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Síntese do livro “O que faz o brasil, Brasil?” , R.

da Matta

Estamos diante de um livro que dá gosto de se ler, a


cada página uma nova descoberta, uma nova peculiaridade
que nos faz entender porque o brasileiro é o que é. Cada
capítulo é uma viagem deliciosa em direção ao
autoconhecimento de nossas características tão peculiares e
particulares, complexas, contraditórias e complementares, que
nos definem tão bem.

Em determinado ponto do livro Roberto Da Matta fala


sobre a memória, de como ela é seleti va, de como nos
lembramos com gosto de tudo aquilo que nos faz feliz, mas
também recordamos de experiências ruins, e outras memórias
caem no esquecimento para nunca mais voltar. Essa
dualidade se faz presente em nossa realidade, alternamos
momentos das qua is esquecemos tudo o que foi vivido, mas
que simplesmente se vai e fica distantemente sepultado no
passado; com aquilo que nos toca, nos marca, que nos traz
saudade e fica guardado na memória, é o tempo lembrado. (p.
45)

O autor destaca algumas particulari dades de uma


sociedade protestante e o quanto essa influencia uma nação,
embora sejamos um país com maioria católica, o
protestantismo faz parte de nossa história. Racionalidade e
previsibilidade das rotinas produtivas vistas em sociedades
industrializadas fazem com que o trabalho seja visto como
castigo, dor, dureza, “batalha” e os momentos de lazer como
sinônimo de festa, alegria, descontração. O trabalho fica bem
distante do lar, porque o local da labuta é o espaço onde tudo
é calculado para que a produção continue a aumentar e a
máquina continue a funcionar, é o espaço para controle das
emoções, é a rotina que fica esquecida da memória. Da
segurança, do controle do ambiente de trabalho depende toda
a economia e da estabilidade do nosso sistema.

Outra contribuição do protestantismo é a compreensão


de que todos são iguais perante a lei. Numa sociedade
capitalista cada um é por si, um individualismo exacerbado se
apresenta em um “pega pra capar” em que cada um quer
conquistar profissionalmente “seu lugar ao sol”, cada um
almeja “se dar bem” no mercado de trabalho. O indivíduo
prevalece sobre o todo, as relações de solidariedade
inexistem e cada pessoa pode disponibilizar sua força de
trabalho em troca de capital num mercado extremamente
competitivo de homens livres, “mercado esse que desvincula
moralmente quem oferece de quem faz o trabalho.” (p. 30)

O brasileiro também se relaciona com o sagrado de


forma ambígua; na religião bem como em todas outras áreas
abordadas por Da Matta em seu livro, existe o contradi tório,
mas este nunca exclui totalmente as outras possibilidades. O
que em outros países é descartado ou visto com indiferença e
suspeita, aqui é amplamente aceito e um meio para que haja
uma expansão das possibilidades religiosas e das
experiências com o divino se tornar cada vez mais intensas e
pessoais. Nosso sincretismo religioso abarca todas as
expressões de relações íntimas transcendentais entre as
pessoas que habitam esse mundo “de dores” concreto com as
mais diversas variedades de se comunicar com o “mundo
ideal”, aquele que não mais terá dor nem sofrimento para
todos.

Vida de gado, de um povo marcado, mas feliz, diria o


poeta Zé Ramalho. O milagre da religiosidade brasileira é
conviver perfeitamente entre a religião oficial católica e as
demais “ilegítimas”; é não excluir em nenhuma hipótese todas
as formas de religiosidade, todas são legítimas, afinal de
contas “todos os caminhos levam a Deus”. Tanto no natural
quanto no sobrenatural, nada é impossível para o brasileiro.

Uma sociedade tão desigual, tão divida em suas


diferenças sociais , mas que ao mesmo tempo é constituída de
pessoas que se relacionam o temp o todo, apesar de suas
diferenças.

Ouso afirmar que esta é uma obra que fica registrada na


existência de qualquer pessoa que tem a oportunidade d e com
ela se relacionar. Sim, porque é impossível só ler esse livro,
qualquer brasileiro se identifica e interage com os assuntos
abordados de forma fascinante e embasad os em estudos
antropológicos de quem é autoridade e referência nessa
ciência social.

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