Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Entrevista com Idosos: percepções de qualidade de vida na velhice
1 2 1
Lara
Carvalho
Vilela
de
Lima ,
Wilza
Vieira
Vilella ,
Cléria
Maria
Lobo
Bittar
1
Programa
de
Pós
Graduação
Mestrado
e
Doutorado
em
Promoção
da
Saúde
da
Universidade
de
Franca
2
Departamento
de
Medicina
Preventiva
da
Universidade
Federal
de
São
Paulo
Resumo.
Pesquisa
realizada
com
32
idosos
de
ambos
os
sexos,
residentes
em
cinco
municípios
brasileiros
de
pequeno
porte,
que
buscou
conhecer
suas
percepções
sobre
qualidade
de
vida.
Para
tanto
utilizou-‐se
a
entrevista,
cujo
roteiro
de
perguntas
abertas
foi
embasado
nos
domínios
dos
questionários
WHOQOL-‐OLD
e
WHOQOL-‐BREF.
Estas
foram
posteriormente
transcritas
e
tratadas
à
luz
da
análise
do
conteúdo.
Não
se
pretendeu
criar
novo
instrumento
ou
adaptar
o
existente,
entretanto
a
realização
de
entrevistas
abertas
orientadas
pelas
perguntas
extraídas
dos
domínios
do
instrumento,
revelou-‐se
bastante
produtiva
quanto
à
coleta
de
informações,
quando
comparado
a
trabalhos
anteriormente
realizados
exclusivamente
com
os
instrumentos,
que
demonstraram
que
idosos
de
baixa
escolaridade
tinham
dificuldades
na
compreensão
dos
termos
e
vocábulos
propostos
pelos
instrumentos.
Palavras-‐chave:
Entrevistas
com
idosos.
Qualidade
de
vida
na
velhice.
Whoqol-‐Old
e
Bref.
Interview
With
The
Elderly:
perceptions
of
quality
of
life
in
old
age
Abstract.
Survey
of
32
elderly
of
both
sexes,
living
in
five
Brazilian
cities,
which
sought
to
meet
his
perceptions
about
quality
of
life.
To
do
this
the
interview
was
applied,
whose
screenplay
of
open-‐ended
questions
was
based
in
the
areas
of
WHOQOL-‐OLD
and
WHOQOL-‐BREF
questionnaires.
These
were
later
transcribed
and
treated
in
light
of
the
analysis
of
the
content.
It
was
not
intended
to
create
a
new
instrument
or
adapt
the
existing,
however
open
interviews
guided
by
questions
from
the
fields
of
instrument,
proved
to
be
very
productive
with
respect
to
gathering
information,
when
compared
to
works
previously
carried
out
exclusively
with
the
instruments,
which
have
shown
that
seniors
with
low
schooling
had
difficulties
in
understanding
of
terms
and
words
proposed
by
the
instruments.
Keywords:
Interviews
with
elderly
people.
Quality
of
life
in
old
age.
Whoqol-‐Old
e
Bref.
1 Introdução
As
quedas
das
taxas
de
mortalidade
e
fecundidade
ocorridas
no
Brasil
foram
responsáveis
pela
mudança
da
estrutura
etária
do
país
e
consequentemente
pela
transição
demográfica,
com
expressivo
aumento
do
número
de
idosos
e
da
expectativa
de
vida.
As
projeções
indicam
que
em
2020
a
população
brasileira
acima
de
60
anos
atingirá
um
percentual
de
13,7%
(28,3
milhões)
e
em
2040
representarão
quase
um
quarto
do
total
de
habitantes
do
país
23,8%
(52
milhões
de
pessoas)
(Mendes,
Sá,
Miranda,
Lyra
&Tavares,
2012).
O
aumento
do
número
de
anos
de
vida
não
significa
que
as
pessoas
vivam
melhor.
São
necessárias
ações
específicas
que
garantam
aos
cidadãos
a
chance
de
viver
esta
etapa
de
forma
digna
e
com
qualidade
(Brasil,
2006).
A
qualidade
de
vida
(QV)
envolve
uma
variedade
de
fatores.
Segundo
Neri
(2008,
p.
163)
“QV
é
um
evento
que
tem
múltiplas
dimensões,
é
multideterminado,
diz
respeito
à
adaptação
de
indivíduos
e
grupos
humanos,
em
diferentes
épocas
e
sociedades,
e
assim,
sua
avaliação
tem
como
referência
diversos
critérios”.
O
Grupo
WHOQOL
da
Organização
Mundial
da
Saúde
(OMS)
define
QV
como
“a
percepção
do
indivíduo
de
sua
posição
na
vida,
no
contexto
de
sua
cultura
e
no
sistema
de
valores
em
que
vive
e
em
relação
a
suas
expectativas,
seus
padrões
e
suas
preocupações”.
Esta
considera
o
conceito
de
QV
57
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Saúde//Investigación
Cualitativa
en
Salud//Volume
2
amplo,
e
incorpora
a
saúde
física,
o
estado
psicológico,
o
nível
de
independência,
as
relações
sociais,
as
crenças
pessoais
e
a
relação
com
aspectos
significativos
do
meio
ambiente
(The
WHOQOL
Group,
1995
apud
Fleck,
2008,
p.25).
Para
Paschoal
(2006),
a
natureza
abstrata
do
termo
explica
porque
o
significado
de
uma
boa
QV
é
diferente
para
diferentes
pessoas,
em
distintos
lugares
e
ocasiões.
Talvez,
cada
indivíduo
tenha
um
conceito
próprio,
submetido
a
múltiplos
pontos
de
vista,
dada
a
variedade
de
dimensões
a
serem
aferidas.
Segundo
o
autor,
quando
se
pensa
em
QV
para
idosos,
algumas
incertezas
pairam.
Por
exemplo,
o
que
pensam
os
idosos
sobre
QV?
Como
eles
definem
QV?
Quais
modificações
poderiam
ser
implementadas
para
alcançar
uma
QV
excelente,
no
ponto
de
vista
dos
idosos?
A
complexidade
da
relação
entre
envelhecimento
e
QV
foi
observada
durante
pesquisa
em
que
foi
comparada
a
percepção
de
QV
entre
dois
grupos
de
idosos
em
um
pequeno
município
brasileiro,
a
partir
da
aplicação
dos
questionários
WHOQOL-‐OLD
e
WHOQOL-‐BREF
e
da
realização
de
entrevistas
abertas
(Lima,
2010).
Nesta
oportunidade
foi
constatado,
que
aqueles
idosos
que
frequentavam
as
atividades
realizadas
no
grupo
da
terceira
idade
tiveram
melhor
percepção
de
QV
global
e
em
outros
domínios
em
relação
aos
que
não
frequentavam
essas
atividades.
Entretanto,
foi
observado,
durante
a
aplicação
dos
questionários
que
muitas
perguntas
existentes
nos
mesmos
não
eram
claramente
compreendidas
pela
maior
parte
dos
participantes.
Vale
ressaltar
que
durante
a
aplicação
dos
questionários
os
termos
empregados
nas
perguntas
que
não
foram
compreendidos
pelos
participantes
não
foram
substituídos
por
outros.
Percebeu-‐se
neste
caso,
o
quanto
QV
é
um
tema
complexo
de
se
avaliar,
principalmente
utilizando
apenas
métodos
quantitativos,
pois
cada
pessoa
tem
uma
concepção
sobre
a
sua
QV,
que
pode
variar,
considerando
a
idade,
a
origem,
a
cultura,
os
valores
e
os
sentimentos
vividos
em
determinados
momentos
de
suas
vidas,
extrapolando
muitas
vezes
as
respostas
que
os
questionários
oferecem.
Coelho
(2012)
considera
importante
a
realização
da
pesquisa
qualitativa
sobre
percepção
de
QV
dos
idosos,
para
que
a
subjetividade
desse
construto
possa
ser
melhor
explorada
e
analisada.
Além
disso,
a
baixa
escolaridade
e
principalmente
o
contexto
e
a
cultura
na
qual
as
pessoas
estão
inseridas
podem
interferir
no
entendimento
dos
idosos
em
relação
às
perguntas
existentes
em
questionários,
limitar
a
compreensão
sobre
determinados
assuntos
ou
até
mesmo
interferir
nas
respostas,
que
neste
caso,
podem
não
fazer
sentido
aos
idosos.
Braz
(2012)
observou
em
pesquisa
sobre
percepção
de
QV
entre
idosas
em
uma
cidade
de
médio
porte,
que
a
maioria
das
participantes
apresentou
boa
compreensão
dos
questionários
WHOQOL-‐OLD
e
BREF,
provavelmente
porque
estas
tinham
maior
grau
de
escolaridade
do
que
os
participantes
do
estudo
de
Lima
(2010).
Outro
problema
foi
identificado
por
Maués,
Paschoal,
Jaluul,
França
&
Filho,
(2010)
em
pesquisa
realizada
com
idosos.
Houve
dificuldade
em
compor
a
amostra
devido
ao
grande
número
de
analfabetos,
principalmente
os
mais
velhos,
já
que
o
WHOQOL-‐OLD
era
auto-‐aplicado;
assim,
o
analfabetismo
foi
critério
de
exclusão.
Outra
limitação
encontrada
neste
estudo
foi
a
impossibilidade
de
auxílio
por
parte
de
familiares,
cuidadores
ou
do
pesquisador
para
o
preenchimento
do
questionário.
Isto
foi
criticado
por
idosos
com
dificuldade
de
entendimento
de
termos
e
expressões
encontradas
nas
perguntas
e
opções
de
resposta.
O
questionário
WHOQOL-‐BREF
é
uma
versão
abreviada
do
WHOQOL-‐100,
instrumento
genérico
que
afere
QV
e
pode
ser
aplicado
em
uma
variedade
de
populações.
O
WHOQOL-‐BREF
foi
validado
em
vários
centros
do
mundo,
inclusive
no
Brasil,
em
Porto
Alegre,
onde
a
amostra
foi
composta
por
pessoas
doentes
e
saudáveis
(Chachamovich
&
Fleck,
2008).
A
versão
OLD
também
foi
desenvolvida
pelo
grupo
WHOQOL
com
o
objetivo
de
oferecer
um
conjunto
de
itens
adicionais
para
a
avaliação
da
QV
de
idosos,
a
partir
de
uma
metodologia
transcultural.
Sua
validação
e
tradução
foram
feitas
em
vários
centros
do
mundo,
incluindo
o
Brasil,
obedecendo
a
uma
metodologia
padronizada,
com
a
participação
de
cinco
grupos
focais
que
incluíram
idosos
saudáveis
e
doentes
(Chachamovich,
Trentini,
Fleck,
Schmidt
&
Power
(2008);
Fleck,
Chachamovich
&
Trentini,
2003).
58
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Saúde//Investigación
Cualitativa
en
Salud//Volume
2
Assim,
foi
questionado
se
uma
abordagem
dos
diferentes
temas
descritos
pelos
domínios
dos
questionários
WHOQOL-‐OLD
e
WHOQOL-‐BREF
por
meio
de
entrevistas
abertas,
com
base
em
outra
metodologia,
especificamente
a
partir
da
utilização
de
uma
abordagem
qualitativa,
e
ampliando
o
escopo
para
idosos
que
residem
em
diferentes
municípios
brasileiros
de
pequeno
porte,
poderia
proporcionar
um
melhor
entendimento
das
perguntas
e
consequentemente
respostas
mais
amplas
sobre
os
assuntos
propostos.
Dada
a
heterogeneidade
do
processo
de
envelhecimento
no
Brasil
é
essencial
conhecer
os
pontos
de
vista,
sentimentos
e
expectativas
dos
sujeitos
nesta
fase
da
vida.
Conhecer
e
compreender
as
percepções
de
QV
de
idosos
que
residem
em
municípios
de
pequeno
porte
torna-‐se
relevante
para
a
elaboração
de
ações
voltadas
para
a
promoção
de
saúde
dessa
população.
Estes
podem
vivenciar
experiências
sócio
culturais
particulares
em
relação
ao
processo
de
envelhecimento
que
podem
refletir
na
sua
percepção
sobre
QV,
consequentemente,
a
abordagem
qualitativa
através
da
utilização
de
entrevistas
abertas,
por
explorar
os
aspectos
subjetivos
e
aproximar
pesquisador
e
pesquisado
poderá
oferecer
informações
amplas
sobre
o
tema,
facilitando,
sobretudo
a
compreensão
dos
assuntos.
O
presente
estudo
tem
como
objetivo
conhecer
a
percepção
de
QV
de
idosos
utilizando
a
entrevista
como
técnica
de
coleta,
cujo
roteiro
das
perguntas
se
norteou
nos
temas
dos
questionários
WHOQOL-‐OLD
e
WHOQOL-‐BREF;
e
discutir
a
experiência
de
realizar
entrevistas
abertas
com
idosos.
2 Metodologia
59
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Saúde//Investigación
Cualitativa
en
Salud//Volume
2
Quadro
1
-‐
Roteiro
proposto
nas
entrevistas
relacionado
aos
temas
estruturantes
para
a
QV
na
velhice
Roteiro
da
entrevista
Temas
importantes
para
a
Qualidade
de
Vida
(QV)
na
velhice
1)
Para
você,
o
que
é
ter
qualidade
de
vida?
QV
global
2)
De
um
modo
geral,
você
está
satisfeito
com
a
sua
Aspectos
físicos
relacionados
ao
envelhecimento
saúde?
(especialmente
à
saúde
do
idoso)
3)
Em
sua
opinião,
você
está
realizado
com
a
sua
vida?
Aspectos
psicológicos
(realização
com
a
vida)
Por
quê?
4.1)
Você
está
satisfeito
com
as
condições
de
transporte
Ambiental/
Satisfação
com
o
transporte
público
público
oferecido
no
local
onde
você
mora?
Em
sua
opinião,
o
que
poderia
melhorar?
4.2)
E
em
relação
ao
atendimento
na
área
de
saúde,
o
Ambiental/Satisfação
com
o
atendimento
na
área
de
senhor
(a)
está
satisfeito
com
o
atendimento
na
área
de
saúde
saúde
oferecido
no
local
onde
você
mora?
Em
sua
opinião,
o
que
poderia
melhorar?
5)
No
seu
entender,
as
perdas
nos
seus
sentidos,
se
as
Funcionamento
dos
sentidos
tiver
(por
exemplo,
audição,
visão,
paladar,
olfato,
tato),
afetam
a
sua
vida?
Em
quê?
6)
Você
tem
liberdade
de
tomar
as
suas
próprias
Autonomia
decisões
na
sua
vida?
Por
quê?
7.1)
Você
está
satisfeito
com
aquilo
que
alcançou
na
sua
Aspectos
relacionados
às
atividades
passadas-‐
vida?
presentes-‐futuras
7.2)
O
que
você
espera
daqui
para
frente?
8.1)
Você
está
satisfeito
com
as
oportunidades
de
lazer
Relações
sociais
e
participação
social
(lazer
e
atividade
que
você
tem
em
sua
comunidade?
física)
8.2)
Você
pratica
algum
tipo
de
atividade
física?
9)
O
que
você
pensa
sobre
a
morte?
Morte
10)
Você
sente
amor
em
sua
vida?
Intimidade
(amor)
11)
Em
sua
opinião,
quais
ações
poderiam
ser
feitas
aqui,
Ações
para
melhorar
a
QV
dos
idosos
neste
município,
para
melhorar
a
sua
qualidade
de
vida?
Fonte: Temas com base nos domínios dos questionários WHOQOL-‐OLD e WHOQOL-‐BREF.
Foi
incluída
no
roteiro
uma
pergunta
sobre
as
ações
que
melhorariam
a
QV
dos
participantes
(questão
11).
Este
instrumento
foi
aplicado
previamente
em
um
estudo
piloto
em
fevereiro
de
2013,
em
idosos
de
ambos
os
sexos
e
diferentes
faixas
etárias,
residentes
em
um
dos
municípios.
Após
o
estudo
piloto,
foi
feito
um
ajuste
no
roteiro
para
realização
das
entrevistas
definitivas,
pois
foi
constatado
que
em
algumas
perguntas,
por
exemplo,
referentes
ao
domínio
funcionamento
dos
sentidos,
muitos
participantes
tiveram
dificuldades
de
compreender
algumas
palavras,
como
tato,
paladar
e
olfato.
Neste
caso,
foram
utilizadas
expressões
sinônimas:
vista/enxergar,
ouvir,
toque,
cheiro
e
gosto,
para
explicar
a
pergunta
e
facilitar
a
compreensão
durante
as
entrevistas.
Do
mesmo
modo,
alguns
idosos
não
compreenderam
as
palavras
lazer
e
atividade
física,
por
isso,
foram
utilizados
termos
como
distração,
diversão
e
exercícios
físicos,
mais
habituais
para
o
vocabulário
deles.
Assim,
durante
as
entrevistas,
quando
surgiam
dúvidas
em
relação
aos
termos
empregados,
palavras
sinônimas
foram
utilizadas
para
facilitar
o
entendimento.
As
entrevistas
foram
gravadas,
transcritas
e
posteriormente
analisadas,
através
das
técnicas
de
análise
do
conteúdo,
que
incluíram
as
seguintes
etapas:
pré-‐análise,
codificação
do
material
e
interpretação
dos
resultados
(Oliveira,
2008).
Observações
relativas
ao
contexto
da
entrevista,
como
expressões
verbais,
linguísticas,
corporais
ou
faciais
surgidas
durante
as
perguntas,
gestos
ou
falas
ditas
após
desligar
o
gravador
e
emoções
(riso
ou
choro)
que
emergiram
durante
as
falas
foram
anotadas
no
diário
de
campo.
60
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Saúde//Investigación
Cualitativa
en
Salud//Volume
2
A
análise
das
falas
considerou
em
um
primeiro
momento
as
percepções
dos
idosos
em
relação
à
QV.
Para
a
análise
do
material,
após
a
leitura
exaustiva
das
entrevistas,
foi
realizada
a
organização
dos
seus
conteúdos
de
acordo
com
as
categorias
que
emergiram
em
cada
bloco
temático.
Posteriormente,
foi
relatada
a
experiência
de
realizar
entrevistas
abertas
com
idosos,
cujos
desafios
foram
observados
e
discutidos.
Todas
as
entrevistas
foram
realizadas
individualmente,
respeitando
a
confidencialidade
e
o
sigilo
das
informações
de
cada
participante.
3 Resultados e Discussão
61
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Saúde//Investigación
Cualitativa
en
Salud//Volume
2
Há
também
que
se
ressaltar
que
existem
entraves
e
desafios
na
realização
das
entrevistas
abertas,
os
quais
foram
entendidos
de
forma
positiva.
Um
primeiro
foi
conseguir
agendar
as
entrevistas,
que
por
serem
realizadas
em
diferentes
municípios
demandaram
tempo,
tanto
para
conseguir
o
contato
inicial
com
os
participantes
e
posteriormente
agendar
o
encontro,
quanto
para
a
realização
das
perguntas,
no
entanto,
esta
situação
proporcionou
a
chance
de
conhecer
a
realidade
de
outros
municípios.
Além
disso,
se
percebeu
que
os
participantes
queriam
falar
sobre
outros
assuntos
que
lhes
vinham
na
cabeça
naquele
momento
da
entrevista,
pois
queriam
ser
ouvidos.
Assim,
as
conversas
não
terminavam
quando
o
gravador
era
desligado,
pois
permanecia
a
expectativa
dos
idosos
de
expressar
os
seus
sentimentos
e
opiniões.
Ao
mesmo
tempo,
foi
a
oportunidade
que
eles
tiveram
em
falar
o
que
pensavam
e
sentiam
sobre
QV,
por
isso,
demandou
tempo.
Este
fato
permitiu
uma
maior
compreensão
da
realidade
de
vida
dos
participantes.
A
forma
específica
de
conversação
que
se
estabelece
em
uma
entrevista
para
fins
de
pesquisa
favorece
o
acesso
direto
ou
indireto
às
opiniões,
às
crenças
e
aos
significados
que
as
pessoas
atribuem
a
si,
aos
outros
e
ao
mundo
em
sua
volta.
Deste
modo,
a
entrevista
dá
voz
ao
interlocutor
para
que
ele
fale
do
que
está
acessível
a
sua
mente
no
momento
da
interação
com
o
entrevistador
e
em
um
processo
de
influência
mútua
produz
um
discurso
compartilhado
pelos
dois
atores:
pesquisador
e
participante
(Fraser
&
Gondim,
2004).
As
entrevistas
foram
realizadas
no
domicílio
ou
nos
locais
onde
os
participantes
realizavam
as
suas
atividades,
em
meio
a
sua
rotina.
Embora
este
procedimento
tenha
respeitado
a
disponibilidade
dos
idosos,
em
alguns
casos
comprometeu
a
fluidez
da
conversa,
em
função
de
interrupções.
Este
fato
novamente
foi
entendido
de
forma
positiva,
uma
vez
que
proporcionou
uma
aproximação
do
seu
cotidiano.
Por
meio
das
entrevistas
e
da
interação
verbal
que
elas
proporcionam
entre
o
entrevistador
e
o
entrevistado,
é
possível
apreender
significados,
valores
e
opiniões,
além
de
compreender
a
realidade
social
de
forma
mais
profunda.
A
relação
estabelecida
entre
o
entrevistador
e
o
entrevistado
permite
um
diálogo
amplo
e
aberto,
favorecendo
não
apenas
o
acesso
às
opiniões
e
às
percepções
dos
entrevistados
à
respeito
de
um
tema,
como
também
a
compreensão
das
motivações
e
dos
valores
que
dão
suporte
à
visão
particular
da
pessoa
em
relação
às
questões
propostas
(Fraser
&
Gondim,
2004).
Outro
desafio
foi
a
dificuldade
de
compreensão
de
muitos
idosos
diante
dos
termos
existentes
no
roteiro.
Mesmo
tendo
sido
realizado
um
pré-‐teste,
muitas
vezes
houve
necessidade
de
adequação
do
vocabulário,
dado
que
o
contexto
vivenciado
pela
maioria
é
rural;
situação
que
pode
ter
comprometido
o
entendimento
e
o
fluxo
da
entrevista
em
virtude
de
algumas
palavras
não
estarem
presentes
no
convívio
e
vocabulário
destas
pessoas.
Embora
os
questionários
WHOQOL-‐OLD
e
WHOQOL-‐
BREF
sejam
validados
para
o
Brasil,
é
preciso
considerar
que
o
país
é
marcado
por
profundas
diferenças
regionais
e
socioculturais,
inclusive
em
relação
ao
vocabulário,
o
que
pode
influenciar
na
compreensão
de
idosos
em
relação
a
alguns
termos
existentes.
A
realização
de
entrevistas
abertas
permitiu
adequação
do
vocabulário,
liberdade
de
expressão
e
simplificação
da
linguagem,
facilitando
a
compreensão
e
o
sentido
das
palavras
pelos
participantes.
Um
estudo
verificou
que
a
forma
de
construto
dos
instrumentos
utilizados
em
pesquisa
com
idosos
residentes
em
Botucatu-‐SP
não
se
aplicava
à
realidade
deles,
que
apresentaram
dificuldade
de
interpretação
das
questões.
Por
isso,
foram
feitas
pelos
autores
adaptações
aos
questionários
validados
para
facilitar
a
compreensão
dos
participantes
(Joia,
Ruiz
&
Donalísio,
2007).
Entende-‐se
que
em
pesquisa
com
idosos
as
técnicas
e
abordagens
metodológicas
utilizadas
devem
ser
de
fácil
aplicação
e
entendimento,
de
modo
que
facilitem
a
comunicação
entre
o
pesquisador
e
o
entrevistado.
62
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Saúde//Investigación
Cualitativa
en
Salud//Volume
2
4 Conclusão
O
estudo
apontou
a
amplitude
de
termos
que
define
QV
na
velhice
para
os
participantes
do
estudo
e
as
particularidades
que
envolvem
o
processo
de
envelhecimento
em
municípios
brasileiros,
sobretudo
os
de
pequeno
porte
que
sofrem
forte
influência
do
estilo
de
vida
e
costumes
da
zona
rural.
Além
disso,
a
abordagem
qualitativa,
em
especial
a
realização
de
entrevistas
abertas,
mostrou-‐
se
importante
para
o
estudo
da
percepção
de
QV,
pois
a
partir
das
falas
é
possível
aprofundar
o
conhecimento
sobre
o
assunto
frente
a
realidade
vivida.
Observou-‐se
que
os
temas
abordados
nos
domínios
dos
questionários
WHOQOL-‐OLD
e
WHOQOL-‐
BREF
são
interessantes
e
importantes
para
conhecer
as
percepções
da
QV
da
população,
em
especial
da
idosa.
Embora
algumas
perguntas
existentes
nos
respectivos
questionários
causem
certa
dificuldade
de
compreensão,
principalmente
considerando
idosos
com
baixa
escolaridade
e
que
residem
em
municípios
de
pequeno
porte
marcados
por
um
contexto
rural,
ao
utilizar
os
temas
referentes
aos
domínios
a
partir
da
entrevista
aberta
constatou-‐se
mais
facilidade
de
entendimento
e
liberdade
para
os
participantes
responderem.
As
pesquisas
realizadas
com
abordagens
qualitativas
demonstram
ser
importantes
fontes
de
conhecimento
sobre
as
questões
relativas
à
percepção
de
QV
na
velhice,
pois
consideram
os
63
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Saúde//Investigación
Cualitativa
en
Salud//Volume
2
aspectos
subjetivos
e
o
ponto
de
vista
dos
participantes
sobre
um
assunto,
fornecem
informações
variadas
que
são
importantes
para
a
formulação
de
ações
e
estratégias
de
cunho
social,
assistencial,
da
promoção
da
saúde,
entre
outros,
e
permitem
mais
liberdade
durante
a
sua
utilização,
pelo
fato
da
linguagem
ser
mais
próxima
do
universo
cultural
e
social
do
participante.
Referências
Braz,
I.
A.
(2012).
Percepção
da
qualidade
de
vida
de
idosas
participantes
e
não
participantes
de
um
grupo
de
convivência
da
terceira
idade
de
Catanduva
(SP).
Dissertação
(Mestrado
em
Promoção
de
Saúde)
–
Universidade
de
Franca,
Franca.
Chachamovich,
E.;
Fleck,
M.
P.
A.
(2008)
Desenvolvimento
do
WHOQOL-‐BREF.
In:
FLECK,
M.
P.
A.
et
al.
(Org.).
A
avaliação
de
qualidade
de
vida:
guia
para
profissionais
da
saúde.
Porto
Alegre:
Artmed.
cap.
6,
p.
75-‐82.
Chachamovich,
E.;
Trentini,
C.
M.;
Fleck,
M.
P.
A.;
Schmidt,
S.;
Power,
M.
(2008).
Desenvolvimento
do
instrumento
WHOQOL-‐OLD.
In:
FLECK,
M.
P.
A.
et
al.
(Org.).
A
avaliação
de
qualidade
de
vida:
guia
para
profissionais
da
saúde.
Porto
Alegre:
Artmed.
cap.
9,
p.
102-‐111.
Coelho,
A.
R.
(2012).
A
contribuição
do
programa
de
saúde
da
terceira
idade
na
qualidade
de
vida
e
promoção
de
saúde.
Dissertação
(Mestrado
em
Promoção
de
Saúde)
–
Universidade
de
Franca,
Franca.
Faller,
J.
W.;
Melo,
W.
A.;
Versa,
G.
L.
G.
S.;
Marcon,
S.
S.
(2010).
Qualidade
de
vida
de
idosos
cadastrados
na
estratégia
saúde
da
família
de
Foz
do
Iguaçu-‐PR.
Escola
Anna
Nery,
14(4):803-‐
810.
Fleck,
M.
P.
A.
(2008).
Problemas
conceituais
em
qualidade
de
vida.
In:
_______.
(Org.).
A
avaliação
de
qualidade
de
vida:
guia
para
profissionais
da
saúde.
Porto
Alegre:
Artmed,cap.
1,
p.
19-‐28.
Fleck,
M.
P.
A.;
Chachamovich,
E.;
Trentini,
C.
M.
(2003).
Projeto
WHOQOL-‐OLD:
método
e
resultados
de
grupos
focais
no
Brasil.
Revista
de
Saúde
Pública,
37(6):
793-‐799.
Fraser,
M.
T.
D.;
Gondim,
S.
M.
G.
(2004).
Da
fala
do
outro
ao
texto
negociado:
discussões
sobre
a
entrevista
na
pesquisa
qualitativa.
Paidéia,
14
(28),
139
-‐152.
Garcia,
M.
A.
A.;
Rodrigues,
M.
G.;
Borega,
R.
S.
(2005).
Satisfação
e
qualidade
na
atenção
à
saúde
do
idoso.
Revista
Ciências
Médicas,
14(6),515-‐522.
64
>>Atas
CIAIQ2016
>>Investigação
Qualitativa
em
Saúde//Investigación
Cualitativa
en
Salud//Volume
2
Günther,
H.
Pesquisa
qualitativa
versus
pesquisa
quantitativa:
esta
é
a
questão?
(2006).
Psicologia:
teoria
e
pesquisa,
22(2),201-‐210.
Joia,
L.
C.;
Ruiz,
T.;
Donalísio,
M.
R.
(2007).
Condições
associadas
ao
grau
de
satisfação
com
a
vida
entre
a
população
de
idosos.
Revista
de
Saúde
Pública,
41(1),131-‐138.
Maués,
C.
R.;
Paschoal,
S.
M.
P.;
Jaluul,
O.;
França,
C.
C.;
Filho,
W.
J.
(2010).
Avaliação
da
qualidade
de
vida:
comparação
entre
idosos
jovens
e
muito
idosos.
Revista
Brasileira
de
Clínica
Médica,
8(5),
405-‐410.
Mendes,
A.
C.
G.;
Sá,
D.
A.;
Miranda,
G.
M.
D.;
Lyra,
T.
M.;
Tavares,
R.
A.
W.
(2012).
Assistência
pública
de
saúde
no
contexto
da
transição
demográfica
brasileira:
exigências
atuais
e
futuras.
Cadernos
de
Saúde
Pública,
28(5),
955-‐964.
Neri, A. L. (Org.). (2008). Palavras-‐chave em gerontologia. 3. ed. Campinas: Alínea.
Paschoal,
S.
M.
P.
(2006).
Qualidade
de
vida
na
velhice.
In:
FREITAS,
E.
V.
et
al.
Tratado
de
geriatria
e
gerontologia.
2.
ed.
Rio
de
Janeiro:
Guanabara
Koogan.
cap.
14,
p.
147-‐153.
Pérez,
A.
S.
M.;
Navarrete,
M.
L.
V.
(2009).
Técnicas
qualitativas
aplicadas
em
saúde.
In:
NAVARRETE,
M.
L.
V.
et
al.
Introdução
às
técnicas
qualitativas
de
pesquisa
aplicadas
em
saúde.
Recife,
Tema
3,
p.
51-‐80.
Ruiz,
T.;
Corrente,
J.
E.;
Bocchi,
S.
C.
M.;
Donalísio,
M.
R.;
Cordeiro,
R.
C.
(2008).
Correlação
entre
visão
de
qualidade
de
vida
e
aspectos
do
estilo
de
vida
em
idosos
do
município
de
Botucatu-‐SP.
Revista
da
APS,
11(2),145-‐151.
WHO
-‐
WORLD
HEALTH
ORGANIZATION.
(2008).
Manual
WHOQOL-‐OLD.
Disponível
em:
http://www.ufrgs.br/psiquiatria/psiq/WHOQOL-‐OLD.pdf.
Acesso
em:
24
fev.
2016.
65