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O QUE É O HOMEM?

2a. Parte
John Wesley

'Que é o homem mortal para que te lembres dele?


E o filho do homem, para que o visites?' (Salmos 8:4)

1. Mais do que isto, o que sou eu? Com a ajuda de Deus, eu irei considerar a
mim mesmo. Aqui está uma máquina curiosa, 'terrivelmente e maravilhosamente
feita'. É uma pequena porção de terra; das partículas da qual aderem, e não sei como,
estendidas em incontáveis fibras, milhares de vezes mais finas do que os fios de
cabelo. Essas cruzam umas às outras, em todas as direções, e são espantosamente
forjadas em membranas; que, por sua vez, são forjadas em artérias, veias, nervos, e
glândulas; as quais contêm vários fluídos, circulando, constantemente, através de toda
máquina.

2. Para a finalidade desta circulação, uma quantidade considerável de ar é


necessária. E isto continuamente, através de um mecanismo adequado para este
mesmo propósito. Mas como uma partícula de fogo etéreo é ligada a toda partícula de
ar (e uma partícula de água também), assim, tanto o ar, quanto água e fogo são
recebidos, juntos, nos pulmões, onde o fogo é separado do ar e água, que são
continuamente expelidos; enquanto o fogo, extraído de ambos, é recebido em seu
interior e misturado com o sangue. Assim, o corpo humano é composto de todos os
quatro elementos, devidamente proporcionados, e misturados; o último do qual
constitui a chama vital, de onde flui o calor humano.

3. Deixe-me considerar isto um pouco mais além... Não é a função primária


dos pulmões administrar o fogo para o corpo, o qual é continuamente extraído do ar,
através daquela curiosa lareira? Por inspiração, toma-se o ar, água e fogo, juntos. Em
suas numerosas células (comumente chamadas de vasos aéreos) separa-se o fogo do ar
e água. Este, então, mistura-se com o sangue; uma vez que todo vaso aéreo tem um
vaso sanguíneo unidos a ele: E, tão logo o fogo é extraído, o ar e água são expelidos
pela expiração.

4. Sem esta fonte de vida; este fogo vital, não poderia haver circulação do
sangue; conseqüentemente, nenhum movimento de quaisquer dos fluídos, -- dos
fluídos nervosos, em específico, (se não for, mais precisamente, como é altamente
provável, que seja deste mesmo fogo que estamos falando a respeito). Portanto, não
haveria qualquer sensação, nem qualquer movimento muscular. Eu digo que não
haveria circulação, porque a causa usualmente afirmada para isto, ou seja, a força do
coração, é completamente inadequada para o efeito suposto. Ninguém supõe que a
força do coração, em um homem forte, seja equivalente ao peso de três mil libras.
Considerando que ele requer a força igual ao peso de cem mil livras, para propelir o
sangue do coração, através de todas as artérias. Isto pode apenas ser levado a efeito,
através do fogo etéreo contido no próprio sangue, assistido pela força elástica das
artérias, em que ele circula.

5. Mas, além desta estranha composição dos quatro elementos, -- terra, água,
ar e fogo, -- eu encontro alguma coisa em mim de uma natureza completamente
diferente; nada semelhante a algum desses. Eu encontrei alguma coisa em mim que
pensa; que nem a terra, água, ar e fogo; nem alguma mistura deles, pode
possivelmente fazer: Tendo percebido objetos, através de alguns desses sentidos, ela
forma idéias interiores deles. Ela julga, concernente a eles; ela vê, se eles concordam
ou discordam uns com os outros. Ela raciocina concernente a eles: ou seja, infere uma
proposição de outra. Ela reflete sobre suas próprias operações; ela é investida de
imaginação e memória; e alguma de suas operações, julgamento, em específico, pode
ser subdividido em outras.

6. Mas, por quais meios eu poderei aprender em que parte de meu corpo este
princípio pensante está situado? Alguns homens eminentes afirmaram que ele é 'tudo
em tudo, e está em todas as partes'. Mas, eu não consegui saber nada disto: Estas
parecem ser palavras que não têm um significado determinado. Vamos, então, apelar,
da melhor maneira que pudermos, para nossa própria experiência. Desta eu aprendi
que este princípio pensante não está situado em minhas mãos, pés, pernas ou braços.
Não está situado no tronco de meu corpo. Qualquer um pode se assegurar disto,
através de uma pequena reflexão. Eu não posso conceber que ele esteja situado em
meus ossos, ou em alguma parte de minha carne. Assim sendo, tanto quanto eu posso
julgar, parece que ele está situado em alguma parte de minha cabeça; mas se na
glândula pineal, ou em qualquer outra parte do cérebro, eu não sou capaz de
determinar.

7. Mas, mais além: Este princípio interior, onde quer que este situado, ele é
capaz, não apenas de pensar, mas igualmente de mar, odiar, sentir alegria, tristeza,
desejo, medo, esperança, e ai por diante, e toda uma série de outras emoções
interiores, que são comumente chamadas de paixões ou afeições. Elas são
denominadas, por um entendimento geral, de vontade: e são misturas e diversificadas
em milhares de maneiras; parecendo ser a única fonte de ação naquele princípio
interior que eu chamo de alma.

8. Mas o que é minha alma? Esta é uma questão importante e não é fácil de ser
respondida.

Ouve tu submisso, mas de um nascimento humilde,


A algumas partículas separadas da mais fina terra?
Um efeito claro de que a natureza tem de procriar,
quando o movimento ordena, e quando os átomos se encontram?

Eu não posso de maneira alguma acreditar nisto. Minha razão recua diante
disto. Eu não posso ficar satisfeito com o pensamento de que a alma é tanto terra,
água, ou fogo; ou uma composição de todos eles juntos, fosse apenas por esta razão
simples: -- Todos esses, quer separados, ou compostos, de alguma maneira possível,
são puramente passivos ainda. Nenhum deles tem o menor poder de automovimento;
nenhum deles pode mover-se por si mesmo. 'Mas', diz alguém, 'aquela embarcação
não se move?'. Sim; mas não por si mesma; ela é movida pela água na qual ela flutua.
'Mas, então, a água se move'. Verdade; mas a água é movida pelo vento, a corrente de
ar. 'Mas o ar se move'. Ele é movido pelo fogo etéreo, que está unido a cada partícula
dele; e este mesmo fogo é movido, através do Espírito Todo Poderoso, a fonte de todo
movimento no universo. Assim sendo, minha alma tem Dele, um princípio de
movimento interior, por meio do qual, ela governa com prazer todas as partes do
corpo.
9. Ela governa cada movimento do corpo, apenas com esta exceção, e que é
um maravilhoso exemplo da sábia e graciosa providência do grande Criador: Existem
alguns movimentos do corpo que são absolutamente necessários para a continuidade
da vida; tais como dilatação e contração dos pulmões; a sístole e diástole do coração;
a pulsação das artérias; e a circulação do sangue. Esses não são governados, por mim,
como me aprouver: eles não esperam a direção de minha vontade. E é bom que não
façam isto. É altamente apropriado que todos os movimentos vitais possam ser
involuntários; seguindo em frente, quer aludamos a eles ou não. Fosse de outra forma,
inconveniências graves poderiam se seguir. Um homem poderia colocar um fim em
sua própria vida, quando for que lhe agradasse, interrompendo o movimento de seu
coração, ou de seus pulmões; ou ele poderia perder sua vida, por mera desatenção, --
por não se lembrar, e não estar atento à circulação do sangue. Mas, com exceção
desses movimentos vitais, eu dirijo o movimento de todo meu corpo. Embora eu não
compreenda como eu faça isto, tanto quanto eu não posso compreender como 'TRÊS
que testemunham nos céus são UM'.

10. Mas o que eu sou? Indiscutivelmente, eu sou alguma coisa distinta de meu
corpo. Parece evidente que meu corpo não está necessariamente incluído nela. Porque
quando meu corpo morre, eu não devo morrer: eu devo existir tão real quanto
anteriormente. E eu não posso deixar de acreditar que este automovimento, princípio
pensante - com todas as suas paixões e afeições, irá continuar a existir, embora o
corpo esteja emoldurado dentro do pó. Na verdade, no momento, este corpo está tão
intimamente ligado com a alma, que eu pareço consistir de ambos. Em meu presente
estado de existência, eu indubitavelmente consisto de alma e corpo. E assim, eu devo
novamente, depois da ressurreição, para toda a eternidade.

11. Eu estou consciente de uma mais propriedade, comumente chamada de


liberdade. Ela é muito freqüentemente confundida com a vontade; mas é de uma
natureza muito diferente. Nem se trata de uma propriedade da vontade, mas uma
propriedade distinta da alma; capaz de ser manifestada com respeito a todas as
faculdades da alma, assim como todos os movimentos do corpo. É um poder de
autodeterminação, que, embora ele não se estenda a todos os nossos pensamentos e
imaginações, ainda assim, se estende às nossas palavras e ações em geral, e não com
muitas exceções. Eu estou completamente certo disto, de que eu sou livre, com
respeito a esses, para falar ou não falar; para agir ou não agir; fazer isto ou ao
contrário, quanto estou de minha própria existência. Eu não tenho apenas o que é
denominado de 'liberdade de contradição', -- o poder de fazer ou não fazer, mas o que
é denominado de 'poder da contrariedade', -- um poder de agir de uma maneira, ou de
maneira contrária. Negar isto seria negar a experiência constante de toda espécie
humana. Cada um sente que ele tem um poder inerente de mover esta ou aquela parte
de seu corpo; de mover isto ou não; de mover deste modo ou ao contrário, como lhe
aprouver.

Eu posso, quando eu escolho (e assim pode cada um que é nascido da mulher)


abrir ou fechar meus olhos, falar; ou ficar em silêncio; levantar-me ou me sentar;
esticar minha mão, ou recolhê-la; e usar de algum de meus membros, como me
agradar, assim como todo meu corpo. E embora eu não tenha poder absoluto sobre
minha própria mente, por causa da corrupção de minha natureza; ainda assim, através
da graça de Deus me assistindo, eu tenho o poder de escolher e fazer o bem, tanto
quanto o mal. Eu sou livre para escolher a quem servir; e se eu escolho a melhor parte,
para continuar nela, até mesmo na morte.

Mas diga-me, trêmula criatura, o que é morte?


O sangue apenas que pára; e a respiração interrompida?
O mais extremo limite de um estreito palmo?
E até mesmo do movimento, que com a vida se inicia?

12. A morte é propriamente a separação da alma do corpo. Disto nós estamos


certos. Mas nós não estamos certos (pelo menos em muitos casos) do momento em
que esta separação é feita. É quando a respiração cessa? De acordo com uma máxima
bem conhecida, 'quando não existe respiração, não existe vida'. Mas nós não
podemos absolutamente afirmar tal coisa: porque muitos exemplos têm sido trazidos,
daqueles cuja respiração esteve totalmente perdida, e, ainda assim, suas vidas foram
recuperadas. É quando o coração não mais bate, ou quando a circulação do sangue
cessa? Não exatamente. Porque o coração pode bater novamente; e a circulação do
sangue, depois de estar completamente interrompida, começar de novo. Então, a alma
é separada do corpo, quando todo o corpo está rijo e frio, como um pedaço de gelo?
Mas recentemente existem muitos exemplos de pessoas que estavam assim geladas e
rijas, e não tinham sintomas de vida remanescente, que, não obstante, com uma
aplicação apropriada, recobraram a vida e a saúde. Portanto, nós não podemos mais
dizer que a morte é a separação da alma do corpo; mas em muitos casos, apenas Deus
pode dizer o momento daquela separação.

13. Mas o que nós estamos preocupados em saber, e profundamente


preocupados em considerar é a finalidade da vida. Mas para que finalidade a vida é
concedida a meus filhos? Por que fomos enviados para este mundo? Para uma única
finalidade, e nenhuma outra: para que nos preparemos para a eternidade. Para isto tão
somente, nós vivemos. Para isto, e nenhum outro propósito, nossa vida nos foi dada
ou tem continuidade. Agradou ao Todo sábio Deus, na época em que Ele viu que era
bom, levantar-se na grandiosidade de sua força, e criar os céus e terra, e todas as
coisas que neles existem. Tendo preparado todas as coisas para ele, Ele 'criou o
homem à sua própria imagem, segundo sua própria semelhança'. E qual foi a
finalidade de sua criação? Apenas uma, e nenhuma outra, -- para que ele soubesse e
amasse, e se regozijasse, e servisse ao seu grande Criador para toda eternidade.

14. Mas 'o homem, estando em honra, não continuou', mas tornou-se inferior,
até mesmo, às bestas que perecem. Ele decididamente e abertamente rebelou-se contra
Deus, e atirou fora sua submissão à Majestade dos céus. Por este meio, ele
instantaneamente perdeu tanto o favor de Deus, quanto a imagem de Deus em que ele
foi criado. Quando ele foi, então, incapaz de obter felicidade através da antiga aliança,
Deus estabeleceu uma nova aliança com o homem; os termos da qual não foi 'faça
isto e viva', mas, 'creia e você será salvo'. Mas, ainda assim, a finalidade do homem é
uma só e a mesma; apenas ela se situa em um outro fundamento. Porque o teor claro
dela é: 'Creia no Senhor Jesus Cristo, aquele a quem Deus enviou para ser a
reparação para seus pecados, e você será salvo'; primeiro, da culpa do pecado, tendo
a redenção, através do seu sangue; então, do poder do pecado, que não mais domina
sobre você; e então, da raiz do pecado, para a imagem total de Deus. E sendo
restaurado, ambos para o favor e imagem de Deus, você deverá conhecer, amar e
servir a Ele para toda a eternidade. De modo que a finalidade de sua vida; a vida de
todo aquele nascido no mundo é conhecer, amar, e servir ao seu grande Criador.

15. Observe que, como assim é a finalidade, então esta é toda e a única
finalidade para a qual todo homem sobre a face da terra, ou cada um de nós, foi
trazido para o mundo, e dotado de uma alma vivente. Lembre-se! Nós não nascemos
para coisa alguma mais. Nós não vivemos para coisa alguma mais. Sua vida e a minha
continuam na terra, para nenhum outro propósito que este, para que possamos
conhecer, amar e servir a Deus na terra, e nos regozijarmos nele para toda a
eternidade. Considere! Nós não fomos criados para satisfazermos os nossos sentidos,
para gratificarmos a nossa imaginação, para ganharmos dinheiro, ou louvarmos a
homens; para buscarmos felicidade em algum bem criado, em alguma coisa debaixo
do sol. Tudo isto é 'caminhar em sombra vã'; é conduzir uma vida impaciente e
miserável, com o objetivo de uma eternidade miserável. Ao contrário, fomos criados
para isto, para nenhum outro propósito; para buscarmos e encontramos felicidade em
Deus na terra; para afirmarmos a glória de Deus no céu. Portanto, que nossos corações
digam continuamente: 'Está é a única coisa a ser feita', -- ter uma coisa em mente,
nos lembramos do porquê nós nascemos, e do porquê continuamos a viver, -- 'para
atingirmos a marca'. Eu objetivo uma única finalidade para minha existência, Deus;
'Deus em Cristo reconciliando o mundo para si mesmo'. Ele deverá ser meu Deus para
sempre e sempre, e meu guia, até mesmo na morte!

Bradford, 02 de Maio de 1788.

John Wesley tinha 85 anos; três anos antes de falecer

[Editado por George Lyons para a Wesley Center for Applied Theology.]

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