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Algumas regras de ouro para o seu relacionamento

Este tema é muito abrangente, pois envolve nossa vida como um todo. Podemos focar os relacionamentos afectivos
de casais, de homossexuais, de amizades…, ou relacionamentos familiares, profissionais, etc. Vou manter o foco nas
atitudes que favorecem todo e qualquer relacionamento. Atitudes essas que contribuem para uma vivência bem mais
saudável e harmoniosa entre as pessoas.

Que atitudes são essas?

Jesus apresenta uma regra de ouro, que resume toda a Sagrada Escritura: “Tratai os outros assim como quereis que
vos tratem” (Mt 7,12). Aplicada essa regra de ouro a vida entre as pessoas seria de mais paz, harmonia, fraternidade,
respeito… Ainda dentro dos ensinamentos de Jesus encontramos uma segunda atitude, fundamental para um bom
relacionamento com qualquer pessoas: “Amarás o próximo como a ti mesmo” (Mt 22,39). Esse “como a ti mesmo”
já comentei num artigo anterior, pois aprendemos a amar a Deus e ao próximo e nos esquecemos de amar a si
mesmo, como referência para amar esse próximo.

Nos relacionamentos afectivos estão as maiores deficiências ou os maiores estragos quando as pessoas não
aprenderam a amar a si mesmo. É muito bom estar com a pessoa que amamos, mas deve ser muito bom estar
longe dela também. Não conheço o autor dessa frase: “Quem não é um bom impar, jamais será um bom par”. E
sabe por que jamais será um bom par? Porque vive um amor dependência. E dependência não é amor, pois quem
depende, apenas usufrui. Essa pessoa pode ser chamada até de vampiro do amor. Quantos casais vampiros por aí!
Outra atitude básica para todo e qualquer relacionamento, em especial os afetivos, é deixar o outro ser ele.
Ninguém precisa anular-se para viver com outra pessoa, pelo contrário, conforme o Apóstolo Paulo,

“o amor não procura o próprio interesse” (1Cor 13,5), ou seja, visa promover a outra pessoa, querer que ela
cresça, desenvolva-se, realize seus sonhos… Existe uma famosa lenda, onde um casal muito apaixonado de uma
tribo pediu ao feiticeiro um conselho para viverem esse amor para sempre. Ao final da lenda ele diz: “Voem juntos,
nunca amarrados”. Kalil Gibran, no seu livro “O Profeta”, referindo-se ao casal, diz: “Amai-vos, um ao outro,
mas não façais do amor um grilhão”. Respeitar o outro como ele é, entender que cada um tem um “mapa mental”,
é uma das tarefas básicas nos relacionamentos. Ainda referindo-se ao casal, Dalai Lama diz: “Dê a quem você ama
asas para voar, raízes para voltar e motivos para ficar”.

Não há nada mais belo do que dois seres livres permanecerem juntos ligados pelo amor incondicional – amor
liberdade. Diz ainda Gibran: “Vivei juntos, mas não vos aconchegueis em demasia, pois as colunas do templo
erguem-se separadamente, e o carvalho e o cipreste não crescem à sombra um do outro”. Uma comparação
perfeita. Viver juntos, mas cada um respeitando o espaço do outro. O lar é um templo que deve ser

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sustentado por duas colunas: cada uma na sua posição para que realmente haja apoio. O amor tem por
objetivo a união e não a fusão. Acredito que a afirmação bíblica de que os dois serão uma só carne precisa de uma
melhor explicação.

E a gratuidade? Sim, a gratuidade é indispensável nos relacionamentos. Ainda do livro O Profeta, Kalil Gibran
aconselha: “Dai de vosso pão um ao outro, mas não comais do mesmo pão”. Isso significa que devemos
compartilhar, ser gentis, dar do nosso pedaço, mas sem exigir nada em troca. É comum depois da gentileza vir
a cobrança. Faço um favor e espero logo alguma recompensa. Pretendo tirar alguma vantagem. Dividir o pão, sim,
mas sem comer do mesmo pão. Veja uma atitude de gratuidade: levanto mais cedo, vou preparar o café para a
família e vou curtindo o prazer do que faço, percebo como em cada detalhe o carinho e a realização pessoal ao fazer
isso. Tudo pronto, sentam-se à mesa e eu sigo para os próximos passos do meu dia, curtindo o prazer de ter feito o
que fiz. Nenhuma cobrança pelo que fiz. Sem dúvida que outras atitudes, menos importantes, poderiam ser
mencionadas aqui, mas só acrescento mais uma, que sem ela tudo fica mais difícil: o perdão permanente ou a
compreensão. Faça o exercício de nunca dormir brigado, não deixe que a sujeira de hoje estrague o dia de amanhã.
Perdoar faz um bem enorme para quem perdoa! Guardar a ofensa dentro de si é como beber de um veneno que
corrói a paz, a harmonia, a boa energia.

Quanta gente doente por falta de perdão, por guardar ressentimentos! Hoje eu uso duas armas poderosas ou duas
atitudes diante das ofensas: primeiro procuro viver da boa energia e me proteger contra os ataques da outra pessoa;
segundo, olho para ela e penso que cada um colhe o que semeia, como diz o Livro do Eclesiástico: “O mal se voltará
para quem o faz” (27,27).

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Fernando Pessoa
O amor é uma companhia. Já não sei andar só pelos caminhos. Porque já não posso andar só.

Mia Couto
Desde que te amo, o mundo inteiro te pertence. Por isso, nunca cheguei a dar-te nada. Apenas devolvi.

Rubem Alves
Para o coração, o centro do universo é o lugar do amor.

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Clarice Lispector
Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não
sabia que, somando as incompreensões é que se ama verdadeiramente. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que
amar é fácil.

Adélia Prado
Amor para mim é ser capaz de permitir
que aquele que eu amo exista como tal,
como ele mesmo.
Isso é o mais pleno amor.
Dar a liberdade dele existir
ao meu lado
do jeito que ele é.

Jorge Amado
É a própria vida, é o melhor da vida, tudo. No amor não sou profano, aí não. Sou sectário.

Nelson Rodrigues
Eu sou romântico num sentido quase caricatural. Acho que todo amor é eterno e, se acaba, não era amor. Para mim,
o amor continua além da vida e além da morte. Digo isso e sinto que se insinua nas minhas palavras um ridículo
irresistível, mas vivo a confessar que ridículo é uma das minhas dimensões mais válidas.

Fernando Sabino
Amor é dádiva, renúncia de si mesmo na aceitação do outro. Amar o próximo como a si mesmo e a Deus sobre todas
as coisas.

Hélio Pellegrino
Amor é surpresa, susto esplêndido – descoberta do mundo. Amor é dom, demasia, presente. Dou-me ao outro e,
aberto à sua alteridade, por mediação dele, recebo dele o dom de mim, a graça de existir, por ter-me dado.

Pedro Bloch
As pessoas chamam de amor ao amor-próprio. Chamam de amor ao sexo. Chamam ao amor de uma porção de
coisas que não amor. Enquanto a humanidade não definir o amor, enquanto não perceber que o amor é algo que
independe da posse, do egocentrismo, da planificação, do medo de perder, da necessidade de ser correspondido, o
amor não será amor. O que faz o mundo se mover em sentido construtivo é a verdade. Ainda que provisória. Ainda
que seja mais caminho que meta. As palavras afogam tudo: o amor, a verdade, o mundo. Enquanto o homem não

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marcar um encontro sério consigo mesmo, verá o mundo por um prisma deformado e construirá um planeta em que
a Lua terá prioridade, um mundo mais Lua que luar.

Tom Jobim
O amor é se dar, se dar, se dar. Dar-se não de acordo com o seu eu – muita gente pensa que está se dando e não está
dando nada – mas de acordo com o eu do ente amado. Quem não se dá, a si próprio detesta, e a si próprio se castra.
Amor sozinho é besteira.

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“O correr da vida embrulha tudo,


a vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem.
O que Deus quer é ver a gente
aprendendo a ser capaz
de ficar alegre a mais,
no meio da alegria,
e inda mais alegre
ainda no meio da tristeza!
A vida inventa!
A gente principia as coisas,
no não saber por que,
e desde aí perde o poder de continuação
porque a vida é mutirão de todos,
por todos remexida e temperada.
O mais importante e bonito, do mundo, é isto:
que as pessoas não estão sempre iguais,
ainda não foram terminadas,
mas que elas vão sempre mudando.
Afinam ou desafinam. Verdade maior.
Viver é muito perigoso; e não é não.
Nem sei explicar estas coisas.
Um sentir é o do sentente, mas outro é do sentidor.” João Guimarães Rosa

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Deixei De Dar Explicações A Quem Só Entende O Que Quer

Não viva dando explicações para cada coisa que você faz: essa é uma fonte de stress desnecessária. Não há
necessidade de justificar o seu jeito de ser a quem já julga você por ser diferente, por ser único. Quem o ama
o respeita. Portanto, evite cair na cultura do “o que vão dizer” e proteja a sua intimidade e as suas crenças.
Uma coisa que caracteriza a sociedade atual é que existem padrões para tudo: desde o aspecto físico até o que se
considera “biologicamente” normal, como se casar, ter filhos, etc. A pressão social e inclusive familiar nos obriga
frequentemente a ter que dar explicações para cada coisa que fazemos (ou que decidimos não fazer). Pratique a
liberdade pessoal e a arte da assertividade. Deixe de dar explicações sobre tudo o que você faz: quem gosta de você
não precisa disso, e quem não respeita você entenderá o que quiser. Uma coisa importante que deveríamos começar
a fazer hoje mesmo é refletir sobre o número de vezes em que nos justificamos perante os outros. Fazer isto em
excesso é cair em incoerências, sofrimentos e custos desnecessários. Você é o seu próprio juiz e tem direitos
assertivos para dizer: “não, não vou dar-lhe explicações porque isso não lhe diz respeito em absoluto”.

Dar explicações: uma fonte de estresse

Um artigo interessante publicado no espaço “Psychology Today” explica que precisamos aprender a enfrentar a
todas essas pessoas que se atrevem a questionar as nossas “decisões vitais”.

– Como você ainda não se casou?

– Quando você vai tomar jeito e encontrar um bom trabalho?

– Por que vocês não tem outro filho?

O mais complexo destas situações é que os juízes que valorizam as nossas decisões ou “não ações” são precisamente
os parentes mais próximos, por isso a pressão e a sensação de estresse são mais elevadas.

Razões que nos obrigam a ter que dar explicações

Para compreender um pouco melhor as fontes de sofrimento mais comuns, é preciso considerar estas dimensões com
as quais todos podemos nos sentir identificados.

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 Um erro muito comum no qual costumamos cair é que nos condicionamos pela estressante necessidade
de projetar a nossa existência procurando agradar os outros (e em especial as nossas famílias).
 Outro aspecto a considerar é que há quem tenha feito da sua vida pessoal uma tribuna pública, onde
cada atitude, escolha ou pensamento precisa ser dito em voz alta para encontrar aceitação. É algo que
vemos com frequência em nossas redes sociais: um “curtir” é um reforço positivo com o qual a gente se
sente bem logo depois de publicar um pensamento ou uma foto.
 O medo do “o que vão dizer” continua muito presente actualmente. Há quem sinta a necessidade de
justificar cada coisa que faz para não “quebrar” esse círculo de controle, onde agir ou não dar
explicações é ser apontado como diferente.

Aplique na sua vida a seguinte regra: faça as coisas em vez de falar delas, porque as coisas, ao serem feitas,
falam por si mesmas e não precisam de explicações.

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A humildade é caracterizada por uma forte aceitação de si e dos demais como seres com o mesmo valor, a
submissão é marcada pela rejeição de si mesmo e uma supervalorização do outro. Às vezes, confundimos as
coisas e achamos, por exemplo, que ser humilde é a mesma coisa que ser submisso. Mas não, não é, mesmo que
ambas as palavras sejam frequentemente empregadas como sinônimos.

Uma pessoa humilde não busca ficar no centro das atenções, não por medo ou timidez, não por se sentir
inferior, mas por entender que isso não é importante, por saber que ninguém precisa estar no centro para ser
centrado. E a pessoa humilde pode até abrir mão de expressar sua própria opinião, não por achar que ela não
tenha valor, mas por entender que o que ela pensa, naquele momento, talvez não seja tão importante ou por
perceber em certas situações que é mais prudente se calar. Ser humilde é ser modesto e ter consciência das
próprias limitações, é aceitar-se e aceitar os outros e viver de forma simples, natural e despretensiosa, sem
vaidade, sem se corromper por valores estranhos e compreendendo que não é melhor que ninguém. Sim, ser
humilde é principalmente isso: compreender que não se é melhor que ninguém, pois ninguém neste mundo é
melhor que ninguém. Então, a pessoa humilde sabe que também o outro, qualquer outro, não é melhor que
ela. E aqui está a principal diferença entre a humildade e a submissão. A pessoa submissa não se valoriza,
acredita não ter os mesmos direitos que (determinadas) outras pessoas, acha-se fraca perante aqueles que vê
como mais fortes, permite ser desprezada porque ela mesma se despreza e abre muitas vezes mão de seu lugar
neste mundo por se sentir inferior, por acreditar ser alguém de segunda categoria.

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Enquanto a humildade é caracterizada por uma forte aceitação de si e dos demais como seres com o mesmo valor, a
submissão é marcada pela rejeição de si mesmo e uma supervalorização do outro. Enquanto, então, a humildade é o
gesto de amor próprio e ao próximo, a submissão é um gesto de negação de si mesmo, de alguém que não se ama e
não se respeita.

Ao ter consciência das próprias limitações, a pessoa humilde sabe também onde estão os limites do outro, não
permitindo que ele vá longe demais e não aceitando ser menosprezada, maltratada, humilhada por ninguém.
Já a pessoa submissa não conhece esses limites ou talvez até conheça, mas não acredita ter o direito de impô-los,
aceitando o menosprezo, os maus-tratos e a humilhação, submetendo-se até mesmo a um rebaixamento moral.
Portanto, está enganado quem acredita que está sendo humilde ao aceitar ser pisado por quem quer que seja, pois
isso nada tem a ver com humildade. Isso é submissão.

Outra diferença entre as duas coisas é que a pessoa humilde é humilde sempre, independentemente da pessoa com
quem interage. Ela será humilde ao falar com o chefe, com o prefeito, com o Presidente da República e será
igualmente humilde ao falar com um empregado, com o zelador do prédio ou com o desabrigado que lhe pede
esmola na rua. Novamente: ela entende que todas as pessoas (todas mesmo!) têm o mesmo valor. Já a pessoa
submissa costuma se rebaixar diante daqueles que acredita que são mais fortes que ela, mas tenta humilhar
alguém que acredite ser mais fraco. Ela aceitará então ser maltratada por seu chefe, mas maltratará o zelador
do prédio ou qualquer um que julgue ser inferior. Para mim, humildade é uma virtude, que devemos incentivar e
alimentar. Já a submissão é um desvio, um defeito que precisamos corrigir o mais rápido possível. A humildade
liberta, a submissão aprisiona. Devemos sim nos sentir pequenos, pois somos pequenos, mas diante da criação, do
universo, da vida. Mas jamais devemos nos diminuir perante qualquer outra pessoa, já que, na essência, somos todos
iguais.

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Impossível borboleta que voa com uma só.

Avião de asa quebrada cai, não adianta ter a outra intacta e perfeita com a turbina funcionando. Para andar,
precisamos de duas pernas. Na gangorra, duas pontas. Na vida, muitas coisas são assim. Um sobe para que o outro

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desça, um empurra para que o outro ganhe impulso, um cala para o outro falar. Somos feitos para viver em pares.
Há sempre um complemento de forças que fortalece ambos os lados. Pelo menos, era para ser assim…

Hoje em dia a natureza nos mostra que há mais gente no mundo do que ele dá conta. Gente que nasce abandonada
pelos pais que não querem carregar o preço de uma noite de sexo inconsequente. Outros crescem supervalorizados,
sem referencias de limites. Outros são ensinados a vencer custe o que custar. Essas pessoas não se relacionam para
somar forças pois pensam que “vencem” e vivem por conta própria. Nunca na história da humanidade houve um
período tão desastroso em relação aos relacionamentos. Estão se construindo casamentos de duas borboletas de uma
asa só… Impossível voar gostoso e alto assim! E o culpado é sempre o outro que não consegue voar direito… A
sociedade se esqueceu do sentimento de coletivo dando lugar ao desenvolvimento integral individualizado.
Compreende-se. As pessoas estão preferindo ficar solteiras diante de tantos cenários conjugais desastrosos. E assim
ensina-se e aprende-se a se desenvolver e sentir amor e plenitude por conta própria.

E tampa-se o sol com a peneira. Salvo raros casos de gente que se casa com a solteirice por escolha, os demais
aprendem a ser felizes por conta própria para fugir da ansiedade de encontrar a outra ponta da sua gangorra.
Evoluem, descobrem-se, tornam-se amigas profundas de suas almas. Mas a falta do outro sempre está por lá,
pairando feito urubu no céu – longínquo e silencioso, que fica rodeando o que quer. Creio que o desejo de se
relacionar de forma construtiva vem junto com a pessoa. Como se fizesse parte do DNA. Mas assistindo tantos
relacionamentos doentes que existem, optam por viver sozinhas mesmo que haja um urubu negro a espreita.

Isso é mais um tipo de abrigo. A humanidade desde os seus primórdios refugiou-se em abrigos: cavernas, casas… E
agora abriga-se dentro de si. Sempre se fala para olharmos o outro lado da moeda. Como se tudo na vida tivesse dois
lados só. As questões da vida tem tantas faces para serem olhadas! Não sei quantas são, mas sei que são várias
– muito mais que apenas dois lados. Entre o branco e o preto há milhões de tons de cinza. Hoje em dia decisões são
tomadas cada vez mais analisando os tons de cinza. Era para ser mais eficaz. E é! Mas por mais que a pessoa
construa perfeitamente suas argumentações racionais, ela não consegue espantar seu urubu. Urubus vivem de
carniça. E pela própria analogia, só o amor bem vivido e sentido tem poder de não deixar apodrecer. Sem a
carniça, ao invés de urubus, planam sobre nossas cabeças águias, cheias de coragem para construir seus ninhos cada
vez mais altos. A paz do voo do urubu e da águia é a mesma. Planam e contemplam a beleza do mundo de forma
mansa. Mas um se alimenta de carniça. O outro se alimenta de coragem. O homem não sabe do que é capaz de
construir quando se enche de coragem. Mais uma vez, o amor é a grande engrenagem que impulsiona o mundo.

Não sejam borboletas de uma asa só…

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Não conte nada a ninguém e seja feliz!

“Que as grandes fortunas foram feitas em silêncio e a velha guarda dos bilionários às vezes é flagrada até viajando
numa classe econômica. Não sei porquê, mas boa parte dos homens mais ricos que conheci tinham a camisa meio
surrada e, quando tinham avião, sempre era em sociedade com amigos. E jamais entraram numa Ferrari ou sabem o
que é um camarote de boate. A não ser que tenham sociedade na boate, é claro. Um dia, perguntei a um poderoso
amigo Francês por que os ricos de sua terra eram discretíssimos em relação à dinheiro, a ponto de jamais tocar no
assunto e levar uma vida de classe média. Num surto de sinceridade, meu amigo, cujas filhas só ficaram sabendo aos
30 anos que o pai tinha um avião, disse: ” Tão perigosa quanto a inveja é a capacidade de o ser humano achar
que chegou ao topo. Quando ele acha que pode tudo, começa o fim.” Bruno Astuto para a GQ Brasil de
dezembro, n.º 33 – Edição Especial Men Of The Year

Minha avó já dizia, contra a inveja, o silêncio. Ninguém precisa saber da sua vida, das suas conquistas, dos
caminhos que pretende seguir, dos tombos, fracassos, enfim, da sua rotina. Você não deve explicação à
ninguém. Não precisa sair por ai gritando a felicidade ou reclamando no facebook, viver a sua vida, já está de
bom tamanho. Ninguém é feliz e tão bem sucedido como no facebook. Você não precisa fazer propaganda da
sua vida em uma rede social para dizer que é melhor do quê o outro. Ninguém é melhor do quê ninguém, o
dinheiro faz (de conta) que umas pessoas são melhores que as outras, quanto engano. Uma meta para 2016:
Ficar mais em silêncio. Tenho à péssima mania de contar algumas conquistas e coisas bacanas para os outros.
Mesmo sendo bem seletiva, descobri como poucas que a inveja não tem nome ou sobrenome, vem de quem a gente
menos imagina. Além do silêncio, a outra meta é fazer coisas acontecerem, sem ninguém perceber. Como já disse e
repito, não conte a sua vida para ninguém e verá como sera feliz.

É Bruno Astuto, se tem uma frase que marcou a minha vida e vai ser levada à risca agora em diante é essa: ” Tão
perigosa quanto a inveja é a capacidade de o ser humano achar que chegou ao topo. Quando ele acha que pode tudo,
começa o fim.” Desejos para 2016? Pés no chão, boca fechada, olhar para frente e coração-bussola. Se a gente tem
isso e saúde, não há mal que sempre vença. Que o bem prevaleça. Amém!

Por Juliana Manzato – Dona Oncinha

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O caminho seguro
Sim, andar sem parar. Mas, preste atenção se estás andando pelo caminho seguro. Perguntaram a um piloto se
conhecia os pontos perigosos existentes nos mares que habitualmente atravessava.

Respondeu:

– Conheço, apenas, o canal em que devo navegar e dele não me afasto. Assim devemos proceder. Basta conhecer o
caminho do bem, da virtude, da justiça, do amor. Quem caminha seguro, por um roteiro certo, não pode temer
os arrecifes das incertezas nem os baixios em que encalham os desprevenidos. Como fazia o responsável por
descobrir moedas falsas. Passava o dia olhando uma moeda falsa, até que um dia perguntaram-lhe por que passava o
dia olhando a moeda falsa, em vez de olhar a verdadeira? Ele disse:

– Quanto mais olhar a falsa, mais facilmente descubro-a entre as verdadeiras. O homem de vontade débil, e sem
confiança em si próprio, é um joguete (pessoa que serve de brinquedo) das circunstâncias e um escravo do
acaso. O nosso maior inimigo é a hesitação, pois, para vencer, é preciso estar, de antemão, seguro da vitória,
apesar de todos os obstáculos que a dificultem ou retardem. Não permita que te assalte o pensamento de que
não és capaz de vencer as batalhas da vida. Repele todo receio de fracasso, e também a falsa crença que se
manifesta dentro de você de que não mereces o êxito. Expulse semelhantes sugestões do teu espírito, como
expulsarias um ladrão de tua casa.

A grande Joana d’Arc não triunfou unicamente pela energia do seu caráter varonil, mas, também, porque
aconselhada por suas intuições e sua fé, tinha plena confiança em si mesma, e estava convicta do triunfo. Não pare
de caminhar, mas tome todo cuidado para não andar em círculo, acomodado na sua zona de conforto. Quem
parou de sonhar, de enxergar novos desafios, começou a morrer. Triste morte não é a física, mas a interior, a
morte dos sonhos.

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O que é vida? Mais precisamente, o que é a vida de
um ser humano? O que e quem a define?

Já tive medo da morte. Hoje não tenho mais. O que sinto é uma enorme tristeza. Concordo com Mário Quintana:
“Morrer, que me importa?.. O diabo é deixar de viver.” A vida é tão boa! Não quero ir embora… Eram 6h. Minha
filha me acordou. Ela tinha três anos. Fez-me então a pergunta que eu nunca imaginara: “Papai, quando você morrer,
você vai sentir saudades?”. Emudeci. Não sabia o que dizer. Ela entendeu e veio em meu socorro: “Não chore, que
eu vou te abraçar…” Ela, menina de três anos, sabia que a morte é onde mora a saudade. Cecília Meireles sentia
algo parecido: “E eu fico a imaginar se depois de muito navegar a algum lugar enfim se chega… O que será, talvez,
até mais triste. Nem barcas, nem gaivotas. Apenas sobre humanas companhias… Com que tristeza o horizonte
avisto, aproximado e sem recurso. Que pena a vida ser só isto…” Da. Clara era uma velhinha de 95 anos, lá em
Minas. Vivia uma religiosidade mansa, sem culpas ou medos. Na cama, cega, a filha lhe lia a Bíblia. De repente, ela
fez um gesto, interrompendo a leitura. O que ela tinha a dizer era infinitamente mais importante. “Minha filha, sei
que minha hora está chegando… Mas, que pena! A vida é tão boa…” Mas tenho muito medo do morrer. O morrer
pode vir acompanhado de dores, humilhações, aparelhos e tubos enfiados no meu corpo, contra a minha vontade,
sem que eu nada possa fazer, porque já não sou mais dono de mim mesmo; solidão, ninguém tem coragem ou
palavras para, de mãos dadas comigo, falar sobre a minha morte, medo de que a passagem seja demorada. Bom seria
se, depois de anunciada, ela acontecesse de forma mansa e sem dores, longe dos hospitais, em meio às pessoas que
se ama, em meio a visões de beleza. Mas a medicina não entende. Um amigo contou-me dos últimos dias do seu pai,
já bem velho. As dores eram terríveis. Era-lhe insuportável a visão do sofrimento do pai. Dirigiu-se, então, ao
médico: “O senhor não poderia aumentar a dose dos analgésicos, para que meu pai não sofra?”. O médico olhou-o
com olhar severo e disse: “O senhor está sugerindo que eu pratique a eutanásia?”. Há dores que fazem sentido, como
as dores do parto: uma vida nova está nascendo. Mas há dores que não fazem sentido nenhum. Seu velho pai morreu
sofrendo uma dor inútil.

Qual foi o ganho humano? Que eu saiba, apenas a consciência apaziguada do médico, que dormiu em paz por haver
feito aquilo que o costume mandava; costume a que freqüentemente se dá o nome de ética. Um outro velhinho
querido, 92 anos, cego, surdo, todos os esfíncteres sem controle, numa cama -de repente um acontecimento feliz! O
coração parou. Ah, com certeza fora o seu anjo da guarda, que assim punha um fim à sua miséria! Mas o médico,
movido pelos automatismos costumeiros, apressou-se a cumprir seu dever: debruçou-se sobre o velhinho e o fez
respirar de novo. Sofreu inutilmente por mais dois dias antes de tocar de novo o acorde final. Dir-me-ão que é dever
dos médicos fazer todo o possível para que a vida continue. Eu também, da minha forma, luto pela vida.

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A literatura tem o poder de ressuscitar os mortos. Aprendi com Albert Schweitzer que a “reverência pela vida” é
o supremo princípio ético do amor. Mas o que é vida? Mais precisamente, o que é a vida de um ser humano? O
que e quem a define? O coração que continua a bater num corpo aparentemente morto? Ou serão os
ziguezagues nos vídeos dos monitores, que indicam a presença de ondas cerebrais? Confesso que, na minha
experiência de ser humano, nunca me encontrei com a vida sob a forma de batidas de coração ou ondas
cerebrais. A vida humana não se define biologicamente.

Permanecemos humanos enquanto existe em nós a esperança da beleza e da alegria. Morta a possibilidade de sentir
alegria ou gozar a beleza, o corpo se transforma numa casca de cigarra vazia. Muitos dos chamados “recursos
heróicos” para manter vivo um paciente são, do meu ponto de vista, uma violência ao princípio da “reverência pela
vida”. Porque, se os médicos dessem ouvidos ao pedido que a vida está fazendo, eles a ouviriam dizer: “Liberta-
me”. Comovi-me com o drama do jovem francês Vincent Humbert, de 22 anos, há três anos cego, surdo, mudo,
tetraplégico, vítima de um acidente automobilístico. Comunicava-se por meio do único dedo que podia movimentar.
E foi assim que escreveu um livro em que dizia: “Morri em 24 de setembro de 2000. Desde aquele dia, eu não vivo.
Fazem-me viver. Para quem, para que, eu não sei…”. Implorava que lhe dessem o direito de morrer. Como as
autoridades, movidas pelo costume e pelas leis, se recusassem, sua mãe realizou seu desejo. A morte o libertou do
sofrimento. Dizem as escrituras sagradas: “Para tudo há o seu tempo. Há tempo para nascer e tempo para morrer”. A
morte e a vida não são contrárias. São irmãs. A “reverência pela vida” exige que sejamos sábios para permitir que a
morte chegue quando a vida deseja ir.

Cheguei a sugerir uma nova especialidade médica, simétrica à obstetrícia: a “morienterapia”, o cuidado com os que
estão morrendo. A missão da morienterapia seria cuidar da vida que se prepara para partir. Cuidar para que ela seja
mansa, sem dores e cercada de amigos, longe de UTIs. Já encontrei a padroeira para essa nova especialidade: a
“Pietà” de Michelangelo, com o Cristo morto nos seus braços. Nos braços daquela mãe o morrer deixa de causar
medo.

Texto publicado no jornal “Folha de São Paulo”, Caderno “Sinapse” do dia 12-10-03. fls 3.

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