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Para este princípio, o Direito Penal não deve se preocupar com condutas incapazes de
lesar o bem jurídico.
Não basta que a conduta praticada tenha apenas correspondência nos elementos de um
tipo penal. Faz-se necessário que a conduta seja capaz de lesar ou expor terceiros a
risco, provocar lesões significantes ao bem jurídico tutelado.
A jurisprudência de nossos Tribunais Superiores tem fixado certos requisitos para que
o aplicador do direito possa reconhecer a insignificância de determinada conduta. São
eles:
Aqui, a meu ver, deve preponderar o bom senso do magistrado para que situações
concretas não se tornem verdadeiras aberrações no mundo jurídico.
Ora, se uma pessoa subtrair um único palito de fósforo, ainda que ostente maus
antecedentes e tenha personalidade voltada para o crime, deve ser beneficiada com o
princípio da insignificância, pois a norma proibitiva do artigo 155 do Código
Penal certamente não foi criada para uma subtração tão insignificante.
Todavia, se a subtração não for insignificante, ainda que as circunstâncias do
artigo 59 do Código Penal sejam favoráveis, não há que se falar em princípio da
insignificância.
É possível reconhecer, e isto tem se verificado na jurisprudência, que algumas
variantes podem influenciar na análise do magistrado para a aplicação de tal princípio,
como a situação em que se encontra a vítima e a lesividade a esta causada, bem como
os antecedentes criminais do agente, os quais podem demonstrar que o modo de vida
do sujeito é, por exemplo, viver “furtando.
De qualquer forma, a análise, única e tão somente, do nível de lesão sofrida, para
aplicação do princípio da insignificância, deve ser feita quando evidentemente
e inquestionavelmente ínfima a lesão, em hipóteses como a subtração de uma bolacha,
uma folha de papel, um palito de fósforo, etc.
O tema, por certo, não se fecha aqui. Muito pelo contrário, abre indagações,
contestações, impugnações.
Apesar de não haver previsão no ordenamento jurídico, sua aceitação é cada vez maior
dentre os Tribunais Pátrios, mas ainda ocorrem casos vergonhosos, onde o princípio
de insignificância é ignorado, causando, em alguns casos, resultados e danos
irreversíveis.
Para aqueles que não lembram, e que atesta o afirmado acima, um caso chocante que
ocorreu há cinco anos, onde Maria Aparecida, uma ex-empregada doméstica e
portadora de "retardo mental moderado", foi detida em flagrante em abril de 2004,
quando tinha 23 anos, após tentar furtar um xampu e um condicionador que, juntos,
custavam 24 reais, e ficou presa por mais de um ano.
Ela foi encaminhada ao Cadeião de Pinheiros, onde dividia uma cela com mais 25
presas. A jovem sofria surtos, não dormia à noite, urinava na roupa, o que provocou
um tumulto, que foi encerrado com o lançamento de uma bomba de gás lacrimogêneo
dentro da cela. Diante do desespero de Maria Aparecida, uma das presas jogou água
em seu rosto, e a mistura do gás com a água fez com que ela perdesse a visão. Aos
gritos de dor, ela foi transferida para local destinado as presas ameaçadas de morte, e
ainda, agredida várias vezes com cabo de vassoura.
Somente após sete meses de prisão, foi realizada uma audiência, e ela foi transferida
para a Casa de Custódia de Franco da Rocha, em São Paulo, onde foi atestada a perda
da visão de seu olho direito. A advogada contratada pela irmã de Maria Aparecida
entrou com pedido de habeas corpus no Tribunal de Justiça de São Paulo, que foi
negado. Apelou, então, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), o qual a concedeu, em
maio de 2005, liberdade provisória, após 13 meses de prisão, sofrimento e perda de
sentido, por causa de 24 reais.
Situações como estas ocorrem diversas vezes, onde após passar por três instâncias do
Judiciário, os ministros do Supremo Tribunal Federal são chamados para análise de
prisões decorrentes de furtos de objetos de valor insignificante, através de pedidos de
habeas corpus. A maioria dos pedidos são impetrados pela Defensoria Pública da
União contra decisões do Superior Tribunal de Justiça, que mantêm as prisões
decorrentes de furtos de objetos de pequeno valor, causando além de resultados
irreversíveis, como também excesso de processos que causam lentidões e entrava
ainda mais a nossa morosa Justiça Brasileira.
A pergunta que fica é, se a pessoa que furta uma maça, ou um mísero xampu e
condicionador, deve ser tratada de forma igual a uma outra que arromba a porta de
uma loja e furta cinco mil reais em roupas?
A não condenação nesses casos, não seria um incentivo à proliferação das ações
praticadas não em estado de necessidade, mas em um país com tantas diferenças
salariais, educacionais, seria sim um incentivo a não prática de crimes obsoletos e a
não marginalização, com aplicação de penas de multas ou alternativas.
(1) - Revista Diálogo Jurídico. Ano I - Vol. I - Nº. 1 - abril de 2001 - Salvador - Bahia
- Brasil. Delito de Bagatela: Princípios da insignificância e da irrelevância penal do
fato.