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ACONSELHAMENTO
PAC 413 / PPR 406
.
Wadislau Martins Gomes.
Outubro, 2009
2
OBJETIVO
O objetivo geral da matéria é familiarizar o aluno com a idéia da mensagem redentiva, no
sentido de aplicar os conceitos bíblicos de como lidar com os percalços da presente vida, à
pregação. O objetivo específico é fornecer ao aluno uma linha de pensamento que lhe
possibilite aprofundar e ampliar o conceito de pregação para aconselhamento.
REQUISITOS E AVALIAÇÃO
A avaliação não visa coibir o aluno, mas, sim, fornecer parâmetros para melhor
aproveitamento da matéria, fixação do aprendizado e justa recompensa pelo bom esforço. A
avaliação leva em conta:
• Freqüência regular às aulas segundo o padrão da escola.
• Participação adequada e pertinente nas aberturas para discussão com o instrutor e
com os colegas, buscando compreensão ou demonstrando entendimento da matéria
dada. (Valor: 20 por cento da gradação final.)
• Leituras de, pelo menos, 900 páginas (PAC 413) e 1200 páginas (PPR 406),
selecionadas entre as obras recomendadas. A leitura de 1200 páginas (PAC 413) ou
1800 páginas (PPR 406) acrescenta, respectivamente, 1 ponto na nota final. A
declaração de leitura deverá ser entregue até três meses depois da finalização do
módulo. (Valor: 30 por cento da gradação final.)
• Esboço detalhado e sermão escrito, abordando um problema, causas e solução
bíblica, com cerca de 15 páginas (PAC 413) ou 20 (PPR 406) a ser entregue até três
meses depois da conclusão do módulo.
LEITURA RECOMENDADA:
CONTEÚDO
Introdução
A Pregação e culto
Evangelismo implosivo
Quatro tipos de evangelismo
Evangelização implosiva
O modelo redentivo
INTRODUÇÃO
Em meu livro, Aconselhamento Redentivo, escrevi que “o aconselhamento
cristão não deveria ser considerado como uma especialidade separada do aspecto
pastoral e da comunhão cristã na igreja. Para o pastor, as habilidades para o
aconselhamento são tanto parte do preparo e da entrega de sermões quanto da
prontidão para responder aos ouvintes após a mensagem. É preciso que o pastor seja
hábil interprete da Palavra e hábil interprete de pessoas, se ele quiser ser efetivo no
ministério”.1 Creio que este é um bom começo nosso estudo sobre pregação e
aconselhamento pastoral.
Homilética
Para ilustrar o que quero dizer por “perspectivas particulares”, veja, por
exemplo, a questão de tipos de sermões. Para fins didáticos, é costume dividir os
tipos de sermões em categorias: textuais, tópicos e expositivos. O problema é que
professores e alunos passaram a considerar tais divisões didáticas como sendo
categorias estanques e preferenciais. A esse respeito, levanto algumas questões. Um
sermão poderá ser tópico sem considerar textos específicos? Poderá ser textual sem
considerar tópicos relacionados? E poderá ser expositivo sem levar em conta o texto
e os tópicos relacionados?
Jay E. Adams, cuja formação em pregação e em aconselhamento o autorizam
a mais do que somente comentar, escreve:
Por muito tempo temos recebido a informação de que há três tipos de pregação:
expositiva, tópica (ou doutrinária) e textual. Mais do que indicadores de ênfases, tais
distinções são ingenuidades sem sentido e servem mais para criar confusões que
causam mais mal do que bem. Em toda boa pregação, essas três perspectivas jamais
poderão ser separadas; somente em pregações pobres você encontrará tais
separações. Por exemplo, “pregadores expositivos” fracos acham que a exposição
implica meros comentários sobre uma passagem da Escritura durante um período de
tempo, cobrindo um número de áreas com aplicações interpessoais, e concluindo
quanto o relógio avisa que terminou o tempo. “Pregadores tópicos” fracos tomam um
tópico ou tema à parte da Escritura (ou usando a Escritura como pano de fundo), e
1
Wadislau Martins Gomes, Aconselhamento Redentivo (São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2004), 8.
Teologia
Igualmente, quando falamos sobre teologia, saímos com uma carta da manga e
exclamamos conspicuamente: “Prefiro teologia bíblica à teologia sistemática”. A meu ver, a
Bíblia é a base proposicional da tarefa do pregador, a teologia bíblica é seu método
organizacional, e a teologia sistemática, seu plano funcional de abstração prática. O que é
que eu quis dizer? Que a Bíblia é a fonte da água viva, a teologia bíblica o vasilhame em
que são guardadas as porções de água, e a teologia sistemática, o ato examinar a água para
servi-la às diversas necessidades.
Richard A. Muller, escrevendo sobre a unidade do discurso teológico, especialmente
sobre objetividade e subjetividade no seu estudo, argumenta que a divisão usual em teologia
bíblica, histórica, sistemática e prática é justificada. “Para afirmar o caso ainda mais
teologicamente”, ele diz, “o princípio escritural da Reforma requer uma distinção inicial
entre teologia bíblica e histórica, enquanto que os mandamentos bíblicos para crer e
obedecer, criam a distinção entre as disciplinas do pensamento e ação, sistema e prática”.
Contudo, se não considerarmos a unidade do discurso teológico, perderemos a relação
conseqüente entre os aspectos do estudo, especialmente da prática final. Muller escreve:
O estudo da teologia, então, através de grande parte da tradição cristã, foi um estudo
do material relevante para a vida da igreja e para a espiritualidade do indivíduo. Mais
do que isso, a meditação sobre o material da teologia era tão espiritual quanto uma
disciplina acadêmica. A disciplina da teologia – de fato, a disciplina do estudo da
teologia – deveria criar na mente dos estudantes uma série de padrões de idéias e
interpretações que podem influência a mente e a vontade, pensamento e ação.5
...não basta ensinar, se você não insta... Pois a doutrina do evangelho é ajudada por
exortações, para que não fique sem efeito... é responsabilidade do embaixador
reforçar com argumentos... Eles [os pregadores] não apenas “oferecem” ...a graça de
Deus, mas se esforçam ...para que ela não seja oferecida em vão.7
Uma exortação não exclui a doutrina... este é o ofício do que ensina: não proferir
palavras de seu próprio pensamento, mas da Escritura...8
Mas sabemos que o uso do ensino é duplo; primeiro, que aqueles que sejam
totalmente ignorantes aprendam os elementos primários, e segundo, que aqueles que
são iniciados, progridam.9
6
Os Guinness e John Seel, org., No Gods But God (Chicago: Moody Press, 1992), 18.
7
João Calvino, Commentaries, Vol. 20, 244.
8
Ibid., Vol. 18, 514.
9
Ibid., Vol. 22, 230.
Deus quer usar sua pregação para mudar as vidas das pessoas [alvo do
aconselhamento]. Entretanto, negligenciando os três fatores: simplicidade,
autoridade e praticidade, você estará retirando o âmago do poder transformador da
palavra pregada. Nós [os ouvintes] somos ovelhas estultas; precisamos de sermões
de estrutura simples. Somos rebeldes, pecadores de surdos ouvidos; precisamos de
mensagens entregues com autoridade. Somos confusos, vagantes; precisamos de
algo que mudem as nossas vidas de maneiras práticas. Oro, pedindo a Deus que nos
dê isto: que a cada Dia do Senhor ele nos alimente com boa comida temperada com
estes três ingredientes.10
...todas essas doutrinas serão diminuídas se a salvação não fosse para sempre. Retire
tal doutrina [perseverança dos salvos], e toda alegria consumada, confiança.
segurança, descanso, conforto e esperança serão significantemente degradados e
justificadamente substituídos por dúvidas, medos, ansiedades e preocupação .... Qual
seria a garantia? .... A bendição de Judas 24.25 responde à questão.13
A Pregação e culto
O apóstolo Paulo, discorrendo sobre a luta pelo poder e o uso da
comunicação, em Coríntios 12-14, encerra a argumentação estabelecendo ligação
entre a evangelização e o aconselhamento. De uma maneira clara, ele apresenta uma
ligação entre tal pregação e o próprio culto: “Porém, se todos profetizarem, e entrar
algum incrédulo ou indouto, é ele por todos convencido e por todos julgado;
tornam-se-lhe manifestos os segredos do coração, e, assim, prostrando-se com a
face em terra, adorará a Deus, testemunhando que Deus está, de fato, no meio de
vós” (1 Co 14.24-25).
A fim de entender a dinâmica da pregação para aconselhamento para
edificação da igreja, será preciso ter uma visão geral do aconselhamento para
evangelização. Tal é o caso da proposta de um evangelismo implosivo.
Evangelismo implosivo
Suponha que você esteja voltando de um estudo bíblico sobre evangelização,
sentindo-se desafiado a falar do evangelho à primeira que pessoa que dê tal
oportunidade. Num banco de praça perto de sua casa, um vizinho, professor de
ciências do grupo escolar do bairro, cumprimenta-o e, gentil, convida-o a sentar. Ao
lado, um raro pau-brasil domina a área; um cão pequinês fareja um rato no gramado
úmido; o ambiente está pleno de claridade e calor amainado pelo pela brisa.
Deixe fazer uma pergunta daquelas que a gente fica olhando com ar de quem
não se localizou ainda: Qual seria o ponto de contacto entre você e seu vizinho, que
lhe permitira uma conversa evangelizadora efetiva? A árvore, o cão, o sol, o vento?
Como poderia ser, se para o seu vizinho toda a natureza é produto do acaso ao longo
do tempo? Seria você mesmo? Como, ainda, poderia ser, se, além do antagonismo
anticristão (a despeito de toda gentileza) domina o não-cristão? Seria ele mesmo?
Como, também, poderia ser, se ele se encontra perdido? A única resposta seria:
Deus mesmo é o ponto de contacto entre o crente e o incrédulo; e a ausência de
Deus, o ponto de contacto entre o incrédulo e Deus.
De posse desse conceito, há mais uma questão: Como é possível falar de
coisas espirituais a alguém que se encontra morto em delitos e pecados? Como disse
o Senhor Jesus a Nicodemos: “Se, tratando de coisas terrenas, não me credes, como
crereis, se vos falar das celestiais?” (João 3). Falar do evangelho a um incrédulo é
com um estrangeiro sem que os interlocutores falem a língua um do outro.O
pensamento pós-moderno (caracterizado pela ausência de absolutos e de obrigação
moral e pelo conceito de que tudo no mundo é construção linguística), agrava a
situação. Seu vizinho poderá até concordar que você tem o direito de crer como crê,
mas você terá de concordar que ele também tem tal direito. Sequer será
politicamente correto tentar uma aproximação proselitista. O que fazer?
A proposta de um evangelismo implosivo segue o padrão da Grande
Comissão: “Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi
dada no céu e na terra. Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-
os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as
coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à
consumação do século” (Mateus 28.18-20). Em meu livro Em Terras dos Brasis,
ilustrei esse texto, dizendo que, indo, sob a autoridade de Cristo, apontamos para
Jesus andando sobre as águas para que outros o sigam; empurramo-los para que,
além de segui-lo, nadem com ele; e, finalmente, pulamos nas águas junto com eles
para gozar da presença de Jesus. Essa ação envolve realismo com esperança. Não
apontamos para um ideal romântico nem falamos de subir aos céus, mas apontamos
para o Deus conosco e falamos de Cristo em nós.
Evangelização implosiva
Por que implosiva? Estou pensando em uma comunicação efetiva que, para
bem da economia do pensamento, preencha três solicitações:
profundidade e conhecer o amor de Cristo, que excede todo entendimento, para que
sejais tomados de toda a plenitude de Deus. Ora, àquele que é poderoso para fazer
infinitamente mais do que tudo quanto pedimos ou pensamos, conforme o seu poder
que opera em nós, a ele seja a glória, na igreja e em Cristo Jesus, por todas as
gerações, para todo o sempre. Amém!” (Efésios 3.14-21).
Não importando as tendências da mídia nem as “necessidades” relevantes do
povo, a igreja tem de continuar a pregar o que Deus quer e sabe que é o melhor para
nós. Deus sabe o que são estratégias, lucros e perdas e propaganda efetiva. Quando
a nós: “Mas, ainda que venhais a sofrer por causa da justiça, bem-aventurados sois.
Não vos amedronteis, portanto, com as suas ameaças, nem fiqueis alarmados; antes,
santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração, estando sempre preparados para
responder a todo aquele que vos pedir razão da esperança que há em vós, fazendo-o,
todavia, com mansidão e temor, com boa consciência, de modo que, naquilo em que
falam contra vós outros, fiquem envergonhados os que difamam o vosso bom
procedimento em Cristo, porque, se for da vontade de Deus, é melhor que sofrais
por praticardes o que é bom do que praticando o mal” (1 Pedro 3.14-17).
Precisamos compreender – entender, abarcar e abraçar – a certeza de que
Deus levará a cabo seu propósito de proclamar o evangelho por meio de sua igreja,
na unidade fé (não na unidade da programação ou da paz entre os homens, que
inimiga de Deus, o pluralismo teológico). Quando a igreja vivencia a verdade em
amor, a fidelidade à Palavra de Deus, e a sabedoria de Deus em pensamento e em
comportamentos, o mundo vê, o mundo ouve: “para que, pela igreja, a multiforme
sabedoria de Deus se torne conhecida, agora, dos principados e potestades nos
lugares celestiais, segundo o eterno propósito que estabeleceu em Cristo Jesus,
nosso Senhor, pelo qual temos ousadia e acesso com confiança, mediante a fé nele”
(Efésios 3.10-12).
Só assim cumpriremos a tarefa que o Senhor delegou: “Jesus, aproximando-
se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Ide,
portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do
Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho
ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século”
(Mateus 22.18-20).
O aspecto distintivo é que a evangelização implosiva é, ao mesmo tempo,
proclamação das boas novas, aconselhamento e discipulado. É o poder de Deus para
implodir corações, vencer rebeliões, trazer arrependimento às reversões dos
pensamentos, e fé em Deus para abandono de ídolos e paixões – para o reino do
Filho do seu amor.
Introdução
Certamente nossos púlpitos estão precisando de mais referências sobre Nietzsche,
Darwin, Freud, e outros. Criticamente. De fato, os sermões, não raro contêm pensamentos e
até frases, dos pensadores “que regem o mundo a partir do túmulo”,14 sem citação de fonte.
Vêm embrenhados na cultura geral, formativa, da sociedade moderna e pós-moderna − não
só dos pregadores. O fenômeno não é particular da igreja, mas foi “importado” para o novo
mundo cristão como especiarias de consumo para agradar o paladar de um novo tipo de
fome.
A última pulsão histórica do pensamento secular − no bojo dos séculos XVIII e XIX
− trouxe aos portos da cristandade o seu grito de independência e morte. “Deus não pode ser
tocado”, bradaria Kant. “Deus sequer pode ser contatado”, ressoaria Schleiermacher. “Deus
não fala”, diria Wellhausen à meia-voz. “Deus morreu”, afirmaria Nietzsche, peremptório.
“Deus é o mal”, determinaria Freud. Súbito, a igreja viu minguar os peixes de suas praias.
Viu se erguerem ondas de autonomia, espumadas de critica e indução, e da independência
da consciência humana lançando na areia móbil a mornidão de uma religião científica.15
Grande número de pregadores abandonou suas redes em busca de alimentos
sintéticos para as necessidades de uma nova sociedade. Faltos de uma epistemologia bíblica
e de uma metafísica transcendental, não poucos pastores − alimentadores do rebanho, curas
de almas, educadores da fé, e pregadores do evangelho − se encontraram reduzidos da
autoridade da Palavra e desejosos do poder da persuasão. O povo estava ali, mendigando à
porta do templo, esperando o favor de Pedro, porém, com novos olhos, ouvidos, e mente.
Onde a relevância do evangelho? Onde o poder e a autoridade nos céus e na terra? Onde a
experiência religiosa? Certamente, o alimento da Palavra, a água do batismo, e o pão e o
vinho da Ceia eram ainda bons memoriais para a fé e, talvez, até mesmo excelentes
metáforas para as grandes descobertas das psicologias. Estaria aí uma nova bênção de Deus?
Novo composto vitamínico cultural para uma população de baixa renda espiritual?
Armand M. Nicholi, professor da Harvard University, escreveu:
*
Wadislau Martins Gomes, Psicologização do Púlpito e Relevância na Pregação, em Fides Reformata, vol. X,
No. 1, 2005, 11-29.
14
Parte do título do livro de Breese, Dave. Seven Men Who Rule the World from the Grave. Chicago: Moody
Press, 1990.
15
Ver o acurado tratamento que Van Til dá ao assunto. Van Til, Cornelius. In Defense of the Faith: Psichology
of Religion Phillipsburg, N.J.: PRPC, 1971, ps. 1-7.
16
Nicholi, Armand M. The Question of God. New York: Free Press, 2002, p. 2.
17
Nicholi, The Question of God, 183-215.
18
Agostinho, Confissões. I: 1.
19
Welch, Edward. The Journal of Biblical Counseling, “A discussion Among Clergy: Pastoral Counseling
Talks with Secular Psichology”, Vol. 13, Number 2, Winter. 1995.
20
Uma discussão mais extensa da relação entre nomes importantes das psicologias modernas, suas raízes
cristãs e seu anticristianismo, será oferecida em meu livro “Personalidade Centrada em Deus”, em preparo.
referencial da salvação, missões como ponto central da Grande Comissão e não a Palavra de
Cristo, etc. − mas tudo isso é também psicologização).
Welch propõe quatro proposições para a consideração da fé na prática do gabinete e
do púlpito. A primeira é que a cosmovisão cristã é singular. Ela começa e termina com Deus
revelado na Escritura. A segunda é que a cosmovisão cristã bíblica fala com profundidade às
observações da psicologia moderna. A terceira, é que a cosmovisão bíblica fala criticamente
a fenômenos psicológicos sequer tratados nas psicologias seculares. A quarta é que o
mundo, o indivíduo, e a sociedade, não têm sentido fora da cosmovisão cristã.
Para o pregador, a importância de uma cosmovisão bíblica clara − uma hermenêutica
da Palavra para o estabelecimento de uma hermenêutica do mundo − têm razões maiores do
que a relevância da mensagem para o mundo. Na verdade, a simples idéia de que alguém
precise relevar a palavra de Deus − como se ela não fosse mar de bela simplicidade e
profundidade temerosa, voz de tempestade e rumor das águas − é um rebaixamento do seu
valor. A mensagem do evangelho já é relevante! Importante e relevante para atingir o
homem interior e o homem exterior (1 Co 14.24-25).
A grande razão para a construção de uma cosmovisão que reflita o pensamento
segundo os pensamentos de Deus é o próprio púlpito. De modo muito grave, pastores que
procuram a relevância da mensagem para a audiência sem considerar a importância da
Palavra, tornam-se medíocres, posto que “descem ao povo” para alcançar a média cultural.
Na tentativa de proferir mensagens “pop”, acabam sendo superados pela audiência. Neste
mundo “virtual”, homens, mulheres, adultos, jovens, e crianças, vêm às igrejas permeados
de “conhecimentos” filosóficos e psicológicos − mais do que seus pregadores. Novelas,
filmes, desenhos animados, noticiários político e esportivo, programas culturais, tudo tem
forte conteúdo filosófico e psicológico. A característica do “faz-de-conta”, ou mimese, do
teatro é a força da televisão. Na “caixinha”, pastores de sucesso dirigem “cultos” com a
preciosidade exigida pelo marketing moderno. Comédias, dramas e propagandas usam
requintados artifícios e argumentos vindos da cultura acadêmica. É inegável a influência de
autores versados em filosofia e psicologia na TV. Desde conteúdo romântico, realista,
social, do absurdo e outros, às técnicas derivadas das idéias, tudo está ali para ser aprendido
de modo não-formal. O estilo de documentário do “efeito de alienação” (técnicas
antiilusórias mostrando à audiência que ela presencia uma representação da realidade) cria
filósofos e psicólogos caseiros. Vez por outra uma expressão de Nietzsche espoca de
Zaratustra para a novela ou letra de música. Darwin é autoridade sobre a finalidade e o
propósito da vida. Ditos de Freud são contrabandeados para em filmes, novelas, e
propagandas − fora de contexto, analisando menos e formando mais o telespectador passivo.
Nomes influentes se tornam letras minúsculas na mente confusa do sambista: diderot, freud,
brecht, marx, etc.
A fim de alcançar essa audiência com a ajuda cristã, o pregador terá de conhecer o
mal que a acomete e não apenas, repetir o rótulo do problema. Terá de entender no coração a
extensão e profundidade do pecado e a extensão e profundidade da redenção. Por exemplo:
existem “mecanismos de defesa”? Sim, mas sua gênese não é freudiana. Freud os
identificou, como excelente observador do homem pecador, mas prisioneiro desses mesmos
mecanismos de defesa. A Palavra de Deus diz que nossa defesa e ataque se referem
primeiramente ao próprio Deus e, depois, às pessoas (Rm 1.18−2.15). Ela estabelece, de
diferente perspectiva e corrigidos, esses e muitos outros “mecanismos”. O que deve ficar
claro, é que não se trata de cooperação entre psicologia e pregação bíblica, mas de uma
pregação importante para pessoas com problemas relevantes que devem ser tratados de
maneira evangélica, redentiva. “Filhinhos, vós sois de Deus e tendes vencido os falsos
profetas, porque maior é aquele que está em vós do que aquele que está no mundo. Eles
procedem do mundo; por essa razão, falam da parte do mundo, e o mundo os ouve. Nós
somos de Deus; aquele que conhece a Deus nos ouve; aquele que não é da parte de Deus não
nos ouve. Nisto reconhecemos o espírito da verdade e o espírito do erro” (1 Jo 4.4-6).
Linguagem e comunicação
O uso de termos das psicologias na pregação poderá dar a idéia de atualização e
erudição, ou de popularidade quando, principalmente, tais termos pertencem à psicologia
“pop”. Na verdade, pessoas influenciam pessoas e palavras influenciam pessoas.
Primeiramente a Pessoa e a Palavra de Deus e secundariamente pessoas e palavras humanas.
Mais do que nunca, a linguagem adquire hoje uma importância vital. É o coração da
comunicação. O alvo onde miram o pregador e o mundo com as armas da verdade e da
supressão da verdade. Especialmente o mundo pós-moderno muda e valoriza o conceito de
linguagem e expressão − atingindo a própria natureza da epistemologia e da metafísica.
A expressão “pós-modernismo” só poderá ser entendida de modo “pós-moderno”. O
que isso quer dizer? James W. Sire diz que o termo pós-moderno é usado por diferentes
pessoas para caracterizar diferentes facetas da vida cultural e intelectual. Trata-se de um
termo nebuloso que pretende definir não apenas aquilo que é periférico, mas também o
centro de uma cosmovisão − “como se um termo que define uma cosmovisão sem um centro
pudesse ter um centro”.21 O problema do desentendimento do termo reside no fato de que
não foram mudados apenas os termos da cosmovisão, mas a própria hermenêutica.
Sire diz que o termo pós-moderno foi cunhado, inicialmente, para se referir ao
distanciamento arquitetônico entre as formas simples impessoais do traçado moderno e as
formas mais complexas, utilizando motivos do passado, mas sem seu significado original.
Jean-Fraçois Lyotard foi quem primeiro usou o termo como uma mudança de legitimação
cultural, “a incredulidade voltada às metanarrativas”.22 A proposta geral foi a de partir da
descrença quanto à epistemologia e à centralidade metafísica, para uma opção pelo
pluralismo de perspectivas. Criar a verdade por meio da construção da linguagem em função
de propósitos particulares, coloca o aspecto modal da estética no lugar, primeiramente, do
aspecto pístico e, depois, dos aspectos éticos e jurídicos.
O mundo de hoje está imerso nesse pluralismo. O perigo existe sempre que as
perspectivas incorporam pressuposições não-cristãs, as quais, subseqüentemente
condicionam a totalidade da investigação. “Por exemplo, os comportamentistas ou os
teóricos da personalidade talvez presumam que a religião seja apenas um meio humano de
se lidar com o cosmos, e que Deus poderia ser efetivamente eliminado dos estudos.
21
Sire, James W. O Universo ao Lado. S.Paulo: Editorial Press, 2001, p. 214.
22
Lyotard , Jean-Fraçois. The Post-Modern Condition: Report on Knowledge. (Minneapolis: University of
Minissota Press, 1984), 10: xxiv. cit. Ibid., ibid.
Comunicação da Palavra
Muitos dos nossos ouvintes estão nos bancos da igreja para apreciar a estética do
culto, e às vezes, do sermão (mais ou menos por trinta minutos), ou para entregar a vida a
uma narrativa de entusiasmo ou de sucesso. Para eles, o passado não é fixo, mas poderá ser
mudado por perspectivas criadas à luz do presente. O profeta é um historiador com poderes
para recriar o passado e criar o futuro. Sua linguagem é compreendida porque suas
perspectivas, seus termos e suas imagens são adequados à mentalidade moderna. Por que?
Porque os púlpitos já compraram a idéia do horário nobre, da linguagem “religiosa” secular,
usadas nos filmes, nas novelas e nas propagandas. O ensino bíblico foi substituído pela
educação nas escolas públicas e particulares sem a crítica necessária da luz da Palavra de
Deus.
23
Poythress, Vernon S. Symphonic Theology: the Validity of Multiple Perspectives in Theology. Grand
Rapids: Academic Books/Zondervan, 1987, ps. 12-13.
24
Cf. Kalsbeek L. Contours of a Christian Philosophy: An introduction to Herman Dooyeweerd´s thought.
Org. por Bernard e Josina Zylstra. Toronto: Wedge Publishing Foundation, 1975, ps. 95-103.
Qual o significado secular de termos tais como Deus, verdade, redenção, fé, amor,
esperança, e espiritualidade? Seriam os significados bíblico-teológicos? Ou seriam os de
algo superior, de livramento da opressão, de intuição ou salto místico, de sentimento de
bem-estar exigente e solitário, de boa-fortuna ou desejo ardente, de controle sobre o
invisível e sobre o futuro? Na verdade, uma nova religião prega um novo controle
desordenado, uma nova presença etérea e uma nova autoridade incerta em vez de pregar os
antigos e sempre novos princípios do controle, presença e autoridade de Deus.
Além disso, a troca de referencial da linguagem, do ponto focal (Deus) para o ponto
subsidiário (homem), aumenta o abismo entre a pregação das verdades bíblicas e a
compreensão popular. Não apenas os ouvintes, mas, até mesmo, muitos pregadores, adotam
as novas conotações dos termos e a troca do referencial. O novo pensamento passa a ser
coram omnibus em vez de coram Deo, como é o caso das diversas “teologias” naturalistas
ou antropocêntricas (Deus considerado do ponto de vista do homem: teologia do pobre, do
oprimido, da mulher, da prosperidade, do sucesso, do crescimento da igreja, do processo
etc.) O poder se desloca da graça para a fé, do Deus que responde a oração para a própria
oração, e do propósito final de glorificar a Deus para o gozo que deveria ser conseqüencial.
Keller prossegue dizendo que poucas pessoas estão cônscias e são consistentes em
seu secularismo. O pregador cristão, especialmente, deveria manter em mente que há uma
25
Keller Timothy, Journal of Bíblical Counseling, “Preaching to the Secular Mind”. Laverock, Penn.: CCEF.
Vol. 1, N.o 1, 1995, ps. 54-64.
26
Ibid., p. 54.
27
Ibid., ps. 55-56.
28
Ibid., p. 57.
29
Para um tratamento completo do assunto, ver Edgar, William. Razões do Coração. Brasília: Refúgio, 2001.
30
Guinness, Os & Seel, John. No Gods But God. Chicago: Moody Press, 1992, ps. 9-10.
quanto de indivíduos e grupos. Como isso nos afeta no século XXI? O (pós)modernismo
representa os pensamentos descendentes/dissidentes do modernismo. A nova hermenêutica,
o deslocamento do foco das palavras e dos conceitos produzindo novos significados, e a
ausência de elementos críticos em função do pluralismo, requerem uma adaptação na
comunicação evangélica.
Vern S. Poythress, em God Centered Biblical Interpretation,31 propõe uma base
hermenêutica de unidade e diversidade, segundo o arquétipo trinitariano, para a pregação
hoje. A Palavra de Deus tem muitos propósitos e muitas funções (2 Tm 3.16). Contudo, o
propósito de Deus para revelar sua Palavra é único: revelar a si mesmo. Há muitos
propósitos numa só unidade interna e externa. A pregação expositiva deverá ter essa base: a
exposição da revelação de Deus sobre si mesmo. Tomando o texto de João 17, Poythress
trata sobre a exposição da verdade.
João 17 fala da obra de Deus e da sua Palavra. A Bíblia inicia revelando a Deus em
sua obra e prossegue confirmando essa obra (Gn 1.1; Jo 5.17). Isso não quer dizer que toda
pregação deverá conter uma menção desse fato, mas que deverá estar, primeiro, baseada no
fato de que Deus está no controle. Qualquer outro ponto de controle que não seja Deus e sua
graça como revelado na Escritura será manifestação de idolatria. Nada há nem na terra nem
nos céus que tenha esse controle, quer seja nome quer seja doutrina quer seja esforço
humano. A Bíblia fala da obra do Pai, da Obra do Filho e da obra do Espírito Santo.
A Palavra de Deus envolve dar e receber a verdade. Essa verdade é pessoal − Jesus
Cristo! Quem vê Jesus vê o Pai em ação! Tal verdade tem significado e é comunicada para o
conhecimento. Novamente, nem toda mensagem deverá citar isso, mas toda mensagem
bíblica se baseia nesse fato. Deus fala e o homem ouve. Deus nos falou de muitas maneiras e
hoje nos fala por meio da sua Palavra, e especialmente pelo Filho encarnado. Os ouvintes da
pregação evangélica deverão ouvir que Jesus é Deus e que suas palavras são espírito e vida.
Não será a experiência religiosa nem a mensagem que lhes falará ao espírito, mas o Espírito
de Jesus de Nazaré.
Deus está presente por meio da habitação do Espírito Santo. A Palavra de Deus lida
e pregada é efetivada pelo poder do Espírito, tanto no pregador quanto no ouvinte; e a
Palavra de Deus é suficiente para estabelecer a verdade em amor. A beleza da verdade e a
beleza do amor serão vistas por aqueles que ouvirem o evangelho da boca do verdadeiro
praticante da Palavra. Nem toda pregação deverá declarar isso, mas toda pregação deverá se
basear na presença de Deus. Uma presença patente na criação, patente na habitação do seu
povo e patente na proclamação da Palavra.
Poythress aponta para as implicações desses três propósitos em um, isto é, Deus em
ação (controle), Deus em comunicação (verdade) e Deus em comunhão (presença): “Por um
lado, Deus tem uma pluralidade e riqueza de propósito para a Bíblia. Não podemos reduzi-la
a um propósito monolítico. Não podemos reduzir a Bíblia a um simples encontro pessoal...
sem a presença da verdade conceitual... Não deveríamos ser intelectualistas, esticando a
verdade sem prestar atenção ao encontro com Deus ou à prática da Palavra na vida. Nem
deveríamos ser pragmatistas, cuidando apenas 'do que é relevante’ quando aos efeitos
31
Poythress, Vernon S. God Centered Biblical Interpretation. Phillipsburg, N.J.: Presbyterian & Reformed
Publishing, 1999, ps. 52-24.
visíveis sem atentar à verdade ou ao Deus que fala".32 “João 17.4 diz algo definitivo”,
continua Poythress. “Outros versos não apenas repetem esse, mas dizem outras coisas. Ao
mesmo tempo, todos os versos de João, e todos os versos da Bíblia, se concatenam para
ensinar uma verdade coerente”.33
Temos declarações singulares e plurais, diz Poythress. podemos entender a unidade e
diversidade da revelação de Deus por meio de uma tríade de categorias. Classificação ou o
tipo de coisa é, por exemplo, ‘que Deus é e sempre será um e o mesmo Deus ao longo da
história’... Momento, ou o aspecto particular, expressa a diversidade da revelação de Deus,
‘cada ato de Deus tem sua própria individualidade’. Por exemplo: “A Palavra que se fez
carne (Jo 1.14) é uma instantaneidade de Deus”.34 Associação ou relação é o aspecto que
expressa os diversos atos instantâneos de Deus de modo coerente: “Era o Verbo... estava
com Deus... era Deus...” (João 1.1).
Há um sentido estável naquilo que Deus fala. O sentido da passagem bíblica poderá
ser expresso de muitos modos: poderemos parafraseá-la, explicá-la com outros termos,
ilustrá-la, mas seu conteúdo, unidade e diversidade deverão permanecer os mesmos,
fundados sobre a base do Deus que fala. A aplicação desse sentido deverá ser feita num
particular momento levando-se em conta tanto a singularidade do seu sentido quando a
diversidade de momentos particulares. Veja, por exemplo, a ordem de Jesus para que os
discípulos portassem espadas e a censura a Pedro por havê-la usado contra Malco (Jo 22.36
e 18.10, 11). A aplicação correta deverá ser feita por meio da importação de outras
passagens a fim de estabelecer as conexões entre seu sentido estável e as diversas aplicações
instantâneas.35
A prática hoje é importar valores seculares para os sermões. Inadvertida ou
maliciosamente, pregadores vão introduzindo nos púlpitos expressões e conceitos
consagrados principalmente pela psicologia “pop”, em detrimento da doutrina e da
linguagem bíblicas. Por exemplo: “auto-estima” (amar primeiro a si mesmo para poder amar
o próximo, em vez de receber o amor de Deus que implica o amor próprio e dar amor ao
próximo). “Sentimento de culpa” psicológica como origem do problema em vez de culpa
moral resultante do pecado. “Disfunção” em vez de pecado ou de peso (Hb 12.1). “Auto-
realização” em vez de realização dos propósitos graciosos de Deus para conosco.
“Centralização na pessoa” em vez de referência a Deus. “Eu estou OK, você está OK” em
vez de paz com Deus e paz entre os homens; “adulto/criança” em vez de Pai-Filho-Espírito
Santo e filhos-irmãos-servos (Ef 4−6).
Alguém poderá perguntar: Não são essas boas metáforas para as doutrinas bíblicas,
suprindo para necessidades a que a Bíblia não se refere? Certamente, não! A Palavra de
Deus é o livro da Redenção. Ela faz as analogias da redenção − e qualquer outro discurso
psicológico que seja anticristão é formulado com valores usurpados do evangelho mas sem o
devido poder.
32
Ibid., 56.
33
Ibid., p. 70.
34
Ibid., p. 71.
35
Confissão de fé de Westminster, I.IX.
36
Poytress. Symphonic Theology, ps. 15-17.
37
Ibid., ps. 26-28.
38
Ibid., p. 63.
39
Ibid., ps. 69-71.
40
Ibid., p. 102.
41
Ibid., p. 103.
Conclusão
Tem autoridade e coragem com amor? Essa é a pergunta conclusiva. Nos púlpitos,
uns apelam para o conteúdo das psicologias porque não confiam que a Palavra de Deus
cumpra aquilo que promete. Não crêem realmente que a palavra de Deus não volte vazia,
mas prospere segundo o desígnio de Deus (Is 55.11). Outros, não crêem nos recursos
inspirados da Escritura para o ensino, aprendizado, disciplina, reorientação e formação (2
Tm 3.16-17). Uns e outros não vêem a extensão e profundidade do pecado nem a altura,
largura e profundidade da palavra da redenção para penetrar, entender, expor e resgatar
“pensamentos e propósitos do coração” (Hb 4.12). Inadvertida ou deliberadamente,
escolhem a sabedoria desde século, envergonhados do evangelho que não nos envergonha
(Rm 1:16).43 Para estes, a nossa pregação apela para a autoridade divina da Escritura para
desconstruir sofismas e reconstruir o pensamento segundo o pensamento bíblico redentivo,
“levando cativo todo pensamento à obediência de Cristo” (2 Co 4.10).
42
Keller, Timothy. Journal of Biblical Counseling, A Model for Preaching (I, II, III). Laverock, Penn.: CCEF,
Vol. 12, n.o 3 - 1994, ps. 36-42; Vol. 13, n.o 1 – 1995, ps. 39-48 e Vol. 13, n.o 2, ps. 51-60.
43
Francis Schaeffer, A Missão da Igreja. (São Paulo: ABU/VM, 1983), 207-208: “O Cristianismo é um corpo
específico de verdades. è um sistema. Não temos por que nos envergonhar disso.”
44
Hebreus 11.3, 6: “Pela fé, entendemos que foi o universo formado pela palavra de Deus, de maneira que o
visível veio a existir das coisas que não aparecem ... De fato, sem fé é impossível agradar a Deus, porquanto é
necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe e que se torna galardoador dos que o
buscam”.
45
Sou grato ao Dr. Jay Edward Adams por estes insights proporcionados em classe (CCEF, 1987). Ver J.
Adams, Lectures on Counseling (Grand Rapids: Baker, 1978), 181.
46
“Tu, porém, permanece naquilo que aprendeste e de que foste inteirado, sabendo de quem o aprendeste e
que, desde a infância, sabes as sagradas letras, que podem tornar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo
Jesus. Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a
educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa
obra” (2 Timóteo 3.14-17).
47
David Powlison, “The Sufficience of Scripture to Diagnose and Cure Souls”, Journal of Biblical
Counseling, 2005, Vol. 23, No. 2, 2.
Sondamos apenas um dos muitos termos por meios dos quais a Bíblia explana as
obras do coração humana em detalhes específicos. Este é um tema cujas riquezas são
inexauríveis. O coração humano é um verbo ativo. Não “temos necessidades”;
“desejamos” da maneira como amamos, tememos, esperamos, confiamos, etc. Neste
artigo, examinamos os termos do desejo. Poderíamos ter examinado quaisquer temas
e termos que capturam as atividades fundamentais do coração humano. E
deveríamos fazê-lo seguros disto: o evangelho de Jesus Cristo é tão abrangente como
a diversidade humana e tão profundo como a complexidade humana.48
48
Ibid., 13.
49
“Tendo purificado a vossa alma, pela vossa obediência à verdade, tendo em vista o amor fraternal não
fingido, amai-vos, de coração, uns aos outros ardentemente, pois fostes regenerados não de semente
corruptível, mas de incorruptível, mediante a palavra de Deus, a qual vive e é permanente. Pois toda carne é
como a erva, e toda a sua glória, como a flor da erva; seca-se a erva, e cai a sua flor; a palavra do Senhor,
porém, permanece eternamente. Ora, esta é a palavra que vos foi evangelizada” (1 Pedro 1.23-25).
50
Tiago 1.23-24: “Porque, se alguém é ouvinte da palavra e não praticante, assemelha-se ao homem que
contempla, num espelho, o seu rosto natural; pois a si mesmo se contempla, e se retira, e para logo se esquece
de como era a sua aparência”.
51
2 Coríntios 3.18: “E todos nós, com o rosto desvendado, contemplando, como por espelho, a glória do
Senhor, somos transformados, de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o Espírito”.
52
João Calvino, Commentaries, Vol. 3, 273.
da qual alguém possa estar consciente que não esteja ali representada como que
num espelho”. Longman então diz:
Calvino, em outro lugar, aplica a metáfora do espelho não somente para o livro dos
Salmos, mas para a Bíblia inteira. O que ele quer dizer? Corretamente, ele crê que,
quando lemos a Bíblia, algo de reflexivo ocorre tal como quando nos colocamos
diante do espelho pela manhã e temos uma visão de nós mesmos. Na Bíblia,
entretanto, em vez de termos uma visão de nosso corpo, temos um vislumbre daquilo
que vai dentro de nós. Deixados ao nosso próprio engenho, estaremos perdidos,
buscando nosso “verdadeiro eu” em lugares em que jamais poderíamos nos
encontrar. Mas a Bíblia articula o que vai dentro de nós − conta-nos a história de
nossa vida − e ministra às nossas necessidades, nossa culpa e nossa alienação.53
Adiante, Longman ainda diz que a Bíblia nos faz entender a nós mesmos em
meio a toda essa confusão que sentimos dentro de nós (e eu acrescento: e em meio a
toda a confusão de nossas relações interpessoais); fornece estrutura para nosso
pensamento (e para as nossas conversas); e aponta-nos para Deus. “Lemos as
Escrituras e vemos dentro de nós”.54 Sobretudo, vemos Deus e vemos o nosso
semelhante, segundo a lei maior de amar a Deus primeiro, e depois, ao próximo
como a nós mesmos.
53
Tremper Longman, Reading the Bible with Heart & Mind, (Colorado Springs: NavPress, 1997), 29.
54
Ibid., 31.
55
Michael Horton, Um Melhor Caminho, (São Paulo: Editora Cultura Cristã, a ser lançado), cap. 3.
56
Ibid.
57
Citado em W. M. Gomes, Aconselhamento Redentivo (São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2004), p. 10. Ver
J. Douma, Os Dez Mandamentos (São Paulo: Os Puritanos, 2003).
58
“Certo homem de posição perguntou-lhe: Bom Mestre, que farei para herdar a vida eterna? Respondeu-lhe
Jesus: Por que me chamas bom? Ninguém é bom, senão um, que é Deus. Sabes os mandamentos: Não
adulterarás, não matarás, não furtarás, não dirás falso testemunho, honra a teu pai e a tua mãe. Replicou ele:
Tudo isso tenho observado desde a minha juventude. Ouvindo-o Jesus, disse-lhe: Uma coisa ainda te falta:
vende tudo o que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro nos céus; depois, vem e segue-me. Mas, ouvindo ele
estas palavras, ficou muito triste, porque era riquíssimo. E Jesus, vendo-o assim triste, disse: Quão dificilmente
entrarão no reino de Deus os que têm riquezas!” (Lucas 18.18-24). “...Quando vier, porém, o Espírito da
verdade, ele vos guiará a toda a verdade; porque não falará por si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido e
vos anunciará as coisas que hão de vir” (João 16.13).
59
“Aos mais digo eu, não o Senhor: se algum irmão tem mulher incrédula, e esta consente em morar com ele,
não a abandone” (1 Coríntios 7.12). “Filho meu, guarda o mandamento de teu pai e não deixes a instrução de
tua mãe; ata-os perpetuamente ao teu coração, pendura-os ao pescoço. Quando caminhares, isso te guiará;
quando te deitares, te guardará; quando acordares, falará contigo. Porque o mandamento é lâmpada, e a
instrução, luz; e as repreensões da disciplina são o caminho da vida” (Pv. 3.20-23).
60
“Meus irmãos, tende por motivo de toda alegria o passardes por várias provações, sabendo que a provação
da vossa fé, uma vez confirmada, produz perseverança. Ora, a perseverança deve ter ação completa, para que
sejais perfeitos e íntegros, em nada deficientes. Se, porém, algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus,
que a todos dá liberalmente e nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida ... acolhei, com mansidão, a palavra
em vós implantada, a qual é poderosa para salvar a vossa alma” (Tiago 1.2-5, 21).
61
“Pelo que diz: Desperta, ó tu que dormes, levanta-te de entre os mortos, e Cristo te iluminará. Portanto, vede
prudentemente como andais, não como néscios, e sim como sábios, remindo o tempo, porque os dias são maus.
Por esta razão, não vos torneis insensatos, mas procurai compreender qual a vontade do Senhor” (Efésios 5.14-
17). “Lâmpada para os meus pés é a tua palavra e, luz para os meus caminhos” (Salmo 119.105).
62
“E com muitas parábolas semelhantes lhes expunha a palavra, conforme o permitia a capacidade dos
ouvintes. E sem parábolas não lhes falava; tudo, porém, explicava em particular aos seus próprios discípulos”
(Marcos 4.33-34).
63
“Se, tratando de coisas terrenas, não me credes, como crereis, se vos falar das celestiais?” (João 3.12).
64
“Havendo Deus, outrora, falado, muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, nestes últimos
dias, nos falou pelo Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, pelo qual também fez o universo”
(Hebreus 1.1.-2).
65
John Frame em The Doctrine of the Knowledge of God (Phillipsburg, N.J.: Presbyterian and Reformed,
1987), 75. Adaptei a tríade sobre o conhecimento humano proposta por John Frame para fins de aplicação na
pregação.
fundamental, ainda que não a manterão com consistência absoluta até a sua
glorificação no dia final”.66 É significante o fato de que os mandamentos e
promessas de Deus fazem paralelo com seu caráter justo e bom, com sua verdade
em amor.
A perspectiva descritiva significa a exposição circunstanciada da Palavra
escrita por meio da palavra pregada,67 refletindo a sabedoria de Deus.68 Existem
duas linguagens, dois discursos correntes no mundo. Um é o da palavra verdadeira e
amorosa de Deus, e outro, o da palavra falsificada e autocentrada dos homens
rebeldes contra Deus.69
A perspectiva situacional focaliza no controle de Deus sobre a totalidade da
sua obra e das circunstâncias, compreendendo, como Frame ainda diz, “tanto a lei
revelada na escritura quando a revelação geral na natureza criada. Deus ordena que
entendamos a criação bem bastante para aplicar a Escritura a todas as áreas da
vida... Cada fato posta uma questão ética... e sugere respostas...”70 A perspectiva
situacional, portanto, analisa o que sabemos do mundo à luz da Escritura e sugere o
conhecimento bíblico em diferentes situações.
A perspectiva existencial focaliza o poder de Deus na lei revelada ao homem
criado à imagem de Deus. Como Frame diz também: “Chegamos a conhecer melhor
a lei à medida que melhor conhecemos a nós mesmos. Além disso, aprendemos
como a regeneração e a santificação (isto é, obediência) são essenciais para o
conhecimento, em seu sentido pleno, e como estes interagem com a lei e com a
situação a fim de conduzir-nos à verdade”.71
Assim, a pregação para aconselhamento terá de prestar atenção a tais
perspectivas a fim de proceder a uma hermenêutica correta da Palavra, uma
hermenêutica correta da pessoa e uma hermenêutica correta do mundo a fim de
produzir uma aplicação adequada.
66
Ibid.
67
Romanos 10.17: “E, assim, a fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo”.
68
1 Coríntios 1.21: “Visto como, na sabedoria de Deus, o mundo não o conheceu por sua própria sabedoria,
aprouve a Deus salvar os que crêem pela loucura da pregação”; Gálatas 3.2: “Quero apenas saber isto de vós:
recebestes o Espírito pelas obras da lei ou pela pregação da fé?”
69
Romanos 1.18-25: “A ira de Deus se revela do céu contra toda impiedade e perversão dos homens que
detêm a verdade pela injustiça; porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus
lhes manifestou. Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria
divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que
foram criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis; porquanto, tendo conhecimento de Deus, não o
glorificaram como Deus, nem lhe deram graças; antes, se tornaram nulos em seus próprios raciocínios,
obscurecendo-se-lhes o coração insensato. Inculcando-se por sábios, tornaram-se loucos e mudaram a glória do
Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, bem como de aves, quadrúpedes e
répteis. Por isso, Deus entregou tais homens à imundícia, pelas concupiscências de seu próprio coração, para
desonrarem o seu corpo entre si; pois eles mudaram a verdade de Deus em mentira, adorando e servindo a
criatura em lugar do Criador, o qual é bendito eternamente. Amém!”
70
John Frame, The Doctrine of the Knowledge of God, 75.
71
Ibid.
pensar é pecado, pois cede à natureza decaída; pensar sem agir também é pecado,
pois falha em alcançar o padrão de Deus. Uma das razões pelas quais muitos
aconselhamentos e aconselhados falham é exatamente porque não sabem como
concluir a teoria em termos de sua aplicação, às vezes, interpretando mal o texto
bíblico, às vezes, deixando de considerar perspectivas e elasticidade de termos e
temas e, às vezes, de fornecer passos facilmente identificáveis e aplicáveis.
Lembre-se do que tratamos sobre o caráter reflexivo da pregação. Tiago diz
que, quando a Palavra de Deus não é praticada, é como o que ocorre com
aconselhado que olha seu rosto no espelho e sai para logo se esquecer da própria
feiúra.72 Para que a prática seja completa, será preciso que o princípio bíblico seja
implementado.Uma mensagem sem implementação prática será um vidro sem prata
que a faça reflexo da glória de Deus e da alma do homem. (“E todos nós, com o
rosto desvendado, contemplando, como por espelho, a glória do Senhor, somos
transformados, de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o
Espírito” − 2 Coríntios 3.18.)
Veja o seguinte exemplo. Às vezes, o conselheiro cita Efésios 4.25 (“Por
isso, deixando a mentira, fale cada um a verdade com o seu próximo”), esperando
que este seja o conselho bíblico para o mentiroso. No entanto, nesse caso, o
aconselhamento poderá se perder numa artimanha comportamentista. De fato, não
basta tirar a mentira e por a verdade. Paulo diz que é preciso, antes, conhecer e ser
instruído na verdade de Jesus, despojando do velho homem, renovando o
entendimento e revestindo de Cristo. Daí, diz o apóstolo, tire a mentira e ponha a
verdade – atentando para a motivação certa, a qual é ser membro de Cristo e uns dos
outros. A chave para a transformação é ser membro do corpo do qual Cristo é a
cabeça.
72
“Portanto, despojando-vos de toda impureza e acúmulo de maldade, acolhei, com mansidão, a palavra em
vós implantada, a qual é poderosa para salvar a vossa alma. Tornai-vos, pois, praticantes da palavra e não
somente ouvintes, enganando-vos a vós mesmos. Porque, se alguém é ouvinte da palavra e não praticante,
assemelha-se ao homem que contempla, num espelho, o seu rosto natural; pois a si mesmo se contempla, e se
retira, e para logo se esquece de como era a sua aparência. Mas aquele que considera, atentamente, na lei
perfeita, lei da liberdade, e nela persevera, não sendo ouvinte negligente, mas operoso praticante, esse será
bem-aventurado no que realizar” (Tiago 1.21-25).
Efésios 4.30-31
Efésios 4.32
E não entristeçais o Espírito de
Antes, sede uns para com os
Deus, no qual fostes selados para
outros benignos, compassivos,
o dia da redenção. Longe de vós,
perdoando-vos uns aos outros,
toda amargura, e cólera, e ira, e
como também Deus, em Cristo,
gritaria, e blasfêmias, e bem assim
vos perdoou.
toda malícia.
Jack Hughes, pastor em Burbank, California, diz que “os pastores de hoje
deixaram de considerar a diferença entre princípios, aplicação e implementação”.
Aplicação, diz ele, é como os princípios bíblicos deveriam ser obedecidos. Por
exemplo, escreve Hughes, “no caso de Salmo 19.7-14,73 uma das aplicações é:
“Leia sua Bíblia”. Mas não basta o princípio nem a aplicação; falta a
implementação.
“Leia a sua Bíblia” é o que tem de ser feito. As pessoas sabem o que significa ler e
sabem o que a Bíblia é, e entendem o conceito de ler a Bíblia. Até aqui, não há
problema. Para muitos, porém, a simples exortação: “Leia a sua Bíblia”, será como
dizer: “Vá reformar o motor do seu carro”. Reformar o motor de um carro é um
conceito fácil de ser compreendido. O problema não é com o conceito; o problema é
com a implementação do conceito. Como alguém reforma um motor de carro? Se
você nada souber sobre mecânica de motores, como poderia encontrar os meios e
habilidades para fazê-lo?74
73
Salmo 19.7-14: “A lei do Senhor é perfeita e restaura a alma; o testemunho do Senhor é fiel e dá sabedoria
aos símplices. Os preceitos do Senhor são retos e alegram o coração; o mandamento do Senhor é puro e
ilumina os olhos. O temor do Senhor é límpido e permanece para sempre; os juízos do Senhor são verdadeiros
e todos igualmente, justos. São mais desejáveis do que ouro, mais do que muito ouro depurado; e são mais
doces do que o mel e o destilar dos favos. Além disso, por eles se admoesta o teu servo; em os guardar, há
grande recompensa. Quem há que possa discernir as próprias faltas? Absolve-me das que me são ocultas.
Também da soberba guarda o teu servo, que ela não me domine; então, serei irrepreensível e ficarei livre de
grande transgressão. As palavras dos meus lábios e o meditar do meu coração sejam agradáveis na tua
presença, Senhor, rocha minha e redentor meu!”.
74
Jack Hughes, “Implementation: the Missing Ingredient”, Journal of Modern Ministry, 2004, Vol. 1, Issue 1,
89-93.
75
Tremper Longman III, Heart & Soul, 31.
76
Veja Wadislau Martins Gomes, Coração e Sexualidade (Brasília: Refúgio 1999).
77
Longman, Heart & Soul, 32.
78
1 Coríntios 15.14: “E, se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação, e vã, a vossa fé”.
79
Longman, Heart & Soul, 32-33.
maneira cativante e com estilo vívido que nos deixa assentados na beirada dos
nossos bancos”80 − prontos para experimentar a Palavra.
Conectando nossa história à história de Deus
Longman propõe ainda que a leitura e exposição da Palavra deveriam fazer
“soar os sinos” de nossa experiência. “Deus quer nos transformar por meio da sua
Palavra. Assim, ele nos fala de maneira a capturar o nosso coração e levar-nos para
junto do seu coração”. E nos deixa com algumas questões:
• Como a Bíblia lança luz sobre minha história? Quais as histórias e
poesias na Bíblia que mais diretamente refletem sobre aquilo que é a
minha vida [e dos meus ouvintes]?
• Como tenho[e os meus ouvintes] reagido às perdas? Alegrias?
Sucessos? Quais os insights que vêm à mente em tempos difíceis? Em
bons tempos?
• Quais têm sido as minhas [e dos meus ouvintes] orientações e os
propósitos do coração ao considerar o passado e o futuro? Quando
tenho [e meus ouvintes] visto Deus operando? Quando Deus parece
mais próximo e real? Quando ele parece mais distante e enigmático?
• Como a minha vida [e dos meus ouvintes] faz sentido até agora? Quais
são os aspectos mais confusos da vida até então? De que maneiras a
Bíblia espelha o que ocorreu e o que está ocorrendo?
• Quais as “grandes questões” que tenho [e meus ouvintes] feito ao
longo de minha vida? Até que ponto tais questões têm sido
respondidas? Como eu [e meus ouvintes] avalio o processo e a
qualidade das decisões que têm sido feitas? Até que ponto a Bíblia
influenciou tais decisões?
• Quais têm sido meus [e dos meus ouvintes] desejos mais profundos?
Como têm sido satisfeitos? O que mais falta? Que papel Deus e sua
Palavra têm desempenhado nessa busca?81
80
Ibid.
81
Ibid., 34-35.
Introdução e proposição
Foi isso que Paulo fez quando escreveu aos coríntios. Ele começou a sua
carta com a afirmação de sua própria vocação e a confirmação do chamado dos
coríntios (1.1-3), ressaltando a centralidade do Deus triuno tanto quanto à eleição,
consumação e perseverança da salvação (1.4-8). O propósito da carta é claro: A
unidade de Deus deveria estar sendo refletida na comunhão do corpo de Cristo
(1.9-10).
Divisão e dispersão
A partir daí, Paulo argumenta sobre diversas questões que causam divisão no
corpo de Cristo e suas soluções: (1) contendas sobre pessoas e posições (1.11-17);
(2) discussões sobre poder e sabedoria (1.18−2.16); (3) obras da carne versus obras
de Deus (3.1−4.21); (4) pecado e disciplina redentiva (5.1−6.20); (5) sexualidade e
compromisso conjugal (7.1-40); (6) escravidão a ídolos e liberdade do jugo de
Cristo (8.1−9.27).
União e propósito
Neste ponto, então, Paulo adverte: todas essas coisas que causam divisão na
comunhão do corpo de Cristo são sintomas de um problema maior: os coríntios
estavam centrados em si mesmos, na própria estultícia, e conseqüentemente, em
ídolos (pois ninguém é deus suficiente para si mesmo), agindo por necessidade e
não por expressão, sendo conduzidos à dissolução interna (individualismo) e à
desintegração externa (luta pelo poder) (10.1-33). Todas as questões morais que
causavam divisões entre os coríntios em nada refletiam a ética de Deus. A questão
principal não seria a de como se vive para “subir a Deus”, mas como Deus “veio ao
homem”, em Cristo, para trazer-lhe a luz de sua glória. Comer, beber, casar, enfim,
viver, só tem sentido se for para a glória de Deus (11.1-34). Tudo mais, continua
Paulo, é jogo de palavras (línguas) e luta por poder (dons) − a qual poderá parecer
que sejam lutas autênticas, mas que desviam o crente do caminho (12.1-31).
nosso pecado, tudo o que podemos vislumbrar de Sua glória são os rasgos de luz de
um dom imerecido.
O mesmo ocorre com o termo fé. Ele descreve a crença, a confiança e a
esperança que regulam as relações do homem com Deus, com o homem e com o
mundo. Mas significa muito mais que isso. É a habitação do homem com Deus (ou,
no âmbito da Queda, com os ídolos). A fé é um movimento do homem, primeiro,
para cima, para o transcendental; segundo e decorrente, um movimento para fora,
para a realidade criada; e terceiro, um movimento para dentro, de retroalimentação.
Por sua vez, o termo amor, mais conhecido pela sua conseqüência, o sentimento do
amor, na verdade, como causa, é o ato responsável de fazer o bem. Como tal, é um
movimento operacional, primeiro em relação a Deus e, segundo, para fora, na
direção do outro.
Será preciso, sempre, ler a Bíblia com a mente e com o coração. A leitura da
Palavra deveria ser feita sob o entendimento da dinâmica da tríade
habitação/imaginação/operação. Primeiro, o leitor habita com Deus na Palavra. Ele
lê o texto em humilde oração até que seu entendimento seja esclarecido pelo
Espírito Santo, conforme a promessa, acerca das verdades ali contidas. Segundo, ele
refaz tudo aquilo que imagina em seu coração sobre a realidade da vida, com base
na crença, esperança e confiança nas verdades ali expostas; terceiro, o leitor conduz
seu coração a planejar, segundo Deus, novos objetivos de vida segundo os caminhos
de Deus (“entrega teu caminho ao Senhor”), novas e santas estratégias (“o coração
... pode fazer planos, mas a resposta certa vem dos lábios do Senhor”) e cria novos
desejos virtuosos e frutíferos (“ele satisfará os desejos do teu coração”). Uma fez
feita essa “leitura”, é chegada a hora de “ler” a possível assistência, os ouvintes:
Onde habitam? Como imaginam? O que esperam? Qual o desejo do coração:
espiritual, carnal, autárquico, autônomo? É preciso que o pregador leia a Palavra e
as pessoas, que fale delas a Deus tanto quanto pretende falar de Deus a elas. Isso
significa fazer a hermenêutica da Palavra e a hermenêutica da pessoa.
O modelo redentivo
Utilização do modelo
Conclusão
A pregação para aconselhamento se mostra efetiva quando exibe a relação
entre a unidade multi-perspectiva da mensagem (A Escritura: o pregador é o meio
entre a exegese e a estrutura do sermão) e a coerência da ato-estrutura do pregador
(O pregador é o meio entre a mensagem e o recipiente da mensagem) com o
objetivo de transformar o caráter dos ouvintes e de produzir mudança de
comportamento (A mensagem deverá se viva para apresentar a Vida à vida).
Portas Estreitas
Entrai pela porta estreita (larga é a porta, e espaçoso, o caminho que conduz
para a perdição, e são muitos os que entram por ela), porque estreita é a
porta, e apertado, o caminho que conduz para a vida, e são poucos os que
acertam com ela (Mateus 7.13-14).
Alguns ministros pregam abrindo largas as portas do evangelho, mas uma vez
que alguém adentre pelas portas escancaradas, nada há para ser alcançado. Dizem-
me, às vezes, que faço estreitas as minhas portas. Tal não é verdadeiro, pois eu prego
o evangelho a toda criatura debaixo dos céus com todo meu poder; e, se forem
estreitas, sempre há algo de valor além das portas. Mesmo que o caminho seja
estreito, se você chegar lá, e entrar, terá encontrado vida eterna, e jamais perecerá – e
ninguém o arrebatará das mãos de Cristo.
Pecador: venha e receba uma bênção eterna! Vale a pena; venha obtê-la! Se você
crer, será salvo. “Quem crer e for batizado será salvo” – salvo do pecado para não
mais voltar a viver nele outra vez; salvo para ser preservado em santidade. E
santidade será o fluxo principal da corrente da vida, até que um dia, feito plena e
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perfeitamente santo, você habite no alto com Deus.
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C. H. Spurgeon (“Drifted Leaves” em The King’s Own, fevereiro de 1890, 159).