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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE DIREITO DE RIBEIRÃO PRETO

PEDRO SBERNI RODRIGUES

TIAGO AUGUSTINI DE LIMA

AVALIAÇÃO FINAL – PESQUISA EMPÍRICA EM DIREITO

RIBEIRÃO PRETO

2018
AVALIAÇÃO FINAL – PESQUISA EMPÍRICA EM DIREITO

Relatórios entregues como avaliação final da


disciplina Pesquisa Empírica em Direito na
Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, ministrada
pelo Professor Doutor Paulo Eduardo Alves da
Silva

PEDRO SBERNI RODRIGUES – Nº USP: 10278232

TIAGO AUGUSTINI DE LIMA – Nº USP: 10387258

RIBEIRÃO PRETO

2018
ANÁLISE DO V RELATÓRIO SUPREMO EM NÚMEROS: O FORO PRIVILEGIADO
E O SUPREMO - FGV

Autores: Joaquim Falcão


Ivar A. Hartman
Guilherme da F. C. F. de Almeida
Luciano Chaves

1. INTRODUÇÃO

O relatório utilizou como fonte para a pesquisa os dados do Supremo em


Números da FGV-RIO para a compilação de todas ações penais e inquéritos do STF
correspondentes aos anos de 2002 a 2016. Foram analisados volume, tempo, assunto e
decisões a respeito desses processos, entre os principais achados os autores destacaram:
“O tempo médio de tramitação das ações penais no STF tem crescido
consistentemente desde 2002. Os processos, em casos limite, chegam a ficar
mais de quatro anos aguardando providência do relator, um ano do revisor e
dois anos em vista à PGR. Apenas 1,04% das decisões em ações penais são
de condenação ou condenação parcial. Apenas 0,61% dos crimes resultam
em condenação.
Uma em cada três decisões em ações penais são sobre recursos internos. Em
duas de cada três ações penais o mérito da acusação não chega a ser avaliado
pelo Supremo, em razão do declínio de competência ou da prescrição. Os
recursos internos custaram 566 dias de tramitação às ações penais que
terminaram em 2016.
Apenas 22% das decisões em inquéritos em 2016 foram tomadas por um
órgão colegiado. Apenas 5,94% das ações penais terminaram no Supremo e
resultam de inquéritos iniciados no Supremo. Apenas 5,44% das ações
penais envolvem ao menos um crime que preencha duas condições: 1)
cometido em razão do cargo e 2) cometido após a investidura no cargo que
garante o foro privilegiado no Supremo”.

A análise e aplicação do foro por prerrogativa de função – ou simplesmente foro


privilegiado – tem sido debatida academicamente, na mídia, na política e na sociedade
civil por meio de redes sociais devido à percepção popular de corrupção generalizada
no Executivo e Legislativo nacional.
Através da edição de 2017, o ranking da Transparência Internacional conferiu
ao Brasil o 79° lugar dentre 176 países sobre a percepção da corrupção. Isso se relaciona
com o foro privilegiado, pois a falta em demasia de estudos sobre o tema causa a
percepção de impunidade e que o instituto do foro por prerrogativa de função seja um
privilégio a quem ocupa o cargo e não a análise correta que preceitua o art. 102 da Carta
Magna:
“nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente,
os membros do Congresso Nacional, seus próprios ministros e o Procurador-
Geral da República”, bem como “nas infrações penais comuns e nos crimes
de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha,
do Exército e da Aeronáutica (...), os membros dos Tribunais Superiores, os
do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter
permanente”.

O instituto do foro privilegiado vem sendo muito criticado pelos próprios


ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), membros do MP (Ministério Público), e
do Legislativo, sendo que na Câmara há tramitação de pelo menos quatorze propostas
que visam alterar o instituto.
A questão levantada pelos autores é: “na prática, como se dá o processamento e
julgamento de pessoas com foro privilegiado?” – esse é, portanto, o objetivo da
pesquisa, que é específica ao STF – sem a pretensão de comparar com outros tribunais,
muito menos de levantar os dados sobre a “tramitação de crimes similares” nessas outras
instâncias.

2. METODOLOGIA

A metodologia utilizada foi à aferição do banco de dados Supremo em Números


produzido desde a promulgação da Constituição da República de 1988 pela Faculdade
de Direito da FGV-Rio. Esse banco de dados foi atualizado periodicamente mediante os
processos julgados pela Suprema Corte.
Dentre as tantas variáveis, a mais importante para realização do trabalho é o
andamento processual. E, então, abarcadas dentre o andamento processual foi utilizado:
“conclusão do relator/revisor, trânsito em julgado, vista à PGR” e o andamento das
inúmeras decisões.
O trabalho, portanto, utiliza dados do STF para análise do que “acontece nos
inquéritos e ações penais” concernentes ao foro privilegiado dentre os anos 2002 a 2016.
A vertente quantitativa de pesquisa empírica é, pois, dominante na pesquisa
analisada – uma vez que ela se dá através de junção de dados fáticos acerca da dinâmica
do Supremo Tribunal Federal. Por outro lado, a completude desses dados permite a
interpretação e a construção de dados qualitativos para um complexo aprofundamento
da realidade.
A intepretação qualitativa do relatório pode ser feita mediante o exercício de
comparação dos resultados quantitativos obtidos, utilização de casos notórios para
ilustração e comparação, enfim, inúmeras possibilidades para que, posteriormente, em
esforços subjetivos, construam-se conhecimentos qualitativos com base nas amostras
concebidas por esta.
De qualquer forma, reafirma-se que essa pesquisa, por si só, tem caráter
majoritariamente quantitativo, abarcando-se uma grande amplitude de variáveis com o
objetivo de se fazer um grande panorama da corte constitucional brasileira, centro das
maiores polêmicas e última instância do ordenamento jurídico brasileiro.
Enfim, a construção metodológica da pesquisa se deu através da obtenção dos
dados de diferentes e variados objetos – relacionados, principalmente, com princípio da
razoável duração do processo e as imunidades que remetem competência à corte
analisada.

3. OBJETOS DA ANÁLISE

3.1. TEMPO ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO, ANÁLISE DO TEMPO EM


CONCLUSÃO AO RELATOR E REVISOR, VISTA À PGR

O que foi constado mediante análise gráfica é que nos períodos pós eleições do
Congresso e do Executivo estadual e da União, ou seja, em 2003, 2007, 2011, 2013 e
2015 houve considerável aumento de ações penais e inquéritos ao STF. Isso indica que
havia processos em outras instâncias e a partir do momento em que o investigado ou réu
assume cargo com competência da Suprema Corte ele passa a ter foro de prerrogativa
de função.
Outra análise importante é que a partir de 2007 o número de processos novos é
maior que os números de processos encerrados, tendo em vista que o número de
ministros é o mesmo e o volume processual aumenta a quantidade de processos
encerrados é sempre menor, ou seja, a celeridade fica comprometida pela grande
demanda processual.
O tempo em média dos processos que houve o maior número de anos em
tramitação foi de 8,23 anos. O trabalho elencou os dez processos menos céleres
correspondentes ao foro privilegiado, dentre os motivos de pouca celeridade há o de
troca de relator o que ocasionou a prescrição dos processos em três desses dez processos.
A média de anos em relação aos dez casos de maior tempo de conclusão ao
relator foi de 3,4 anos e de conclusão ao revisor 1,29 anos.
Houve no início do período do estudo um aumento no número de vistas à PGR
em relação aos inquéritos e as ações penas, estas últimas, entretanto, começaram a
declinar em números no início do estudo. Também é possível aferir por meio de análise
gráfica que o tempo médio que as ações penais ficam em vista à PGR reduz, salvo nos
períodos de 2006 e 2013. Portanto, a média de dias em vista à PGR, preterindo os anos
citados a posteriori, foi de 20 dias.
Os dez casos de maior número, em vistas a Procuradoria Geral da República, em
média, foram de 2 anos.

3.2 ACÓRDÃOS, DECISÕES COLEGIADAS E TRÂNSITO EM JULGADO

A análise dessa área no trabalho foi tida como problemática, pois assim
dispuseram os autores:
“Nesse levantamento (acórdãos¹, identificamos a data das decisões
colegiadas nos inquéritos e ações penais e a data da publicação do
respectivo acórdão. Quando existem múltiplas decisões colegiadas e
múltiplos registros de publicação de acórdão, calculamos o tempo entre a
primeira decisão e o primeiro acórdão, entre a segunda decisão e o
segundo acórdão e assim sucessivamente. Para cada ano, computamos a
média em função dos acórdãos publicados naquele ano.” (1 – grifo nosso)

De acordo com o regimento interno do STF, o prazo para a publicação de


acórdão é de 60 dias, contudo, pelo exame do trabalho, o prazo superou em quase todos
os anos aferidos a marca de 100 dias. Dentre as explicações para essa morosidade de
publicação salienta-se o tempo que o ministro relator leva para entregar seu voto para
publicação; o tempo que os outros ministros levam para confecção dos votos e então, o
tempo que a secretaria do STF leva para organizar esses votos para publicação.
A média de tempo dos dez casos com maior intervalo de tempo entre a decisão
colegiada e a publicação do respectivo acórdão foi de 1,74 anos, e dentre os dez, três
prescreveram. A velocidade entre a diferença de tempo da sessão do julgamento e a
publicação do referido acórdão deve ser a menor possível para garantir a publicidade e
tempo razoável do processo.
Entre a primeira decisão colegiada final e o trânsito em julgado houve aumento
do tempo do trânsito em julgado nos processos examinados no período. A média dos
dez casos com maior tempo entre a decisão colegiada final e o trânsito em julgado foi
de 4,53 anos com três prescrições e uma decadência do direito do querelante entre os
dez casos.

4. ASSUNTOS MAIS FREQUENTES EM AÇÕES PENAIS NO STF

No início do tópico os autores deixam claro que ações penais concernentes a


foro privilegiado tipificadas como crimes contra o patrimônio; contra o patrimônio e
com violência ou grave ameaça são incomuns. Contudo, faz-se mister a ressalva que,
habitualmente, um mesmo processo pode estar computado em dois assuntos diferentes.
Dentre os doze assuntos mais frequentes correspondentes a inquéritos
encontram-se graficamente: “crimes da lei de licitações (230); crimes de
responsabilidade (193); crimes eleitorais (185); peculato (159); crimes de “lavagem” ou
ocultação de bens, direitos ou valores (127); calúnia (126); difamação (117); corrupção
passiva (114); prefeito (100); injúria (99); captação ilícita de votos ou corrupção
eleitoral (89); crimes contra a ordem tributária (80)”.
Já os assuntos mais frequentes referentes a ações penais são: “crimes contra o
meio ambiente e o patrimônio genético (143); crimes de responsabilidade (63); crimes
da lei de licitações (60); peculatos (53); Prefeito (37); quadrilha ou bando (36); crimes
de lavagem ou ocultação de bens, direitos ou valores (25); injúria (24); calúnia (22);
crimes contra o sistema financeiro nacional (21); crimes eleitorais (21) e outros (317)”.
5. Resultados

De acordo com os autores, o principal complicador e responsável pela


morosidade processual da Suprema Corte é a mudança constante de instâncias do
interessado ou réu, por exemplo, “muitas vezes a investigação se inicia na primeira
instância, vai ao supremo quando o investigado assume cargo com a competência de
julgar do STF e depois retorna à instancias inferiores quando o réu sai do cargo ou
renuncia-o. É relevante o exame dos casos, pois em relação às ações penais há declínio
da competência à instâncias inferiores em cerca de dois em cada três ações penais.
Dentre as 500 ações penais autuadas no STF no período de 2007 a 2016, foram
retiradas uma amostra aleatória de 21,4% que trouxe os seguintes resultados:

a) Cargo do réu: 29,5% dos processos da amostra não continham réu


detentor de foro. Dos 237 réus identificados 68,78% não possuíam foro
privilegiado; 28,69% eram deputados ou deputadas federais; 2,53% eram
senadores ou senadoras.
b) Processos que se iniciaram no STF: Apenas 9,52% tiveram início na
Suprema Corte.
c) Crimes relativos à função: 52,88% dos processos têm seu conteúdo
sobre pelo menos um crime funcional – 61,3% dos réus foi processado
por pelo menos um crime funcional ou conexo a crime funcional.
d) Número de mudanças de competência em função do foro
privilegiado: há pouca certeza do número de processos que variavam de
competência, mas em média os processos da amostra mudaram de
competência em função de mudanças de foro 1,47 vezes.
e) Processos decididos no período: 76,19% dos processos em análise
tiveram decisão terminativa. Dentre os processos em que o réu não
possui foro por prerrogativa de função, há decisão terminativa em
93,55% dos casos, já em decisões de mérito nos casos de réus com a
prerrogativa de foro foram de 68,92% dos processos.
f) Resultados: os autores relacionaram como absolvidos aqueles em que
houve ao menos absolvição em uma imputação. Para condenação,
aqueles processos em que houve condenação em pelo menos uma
imputação. Como prescrição nos casos em que não houve condenação
nem absolvição. Nos casos em que houve ao menos uma imputação que
alterou-se a instância foi denominado como declínio.E nos casos em que
não houve ainda nenhuma decisão estão ilustrados como “não
decididos”.

Portanto, 23,81% dos casos ainda estão sem decisão; 52,38% houve
declínio; 7,62% houve prescrição; 11,43% houve absolvição; 1,9% dos
casos houve condenação do réu.

Resultados mediante a alteração da interpretação constitucional do foro por prerrogativa


de função:

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, no ano de 2017 propôs
alteração interpretativa da regra de competência do foro privilegiado. Dentre o ínterim da
proposta destacam-se duas:

1) O fato imputado ao réu ou investigado deve ter ocorrido após a investidura no


cargo;
2) O fato deve estar relacionado à função que o réu ou investigado exerce em
virtude do cargo.

Dentre o escopo em análise no determinado período apenas 5,44% das imputações e


5,71% dos processos da referida amostra satisfazem os requisitos propostos pelo eminente
ministro. Trazendo à tona essa interpretação ao ano de 2006, 19 de cada 20 ações penais
apreciadas pelo STF nesses 10 anos teriam ocorrido em instâncias diferentes.

6. CONCLUSÃO
Mediante o estudo dos casos no período em exame, concluiu-se que o STF como
instancia “originária com relação aos crimes cometidos por agentes com foro especial por
prerrogativa de função”, não consegue, na maioria das vezes, concluir – e em muitos casos
analisar – o “mérito das investigações ou acusações apresentadas pela PGR”.
Em relação à morosidade, os autores entendem que pode ser caracterizada pelo tempo
de publicação do acórdão que não é respeitado pelo Supremo; o tempo entre a autuação e o
trânsito em julgado está aumentando em relação às ações penais e o tempo entre a primeira
decisão colegiada e o trânsito em julgado também está subindo.
As causas desses aumentos de tempo, o que ocasiona a morosidade, podem-se classificar
a carga excessiva de trabalho e processos do tribunal, o que geram dados como os 5,94% das
ações penais começam e se encerram na Suprema Corte. Isso ocasiona, segundo o Ministro
Barros, “disfuncionalidade prática” do instituto – o que caberia sua revisão para melhor
aplicabilidade para que o Estado Democrático de Direito não seja prejudicado pelo Direito
Processual.
As ideias que julgam os processos em que o investigado possui cargo com a prerrogativa
do foro tem celeridade maior, pois há apenas uma instância também foi solucionada. Na verdade
isso não ocorre, de acordo com o presente trabalho, tendo em vista que somente no ano de 2016
a média de tempo entre a primeira decisão colegiada e o trânsito em julgado do processo foi de
566 dias nas ações penais.
Destarte, o que se depreende do estudo em vista é que o Supremo não consegue realizar
suas funções plenamente, pois a Corte Superior, como missão institucional, não tem a função
de condenar ou absolver, mas sim “garantir a tramitação adequada e viabilizar o julgamento de
mérito dos processos que nele chegam”.

REFERÊNCIA:

V Relatório Supremo em Números : o foro privilegiado / Joaquim Falcão...[et al.]. - Rio de


Janeiro : Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas, 2017. Disponível
em : < http://hdl.handle.net/10438/18097> . Acesso em: 14 de jun. 2018.
RELATÓRIO DE PESQUISA: “A ANÁLISE DA INFLUÊNCIA DA TV
JUSTIÇA NO PROCESSO DECISÓRIO DO STF”

Autores: Ivar Alberto Hartmann,


Guilherme da Franca Couto Fernandes de Almeida,
Beatriz Nunes Valim,
Clarissa Emanuel Leão Lima,
Gabriel Borges Mariano,
José Luiz Nunes e
Larissa de Lima e Campos.

I. INTRODUÇÃO

A pesquisa em questão nasce através do constante questionamento da sociedade jurídica


sobre o televisionamento como forma de publicidade e transparência do processo de decisão da
suprema corte brasileira, como última instância do ordenamento jurídico e corte constitucional
que é, carregando, por si só, peso de decisão nas questões mais polêmicas envolvendo o aparato
judiciário-civil.
Questiona-se, frequentemente, a franqueza dos debates realizados, apontando-se
possibilidades de que o desenvolvimento das discussões, após o início da transmissão, está
mudado, com votos mais longos e menos “sinceros” por assim dizer, com a ânsia de agradar a
população ou, ao menos, de atender as pressões que surgem com esse novo método de
transparência.
Surge, pois, a necessidade de se produzir conhecimentos empíricos/científicos acerca
do tema para que saiba se existe alguma interferência significativa, positiva ou negativa (à
mercê da intepretação subjetiva) e os caminhos a serem tomados a partir de então, saindo da
obscuridade das meras especulações que permeiam o tema.
Introduz-se com blocos de argumentação favoráveis e desfavoráveis ao meio de
transmissão de informação – televisionamento:
O argumento básico a favor do televisionamento das sessões deliberativas
de tribunais está ligado à ideia de legitimidade democrática. Tribunais de
cúpula, na maior parte do mundo, não são compostos por juízes eleitos. Sua
legitimidade democrática, portanto, parece advir de sua argumentação, das
razões que o tribunal fornece para sustentar as suas decisões e da repercussão
que essa argumentação tem na sociedade. (p. 40)

O cerne dos argumentos contra o televisionamento/publicidade das


deliberações judiciais é a ideia de que a qualidade e franqueza dos debates
entre os ministros é maior quando não há o constante escrutínio público de
sua deliberação. Virgílio Afonso da Silva, por exemplo, argumenta que
“deliberar em público claramente reduz a abertura do participante a contra-
argumentos e, acima de tudo, a sua suscetibilidade a mudar de opinião” (Da
Silva, 2013). Fatores como a preocupação com a imagem pública dos juízes
individuais e da corte como um todo, bem como o medo de abertamente
discutir questões moralmente polêmicas tornariam a deliberação menos
franca em fóruns abertos, tornando tal desenho institucional indesejável para
o tipo de decisão que cortes de cúpula geralmente tomam (Chambers, 2004).
(p. 41)

II. OBJETIVO GERAL

A finalidade do trabalho se manifesta já na introdução conforme exposto, trata-se da


elaboração de estudo científico para que se chegue a alguma conclusão acerca de possíveis
mudanças de comportamentos dos ministros da suprema corte brasileira que tenham relação
com o televisionamento das sessões – a influencia da imprensa, da pressão que pode ser gerada
pela exposição dos mesmos.

Confirma-se, contudo, o objetivo geral no capítulo III da pesquisa “Hipóteses”, uma vez
que, conforme exposto, parte-se da hipótese de que essa influência é verdadeira mesmo sem
nenhuma evidência científica / empírica consistente, e tal fato é problemático para o
enfrentamento e compreensão da real dimensão das questões envolvendo essas possíveis
alterações de hábitos e atitudes.
Nas palavras dos próprios autores:
“Portanto, nossa hipótese é que a TV Justiça influencia o comportamento dos ministros. Caso
esta hipótese seja confirmada, queremos saber em qual direção ocorre essa influência, para
então discutirmos alguns dos argumentos normativos supra.” (p. 42)
Afirma-se, pois, o objetivo geral como exame da hipótese descrita, a ser processado a
partir do método proposto a ser analisado em seguida.

III. METODOLOGIA

Apresenta natureza de pesquisa empírica com técnica quantitativa, por utilizar


levantamento de dados majoritariamente para construir seu desenvolvimento. Conforme
aparece, através da utilização de uma base de dados do projeto Supremo em Números (pesquisa
anteriormente analisada em uma de suas versões acima, ainda neste trabalho), além de bases de
dados dos tribunais brasileiros.
Fato é que pesquisas como essas, conforme exposto no relatório da pesquisa anterior,
utilizam um banco de dados com enorme amplitude e complexidade e, a utilização dessa
tecnologia permite que o desenvolvimento dessas pesquisas quantitativas seja realizado de
forma completa e aprofundada, não mais meramente “fria” como uma pesquisa quantitativa
crua, mas gerando certa facilidade na complementação subjetiva, qualitativa e interpretativa
dos dados destacados.
Tendo em vista o afã de se analisar o padrão de comportamento antes e depois da
mudança – criação da TV Justiça e consolidação da sua transmissão – seria superficial em
demasia não estender em tempo suficiente a amplitude da pesquisa, uma vez que, juntamente
com o televisionamento, advém certos fenômenos como a consolidação da televisão como meio
de transmissão de informações, o acesso da população à esse meio e o crescente poder midiático
com enorme relação a uma possível mudança de comportamentos.
Para isso, os pesquisadores utilizaram de margem considerável de tempo, o que garante
maior verossimilhança e robustez às conclusões chegadas. São 10 anos anteriores
(aproximadamente 1992 a 2002) e 10 anos posteriores (2003 a 2013). Seria cabível, por suposto,
criticar também a metodologia aqui utilizada caso se fosse enfrentar a questão da tecnologia e
seu desenvolvimento nesses 20 anos, que por claro muito mudou e poderia, também, influenciar
na obtenção desses dados, mostrando realidades diferentes para diferentes tecnologias
utilizadas.
De qualquer forma, é anacronismo contar à literalidade toda a informação obtida como
retrato único da verdade de qualquer tempo, sendo necessário fazer constantes críticas aos dados
obtidos para melhor compreensão do recorte de realidade que se pretende clarificar, uma vez
que inúmeras variáveis compõem a realidade da sociedade, seja a acessibilidade ao judiciário,
às informações, diferença de composição dos tribunais e da conjuntura política como um todo.
Tal fato não diminui o mérito em produzir o esforço de compreensão dessa realidade,
ainda mais com a complexidade produzida e a observação de enorme amplitude de quesitos
para a construção da pesquisa analisada.
Metodologicamente se deu com a divisão de pesquisadores em certas variáveis –
Objetos – a serem explicitados no próximo tópico, que remeterá a pontos específicos de método.

IV. OBJETOS

Conforme o texto apresenta, foram analisados os seguintes objetos:


1. Extensão dos votos
2. Número de votos efetivos
3. Número total de votos proferidos
4. Proporção de votos efetivos
5. Extensão do debate
6. Número de ministros presentes no debate
7. Índice de complexidade
8. Taxa de coesão
9. Debate agregado
10. Extensão agregada
11. Televisionamento
12. Vista
13. Ano da decisão
(p. 43)

Têm-se que, em geral, a tecnologia teve papel central como se pode observar na
explicitação dos métodos para análise das variáveis, sendo apenas as variáveis 1-6 codificadas
manualmente, mas já com forte preponderância da inteligência artificial para a classificação
divisão e, sobretudo, utilização de métodos de compatibilidade e probabilidade para o
reconhecimento de processos iguais, análise de efetividade dos votos, quais decisões seriam
utilizadas, dentre outras inúmeras utilizações.
Essa questão, a nós se mostra principal para ressaltar no conjunto geral de objetos e
métodos para que se produza um panorama geral, fato é que os meios devidamente descritos
com grande profundidade se encontram no capítulo IV da pesquisa, a se falar de cada variável,
conforme apresenta:
Ao medirmos a extensão dos votos de cada ministro (1), tentamos produzir
uma variável que fosse útil, medindo a extensão “real” das decisões. Se um
ministro se limita a acompanhar o relator, ou o voto de algum outro ministro,
não parece que houve, de fato, um acréscimo substantivo à decisão. Para
controlar esse fator, estabelecemos o seguinte critério: se o voto tivesse menos
de dez linhas, codificamos o tamanho do voto como zero. Se, porém, o voto
tivesse mais de dez linhas, cada página seria contada para a variável,
independentemente do seu tamanho ou conteúdo. Assim, as páginas que
compõem o relatório, por exemplo, contam para nosso cálculo. A mesma
lógica se aplica ao cálculo da extensão do debate em páginas (5): debates com
menos de dez linhas foram codificados como possuindo extensão 0 e cada
página subsequente foi contada independente de seu tamanho em termos de
linhas ou caracteres.
(p.44)

V. RESULTADOS

A pesquisa mostrou leve aumento de páginas na discussão e nos votos dos ministros
nesse tempo.
Conforme apresentado, o argumento de que seria mero efeito temporal ou circunstancial
é possível para justificar a alteração pequena de extensão nas decisões e debates, aplicou-se,
pois, outras variáveis anteriormente descritas como meio de filtrar decisões chaves para que se
fizesse análise mediante casos complexos, o que se fez presumir quando presentes quesitos
como existência de pedidos de vista, coesão da decisão e índice de complexidade considerável
– e, a partir disso, o aumento leve continua no tamanho dos votos dos ministros, o que aumenta
consideravelmente é a extensão dos debates.
Dificuldades metodológicas foram encontradas ao se tentar analisar o tamanho dos votos
dos ministros e a presença de televisionamento por conta de falta de linearidade metodológica
nos diferentes objetos analisados, uma vez que a cada um se atribuiu um desenho metodológico
que proporcionasse maior aprofundamento nos quesitos requeridos.
Com uma adaptação dos dados se construiu o resultado principal da pesquisa que mostra
uma alteração de aumento considerável no tempo de debate nos processos e levíssima alteração
no tamanho dos votos proferidos. Fato que acaba por confirmar parcialmente a hipótese de que
o televisionamento afetaria estendendo os processos no que tange ao processo decisório que
seria mais longo.
Por fim, questões acerca da legitimidade e da visão do STF pelos olhos da população
que agora acessa essas informações com a TV Justiça são propostas mediante a construção do
que mostra um maio acirramento e engajamento dos ministros em debates decisórios do que
propriamente um aumento na extensão de votos.

VI. REFERÊNCIA

A influência da TV Justiça no processo decisório do STF // Ivar Alberto Hartmann


et al. Revista de Estudos Empíricos em Direito, 38 Brazilian Journal of Empirical Legal Studies
vol. 4, n. 3, out 2017, p. 38-56

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