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HISTÓRIA DA MATEMÁTICA
05 a 08 de abril de 2009
Belém – Pará – Brasil
ISBN – 978-85-7691-081-7
CC 70
O trabalho de Jean-Robert Argand e uma
nova concepção sobre os números imaginários
Ulicio Pinto Junior
PPGEM/UFRJ; Escola SESC/RJ
ulicio@pg.im.ufrj.br
Tatiana Roque
PPGEM/UFRJ
tati@im.ufrj.br
Resumo
A história dos números complexos aborda vários acontecimentos, desde seu surgimento nos trabalhos sobre
resolução das equações cúbicas através de radicais durante o século XVI, em que aparecem estas entidades
inicialmente rejeitadas ou toleradas, até sua aceitação como par algébrico na primeira metade do século XIV. Com o
desenvolvimento da álgebra, a utilidade prática destas quantidades na realização de cálculos se tornou notória. Já
não seria possível desconsiderar tais seres imaginários sem que o desenvolvimento da matemática fosse diretamente
afetado. A partir do final do século XVII começaram a ser sugeridas diferentes representações geométricas para os
números negativos e imaginários. Embora algumas tentativas de representação geométrica não tivessem obtido
êxito, elas desempenharam um papel fundamental para o desenvolvimento de diversos trabalhos nesta área de
conhecimento. Este trabalho tem como objetivo destacar durante este longo período, algumas contribuições de
diversos matemáticos na tentativa de representar geometricamente estas quantidades. Podemos observar durante
esta evolução, relações tanto desejadas como desacreditadas entre a álgebra e a geometria. Apontaremos aspectos
relevantes nos trabalhos de John Wallis, Adrien-Quentin Buée, Caspar Wessel, culminando com a proposta de Jean-
Robert Argand, que foi um dos fundadores do que chamamos hoje de “plano de Argand-Gauss”. Durante o século
XIX, justamente no momento em que a Geometria deixa de ser fundamental para a realização de entes algébricos, a
concepção de Argand sobre os imaginários fornecerá as bases para a definição de um Cálculo sobre as quantidades
imaginárias. Já encontramos neste trabalho o esboço de uma estrutura algébrica que possibilitará, mais tarde, que os
reais sejam considerados como um subconjunto dos complexos.
Palavras-chave: história dos números complexos, representação geométrica dos números imaginários, Argand.
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VIII SEMINÁRIO NACIONAL DE
HISTÓRIA DA MATEMÁTICA
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Desde os gregos, o critério de existência para as entidades algébricas era dado a partir de sua
representação geométrica. As soluções para os problemas propostos, que atualmente seriam obtidas
através da resolução de equações, eram dadas por segmentos de reta relacionados a construções
geométricas.
Durante o desenvolvimento algébrico pelos árabes até os matemáticos europeus da Idade Média,
alguns números irracionais associados à relação entre grandezas apareciam na resolução de equações,
mesmo que não possuíssem sentido geométrico. Neste mesmo movimento, os números negativos e suas
raízes quadradas também surgiram na resolução de equações. No entanto, como estes números não
possuíam um estatuto definido na matemática, não eram admitidos como solução.
Diferentemente da ordem em que são apresentados no ensino de Matemática, a história nos mostra
que os números irracionais, negativos e imaginários enfrentaram muitos problemas comuns. Em todos
estes casos, foi longo o caminho trilhado desde seu surgimento até seu reconhecimento como entidades
matemáticas.
Neste artigo, citaremos alguns matemáticos e suas contribuições para a busca de uma
representação geométrica para os números imaginários, culminando com a proposta de Jean-Robert
Argand, que foi um dos fundadores do que chamamos hoje de “plano de Argand-Gauss”.
John Wallis (1616-1703), professor de Geometria de Oxford foi o primeiro a admitir uma
construção geométrica para raízes imaginárias. Esta nova perspectiva constava em sua obra Tratado de
Álgebra (1693), cap. LXVI (Vol. II, p.286) da versão em Latim e já havia sido relatada em uma carta
endereçada a John Collins, datada em 6 de maio de 1673, na qual ele sugere uma construção um pouco
diferente das demais encontradas em seu livro.
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Nesta carta, Wallis apresentou uma explicação de sua interpretação das raízes imaginárias como
médias proporcionais, inseridas no contexto da discussão de Cardano sobre a resolução de equações
polinomiais. Inicialmente, ele apresenta uma representação mostrando que uma magnitude pode ser
“menos que nada”. Considerando uma situação aplicada ao movimento, ele pergunta: se um homem
avança 5 jardas de A para B em linha reta e depois retorna 2 jardas de B para C, quantas jardas ele
avançou a partir de A até C? Teremos então + 5 – 2 = + 3, ou seja, teria ele avançado de A para C, 3
jardas. No caso de ele ter avançado 5 jardas de A para B e então retornado 8 jardas em direção a D, temos
que (+ 5 – 8 = - 3), ou seja, ele avançou 3 jardas menos que nada.
Com este exemplo, Wallis afirma que – 3 designaria o ponto D, assim como + 3 o ponto C, ambos
sobre a mesma reta. Em seguida, o que era admitido para retas, também deveria, pela mesma razão, ser
permitido para planos.
Para isso, ele explica o fato de bc ser a média proporcional entre + b e + c e formalmente afirma
que − bc pode ter o significado de uma média proporcional entre – b e + c. Wallis exemplificou sua
argumentação algébrica através de diversas construções geométricas, mostrando como algumas
quantidades imaginárias poderiam ser representadas como segmentos trigonométricos. Citamos abaixo,
utilizando uma representação atual, como seriam interpretadas geometricamente as raízes da equação
quadrática x 2 + 2bx + c 2 = 0, b, c ≥ 0.
As raízes dessa equação são: x = −b ± b 2 − c 2 , logo reais quando b ≥ c. Neste caso, as raízes
poderiam ser interpretadas por pontos P1 e P2 sobre a reta real, determinados pela construção representada
abaixo.
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Quando b < c, segmentos de comprimento b construídos a partir do ponto Q seriam pequenos o
bastante para alcançar a reta numérica, logo os pontos P1 e P2 não estariam sobre esta reta, porém no
mesmo plano. Esta situação seria representada da maneira citada abaixo:
Argand prossegue e questiona se esta nova concepção poderia ser generalizada para quantidades
imaginárias, observando que elas não poderiam estar sobre a reta onde se representam as quantidades
positivas e negativas, colocadas em direções opostas, mas que deveriam estar sobre o mesmo plano.
Tendo interpretado grandezas relativas como grandezas direcionadas, ele sugere que seja
representada no plano a proporção 1 : - 1 = - 1 : 1. Identificadas as noções de valor absoluto e de direção
como elementos de sua base conceitual, ele investiga a possibilidade de combiná-las de modo a garantir
um lugar para representar as quantidades imaginárias.
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Sabendo que a média proporcional entre grandezas de valor absoluto 1 e com mesmo sinal deve ser
+ 1 ou – 1, como poderíamos determinar a média proporcional caso essas grandezas tivessem sinais
opostos? Ou seja, que valores de x satisfariam às proporções – 1 : x = x : + 1 e + 1 : x = x : - 1 ?
Os valores de x desejados nas proporções acima seriam aqueles que solucionariam a equação
x = −1 e Argand usa um diagrama para representar esta solução:
2
O zero pode ser compreendido agora como centro de rotação. O que representava uma reflexão
para as quantidades relativas, agora pode ser entendida como fruto de uma rotação. Expandindo sua
perspectiva, Argand não restringiu as quantidades imaginárias às linhas perpendiculares. Ele construiu
geometricamente todas as direções e, deste modo, alcançou a construção dos números complexos, antes
que esta denominação fosse proposta.
Argand deu a forma algébrica ± a ± b − 1 para os números complexos e suas linhas
correspondentes à direção. Esses resultados não despertaram muito interesse até suas idéias terem sido
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publicadas em 1813, com autor desconhecido. Esse fato o levou a participar de vários debates públicos, o
que garantiu a conquista da autoria de tão importante trabalho.
Tendo como referencial as idéias citadas por Argand, poderíamos atualmente determinar as
soluções ± 4i da equação quadrática x 2 = −16 da seguinte maneira:
Podemos observar que todos os números complexos podem ser representados geometricamente
usando as idéias de Argand. Basta aliarmos os conceitos de grandeza absoluta e direção. De uma maneira
formal, os números complexos poderiam ser obtidos através de processos algébricos e, com o trabalho de
Argand, passa a ser estabelecida uma álgebra de quantidades orientadas. Durante o século XIX,
justamente no momento em que a Geometria deixa de ser fundamental para a realização de entes
algébricos, a concepção de Argand sobre os imaginários fornecerá as bases para a definição de um Cálculo
sobre as quantidades imaginárias. Já encontramos neste trabalho o esboço de uma estrutura algébrica que
possibilitará, mais tarde, que os reais sejam considerados como um subconjunto dos complexos.
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