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Balbi
Aluno:
português pode ser uma forma simples de racionalizar a discriminação e a desumanização trocando
o foco para a linguagem, a qual os membros das classes mais ricas usam de forma a demonstrar
superioridade e de se segregarem das populações pobres. Em uma entrevista sobre o assunto, um
funcionário público expressou uma visão bastante comum: “Agora quem nasceu aqui e cresceu, se
não sabe falar a conjugação certa do português é porque é ignorante e porque não teve estudo. Tá
falando uma outra língua, tá falando português errado”.
Desqualificar a linguagem da favela como “errada” rotula seus interlocutores como quem
não pertence, e nega sua participação na mesma sociedade. O entrevistado continuou: “O português
é uma língua muito difícil. O português tem muitas chances de você errar. Cada verbo tem 20
conjugações diferentes”. Isto dá espaço para o julgamento da capacidade intelectual dos
interlocutores ‘abaixo do padrão’, contribuindo para maior exclusão e estigmatização.
O medo da ruptura da ordem social existente afasta a linguagem da favela de ser aceita e faz
com que os membros da elite insistam no uso ultraconservador das regras gramaticais. Mano Zeu,
um poeta da Zona Norte, disse: “Os caras ainda vão fazer muita resistência para aceitar, e assimilar,
e absorver a nossa linguagem porque para eles é entendida como regresso. Muita gente fala isso”.
Ironicamente, um dos efeitos da exclusão é a continuidade da falta de acesso às ferramentas
educacionais necessárias para a adoção do dialeto padrão.
O estigma impede que a linguagem das favelas seja vista como nada mais que uma
corrupção do português dominante. As formas com que ela quebra as convenções linguísticas são
lidas como sinais de desordem e de caos mais do que de criatividade e inovação. As realidades da
vida nas favelas que se refletem nas formas não-ortodoxas de linguagem inspiram medo em vez de
compreensão. Interjeições como “bum”, “pum”, “bá” e “pá” imitam sons de tiros e socos, por
exemplo, o que acaba por assustar os ouvintes de fora da comunidade em vez de comunicar como é
naturalizado o ambiente de violência no qual os moradores vivem.
Como resultado, a distinção entre os moradores e as ações criminosas que controlam
algumas comunidades é usualmente ignorada. Em julho desse ano, um jovem foi preso por estar
cantando uma música de funk. A canção descrevia a tensa relação entre a polícia e as facções
criminosas na favela de Cidade de Deus, e cantá-la em público foi considerado apologia ao crime
pelos policiais que realizaram a prisão.
O funk é uma expressão da vida na favela utilizando a linguagem da favela, descrevendo a
realidade do dia a dia que inclui o tráfico de drogas, presença constante em algumas comunidades.
Em vez de ser entendido como uma natural e inevitável expressão dessa realidade, o funk é
geralmente julgado como um endossamento da criminalidade. Essa estigmatização ficou explícita
com a prisão do MC Didô do Complexo do Alemão, em dezembro passado, quando um
representante da polícia explicou que “quando um MC vai a um baile funk e canta o nome do
Comando Vermelho, ou o nome da facção, ele está trabalhando para os traficantes”.
Uma indisposição em olhar para além dos esteriótipos dominantes impede que os falantes
dos dialetos periféricos sejam integrados à sociedade. A estigmatização da linguagem retira o direito
a uma visão positiva sobre si mesmo, conforme Play explica: “Meu corpo aguenta um tiro de fuzil
mas minha moral não sustenta alguém falando ‘não, tu tá errado’”. Entretanto, conforme a Parte
Professora Danieli C. Balbi
Aluno:
Problematizando
5) Como as formas da(s) Linguagem(s) definem as identidades, pertencimentos e são definidos por
diversos agentes?