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Adolescência e Saúde Mental Revisão de Artigos
Adolescência e Saúde Mental Revisão de Artigos
Abstract Introdução
1 Universidade do Vale do
The objective of this work was to review the Bra- O objetivo deste trabalho foi realizar um levanta-
Rio dos Sinos, São Leopoldo,
Brasil. zilian scientific literature from 1995 to 2005 on mento da produção nacional sobre a saúde men-
mental health in adolescence, considering the tal na adolescência, identificando as temáticas
Correspondência priorities identified by the World Health Organi- mais freqüentes na área e destacando algumas
S. P. C. Benetti
Mestrado em Psicologia zation (depression, anxiety, substance abuse, be- características dos principais tópicos nesta faixa
Clínica, Universidade do havioral disorders, eating disorders, psychosis, etária. O interesse em identificar essa produção
Vale do Rio dos Sinos.
child abuse, and violence). 971 abstracts were justifica-se pela importância que a adolescência
Rua Riveira 150, apto. 301,
Porto Alegre, RS identified in the LILACS, MEDLINE, INDEXPsi, adquiriu nas últimas décadas, em função do re-
90670-160, Brasil. and SciELO databases, using descriptors associ- conhecimento das conseqüências negativas dos
sbenetti@unisinos.br
ated with the themes. After selection according problemas de saúde mental e a constatação da
to specified criteria, 267 abstracts were analyzed menor atenção dedicada a esta faixa etária em
by year, focus, methodological design, and prin- relação às demais.
cipal conclusions. A qualitative analysis was Trinta e cinco milhões de adolescentes com
performed on the main findings. Brazilian pub- idade entre 10 e 19 anos foram identificados no
lications in this area have increased in the last Censo Demográfico brasileiro em 2000, realizado
five years. The majority of the articles aimed to pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatís-
identify the problem, while a smaller propor- tica (IBGE). Esse número, acrescido da popula-
tion dealt with the development of intervention ção entre 0 e 9 anos (33 milhões), dimensiona a
and prevention strategies. magnitude e a importância da necessidade de
atenção à saúde mental desta faixa etária, prin-
Adolescent; Mental Health; Review Literature cipalmente considerando-se as estimativas de
prevalência de transtornos mentais de até 20%
nestes grupos 1.
Segundo a Organização Mundial da Saúde
(OMS) 2,3, algumas situações são prioridades na
adolescência, tais como depressão, suicídio e
psicoses. Além dessas, também devem ser consi-
derados os transtornos de ansiedade, transtornos
de conduta, abuso de substâncias, transtornos
alimentares e as condições médicas associadas,
como diabetes e epilepsias. Para uma adequada Mental, psicose, transtorno psicótico, psicopato-
atenção a esses problemas é necessário o desen- logia, saúde mental.
volvimento de ações focalizando a saúde mental Inicialmente, foram levantados todos os tra-
da criança e do adolescente baseadas na compre- balhos nacionais indexados nas bases de dados
ensão, na intervenção sobre as situações identifi- utilizando-se os limites de faixa etária (adoles-
cadas e na elaboração de diretrizes políticas. cência), ano de publicação (período 1995-2005)
Tomando como ponto de partida as situações e publicação nacional brasileira. No segundo
prioritárias na saúde mental de adolescentes, o momento, excluíram-se as publicações classifi-
presente trabalho teve como objetivo principal cadas como teses, capítulos de livros, livros, guias
o levantamento de artigos publicados em perió- médicos, comentários, resenhas, informativos
dicos indexados nacionais nos últimos dez anos. governamentais, mantendo-se somente os resu-
Os artigos foram analisados quanto à freqüência mos de artigos que foram analisados em relação
e procedência das principais áreas de conheci- ao ano de publicação, área científica, foco de in-
mento, ao ano de publicação, ao foco de inte- teresse, tópico principal e análise compreensiva.
resse (identificação, intervenções terapêuticas e Artigos em língua estrangeira referentes às pes-
programas preventivos) e às características me- quisas brasileiras foram incluídos. Os resumos
todológicas. Espera-se contribuir para a compre- classificados em diferentes indexadores foram
ensão do problema através da identificação das mantidos no principal.
características desta produção, apontando-se as
necessidades identificadas como mais relevantes
para o avanço do conhecimento nesta área. Resultados
Tabela 1
Freqüência do tipo de publicação em relação às categorias de análise nas bases de dados Index Psi Periódicos, LILACS, SciELO.
Tipo de publicação Depressão Ansiedade Transtorno de conduta/ Drogas Transtornos Violência Saúde
Delinqüência alimentares mental
Tabela 3
Distribuição por área e foco de interesse dos resumos dos artigos indexados no período 1995-2005.
tro da Saúde Coletiva. Grande parte dos traba- (33%) dos 33 analisados sobre o tema são cita-
lhos (80%) foi composta de artigos teóricos sobre dos. A área da Saúde Coletiva foi a que mais pu-
identificação de quadros clínicos 37, sobre teo- blicou trabalhos sobre violência e maus-tratos
rias e modelos explicativos do envolvimento com (57%), seguida da Psicologia (27,3%) e Medicina
condutas agressivas 38. Destaca-se a maior freqü- (15,3%). O foco de interesse das produções in-
ência de trabalhos voltados para a discussão de cluiu material sobre a identificação de casos e
modelos de intervenção e prevenção 39,40,41. sobre análises teóricas baseadas em modelos de
Os trabalhos de pesquisa empírica utilizaram desenvolvimento (54%). Os demais trabalhos es-
com maior freqüência a metodologia qualitati- tavam voltados para a intervenção 61 e prevenção
va (33%) e modelos compreensivos baseados em da violência 62,63.
determinantes contextuais (44%). Permaneceu, Além dos aspectos informativos sobre o im-
porém, o foco de interesse de identificação (56%) pacto da violência e maus-tratos, os artigos foca-
de características psicológicas, familiares 37 e ge- lizavam a mudança no perfil de mortalidade da
néticas associadas ao comportamento anti-so- adolescência e o aumento de mortes por causas
cial 42. externas, principalmente homicídios envolvendo
As contribuições da psicologia destacaram a jovens 64,65,66. A violência e maus-tratos estavam
precariedade das relações familiares 43, o aban- associados ao comportamento sexual de risco
dono escolar 44, a presença de ambientes vio- 67, a morar na rua 68,69 e ao desenvolvimento de
lentos 45 e também aspectos de intervenção, tais condutas agressivas 70. As repercussões negativas
como análises do sistema socioeducativo 46, o no desenvolvimento das situações de violência
psicodiagnóstico interventivo 47 e trabalhos com apontadas indicavam a urgência da implantação
crianças agressivas 48. Também foram apontadas de ações preventivas e de intervenção 71,72.
as características da cultura contemporânea 49
e da privação emocional durante o desenvolvi- Transtornos alimentares
mento 50.
Cinqüenta artigos discutiram os transtornos ali-
Abuso de substâncias mentares na adolescência. Igualmente às demais
categorias, a publicação de trabalhos aumentou
Ao todo 65 artigos foram classificados nesta ca- a partir de 2000, concentrando-se 70% dos arti-
tegoria. Destaca-se que 50% dos trabalhos foram gos entre 2000 e 2005. A maior contribuição origi-
publicados a partir de 2001. A área médica foi nou-se da área medica (56%) e Psicologia (21%).
responsável por metade desta produção, seguida O foco de interesse (83%) foi a descrição do
da Saúde Coletiva (27%) e da Psicologia (19%). comportamento anorético e bulímico, a identi-
Em geral, a metodologia quantitativa (53%) pre- ficação e prevalência dos casos 73,74,75,76, a com-
dominou. Ainda assim, 23% eram qualitativos e preensão neuropsicológica 77 e psicodinâmica
os restantes trabalhos teóricos fundamentados do adolescente com transtornos alimentares 78.
em análises documentais. As intervenções nos transtornos alimentares
O foco de interesse centrou-se na identifica- foram abordadas por meio das experiências de
ção dos grupos vulneráveis e nas características equipes especializadas 79, da clinica hospitalar 80
de uso de drogas 51,52,53,54. As análises interpre- e de técnicas grupais 81, psicodinâmica 82 e cog-
tativas basearam-se em fatores intrapessoais nitiva 83. Predominaram discussões teóricas ba-
para o entendimento do abuso de substâncias. seadas em compreensões das alterações da ima-
Entretanto, consideraram-se também aspectos gem corporal 84, da dinâmica da personalidade 78
interpessoais e contextuais de análise, tais co- e de conflitos familiares 85.
mo problemas escolares 55, relações familiares 56,
sexo masculino, idade, classe socioeconômica, Saúde mental
maus-tratos, vitimização por assaltos, presença
de familiar usuário de drogas e pouca religiosida- Ao todo, 37 trabalhos foram identificados, co-
de 57,58,59. A visão psicanalítica contribuiu para a brindo as áreas de Psicologia e Psicanálise (50%),
compreensão das motivações internas, o desen- Medicina (35%) e Saúde Coletiva (16%). As temá-
volvimento psíquico e a inter-relação com repre- ticas mais freqüentes abordaram questões epi-
sentações parentais 60. demiológicas das demandas psicológicas de ins-
tituições de atendimento ao adolescente. Nesse
Violência caso, os trabalhos tinham como foco de interesse
inquéritos de morbidades em clínicas-escolas ou
A produção de trabalhos sobre maus-tratos e ambulatórios 86,87,88. Os trabalhos identificaram
violência na adolescência aumentou a partir do a alta procura de atendimento clínico por crian-
ano 2000. Até aquele ano, somente 11 artigos ças e adolescentes, constituindo quase que 50%
da clientela. A necessidade de pesquisas na área portante. Essa faixa etária além de constituir-se
da saúde mental da infância e da adolescência e como uma grande parcela da população que pro-
o desenvolvimento de abordagens terapêuticas cura atendimento, é identificada como um grupo
focalizando serviços comunitários foram ações etário vulnerável e de risco em todas as categorias
consideradas prioritárias para o atendimento em – depressão, transtornos de conduta, transtornos
saúde mental 89. alimentares, drogas e violência. Portanto, a gran-
Também foram encontrados trabalhos dirigi- de demanda por atendimento e a diversidade das
dos ao profissional da saúde 90 oferecendo infor- situações clínicas afetando os jovens são pontos
mações sobre transtornos mentais na infância e fundamentais para o desenvolvimento de ações
adolescência. Os modelos compreensivos abor- em saúde mental.
daram características interacionais de desenvol- Em termos da distribuição entre as áreas de
vimento e análises psicodinâmicas das mudanças conhecimento, observa-se que grande parte das
da adolescência. No primeiro caso, destacavam- publicações provém da área médica, baseada em
se as etapas de desenvolvimento individual e fa- análises documentais ou teóricas, objetivando o
miliar em conjunto com a exposição às situações fornecimento de dados epidemiológicos, infor-
de risco, identificando os eventos traumáticos e mações e características clínicas para o diagnós-
a resiliência individual e familiar 91,92. No último tico das diferentes situações. Esse tipo de traba-
caso, prevaleceram análises teóricas ou estudos lho sinaliza o interesse pela divulgação científica
de casos discutindo a compreensão psicanalítica dirigida aos profissionais das distintas áreas de
sobre a adolescência 93,94. saúde sobre os tópicos de saúde mental na ado-
Artigos sobre psicose na adolescência tota- lescência, ação que se destina à qualificação, à
lizaram oito trabalhos, metade destes organiza- capacitação e à divulgação do conhecimento.
dos acerca da forma de discussão teórica sobre De um modo geral, ainda que se observe um
o adolescente psicótico 95,96,97,98, a necessidade crescente desenvolvimento de estudos voltados
de apoio familiar ao adolescente psicótico 99 e para a intervenção focalizando terapêuticas e
discussões psicanalíticas 100,101. técnicas de trabalho, é pequeno o número de
publicações sob este enfoque em saúde mental
em todas as categorias investigadas. Cabe a res-
Considerações finais salva que os artigos teóricos focalizando a com-
preensão dos quadros psicopatológicos traziam
O levantamento da produção nacional de arti- no desenvolvimento das discussões e conclu-
gos indexados em periódicos nacionais sobre sões inúmeras sugestões e indicações de fatores
saúde mental na adolescência indicou o cres- associados à etiologia dos transtornos mentais,
cimento constante da produção nacional nos apontando estratégias de intervenção e justifi-
últimos anos em todas as categorias investiga- cando a necessidade de ações preventivas. Outro
das, demonstrando que estão sendo reconheci- ponto importante refere-se ao fato de que o inte-
das pela comunidade científica a necessidade resse científico em acompanhar, avaliar e identi-
e a importância de investimentos de pesquisas ficar o trabalho de intervenção desenvolvido na
nesta área. área de saúde mental da infância e adolescência
Com base na análise dos resumos dos artigos está sendo consolidado. Para justificar esta aná-
também foi possível constatar diversas caracte- lise, um exemplo seria o aumento de trabalhos
rísticas desta produção. Uma observação, porém, sobre as clínicas-escolas de psicologia e medi-
deve ser feita quanto aos limites das generaliza- cina que nos últimos cinco anos têm procurado
ções do atual trabalho em relação à abrangência identificar as demandas clínicas no atendimen-
das indexações nas bases de dados, aos descrito- to psicológico, tanto em termos individuais co-
res utilizados, ao período selecionado para o es- mo de características contextuais. Igualmente, o
tudo e a restrição de investigar somente estudos interesse em estudos epidemiológicos da popu-
publicados em periódicos nacionais. Nesse últi- lação, visando à identificação de casos e fatores
mo caso, verifica-se que trabalhos importantes associados, contribui para o desenvolvimento
sobre temas nacionais são publicados em perió- do conhecimento sobre as demandas em saúde
dicos internacionais. Entretanto, mesmo consi- mental.
derando-se esses aspectos, algumas tendências Em termos metodológicos, o fato de que
e direções podem ser observadas a partir da dis- grande parte das publicações foi composta por
tribuição, foco de interesse e contribuição dos resenhas teóricas e/ou estudos quantitativos
trabalhos analisados. descritivos, alinha-se ao objetivo básico de infor-
Em relação aos resultados, as publicações mar e caracterizar grupos vulneráveis ou quadros
das diversas áreas indicaram que a demanda em clínicos. Da mesma forma, a menor freqüência
saúde mental na adolescência é uma questão im- de estudos clínicos indicou que os trabalhos de
intervenção e avaliação de programas necessi- estudos voltados para o atendimento dos casos.
tam ser ampliados. Entretanto, mesmo considerando esses aspectos,
Comparando-se a publicação nacional em a produção nacional em saúde mental do adoles-
relação à saúde mental independentemente de cente necessita de maior investimento nos obje-
um grupo etário, Passos 102 identificou carac- tivos de intervenção e prevenção. Basicamente,
terísticas distintas daquelas encontradas neste os atendimentos restringem-se aos casos mais
trabalho. Numa análise que incluiu a produção necessitados e não recebem os recursos necessá-
em saúde mental de 1980 a 1996, a autora identi- rios para a ampliação dos serviços.
ficou extensa literatura sobre análises de serviços Também importante é a ampliação das inves-
e assistência. Esses achados não invalidam os re- tigações sobre modelos de desenvolvimento que
sultados do presente trabalho e, sim, confirmam incluam aspectos contextuais e macros de com-
a observação de que as áreas da infância e ado- preensão dos problemas em saúde mental, des-
lescência não recebem igual atenção em relação tacando as características de resiliência e saúde
ao adulto. E, também indicam a ênfase terciária individual, familiar e coletiva. Essas abordagens
de ação em saúde mental, que se volta quase que são estratégias que permitem o desenvolvimento
exclusivamente para o atendimento do indivíduo do conhecimento das demandas em saúde men-
ou grupo já identificado. tal. Além disso, fundamentam o estudo e a adap-
tação dos modelos de intervenção mencionados
na literatura internacional, levando em conside-
Conclusão ração as características específicas do contexto
social brasileiro.
Em síntese, pode-se concluir que a produção Somente a partir de sólido conhecimento,
científica em saúde mental na faixa etária da pode-se desenvolver e implantar serviços co-
adolescência tem crescido continuamente, ca- munitários, subsidiar diretrizes, legislação e po-
racterística que indica a ampliação dos estudos líticas públicas em saúde mental de forma que
e investigações sobre os quadros psicopatológi- o desenvolvimento dos serviços sustente-se em
cos e fatores associados. Observa-se um grande apoio financeiro adequado e treinamento apro-
interesse na compreensão e identificação dos priado de recursos humanos para o trabalho.
quadros clínicos e também no delineamento de
Resumo Colaboradores
O objetivo deste trabalho foi realizar uma revisão da S. P. C. Benetti foi responsável pela elaboração textual
publicação nacional de artigos científicos no período e análise dos resumos. V. R. R. Ramires colaborou na
de 1995-2005 sobre as situações prioritárias de saúde produção textual. A. C. Schneider, A. P. G. Rodrigues e
mental na adolescência, definidas pela Organização D. Tremarin coletaram os dados bibliográficos e realiza-
Mundial da Saúde, tais como depressão, ansiedade, ram sínteses dos trabalhos.
abuso de substâncias, transtorno de conduta, trans-
tornos alimentares, psicoses, maus-tratos e violência.
Foram identificados 971 resumos nas bases de dados Agradecimentos
LILACS, MEDLINE, Index Psi e SciELO utilizando-se
descritores associados ao tema. Após seleção segundo Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio
critérios, foram analisados 267 resumos científicos Grande do Sul.
conforme área de produção, ano, foco, delineamento
metodológico e principais resultados. A seguir, foram
feitas análises qualitativas dos principais resultados.
Verificou-se que a produção brasileira tem aumentado
nos últimos anos e que a maioria dos trabalhos está
voltada para a identificação do problema, e em menor
número para o desenvolvimento de estratégias de in-
tervenção e prevenção.
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Submetido em 30/Jan/2006
Versão final reapresentada em 14/Jan/2007
Aprovado em 09/Fev/2007