhentista, na praça Martim Afonso de Sousa, ao fundo das ruas que desciam a
porta de Estremoz para o adro de Santo Agostinho, foi erguida em 1588-1589 uma fonte de
mergulho, “com um pórtico de três tramos arquitravados de colunas dóricas, a que se associava
um lavadouro anexo, obra de Manuel Ribeiro, mestre das obras do duque e mestre do
Concelho”.13 O lavadouro, inspirado num modelo italiano existente em Roma, tinha capacidade
para “mais de cem mulheres oferecia postos individualizados de lavagem, com pedras
intervaladas e canais próprios de adução das águas.14 A fonte sofreu várias alterações ao longo
do tempo e mudou três vezes de sítio (1693, 1856, 1940), tendo o lavadouro de modelo romana
desaparecido na reforma seiscentista. Em 1772, por baixo da Casa de Lisboa, havia sido
construído um outro chafariz destinado para uso público e para “as manadas de cavalos da
Coudelaria de Alter que vinham pastar nas coutadas da casa de Bragança”.15 (o chafariz
desapareceu nas obras de arranjo do terreiro, em 1939-1940). Uma das fontes que está mais
directamente ligada com tema da investigação, era a fonte do Carrascal, com chafariz e
lavadouro, junto da Ermida de São João Baptista da Carrasqueira, obra de D. João II que
“aproveitava um extenso sistema de canos que traziam água dos domínios do paço por
aqueduto, com arcas de água e dois lugares de fresca”.16 Já o Rossio, era servido por duas
fontes: uma junto ao Convento da Esperança e a outra ao lado de São Paulo junto de uma ponte
na embocadura da rua de Frei Manuel.17 !
11ESPANCA, Túlio, in Inventário Artístico de Portugal, volume IX Distrito de Évora, Academia de Belas Artes, 1978, p.
710-711
13 TEIXEIRA, José, in O Paço Ducal de Vila Viçosa: sua arquitectura e suas colecções, Fundação da Casa de Bragança,
Lisboa, 1983, p. 84
importante discutir o seu enquadramento histórico, influências e relação entre a doutrina católica
e tipologias.!
As construções em planta centralizada, são uma presença constante, embora discreta, na
arquitetura ocidental (na maior parte das vezes são aplicados a edifícios religiosos). O tema de
planta central era entendido pelos católicos como obras excecionais, opondo-se a planta
basilical através de um complexo de razões de carácter simbólico e de função (“…Ceballos
atribuído a estas formas tais como, poder de união e eternização, por exemplo. Surgiram
diversos exemplos a partir do século XVI, em Portugal e por toda a europa, influenciadas do
Renascimento italiano, que recuperou da antiguidade essas formas. No entanto, este núcleo
públicos e urbanismo. Este período também é marcado pela arquitetura de estilo maneirista
impulsionado pelas encomendas (…” passado o breve episódio renascentista, a nossa
arquitetura percorreu uma fase de maneirismo experimental, ensaiado ao longo do segundo terço
do século XVI, num processo de reação contra o ideal classicista do Renascimento…”)19. Tal
movimento foi profundamente criticado, por adotar modelos clássicos e torná-los subjetivos,
18PAULO VARELA GOMES, Arquitetura, Religião e Política no Século XVII – A Planta Centralizada, FAUP, Publicações,
Porto, 2001, página 18.
19 JOAQUIM VERÍSSIMO SERRÃO, História de Portugal, vol. IV, Editorial Verbo, Lisboa, 1980, páginas 431-432
(teve uma passagem gradual do Renascimento para o Maneirismo) são o resultado de sucessivas
três diferentes grupos: o aparecimento igrejas baseadas no quadrado com cruz grega inscrita
(segunda metade século XVI e início do século XVII); as plantas poligonais, ligadas às ordens
religiosas; e por fim o aparecimento de igrejas hexagonais e octogonais, no século XVII.!
Os motivos que levaram a construção de igrejas baseadas no quadrado com cruz grega
prendem-se com a relação entre a tipologia e o culto ao Santíssimo Sacramento muito praticado
na época: …” O culto do Santíssimo implicou que se repensasse o espaço interno das igrejas de
modo a orientar os celebrantes para o altar e garantir a clara visibilidade deste…”20. Além disso,
um dos maiores prelados da igreja do século XVI, S. Carlos Borromeu, preferiu as plantas em
cruz grega e em cruz oblonga, pois eram próprias da igreja primitiva 21. Os templos apostólicos e
(forma circular, poligonal, cruz grega e cruz latina), admitindo as preexistências condicionarem a
liberdade criativa do arquiteto. Já Alberti preferia a igreja circular, pois o círculo era a forma
forte sentido de centralidade cuja espacialidade reforça a imediata presença da cúpula, visível
internamente logo à entrada da edificação: (…)” Por edifício de planta centralizada entendo
aquele que foi gerado a partir de uma planta em figura geométrica caracterizada pela
lado da Epístola, Adão e Eva no Paraíso e, do lado oposto, uma Fons Vitae. Um outro
20PAULO VARELA GOMES, Arquitetura, Religião e Política no Século XVII – A Planta Centralizada, FAUP, Publicações,
Porto, 2001, página 151.
21PAULO VARELA GOMES, Arquitetura, Religião e Política no Século XVII – A Planta Centralizada, FAUP, Publicações,
Porto, 2001, página 29.
22PAULO VARELA GOMES, Arquitetura, Religião e Política no Século XVII – A Planta Centralizada, FAUP, Publicações,
Porto, 2001, página 15.
monumento com planta central da região sul do Alentejo é a fonte de Vila de Elvas, de 1622.
Além da ermida de Vila Viçosa, este é (…) “uma obra característica da arquitetura das ermidas
rurais dos Bragança” (…)23 ." !
A estrutura da Ermida, em Cruz Grega, de presença exterior austera e simples, porém,
valorizada através proporções bem trabalhadas para sua volumetria de pequenas dimensões.
Embora não apresente de maneira clara em seu exterior, a edificação contém uma cúpula
semiesférica e quatro abóbadas, conformando a força do seu espaço interior. Estes elementos
são sobrepostos por uma cobertura de telha que oculta a espacialidade interna do edifício.!
Devido ao contraste entre interior e exterior, ao entrar na Ermida provoca grande surpresa e
experimentação de sua espacialidade. A presença da cúpula é forte e imediata, visível desde a
entrada da capela, devido à sua planta de “braços curtos”. Além disto, todo o teto é composto
de formas semicirculares. Esta estrutura apresenta em consonância com as pinturas interiores,
apresentando uma gramática decorativa em tons vibrantes, que faz uma série de referências
Montélios, entre outros, onde podemos identificar relações proporcionais idênticas. A geometria
geral do desenho desenvolve-se inscrevendo círculos múltiplos de um palmo em todas a igrejas.
As plantas são assim, definidas por uma geometria de círculos proporcionais entre si, nos dois
eixos direcionais. Além disso, todas as plantas são inscritas num rectângulo próximo ao
quadrado que define os seus limites. O círculo é recorrentemente usado, como medidor de
escala, pois pode ser inscrito em qualquer polígono regular (é o caso das plantas centralizadas).!
" No caso da Ermida de S. João Baptista, o desenho da planta é desenvolvido por uma
série de círculos com 264 centímetros de diâmetro (doze palmos), que configuram os dois eixos
axiais e toda a dimensão da planta. Esta estabelece uma relação proporcional forte e típica na
arquitetura renascentista. Além do desenho da planta, toda a estrutura da igreja tende a seguir
esta medida proporcional.!
" Podemos concluir que todo o processo histórico da época teve grande influência na
23PAULO VARELA GOMES, Arquitetura, Religião e Política no Século XVII – A Planta Centralizada, FAUP, Publicações,
Porto, 2001, página 202.
arquitetónica. A forma e dimensão das plantas centralizadas surgem relacionadas geometrica e
!
3.3 - Estrutura e Materialidade
" A taipa ou o adobe, apesar apesar de uso comum em construções no Alentejo, parecem
soluções pouco prováveis para a elaboração das paredes da ermida devido à relativa pouca
espessura que apresentam (entre 0.8 e 1 metros) comparada ao enorme esforço horizontal a que
estão sujeitas devido aos impulsos provocados pela cúpula e abóbadas. No entanto também é
verdade que o perímetro do edifício em forma de cruz oferece grande rigidez à construção,
funcionando as faces menores como contrafortes e possibilitando o uso da taipa. Estes
“contrafortes” são ainda de tamanho inferior aos gigantes utilizados em comuns edifícios
agrícolas ou habitacionais no Alentejo, que têm de suportar esforços inferiores, de simples
telhados com estrutura de madeira. Logo, a utilização de taipa neste edifícios provavelmente só
materiais. Tal solução suportaria mais facilmente o peso do tijolo das abobadas e cúpula com
menor volume de parede. !
" Destas paredes resistentes são lançadas as quatro abóbadas de canhão certamente em
tijolo, que conformam os espaços correspondentes aos braços da cruz grega em planta. Sobre
as abóbadas ergue-se a cúpula central também em tijolo. A transição em planta do espaço
central quadrado para o círculo de arranque da cúpula é feito com recurso a pendentivos ou
trompas, à cota do ponto mais alto dos arcos de volta inteira resultantes da abóbada de canhão. !
" As paredes exteriores são rebocadas e caiadas enquanto que as interiores, incluindo os
degraus de acesso ao altar e nas oito gárgulas que rodeiam o edifício. Dos seis tipos de mármore
rosa existentes em Vila Viçosa24 foi provavelmente utilizado o mármore Rosa Venado de Lagoa,
pois os seus laivos branco-cremes, o grão fino a médio e as vergadas cinzento-esverdeadas e
24 Ver anexo
" A cobertura apresenta duas soluções distintas não contemporâneas. Grande parte da
cobertura é resolvida com telha de meia cana montada provavelmente numa estrutura de
madeira que se adapta de forma imperfeita à geometria do extradorso da cúpula central. A sul,
uma pequena parte apresenta um terraço em ladrilho e parte do que seria uma semiesfera
A escolha dos materiais e a forma em que estes são utilizados está associada aos temas de
arquitetura que o edifício explora e a sua justificação não se limita à disponibilidade dos mesmos
na região.!
!
3.4 - Pintura Mural
composições pictóricas iniciado com o Paço Ducal prolonga-se pelos séculos XVI e XVII. !
Muitos artistas atraídos pelas campanhas artísticas promovidas pela corte dos Bragança
produzem um importante núcleo de composições, com destaque à pintura mural. Alguns dos
artistas que trabalharam em Vila Viçosa foram Francisco de Campos (1515 -1580) ao serviço do
duque D. Teodósio I, Giraldo Fernandes de Prado (1530-1592), cavaleiro pintor privativo do duque
D. Teodósio II e Tomás Luís (1565 – 1612). !
Convento da Esperança e das Chagas, assim como nas Salas da Música, no Paço Ducal. As
molduras que cercam os painéis da Ermida são também elementos comuns aos edifícios da
região. Além disso, destaca-se a presença dos retábulos fingidos, tão populares em todas as
regiões do Alentejo. Essa tipologia dos retábulos se relaciona com o espírito da Igreja Pós-Trento,
com a consagração de amplo significado catequético às representações artísticas.!
" A Ermida de São João Baptista, portanto, apresenta um modelo misto de composição
cúpula, encontra-se a representação do Cordeiro de Deus com as inscrições “Ecce Agnus Dei,
" !
" O presente capítulo elabora uma suposição que nasceu somente da análise de material
gráfico referente ao caso de estudo, não tendo sido encontrado qualquer comprovativo ou
mesmo suposição escrita sobre o tema. Esta tese defende que a ermida foi alterada de forma
significativa após os muito prováveis estragos provocados pelo sismo de 1755, com epicentro no
Oceano Atlântico perto de Lisboa.!
" Sabe-se com certeza que o sismo abalou gravemente Vila Viçosa, tendo provocado sérios
danos em edifícios e na população:!
" “Os efeitos do terramoto ocorrido no dia 1 de Novembro de 1755 também foram notáveis
em Vila Viçosa. Com o passar do tempo, as memórias das ruínas e das mortes de 29 mulheres e
2 crianças neste terramoto têm-se esquecido, à excepção do desabamento da nave central da
Igreja Matriz, um princípio de destruição na igreja dos Capuchos, e algumas casas onde
funcionava a Câmara que ficaram inabitáveis. Também sofreram bastante ruína os Conventos de
S. Paulo, da Esperança, de Santa Cruz, das Chagas e dos Agostinhos. !
Como era dia de Todos-os-Santos e era sábado dirigia-se um grande número de pessoas à Igreja
Matriz para ir à missa de Nossa Senhora da Conceição. Entre as nove e as dez horas, quando se
cantava a missa, a terra começa a tremer com um ruído assustador e as abóbadas oscilam,
tendo a abóbada da nave central aberto uma fenda e deixado penetrar os raios de sol. Os
músicos e os coristas gritam para que o povo fuja, mas um novo tremor de terra faz destruir a
abóbada no centro, caindo aos bocados em cima das pessoas que ali se costumavam sentar.”25 !
" Perante um sismo de tal poder destrutivo será bastante improvável que a ermida tivesse
escapado completamente ilesa. Do seu lado sul, por cima do volume da entrada, parte da
cobertura é plana e contém um revestimento de soletos cerâmicos vidrados que protegem
25ESPANCA, Pe. Joaquim José da Rocha Espanca (1983). Memórias de Vila Viçosa. Vila Viçosa:
Cadernos Culturais da Câmara Municipal de Vila Viçosa, vol. 11.
" Não é descabido supor que o sismo fez desabar a parte norte da cobertura original da
capela, tendo esta sido reconstruída mais tarde de forma descuidada e sem preocupação de
preservar nem as formas nem as ideias arquitetónicas inerentes à sua conceção original, da qual
resta apenas uma pequena parte ainda existe. Esta nova cobertura foi colocada de forma acrítica
vidrados. A Capela de São Pedro de Beja pode ser útil apenas para encontrar um paralelo na
arquitetura portuguesa onde uma cúpula assenta diretamente numa cobertura plana. A utilização
de soletos vidrados provoca na paisagem o efeito semelhante a um farol, pois com a reflexão
proveniente da incidência solar, este objeto que pela sua situação no terreno é de grande
visibilidade torna-se ainda mais evidente. Este efeito é conseguido de formas diferentes em obras
semelhantes como é o caso da Capela de São Gonçalinho, em Aveiro, onde o material refletor
que reveste a cúpula é o azulejo. Na Capela do Socorro, de Vila do Conde, o material refletor é o
pó de mármore, na Capela de Santa Luzia, em Alvito, é a forma quase insólita e agulhada da
ao existente na capela do Solar dos Peixinhos, em Vila Viçosa, dessa época. Caso existisse
algum elemento no topo da cobertura semi-esférica não se sabe como seria, no entanto pode-se
supor que fosse um remate mais simples que não perturbasse a leitura e geometria dos volumes
puros. De forma a tornar a experiência do espaço interior mais rica talvez até no lugar do
zimbório existisse um lanternim encarregue de iluminar o espaço interior, evidenciando a sua
geometria. O lanternim da Capela das Onze Mil Virgens, em Alcácer do Sal, de construção
contemporânea à ermida de São João Batista, pode servir como exemplo do que poderia ter sido
tal lanternim, onde a utilização do mármore seria óbvia.!
" O desenho pombalino do zimbório corresponde obviamente à altura da reconstrução da
capela após o terramoto. Os frescos da cúpula central terão sido refeitos também nessa data. A
estrutura do sino será também desta época, embora nada o comprove senão a sua escala algo
desajustada ao tamanho do edifício. O púlpito e os altares interiores poderão também ser
da restante capela. Também o púlpito, apesar da sua estrutura de alvenaria, imita através da
pintura uma coluna e cornija. Estes objetos construídos com materiais banais imitam algo que
não são verdadeiramente, através de elementos superficiais, e seria impossível que esta atitude
" O presente trabalho permitiu acima de tudo levantar questões e suposições que
pensamos ser pertinentes para a compreensão do objeto em estudo. A análise dos desenhos e o
constante cruzamento com informação produzida por outros possibilitou a chegada a
considerações que não podem ser dadas como verdadeiras mas cujos argumentos as tornam
possíveis e até prováveis. !
4.2 - Referências bibliográficas
CHICÓ, Mário; REIS, Humberto; "A Arquitectura Religiosa do Alto Alentejo na segunda metade do século XVI e nos
séculos XVII e XVIII"; Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1983.!
ESPANCA, Pe. Joaquim José da Rocha Espanca; “Memórias de Vila Viçosa”; Cadernos Culturais da Câmara Municipal
de Vila Viçosa, volume XI, 1983.!
ESPANCA, Túlio; “Inventário Artístico de Portugal”, volume IX Distrito de Évora; Academia de Belas Artes, 1978.!
GOMES, Paulo Varela; "Arquitectura, Religião e Política em Portugal no Século XVII - A Planta Centralizada"; FAUP
publicações, 2001.!
KLUBER, G. (1988); “A Arquitetura Portuguesa Chã. Entre as Especiarias e os Diamantes (1521-1706) ”. Tradução de
Jorge Henrique Pais da Silva. Prefácio à edição portuguesa de José Eduardo Horta Correia. 2ª edição, Nova Vega e
Herdeiros do Autor, 2005. Lisboa!
MONTEIRO, Patrícia Alexandra Rodrigues Monteiro; “A Pintura Mural na Região do Mármore (1640-1750): Estremoz,
Borba, Vila Viçosa e Alandroal”. Lisboa. Universidade de Lisboa, 2007. Tese de Mestrado em Arte, Património e
Restauro.!
MOREIRA, Rafael de Farias Domingues; “A arquitectura do renascimento no Sul de Portugal: a encomenda régia entre
o moderno e o romano”; Lisboa: Univ. Nova de Lisboa. Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, 1991.!
OLIVEIRA, M. Maria; “Vila Viçosa: temas de ordenamento da forma urbana” in Callipole revista de cultura da Câmara
Municipal de Vila Viçosa, 2004. !
OLIVEIRA, J.T., OLIVEIRA, V. & PIÇARRA, J.M.– Traços gerais da evolução tectonoestratigráfica da Zona de Ossa
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SANTOS, Jorge Miguel Marques; “Estudo Construtivo e Estrutural de Abóbodas Alentejanas”. Lisboa. Técnico Lisboa.
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TEIXEIRA, C. Manuel; “Vila Viçosa, Cidade Erudita” in Callipole revista de cultura da Câmara Municipal de Vila Viçosa,
2004. !
TEIXEIRA, José; “O Paço Ducal de Vila Viçosa: sua arquitectura e suas colecções” Fundação da Casa de Bragança,
Lisboa, 1983.