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Cinematografias latino americanas. A “nova onda” do cinema argentino.

“Cinema argentino: A representação reativada (1990-2007)”


Andrea Malfetta

Ditadura (p. 182)

“Parece que a saúde do cinema argentino é inversamente proporcional a sua situação


econômica”. (Le Monde)

Se trata do canto testemunhal e trágico de uma geração que trabalha para ter no
cinema, ainda, um mecanismo ativo de reflexão, catarse, consciência e espetáculo.
Conflitos pessoais,
Indivíduo,
Pequenas histórias da geografia íntima, (nas quais sentimos o impacto da crise
nacional),
Apatia e perplexidade da população.

Questionamento existencial diante da perda, diante da desagregação social.


Relação de envolvimento especular do realizador com o filme: o mundo das
personagens e seus conflitos são a matéria de um cinema feito como modo de pensar
o mundo.

Vocação intimamente realista.


As telas são ocupadas para falar do país, reativando a representação.

O Novo cinema argentino (NCA) nasceu entre as fendas criadas ao longo de um ciclo
econômico neoliberal selvagem.
Desenvolveu, como poucos, o poder do cinema para realizar um diagnóstico social.
Mínimo na história, mínimo no orçamento. Cinema independente.
Antiidealista.

Argentina: clima de apatia, depressão e decadência, do pessoal ao nacional - Falta de


esperança.
Lucrécia Martel: “Eles [a geração anterior de cineastas) estão mornos, recorrem a
metáforas complexas quando o cinema está nas pequenas coisas, aqui, na nossa
frente”.
... p. 187 e 188
Essa geração buscou uma restauração, ou resistência, do poder de representação da
ficção dentro de um realismo cru, com forte influência do tratamento documental da
imagem, do cinema direto.
Escolas de cinema na Argentina:

-Incaa: Instituto Internacional de Cinematografia e Artes Audiovisuais (pública),


-Enerc: Escuela Nacional de Realización y Experimentación Cinematográfica (pública),
-FUC: Fundação Universidade do Cinema (privada),
NCA e neo-realismo:
Humanismo existencial,
Diante de um mundo destruído, devemos filmar esse mundo para fazer do cinema uma
experiência de assunção de uma responsabilidade diante de nossa liberdade
Filmagens em locações reais, atores não-profissionais,
NCA: pessimismo, impotência, adaptação, viver com o essencial,
Neo-realismo: utiliza responsavelmente sua liberdade, tomando uma posição.
Cinema fortemente independente

NCA – mostra o poder do cinema para realizar um diagnóstico social.


Como ser humano num mundo animalizado?
Redes de solidariedade desfeitas,

Argentina, um pais de cineastas. No final da década de 1990, Buenos Aires era a cidade
com maior densidade de cineasta por quilômetro quadrado. Cinco mil estudantes
matriculados no curso de imagem e som da Universidade de Buenos Aires.
Aquisição de aparelhos digitais.

Preocupação com a política cultural para o cinema e não com a política do mercado
para o cinema.
Ações institucionais que marcaram a política cultural:
-A nova lei do cinema;
-O renascimento do Festival Internacional de Cinema de Mar del Plata;
-O nascimento do Bafici (1996) – seminário, mostras especializadas em sobre cinema
nacional, lançamento de livros e revistas, ciclos de conferências e debates;
-O compromisso do Incaa (Inst. Nacional de Cinematografia e Artes Audiovisuais) com
a distribuição dos filmes nacionais.

Federalização da distribuição de uma produção subvencionada pelo Estado. Criação de


salas de cinema para a produção local.
Novo cinema argentino:

01. Neo-realista:
Lucrécia Martel, O pântano (La ciénaga, 2002), La niña santa (2004),
Pablo Trapeiro, O outro lado da lei (El bonaerense, 2002)
Juan José Campanella, O filho da noiva (El hijo de la novia, 2001),

02. Realismo num sentido mais experimental, que tende ao surrealismo ou à paródia:
Fabián Bielinsky, Nove rainhas (Nueve reinas, 2001)
Lisandro Alonso, La libertad (2001),
Sergio Bizzio, Animalada (2000),

03. Produção documentária de grande formato, narrativas em primeira pessoa:


Albertina Carri, Los rubios (2003),

04. Documentário militante a serviço das redes sociais, sem apoio financeiro:
Andrés Di Tella, La televisión (2002),
Outros realizadores citados no texto:

-Martin Rejtman: Rapado (1991),


-Esteban Sapir, Picado fino (1994),
-Raul Perrone: Lábios de churrasco (1994), Graciaadió (1997), Cinco pau peso (1998),
-Bruno Stagnaro e Adrián Caetano: Histórias breves (1995), Pizza, birra y faso (1997)
-Adrián Caetano, Bolivia (1999-2002),
-Juan Pablo Rebella e Pablo Stoll: 25 Watts (2001) e Whisky (2004),
Perfil geral dos filmes:
-A memória da ditadura,
-Histórias suburbanas e familiares,
-Histórias que narram os esquecidos pelo neoliberalismo e a globalização.
p. 186

p. 190 e 191
Entrevista com Lucrécia Martel (Cinética)

Você tem problemas com a imagem no sentido de representação?


Uma coisa deliberada que eu faço é não filmar nada por inteiro. Filmo pedaços da
cadeira, pedaços da porta, fragmentos de muita coisa no enquadramento, até de
pessoas. Acho que a imagem é tão referencial que me convém deixar muitos sentidos
de fora dela, para que ela seja debilitada e isso possa permitir que outras coisas
aconteçam, que outras sensações apareçam. O que essa fragmentação permite é
enfraquecer a forte educação visual que temos para que o espectador fique mais
disponível a outras coisas.
Como pensa as relações entre classes sociais vistas nos seus filmes? Você considera
fazer um cinema político?
Cinema político, para mim, é aquele que não acredita que a realidade seja uma coisa
definitiva, mas sim uma construção que pode ser transformada. Veja a ideia da pobreza
estrutural: uma quantidade de ideias que faz com que uma pessoa se disponha a se
adaptar, e não a modificar a pobreza. A mim parece que o cinema, com as fissuras que
ele pode provocar, é onde se pode perceber, porque uma fissura se abre e podemos
olhar por ela como se olha no buraco da fechadura, mas não se pode permanecer nela.
O cinema político então, a mim, é aquele que voluntariamente sai em busca dessas
coisas. Não é o cinema que diz como deveria ser a realidade, mas o que diz como ela
não deveria ser ou, talvez, como deveríamos mudar a realidade. O cinema militante
muitas vezes propõe como a realidade deveria ser, já o cinema político coloca dúvidas
e não propõe soluções. Porque a solução não é algo que se possa propor, a solução é
um processo, e o cinema militante aponta o dedo do que deve e do que não deve de
maneira torpe, o que reforça os problemas já existentes na sociedade. O cinema
político deveria ser o que faz da poesia uma linguagem. A poesia faz lembrar que a
linguagem é para descobrir coisas, e não para nomeá-las. O cinema que me interessa é
o da dúvida – ou, antes da dúvida, o da suspeita. É um caminho muito delicado, porque
desgraçadamente o que se passa agora na Argentina, por exemplo, é um discurso
político entre A ou B, sempre essa dualidade, essa dicotomia que faz com que o
pensamento seja torpe.

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