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HZ158 Sociologia de Durkheim

Juliana Andrade Begiato R.A. 238383

Fichamento: As regras do Método Sociológico

No livro “As regras do método sociológico” (1894), de Émile Durkheim, o autor


deixa claro seu interesse central em firmar a sociologia como uma ciência, uma vez que
apresenta um método para que essa seja considerada como tal. Dessa forma, a obra
inicia com um apelo de Durkheim para que o leitor abandone suas primeiras
impressões, suas prenoções, uma vez que a sociologia, como todas as outras ciências,
não é formada por opiniões exclusivamente, mas por embasamento científico.

Para que seja considerada uma ciência, a sociologia precisa, primeiro,


determinar um objeto de estudo válido e que não seja estudado por nenhuma outra
ciência. Partindo desse pressuposto, Durkheim apresenta como objeto de estudo da
sociologia o que o autor chama de “fato social”.

Para explicar o que é um fato social, o sociólogo primeiro determina que se


fossem tidos como tal todos os fenômenos que acontecem dentro de uma sociedade,
então a sociologia não teria objeto próprio e seria confundida com outras ciências, uma
vez que todo ser humano repete atividades comuns como comer, dormir e beber. Dessa
forma, é apresentada a ideia de que há, dentro das sociedades, fenômenos que se
distinguem dos demais já estudados por outras ciências. Todos os dias cumprimos
deveres que estão definidos independente de nós, como deveres para com nossas
famílias e amigos. Mesmo que concordemos com eles, ainda sim foram passados para
nós através da educação, sendo exteriores ao indivíduo. Também são exteriores
situações como a língua de que me utilizo para me comunicar ou a moeda que uso para
pagar as minhas contas, uma vez que somos coagidos a falar a mesma língua e utilizar a
mesma moeda para que possamos viver em sociedade. Essa coerção não é sentida
quando não me oponho a ela, mas pode ser mais violenta e perceptível caso eu me
negue a aceitá-la. (DURKHEIM, 1894, p. 02)

Dessa forma, Durkheim define como fato social e, sendo assim, objeto de estudo
das ciências sociais, as “maneiras de agir, de pensar e de sentir, exteriores ao indivíduo,
e que são dotadas de um poder de coerção em virtude do qual esses fatos se impõem a
ele” (DURKHEIM, 1894, p. 02). Dessa forma, Durkheim ainda define que, existindo os
fatos sociais, o indivíduo não mais existe de forma autônoma, mas boa parte de sua
existência é fruto da coerção que a sociedade exerce sobre ele, lhe atribuindo ações e
características de origem externa. Exemplo disso é a educação dada às crianças: desde
sempre elas são ensinadas a ver, sentir e agir de determinada forma; são forçadas a
obedecer, ser empáticas e educadas; lhes dizem como se come, o horário que se dorme e
como se fala. Essa coerção, com o tempo, cessa de ser sentida e passa a ser hábito, mas
ainda existem (DURKHEIM, 1894, p. 06). Entretanto, é importante situar que o fato
social não é um pensamento ou um movimento comum a todas as consciências
particulares, mas sim práticas, crenças do grupo que são coletivas. (DURKHEIM, 1894,
p. 07).

Durkheim estabelece situações como a natalidade, o casamento e o suicídio


como, claramente, fatos sociais, uma vez que, por mais que possam ser confundidos
como situações internas ao indivíduo, são representadas com exatidão por pesquisas e
estatísticas que compreendem todos os casos particulares, neutralizando todo tipo de
individualidade supostamente presente em cada um. Entretanto, o sociólogo não nega
que cada uma delas depende ainda de uma constituição orgânica-psíquica do indivíduo.
Sendo assim, não são apenas fenômenos sociológicos, mas podemos considera-las
situações sociopsíquicas (DURKHEIM, 1894, p. 09). Portanto, “É fato social toda
maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção
exterior; ou ainda, toda maneira de fazer que é geral na extensão de uma sociedade dada
e, ao mesmo tempo, possui uma existência própria, independente de suas manifestações
individuais.” (DURKHEIM, 1894, p. 13).

Para Durkheim, a primeira regra relativa à observação dos fatos sociais é


considerar estes últimos como coisas. Segundo o autor, a reflexão é anterior à ciência
uma vez que o homem cria opiniões à cerca de tudo que o cerca. Sendo assim, é natural
que a realidade das coisas seja substituída por especulações. Ao invés de observar e
analisar as coisas, nós tomamos consciência de nossas ideias, de analisa-las e combiná-
las. Ora, isso não passa de uma análise ideológica que entende os fatos como ator
secundarista que so intervêm como exemplos ou confirmação. (DURKHEIM, 1894, p,
16). Para Bacon, essa pré-noção criada por nós são os idola, “fantasmas que nos
desfiguram o verdadeiro aspecto das coisas e que, no entanto, tomamos como as coisas
mesmas” (DURKHEIM, 1894, p. 18). A questão é que o homem não esperou a criação
ou a descoberta das ciências sociais para especular sobre as coisas que era seu objeto de
estudo, uma vez que não podiam viver sem pensar sobre tais. Dessa forma, é
especialmente na sociologia que os idola estão em situação de dominar o lugar das
coisas. (DURKHEIM, 1894, p. 18)

É verdade que as coisas sociais podem ser confundidas como ideias, inatas ou
não, uma vez que só existem através dos homens e, sendo ideias, não podem ser
consideradas objeto de estudo de uma ciência. Entretanto, se nos opusermos aos fatos
sociais, às coisas sociais, sentiremos sua resistência. Ora, algo que resiste à nossa
oposição é, necessariamente, algo real. Dessa forma, podemos ver nas coisas sociais a
realidade social. (DURKHEIM, 1894, p. 19).

Durkheim ainda cita que Comte proclamou os fenômenos sociais como fatos
naturais, reconhecendo, implicitamente, o caráter de coisas. Entretanto, ele ainda
utilizava como objeto de seu estudo ideias. Comte toma como elemento principal de sua
sociologia o progresso da humanidade, o evolucionismo humano. Contudo, a realidade
da evolução só pode ser estabelecida uma vez que seja feita a ciência; dessa forma, só
pode fazer do evolucionismo objeto de estudo se adotá-lo como ideia, não como coisa.
Durkheim também defende que não existe o progresso da humanidade, mas sim
sociedades particulares que existem independentes de outras. (DURKHEIM, 1894, p.
21). Diferente de Comte, Spencer toma como objeto de sua ciência as sociedades. Ele
toma como pré-noção que uma sociedade só existe quando existe a cooperação de
indivíduos e que pode ser dividida em duas classes: as militares e as industriais.
Entretanto, não tem como embasar cientificamente a ideia de Spencer tem de sociedade.
Apenas se mostrarmos que todas as existências coletivas são formas de cooperação
humana é que o objeto de estudo de Spencer seria, então, uma coisa. (DURKHEIM,
1894, p. 22)

Sendo assim, como Spencer e Comte não tinham embasamento científico


naquilo que adotavam como objeto de estudo, também nós não podemos usar palavras
das quais não sabemos exatamente o significado. Durkheim aponta como exemplo de
tais termos o Estado, a liberdade política, a democracia, o socialismo, o comunismo e
etc, palavras comumente utilizadas por sociólogos e cujo método apresentado por
Durkheim apresenta como termos difusos e confusos, inexatos na cabeça de quem os
escutam. (DURKHEIM, 1894, p. 23).

Ora, se para ser objeto de estudo científico precisa ser uma coisa e se os
fenômenos sociais são, na perspectiva de Durkheim, objeto das ciências sociais, uma
vez já discutida sua realidade, os fenômenos sociais, portanto, são coisas e assim devem
ser tratados. Para fortalecer esse argumento, Durkheim classifica os fenômenos sociais
como sendo o único datum oferecido ao sociólogo. Na sequência, classifica como coisa
tudo que se impõe a observação, tudo que é dado. Nessa linha lógica de pensamento,
então, os fenômenos são tratados como coisas uma vez que são tratados como a data
que constitui o ponto de partida da ciência social. É preciso, portanto, estudar os
fenômenos sociais de fora, independente dos sujeitos aos quais estão concebidos.
(DURKHEIM, 1985, p. 28) Mesmo que não tenham, ao final do estudo, caráter de
coisas, devem ser, primeiramente, tratados como se o tivessem, regra esta que pode ser
aplicada à toda realidade social, sem exceções. Segundo Durkheim, o que já foi dito
sobre fato social é o suficiente para comprovar a validade dessa objetividade aplicada a
ele. Se reconhece como coisa tudo aquilo que não pode ser modificado por vontade,
para mudar essa coisa é necessário um esforço devido à resistência que ela oferece a ser
vencida. O fato social, como já visto, oferece tal resistência, uma vez que há uma
coerção que o molda de tal ou qual forma. Dessa forma, considerar fenômenos sociais
coisas é nos conformarmos à sua natureza. (DURKHEIM, 1985, p. 29)

Durkheim, por fim, apresenta três regras principais que devem ser seguidas em
um estudo sociológico. Em primeiro lugar, “é preciso descartar sistematicamente todas
as prenoções” (DURKHEIM, 1894, p. 32), ou seja, o sociólogo precisa fazer o árduo
trabalho de se livrar de tudo que construiu sobre um objeto antes de estudá-lo
cientificamente. Em segundo lugar, o sociólogo precisa “jamais tomar por objeto de
pesquisas senão um grupo de fenômenos previamente definidos por certos caracteres
exteriores que lhes são comuns, e compreender na mesma pesquisa todos os que
correspondem a essa definição.” (DURKHEIM, 1894, p. 36), além disso, Durkheim
apresenta a ideia de que para a sociologia ser objetiva como reivindica em sua segunda
regra, é necessário que ela parta de sensações, que primeiro o sociólogo reconheça um
objeto artificialmente para, então, aprofundar seus estudos de modo científico
(DURKHEIM, 1985, p. 44). Por último, a terceira regra é baseada na ideia de que
“quando, portanto, o sociólogo empreende e explora uma ordem qualquer de fatos
sociais, ele deve esforçar-se em considerá-los por um lado em que estes de apresentem
isolados de suas manifestações individuais.” (DURKHEIM, 1894, p. 46).

Concluindo, Durkheim faz uma sistematização de todas as características de seu


método, apresentando-o como independente da filosofia, objetivo e, por fim,
exclusivamente sociológico. Ao fim desse livro, portanto, Durkheim dá à sociologia um
papel indispensável, uma vez que lhe atribui um objeto único e lhe legitima enquanto
ciência. Na minha opinião, a ideia de Durkheim à cerca de fatos sociais serem coisas e,
consequentemente, à cerca da objetividade das ciências sociais está correta. É inegável
que somos influenciados por fenômenos criados pelos homens ao decorrer de sua
existência e que, agora, existem fora deles e, além disso, é inegável que a coerção social
é uma coisa, uma realidade. Ora, se me oponho a me comunicar usando a fala, grande
parte das pessoas deixarão de me entender e eu, consequentemente, terei muitas
dificuldades que agora desconheço. Portanto, como classificado pelo sociólogo, fatos
sociais são coisas uma vez que existem de forma exterior ao indivíduo e apresentam
certa resistência para serem modificados ou ignorados.

REFERÊNCIA:

DURKHEIM, Émile. 1995. As regras do método sociológico. (Trad. Paulo Neves) São
Paulo: Martins Fontes [1894]

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