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MANIFESTO DO SINDICATO DOS MÉDICOS E DO CONSELHO REGIONAL

DE MEDICINA DE PERNAMBUCO SOBRE A ATUAL SITUAÇÃO DA SAÚDE


PÚBLICA NO BRASIL E SOBRE AS INTERVENÇÕES
JUDICIAIS(JUDICIALIZAÇÃO) COMO INSTRUMENTO NECESSÁRIO PARA
SALVAGUARDAR OS DIREITOS A VIDA E SAÚDE - EM CONTRIBUIÇÃO À
AUDIENCIA PÚBLICA DO STF SOBRE O TEMA

"Só existem dois dias do ano em que não podemos fazer nada. O
ontem e o amanhã."
(Mahatma Gandhi)

A situação atual da saúde pública no Brasil é complexa. Isto porque nos


afronta o seguinte quadro: por um lado a nossa Carta Política é exemplo
na garantia de direitos fundamentais ante o Estado e nossa legislação
ordinária sobre o tema é avançada. Mas por outro, a realidade do nosso
Sistema Único de Saúde é estarrecedora, ensejadora de sofrimento e
morte em números maiores que qualquer feroz beligerância mundial.

A nossa legislação sobre Saúde Pública é tão moderna que criou um


sistema de saúde público quase perfeito; que prevê a descentralização
de competências e responsabilidades, fontes de financiamento, além da
participação da Sociedade Civil na sua gestão e fiscalização. Porém, o
que vem se percebendo é que a oferta do serviço não é suficiente para a
demanda e a qualidade dos serviços está abaixo das condições mínimas
aceitáveis.

É um quadro realmente paradoxal. O artigo 196 da nossa Constituição


Federal determina que “a saúde é direito de todos e dever do Estado”.
Já a Lei nº 8.080/90 ratifica este direito e informa que a assistência à
saúde deve ser integral. Afora isto, esta lei cria o Sistema Único de
Saúde, um instrumento de gestão pública dos mais modernos do
mundo, que expande e descentraliza a assistência à saúde e as
responsabilidades dos entes públicos pela prestação dos serviços.
Inobstante, a qualidade do serviço piorou muito nas ultimas décadas e
assistência pública à saúde no Brasil continua sendo um dos maiores
problemas sociais da atualidade.

A Lei nº 8.142/90 garante, através dos Conselhos de Saúde, a


participação da Sociedade Civil na gestão e fiscalização de políticas e de
recursos; temos ainda a Agência Nacional de Saúde criada pela Lei nº
9.961/2000, que tem como fito fiscalizar a saúde suplementar, enfim,
possuímos instrumentos jurídicos e políticos admiráveis, mas que não
estão se mostrando capazes de conter as mortes e o desespero de quem
precisa do serviço de saúde pública, notadamente os mais pobres.

Podemos citar ainda a existência de vários outros instrumentos legais,


tais como: a lei que cria e regula a política do sangue e seus derivados
(Lei nº 10.205/2001); a Lei n° 9.787/99, que é de grande importância
para a democratização do acesso aos medicamentos; o Plano Nacional
de Saúde, enfim, por tudo isso, podemos afirmar que possuímos um
sistema de saúde público formalmente perfeito, mas que como antes
afirmado, não tem dado os resultados que se espera e que se precisa.

Diante deste quadro, nos vem a pergunta, por que isto acontece? O que
justifica esta situação?

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Naturalmente, dado a complexidade que o tema envolve, as respostas
são muitas, algumas delas até óbvias, dentre elas citamos: o grande
aumento populacional; o empobrecimento e a diminuição da qualidade
de vida da população, principalmente da classe média; a diminuição da
participação da União no financiamento do SUS que não conseguiu ser
compensada por Estados e Municípios; a inviabilidade financeira, devido
a pobreza, de muitos Municípios brasileiros; a falta de interesse político
na questão, pois as principais vítimas da falta de assistência são os mais
pobres e a classe média ainda consegue pagar por planos de saúde
privados; enfim, são muitas as justificativas.

Porém, o problema da saúde pública está aumentando e algo precisa ser


feito com urgência, sob pena desta omissão do Estado e da Sociedade
Civil, resultar em um número ainda maior de mortes por falta de
atendimento.

Na tentativa de se conter o número alarmante de mortes, o Poder


Judiciário tem sido acionado e feito a sua parte no sentido de tentar
garantir o direito à saúde. Com esteio na nossa “Constituição Cidadã”,
os julgados têm sempre priorizado a vida ante a qualquer outro
argumento político ou econômico que contra ela tenha se tentado opor;
o problema é que são pouquíssimos os usuários do SUS que podem
dispor de uma assistência jurídica e lutar por seus direitos à saúde e a
vida.

Outrossim, mesmo sendo sabido que decisões judiciais coagindo as


fazendas públicas e a iniciativa privada a cumprirem a lei, não terão o
condão de resolver a situação, as decisões têm tido um papel de
extrema importância no sentido de se pressionar os entes públicos a

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cumprirem suas obrigações constitucionais para com a saúde do povo
brasileiro.

É por isso que entedemos que: não será a “judicialização” da questão da


saúde pública que resolverá o problema, mas as decisões judiciais estão
tendo um papel muito importante neste momento, que é o de obrigar os
entes públicos a realmente terem que buscar uma solução para o
problema.

Enquanto estas soluções não ocorrem, são as decisões judiciais que vêm
salvando muitas vidas.

Assim, percebe-se que o que se tenta chamar de tentativa de


“judicialização do problema da saúde pública”, é na verdade um pedido
de socorro da população brasileira ao seu Poder Judiciário. Uma
tentativa de salvar as próprias vidas!

Inobstante, é preciso que não se perca o foco principal da discussão:


que é a busca de um SUS eficiente, justo e exeqüível.

No nosso entendimento, atualmente, este objetivo é perfeitamente


possível de ser alcançado, bastando-se para isso que não se adie mais,
nem se vincule a época das campanhas político-partidárias, as medidas
que têm de ser tomadas.

Diante do exposto, o Sindicato dos Médicos de Pernambuco, em nome


de todos os médicos do país, propõe:

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A mudança imediata, por parte do SUS, das atuais regras de distribuição
de recursos de forma a desfazer as INIQUIDADES do sistema.

Esse novo cálculo de distribuição dos recursos do SUS deverá levar em


conta as necessidade reais de cada Município e as informações e índices
contidoss no Sistema de Informações sobre Orçamento Público em
Saúde – SIOPS.

Afinal, Uma política que pretenda ser eqüitativa deve também


considerar a capacidade de autofinanciamento dos municípios quando da
descentralização dos recursos federais.

Outra medida urgente que dever ser tomada é a criação de um Plano de


Carreira Nacional Único para as Atividades de Saúde no serviço púbico
que contemple: piso salarial nacional com incentivo financeiro aos
profissionais que dispuserem a atuar nas áreas mais remotas e carentes
do país; regime único (estatutário) e a previsão de mecanismos que
incentivem e possibilitem aos profissionais a produzir mais e a se
reciclarem, atualizando regularmente suas técnicas e conhecimentos.

Ademais, é preciso que se retome as discussões sobre o percentual


mínimo obrigatório de investimentos União no Sistema Único de Saúde,
para que não se tornem inócuos os avanços obtidos com a Emenda
Constitucional nº 29.

E para que os recursos sejam eficazmente fiscalizados e melhores


políticas de ação, mais peculiares a cada região sejam traçadas, é
necessário que se incentive e viabilize o fortalecimento político e
administrativo dos Conselhos de Saúde da federação.

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É a nossa posição.

Recife, 20 de Abril de 2009.

Manifesto redigido pelo Presidente do Sindicato dos Médicos de


Pernambuco, o médico Antônio Jordão, pelo advogado Mauro Feitosa,
que atua no referido Sindicato, e pelo médico André Longo, Presidente
do Conselho Regional e Medicina de Pernambuco.

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