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FLC0114 - Introdução ao Estudo da Língua Portuguesa I (Maria

Clara, 2019, 21:00)


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II. Formação histórica da língua portuguesa


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1. Formação do português no espaço 'românico'


 

Preparação
Textos fundamentais - sequência sugerida de leitura:
1. Ilari e Basso (2009), Capítulo 1 (parcial) [p. 13-21]
2. Teyssier (2014[1982]), Capítulo 1 [p. 6-19]
3. Castro (2004), Capítulo II [p. 53-81]

Textos complementares pertinentes:


Castro (1991), Capítulo 3 [p. 66-161]
Ilari (1992)

Além do texto complementar acima, segue válida a sugestão do material de apoio de leitura (manuais de
fonética).

Anotações
Textos citados nas anotações a seguir:

Castro, Ivo. Introdução à História do Português. Lisboa: Edições Colibri, 2004. 2a ed, 2006.
Ilari, Rodolfo. Lingüística Românica. São Paulo: Ática, 1992.
Eliot, Simon ; Rose, Jonathan (Eds.). A Companion to the histroy of the book. Oxford : Balckwell, 2007.
Maurer Jr, Teodoro. A Unidade da România Ocidental. São Paulo: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, Universidade de São Paulo, 1952.
Teyssier P. História da língua portuguesa; 2014[1982]. 

1.1 Noção de Romania


Mapa: Domínios romanos em 300dc. Fonte: Projeto Euratlas, “Digital Cartography, Historical GIS Maps and Antique Maps of Europe”,
http://www.euratlas.net/history/europe/300/index.html

Mapa: Línguas românicas modernas - Europa. Fonte: Wikipedia, https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Romance_languages.png

  

1.1.1 Fatores de unidade na ‘România’, durante o império e ao longo da Idade Média


 
“(...) o Império sobreviveu como um ideal de ordem política durante toda a Idade Média; a unidade lingüística e cultural dos territórios romanizados não
impressionou menos os antigos, romanos ou bárbaros. Para denominar esta unidade lingüística e cultural, emprega-se o termo Romania [séc. V].

Romania deriva de romanus, e este foi o termo a que naturalmente recorreram os povos latinizados, para distinguir-se das culturas barbáricas circunstantes:
assim, os habitantes da Dácia, isolados entre os povos eslavos, autodenominaram-se romîni, e os réticos se autodenominaram romauntsch, para distinguir-se dos
povos germânicos que os haviam empurrado contra a vertente norte dos Alpes suíços. 

Sobre romanus formou-se o advérbio romanica, 'à maneira romana', 'segundo o costume romano', e a expressão romanice loqui se fixou para indicar as falas
vulgares de origem latina, em oposição a barbarice loqui, que indicava as línguas não românicas dos bárbaros, e a latine loqui, que se aplicava ao latim culto da
escola. Do advérbio romanice, derivou o substantivo romance, que na origem se aplicava a qualquer composição escrita em uma das línguas vulgares”. (Ilari,
1992:50, meus grifos)

"Falar latim era latine ou romane loqui no latim clássico, mas no fim do Império apareceram as expressões romanice parabolare e romanice fabulare, 'falar
à moda de Roma, nem exactamente em latim nem em língua de bárbaros'. Isso corresponde à situação de transição que se viveu na Europa Ocidental no período
que medeia entre o Império e os estados medievais. Quando estes se constituíram e adquiriram nomes próprios, a designação geral de România foi perdendo parte
da sua razão de ser". (Castro 2006:54, meus grifos)

Fatores da manutenção do Latim na porção centro-ocidental do antigo império

1) O Latim como língua de escrita


2) O cristianismo como fator de união cultural
3) Os “Estados Bárbaros”: “Reinos Romanos”

“Manuscript culture persisted in its essentials across the whole medieval millennium from 500 to 1500: the use of
parchment, the privileging of the clergy, the use of the Latin language and of Latin alphabetical script (even for
writing vernacular languages), the practice of illumination, the form of the codex itself – all these features persisted,
though in varied forms”. (Clanchy, In Eliot e Rose, 2007:194, meus grifos)

Imagem: Full-page miniature of St Dunstan at work, from Smaragdus of St Mihiel’s Expositio in Reglam S
Benedicti, England (Canterbury), c. 1170 – c. 1180, Royal MS 10 A XIII, f. 2v – Fonte:
http://britishlibrary.typepad.co.uk/digitisedmanuscripts/2014/06/the-burden-of-writing-scribes-in-medieval-
manuscripts.html

A unidade lingüística da România para além da cultura de escrita: o “Latim Vulgar”

- Modalidade do Latim (Sócio-dialetal)?


- Estágio Histórico do Latim ?

 “...a grande diferença entre as duas variedades do latim não é cronológica (o latim vulgar não sucede ao latim clássico), nem ligada à escrita, senão social. As duas
variedades refletem duas culturas que conviveram em Roma: de um lado uma sociedade fechada, conservadora e aristocrática, cujo primeiro núcleo seria
constituído pelo patriciado; de outro, uma classe social aberta a todas as influências, sempre acrescida de elementos alienígenas, a partir do primitivo núcleo da
plebe”. (Ilari, 1992:61, meus grifos)
Cucuta a rationibus Neronis Augusti
O ministro das finanças de Nero Augusto é o veneno

Imagem: Grafiti em muro de Pompéia. Fonte: FUNARI, P. Paulo. A vida quotidiana na Roma Antiga. Editora Annablume, 2003.

Em contraste: fatores da não-manutenção do Latim em porções do antigo Império

(cf. Ilari, 1992):

- Romanização Superficial (Germânia, Britânia, Caledônia)


- ‘Superioridade Cultural’ dos Vencidos (Grécia, Mediterrâneo Oriental)
- Superposição Maciça de Populações não-Românicas (África, Península Ibérica)

1.1.2 Fatores de diversificação do ‘Romance’, durante o império e ao longo da Idade Média


 

“É comum entre os romanistas admitir que à relativa uniformidade que o latim apresentou durante o período imperial foi-se substituindo no período românico uma
forte tendência à diversificação regional.

 Como resultado dessa tendência, no final do primeiro milênio, a România apresentava-se fragmentada numa quantidade de dialetos de origem latina e foi nesse
panorama de diversificação que, em seguida, alguns dialetos, projetados pelo prestígio político, econômico ou cultural da região em que eram falados,
se impuseram aos dialetos vizinhos, transformando-se com o tempo em línguas nacionais.

 Como se explica a dialetação do latim vulgar? Em termos muito gerais, vale a explicação de que a variação no tempo e no espaço é inerente à língua, a qual é
parecida sob esse aspecto com as demais instituições sociais. Premidos pela necessidade de tornar sua fala mais exata ou mais expressiva, os falantes criam o
tempo todo palavras e construções sintáticas novas com os materiais disponíveis em sua própria língua; mudanças fônicas surgem pelas tensões paradigmáticás
que ocõrrem no interior do sistema e pelas tensões sintagmáticas que ocorrem entre sons contíguos na fala; em grau menor, alterações de todo tipo podem resultar
de fatores “ externos” , isto é, do contacto entre línguas diferentes.” (Ilari, 1982:135, meus grifos)

“Fatores externos”: as noções de ‘substrato’ e ‘superstrato’

Línguas de 'substrato', na romanística, são as línguas (autóctones ou não) faladas nas diferentes partes do império romano antes da romanização, e que
são abandonadas em favor do latim.

Península Itálica e Umbro, Osco Indo-Europeu (r. Itálico)


Ilhas:
Grego, Celta Indo-Europeu (r. Ilírico)

Etrusco, Lígure Não Indo-Eupropéias

Fenício (Ilhas) Semita

Províncias Ibero Não Indo-Europeu


Ocidentais
Vascão Não Indo-Europeu
ex. Ibéria:
Celtibero Indo-Europeu

 
Línguas de 'superstrato', na romanística, são as línguas originalmente faladas pelos diferentes povos que passam a habitar as diferentes partes do império
romano depois do fim da unidade política romana, mas que não se estabelecem nessas partes como 'línguas-alvo'.

Mapa: A Europa em 400dc. Fonte: Projeto Euratlas, “Digital Cartography, Historical GIS Maps and Antique Maps of Europe”,
http://www.euratlas.net/history/europe/300/index.html

1.1.3 Dos "Romances" às "Línguas Românicas"


 

 
1.1.3 Mas nem tudo é o que parece...

A "Fragmentação" do Antigo Império Romano e a "Unidade da România Ocidental"


Teodoro Maurer Jr. A Unidade da România Ocidental,1952.

 
"[A] notável semelhança das línguas românicas do Ocidente - desde Portugal até a Itália - não se deve apenas à sua origem comum no latim vulgar do Império
Romano, como tantas vezes se parece acreditar, mas é o resultado de uma unidade contínua de contacto ininterrupto entre todas as línguas da família, de
modo que muitas inovações posteriores à destruição do Império pela invasão dos bárbaros se disseminaram por toda a România Ocidental, enriquecendo o seu
léxico e alterando a cultura e, às vezes, a própria morfologia das línguas que a constituem" (Maurer Jr., 1952:9, meu grifo)

"A unidade da România Ocidental é uma ilustração magnífica da importância dos fatores sociais na formação das línguas" (Maurer Jr., 1952:10, meu
grifo)

 
1.1.4 Cronologias: do latim às línguas românicas
 

A partir de Maurer Jr., 1952

A partir de Ilari, 1992

(i. Adaptação do Quadro em Ilari, 1992:64 [*])

1.2 Romanização da Península Ibérica

1.2.1 O período pré-românico


(Ou: a questão dos subs
substratos)
Figura: Povos e línguas pré-românicas na Península Ibérica (200 ac). Fonte: da Silva, Luís Fraga, 2004; Associação Campo Arqueológico de
Tavira, http://geohistorica.net/arkeotavira.com//Mapas/Iberia/Populi.htm

Figura: A Península Ibérica em 400dc. Fonte: Projeto Euratlas, “Digital Cartography, Historical GIS Maps and Antique Maps of
Europe”, http://www.euratlas.net/history/europe

1.2.2 Etapas da romanização e o contraste norte(noroeste)/sul(sudeste)


"Os romanos desembarcam na Península no ano 218 a.C. A sua chegada constitui um dos episódios da Segunda Guerra Púnica. Dão cabo dos cartagineses no ano
de 209 e empreendem, então, a conquista do país. Todos os povos da Península, com exceção dos bascos, adotam o latim como língua e, mais tarde, todos
abraçarão o cristianismo. (…)
A Península é inicialmente dividida em duas províncias (ver mapa 1), a Hispânia Citerior (a região nordeste) e a Hispânia Ulterior (a região sudoeste). No ano 27
a.C., Augusto divide a Hispânia Ulterior em duas províncias: a Lusitânia, ao norte do Guadiana, e a Bética, ao sul. Posteriormente, entre 7 a.C. e 2 a.C., a parte da
Lusitânia situada ao norte do Douro, chamada Gallaecia, é anexada à província tarraconense (a antiga Hispânia Citerior). Cada província subdivide-se num
determinado número de circunscrições judiciárias chamadas conventus. (...)

Nesse território, assim definido, a romanização fez-se de maneira mais rápida e completa no Sul do que no Norte. Os gallaeci, em particular, que
habitavam a zona mais setentrional, se comparados aos outros povos, conservaram por mais tempo elementos da sua própria cultura.

(Teyssier, 1982, meus grifos)

Figura: Divisões administrativas romanas da Hispania, 220ac-19dc. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Conquista_Hispania-pt.svg

1.2.3 O processo de "desromanização" (?) da Península


(Ou: a questão dos superstratos)

"Em 409, invasores germânicos — vândalos, suevos e alanos — afluem ao sul dos Pireneus, seguidos, mais tarde, pelos visigodos. Assim começa um dos períodos
mais obscuros da história peninsular, que terminará em 711, com a invasão muçulmana. Os alanos foram rapidamente aniquilados. Os vândalos passaram para a
África do Norte. Os suevos, em compensação, conseguiram implantar-se e, por muito tempo, resistiram aos visigodos, que tentavam reunificar a Península a seu
favor. No século V o reino suevo era muito extenso, mas por volta de 570 reduziu-se à Gallaecia e aos dois bispados lusitanos de Viseu e Conímbriga. Em 585, esse
território foi conquistado pelos visigodos e incorporado ao seu Estado". (Teyssier, 1980, meus grifos)

Figura: A Península Ibérica em 500dc. Fonte: Projeto Euratlas, “Digital Cartography, Historical GIS Maps and Antique Maps of
Europe”, http://www.euratlas.net/history/europe
Figura: A Península Ibérica em 800dc. Fonte: Projeto Euratlas, “Digital Cartography, Historical GIS Maps and Antique Maps of
Europe”, http://www.euratlas.net/history/europe

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