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Redes DTN: Como Navios da Marinha do Brasil podem

fornecer acesso à Internet para comunidades remotas da


região Amazônica

2T Douglas Silva de Lima 1

RESUMO:

Ainda na presente data, existem muitas comunidades em vários países que ainda não
estão conectadas à Internet devido a falta de uma infraestrutura própria de
telecomunicações. Este cenário ainda prevalece na região Amazônica, principalmente
nas comunidades que habitam nas beiras dos rios, conhecidas como comunidades
ribeirinhas. Soluções baseadas em comunicações via satélite são extremamente caras, de
forma que os custos mensais da mesma são equiparados com os custos para se manter
uma pequena escola nestas regiões. Devido à baixa densidade populacional, as grandes
empresas de telecomunicações não estão interessadas em investir na região. Uma forma
que apresentamos neste artigo para resolver o problema é utilizar NasHs (Navios de
Assistência Hospitalar) da Marinha do Brasil como um meio de transportar informações
e assim fornecer para essas comunidades ribeirinhas um meio de acesso a quaisquer
tipos de dados que necessitem da Internet, através de um tipo específico de rede, chamado
de DTN (Delay Tolerant Network), que possui como grande características suportar
grandes períodos de atraso e funcionar em ambientes com conectividade intermitente que
são característicos da região Amazônica.

Palavras-chave: Marinha do Brasil, Amazônia, NasH, DTN.

INTRODUÇÃO

Nos dias atuais, os recursos de comunicação fazem parte da vida cotidiana de


grande parte da população, sendo utilizados tanto para fins de entretenimento quanto para
fins de trabalho. Porém, para usufruir os serviços disponíveis é necessário que os usuários
estejam conectados através de alguma rede de comunicação de dados.

Nas grandes cidades brasileiras, há uma grande quantidade de redes de


comunicação de dados que oferecem serviços de rede em casa através de tecnologias

1
Aluno do Curso de Aperfeiçoamento em Eletrônica/2019. Turma: CA-HE. Trabalho de Conclusão de
Curso. Orientador: Professor Julio Ho, Centro de Instrução Almirante Wandenkolk.
como redes sem fios, popularmente conhecidas como Wi-Fi 2, redes cabeadas, entre outros
meios de acesso.

O que vemos, entretanto, é que a oferta de redes de comunicações de dados é mais


restrita à medida que a população se afasta dos grandes centros urbanos em direção às
áreas rurais, ou quando essa população reside em países subdesenvolvidos. No entanto,
com a popularização dos serviços de comunicação de dados, os usuários têm interesse, e
algumas vezes necessidade, de persistirem conectados independentemente do local em
que se encontrem, da hora do dia, e do fato de estarem ou não em movimento.

Figura 1 – Mapa do Acesso Domiciliar à Internet - 2010

Fonte: Centro de Políticas Sociais/FGV 3

Por meio de um mapa ilustrado, a Figura 1 representa a densidade de acesso à


Internet em cada estado do Brasil, sendo que as partes mais escuras representam estados
com uma menor porcentagem de habitantes que tem acesso à Internet. Com base nas
porcentagens apresentadas, a região norte do Brasil, mais especificamente a região do
estado do Amazonas, representa uma das áreas com menor quantidade de habitantes que
possuem acesso à Internet em todo o país. Entre as causas para esta baixa disponibilidade
do serviço temos a falta de interesse político na região, a falta de infraestrutura, além da
falta de conhecimento em muitas comunidades a respeito da Internet e sobre
computadores (AMAZONAS, 2019).

2
ALLIANCE, Wi-fi. Who we are. Disponível em: <https://www.wi-fi.org/who-we-are>. Acesso em: 15
mar. 2019.
3
Disponível em: < https://www.cps.fgv.br/cps/telefonica/>. Acesso em: 15 mar. 2019.
De acordo com Machado (2016), na região amazônica, existem cerca de 37 mil
comunidades indígenas, ribeirinhas e remanescentes, que vivem em condições precárias
onde o acesso terrestre é arriscado e diversas vezes impossível, restando apenas como
alternativa o transporte por meio de barcos ou por via aérea.

Dentro dos mais dos 22 mil quilômetros de vias navegáveis da região, Nogueira
(2016) nos diz que o acesso à serviços básicos, como por exemplo o acesso à hospitais
públicos, é praticamente inexistente. Tal ausência de apoio do poder público sobre a
região trouxe para a MB (Marinha do Brasil) a tarefa de prestar auxílio para os seus
habitantes. A MB delegou a responsabilidade sob essa tarefa para o ComFlotAM
(Comando da Flotilha do Amazonas), OM (Organização Militar) que tem como OM
subordinadas os meios navais que realizam Patrulha Naval e Assistência Hospitalar na
área de jurisdição do 9º Distrito Naval, localizado em Manaus no estado do Amazonas
(NOGUEIRA, 2016).

Entre as diversas tarefas do ComFlotAM, possuem a de prestar ACISO (Ações


Cívico-Sociais) e ASSHOP (Assistência Hospitalar), que segundo Simões (2010) são
“atividades de assistência às populações carentes do interior do país, em especial para as
populações ribeirinhas da Bacia Amazônica, visando garantir o atendimento de todos os
núcleos populacionais ribeirinhos da Amazônia e do Pantanal”. Para alcançar esse
objetivo, a MB dispõe de NAsHs (Navios de Assistência Hospitalar), cuja tripulação é
composta por médicos, dentistas e enfermeiros militares que, junto de agentes do serviço
público, proporcionam assistência médica, odontológica e social, além do fornecimento
gratuito de medicamentos e vacinas durante os atendimentos (MACHADO, 2016).

A tarefa realizada pela MB de prover atendimento e conforto para as populações


que vivem em situações precárias como as comunidades ribeirinhas, apesar de seu caráter
temporário devido aos limitados recursos dos navios, pode possibilitar que os habitantes
destas regiões tenham acesso a Internet por meio de protocolos especialmente projetados
para funcionar em ambientes característicos da região Amazônica.

Para os habitantes destas regiões remotas, ter a possibilidade de conexão com a


Internet, mesmo que apenas um simples e-mail, causaria uma grande diferença no seu
cotidiano por se tratar de uma conexão com o mundo externo, além da possibilidade de
trazer mais conforto, auxiliar na educação e poder auxiliar na divulgação de mensagens
com informações úteis à saúde pública, como por exemplo vídeos ou cartilhas para a
prevenção de doenças.

A Internet como conhecemos funciona por meio de pacotes de acordo com


California (1980), ou seja, para que ocorra a transmissão de dados pela rede, os dados
primeiramente precisam ser divididos em pequenos pacotes para então ocorrer a
transmissão dos mesmos. Um fator chave para que isso ocorra é a existência de uma
conexão ponta-a-ponta: no momento que os dados estão sendo transmitidos é necessário
que o destino dos dados esteja pronto para receber (CERF; KHAN, 1974). Entretanto,
vemos que esse fator é bem difícil de se obter em vilas e comunidades ribeirinhas da
região amazônica que estão alguns quilômetros de distantes umas das outras, além de
diversos outros fatores que podem interferir na conectividade como o clima e o meio
ambiente.

Buscando uma solução para o problema, como podemos ver em Amazonas


(2019), o Governo do Estado do Amazonas propôs uma conexão com a Internet por meio
do uso de satélites:

A fim de expandir o acesso à educação nas áreas mais distantes da floresta


amazônica, o governo amazonense elaborou em 2007 o modelo de ensino
mediado pela tecnologia, que equipou cada uma das salas de aula com um kit
tecnológico e acesso a internet por meio de conexão via satélite. É um sistema
inovador e que abrange todas as regiões do estado do Amazonas. Grupos de
alunos se reúnem em uma dessas salas tecnológicas e assistem vídeo
conferências, transmitidas em tempo real por professores de Manaus, sobre os
conteúdos do Ensino Médio brasileiro, oferecidos por módulos. Durante a
transmissão há um professor assistente presencial em sala de aula, que é
responsável por fazer a mediação e acompanhar de perto o desempenho dos
alunos. Além disso, quando não funciona o sinal, o professor presencial tem a
função de trabalhar o conteúdo e revisar o que já foi ensinado. Para isso, no
começo de cada aula o professor presencial recebe uma cartela do que será
ensinado no dia. (AMAZONAS, 2019, p.33)

Entretanto, soluções baseadas em comunicações via satélite são extremamente


caras e, caso adotadas, iriam constituir uma incoerência social, visto que a instalação e os
custos mensais 4 de uma conexão via satélite nessas regiões seriam os mesmos para manter
uma pequena escola nestas comunidades.

Em razão dos problemas citados anteriormente com a solução baseada na conexão


via satélite, uma solução barata e eficaz que podemos utilizar se trata de um tipo de rede
explicado por Warthman (2003), denominada Redes DTN (Delay Tolerant Networks),
que segundo Tudela (2019), podemos também chamar de “Redes Tolerantes a Atrasos e
Desconexões”. Foi projetada para que caso a conexão entre dois dispositivos seja perdida
os dados serão armazenados até que a conexão seja reestabelecida, de forma que tais
dados não precisariam ser reenviados, assim, com essas características, em um ambiente
com grande taxas de atraso e baixa conectividade como vemos na região Amazônica este
tipo de rede seria extremamente indicada para estabelecermos comunicações.

4
Amazônia Banda Larga. Disponível em: < http://www.bandalarga.net/planos/>. Acesso em: 15 mar.
2019.
O objetivo deste artigo é mostrar como que através de Redes DTN podemos
utilizar navios da MB para auxiliar no transporte de dados e assim, prover acesso à
Internet para comunidades ribeirinhas em áreas remotas da Bacia Amazônica, fato este
que pode trazer diversos benefícios para a saúde pública, segurança e bem-estar dos
habitantes da região.

REDES INTERNET E REDES DTN

A Internet que utilizamos no nosso dia-a-dia funciona por meio de pacotes, os


dados são divididos em pequenos pacotes e transmitidos pela rede. Tendo como base Cerf
e Khan (1974), um fator fundamental para que essa transmissão ocorra é a conectividade
ponta-a-ponta no momento da transmissão, ou seja, no momento em que o transmissor
envia o pacote de dados é necessário que o equipamento que vai receber esteja ativo e
pronto para receber os dados.

Em seu núcleo, a Internet é composta de dois protocolos de comutação de pacotes,


conhecidos como TCP (Transmission Control Protocol), criado por Cerf e Khan (1974),
e IP (Internet Protocol) criado pelo Information Sciences Institute (CALIFORNIA,
1980). Enquanto o IP é responsável pela divisão, empacotamento e entrega de dados pela
rede, o TCP é responsável por organizar corretamente estes pacotes de dados, para que
eles sejam enviados e entregues como pretendido.

Como explicado por Comer (2016):

Cada mensagem TCP é encapsulada em um datagrama IP e enviada através da


Internet. Quando o datagrama chega ao computador de destino, o IP passa o
conteúdo para o TCP. Observe que, embora o TCP use o IP para levar as
mensagens, este não lê ou as interpreta. Na verdade, o IP trata cada mensagem
TCP como dados a serem transferidos. Por outro lado, o TCP trata o IP como
um sistema de comunicação orientado a pacotes que fornece a comunicação
entre os módulos TCP em cada extremidade de uma conexão. (Comer, 2016,
p.372)

Sem o TCP, grande parte das aplicações da Internet que usamos no nosso dia a
dia, como por exemplo websites, e-mail, streaming de música, seriam impossíveis. O TCP
e o IP complementam um ao outro, porém diferente do IP, segundo Forouzan (2009), o
TCP é orientado a conexão, o que significa que requer o estabelecimento de uma conexão
entre os hosts antes dos dados serem entregues. A característica positiva do TCP é a
confiança na entrega, pois a conexão garante que os dados serão enviados e recebidos em
uma ordem pré-definida. A característica negativa, entretanto, é que grande parte das
aplicações que confiam nessa transmissão ordenada de dados, não funcionam em uma
situação em que não é possível estabelecer uma conexão entre transmissor e receptor no
momento da transmissão. O TCP foi projetado para funcionar independentemente da
infra-estrutura utilizada, podendo se comunicar por meio de diversos meios, como por
exemplo: fibra ótica, cabo coaxial, entre outros em que o protocolo IP opera.
Como mostrado na figura 2, podemos dividir a operação do TCP em três fases: o
estabelecimento da conexão, transferência de dados e desconexão. Primeiramente para
estabelecermos uma conexão deve ocorrer a troca de três mensagens (three-way
handshake) (FOROUZAN, 2009). A seguir, a transferência de dados se inicia, onde a boa
taxa de recepção de dados pelo destino é sinalizada por reconhecimentos positivos que de
acordo com Forouzan (2009) são os acknowledgments, representados por ACK na Figura
2. O encerramento de uma conexão TCP ocorre com a troca de quatro mensagens. Vendo
o funcionamento de toda a estrutura, fica evidente que para que o TCP opere normalmente
é necessário que exista um caminho ponta-a-ponta entre a fonte e o destino durante todo
o período correspondente à sessão de comunicação, além de uma baixa taxa de erros e
atrasos relativamente pequenos (FALL, 2003).

Figura 2 – Fases de operação do TCP

Fonte: Adaptado de Warthman (2003)

Por meio dessa explicação, podemos ver que a Internet com os protocolos que
utilizamos encontraria grande dificuldade para funcionar em ambientes característicos da
região amazônica, com grandes atrasos nas transferências de pacotes, além da dificuldade
de conectividade devido as características propícias do ambiente, como por exemplo as
grandes distâncias, florestas densas, rios, entre outros. Logo, tendo como objetivo a
criação de uma rede que pudesse suportar essas características é que surgiram as Redes
DTN.

Segundo Zhang (2006), Redes DTN são redes sem fio onde desconexões são tão
frequentes que na maioria do tempo não existe um caminho completo entre uma origem
e um destino. Entre as principais razões citadas para as desconexões, temos a mobilidade
dos nodos e a operação em ambientes hostis. Assim como as redes Internet, as redes DTN
também tem seus protocolos específicos de roteamento para enviar dados através de uma
rede cujos componentes estão constantemente perdendo a conexão um com o outro
(WARTHMAN, 2003). A principal diferença que podemos observar entre as duas redes
é o fato de redes DTN utilizarem um componente de memória, de tal forma que os nós de
rede são capazes de armazenar dados por uma quantidade aleatória de tempo, podendo
ser da ordem de horas ou até dias, enquanto os nós da Internet apenas retransmitem os
dados, sendo todos os recursos de armazenamento dos mesmo concentrados nos pontos
finais de conexão.

A arquitetura da rede DTN busca se apoiar na comutação de mensagens passando


a mensagem por vários nós que armazenam as mensagens até repassarem para outros nós,
tal arquitetura consiste basicamente na armazenagem de dados pelos nós e envio ao
próximo nó, até o encaminhamento ao destino final.

Uma DTN, Delay-And-Disruption Tolerant Network, ou Rede Tolerante a


Atrasos e Desconexões, é uma rede ad-hoc, ou MANET (Mobile Ad-Hoc
Network), composta por conexões sem fios entre os nós, que se auto-configura
de acordo com a inserção e remoção de novos nós em sua estrutura. Além
disso, consegue comportar-se de forma adequada mesmo com desconexões
repentinas ou atrasos na transmissão de dados entre dois nós (TABARELLI e
CESTARI, 2009).

A DTN, utiliza dos nós para a transmissão de dados, pode-se definir um nó como
uma unidade capaz de receber, armazenar e enviar o pacote, o modelo de envio dos nós é
denominado store-and-forward como explicado por Warthman (2003), sendo um
protocolo que garante a entrega das mensagens e mantem a comunicação. Desta maneira
diferente das redes IP onde a operação “store-and-foward”, espera-se que o “store” dure
apenas um breve período, nas redes DTN o nó é capaz de armazenar (discos rídigos,
memória flash, etc.) por um tempo determinado os dados, permitindo a integridade da
mensagem mesmo que o sistema caia ou reinicie, como ilustrado na Figura 3.

A comutação de mensagens apesar de ser muito simples, exige que os


responsáveis por encaminhar as mensagens - os roteadores e gateways - possuam grande
capacidade de armazenamento para poder efetuar sua tarefa com sucesso.

Figura 3 - Comutação de Mensagens Store-and-Foward

Fonte: Adaptado de Warthman (2003).


NAVIOS DE ASSISTÊNCIA HOSPITALAR

A Marinha do Brasil há muito tempo contribui para o bem-estar da sociedade em


algumas regiões do País, onde, muitas vezes, o Poder Público não se faz presente
provocando uma grande carência de serviços básicos nessas regiões. Segundo o Relatório
de Gestão do Exercício do Ano de 2017 5 emitido pela MB, essa carência é resultante,
entre outros fatores, da distância dos centros urbanos da região; da inexistência de
serviços de saúde, públicos ou privados; da falta de cultura de higiene nas populações; da
falta de atividades econômicas estáveis e lucrativas; e da falta de infraestrutura de
saneamento básico (água potável e esgoto tratado). Na região amazônica o apoio à
população carente destas regiões é realizado pela Marinha do Brasil por meio de Ações
Cívico-Sociais (ACISO) e Assistência Hospitalar (ASSHOP), em cooperação com os
agentes da saúde pública federal, estadual e municipal, prestando atendimentos médico-
hospitalares com foco na promoção da qualidade de vida e do bem-estar das populações
carentes.

A ação Cívico-Social pode ser definida como o conjunto de atividades


desenvolvidas, normalmente em caráter temporário, com o desígnio de auxiliar
as comunidades a resolver os seus problemas mais urgentes, desenvolvendo o
espírito cívico e comunitário do cidadão. Ao mesmo tempo, possibilitar a
integração dos militares com a sociedade civil. (SIMÕES, 2010, p.29)

Como muitas das vezes os únicos acessos para essas comunidades carentes são
pelo meio fluvial, para a realização das ACISO e das ASSHOP são utilizados Navios de
Assistência Hospitalar (NAsH), que segundo Machado (2016), é um tipo de navio
operado pela MB que pode ser especialmente projetado, construído ou eventualmente
adaptado para as funções de hospital flutuante. Entre os navios que estão subordinados
ao ComFlotAM que operam na área do 9º Distrito Naval, temos os NAsH Oswaldo Cruz
(U18) e Carlos Chagas (U19) foram construídos com recursos do Ministério da Saúde.
Os NAsH Dr. Montenegro (U16) e Soares Meirelles (U21), antes de serem adquiridos
pela MB, tinham emprego civil em atividades de turismo e pesca amadora. Todos
desenvolvem atividades médicas, odontológicas e sanitárias por meio da Assistência
Hospitalar à População Ribeirinha, desde o final da década de 1970 (MACHADO, 2016).

Nas palavras de Nogueira:

[...] em conjunção ao Poder Naval, os NAsH são capazes de prestar assistência


às localidades longínquas e de difícil acesso, através de meios fluviais e
aeronavais, incluindo-se a necessidade de interações com as demais Forças
Armadas, Governos Estaduais e Municipais e Organizações Não
Governamentais. (NOGUEIRA, 2016, p.86)

5
Relatório de Gestão do Exercício do Ano de 2017. Disponível em:
<https://www.marinha.mil.br/sites/default/files/relatoriogestao2017.pdf >. Acesso em: 15 mar. 2019.
NAsH AUXILIANDO NO TRANSPORTE DE DADOS

Data Mule que é um caso especial de redes DTN, é um acrônimo para (Mobile
Ubiquitous LAN Extension) de acordo com Shah, Roy e Jain (2003). Este termo tem sido
bastante utilizado em DTNs e os autores assumiram o termo “mula de dados” para indicar
a sua tradução. Seu conceito está relacionado a veículos que carregam, fisicamente, um
computador com um dispositivo de armazenamento e um módulo de telecomunicações
limitado (normalmente Wi-fi) entre áreas remotas com o objetivo de criar um enlace de
comunicação de dados eficiente (SHAH; ROY; JAIN, 2003).

Trabalhando em conjunto, as redes DTN e as mulas de dados complementam um


ao outro respectivamente, pois enquanto uma é utilizada como meio de rede que consegue
suportar atrasos e desconexões, o outros consegue carregar os dados que serão
transferidos por essa rede para regiões bem mais distantes.

Figura 4 - NAsH Oswaldo Cruz (U-18) transmitindo dados para comunidades ribeirinhas.

Fonte: Adaptado de Margalho (2014).

Devido ao rigoroso planejamento e caráter mensal das ACISO realizadas pelos


navios da Marinha do Brasil conforme Nogueira (2016), uma boa ideia seria utilizar os
navios como mula de dados, assim, carregariam os dados necessários quando estivessem
nas suas bases e iriam fazer o transporte dessas informações entre as comunidades
ribeirinhas assim como ilustrado pela Figura 4.
Uma ideia semelhante foi utilizada no Wizzy Digital Courier de acordo com
Courier (2007), que se trata de um projeto que visa oferecer acesso à Internet a escolas
rurais da África do Sul. Uma das maneiras de oferecer este acesso é através de um
mensageiro (courier). Nesse caso, o mensageiro utiliza uma motocicleta ou uma bicicleta,
como uma mula de dados, para transferir os dados entre as localidades sem acesso e as
com acesso à Internet. O transporte é realizado através de dispositivos de armazenamento
com interface USB (pen drives) ou através de redes sem fio, com as quais não é necessário
entrar na escola para obter os dados.

A First Mile Solutions, como podemos ver em FMS (2007), também trabalho com
o objetivo de prover acesso à Internet em áreas remotas não atendidas pelo serviço de
Internet. As mulas de dados, aqui chamadas de pontos de acesso móveis, são ônibus,
motos ou barcos que são responsáveis pelo transporte físico dos dados entre quiosques
das vilas e os grandes centros.

De forma semelhante ao mensageiro e as pontos de acesso móveis citado nos


projetos anteriores, sempre que um navio visitar uma comunidade ribeirinha, através das
protocolos das redes DTN ele será capaz de passar as informações para ela, desde que ela
esteja munida dos equipamentos necessários, e assim conseguiriam informações
atualizadas sobre os mais diversos temas, tendo como destaque saneamento básico,
prevenção de doenças e educação por serem os menos conhecidos pelos habitantes da
região.

Pelas características do ambiente, neste tipo de rede DTN os nós não possuem
nenhuma informação sobre o estado da rede, o que impossibilita o cálculo das melhores
rotas. Nesse caso, o algoritmo mais simples é replicar para todos os vizinhos a mensagem,
confiando na mobilidade dos nós para disseminar as mensagens em direção ao
destinatário. Para realizar essas transferências de dados, os navios irão utilizar a bordo
equipamentos que estejam configurados com os protocolos de roteamento das redes DTN,
que são dos mais diversos tipos, sendo um deles o roteamento epidêmico (LE;
SCHOLTEN; HAVINGA, 2012).

Ele é chamado desta forma pois o modo que as mensagens se propagam são como
em doenças transmissíveis que de acordo com Le, Scholten e Havinga (2012), funcionará
da seguinte forma: Quando o navio entrar no alcance dos roteadores instalados nas
comunidades, eles enviarão um sumário ao roteador do navio que identifica quais
arquivos eles contém. O roteador do navio então envia para os roteadores das
comunidades quaisquer pacotes de informação que ele tenha e que os das comunidades
não tenha. Isso acontece em ambas as direções sempre que os navios entrarem no alcance
dos roteadores instalados nas comunidades ribeirinhas (CHRISTIAN; MOH; OEY,
2013).
Através desse protocolo podemos ter uma garantia de entrega de mensagem até
mesmo quando não existe um caminho totalmente conectado entre a fonte e o destino.
Assim, esse protocolo pressupões que um nó fonte não conhece onde o nó de destino está
localizado e nem mesmo sabe qual a melhor rota para alcança-lo. A ideia é que a
mobilidade dos nós na rede possibilite que eles entrem no alcance da transmissão uns dos
outros periodicamente e, o mais importante, de maneira aleatória. Logo, a mobilidade dos
nós, sendo no caso deste estudo o nó móvel um NAsH trafegando no rio, é utilizada como
solução para entrega de mensagens, ao invés de ser tratada como um problema que precisa
ser superado na rede (CHRISTIAN; MOH; OEY, 2013).

Com a rede DTN funcionando da maneira explicitada e auxiliando as populações


ribeirinhas, as possibilidades de benefícios que podemos ter disso são inúmeros, entre
eles podemos citar:

• Um doutor em uma área mais urbanizada pode checar situações que


tenham risco a vida, como por exemplo arquivos de ultrassom de uma
mulher grávida que foram enviados por meio dos NAsHs para seu
consultório.

• Um morador ribeirinho pode relatar seu problema por meio de um vídeo e


enviar para médicos mais especializados que analisariam o problema e
enviariam o diagnóstico para o paciente por meio dos NAsHs.

• Moradores podem ter notícias atualizadas de forma mensal sobre o mundo


ao seu redor, rompendo de certa forma parte do seu isolamento.

Para que redes DTN possam ser usadas por meios da MB, no nosso caso utilizando
NAsH como mula de dados, primeiramente é necessário que haja uma homologação pelo
órgão de TI (Tecnologia da Informação) encarregado, que no caso da MB é a DCTIM
(Diretoria de Comunicações e Tecnologia da Informação da Marinha). Segundo a
publicação que trata a respeito da Doutrina da Tecnologia da Informação da Marinha, a
EMA-416, podemos definir homologação como sendo:

É o processo que consiste no conjunto de ações, realizadas de acordo com


normas editadas ou adotadas pela MB, que resultará na expedição de ato pelo
qual, na forma e nas hipóteses previstas, a entidade responsável pela condução
do referido processo reconhecerá o laudo de conformidade emitido para um
dado sistema ou equipamento avaliado, outorgando à parte interessada
autorização de uso. (EMA-416, p.3).

Após essa homologação pelo órgão responsável, devemos ter em mente que a MB
exige que todas as suas comunicações sigam requisitos básicos de SID (Segurança da
Informação Digital), que segundo a DGMM-540 são eles:
a) sigilo: capacidade da informação digital somente ser acessada por alguém
autorizado;
b) autenticidade: capacidade da origem da informação digital ser aquela
identificada;
c) integridade: capacidade da informação digital somente ser modificada por
alguém autorizado; e
d) disponibilidade: capacidade da informação digital estar disponível para
alguém autorizado a acessá-la no momento próprio. (DGMM-540 REV1, p.8-
1).

A DCTIMARINST Nº 30-13 nos diz que devemos acrescentar um fator extra em


questão de segurança quando se tratam de redes sem fio: “Por utilizarem ondas
eletromagnéticas como meio de acesso, é muito mais difícil controlar o seu alcance,
podendo facilmente ultrapassar os limites físicos da área pretendida, possibilitando a sua
detecção ou utilização por pessoas não autorizadas.” Portanto, caso ocorra das redes DTN
serem homologadas, sua implementação deve ser bem planejada a fim de garantir os
requisitos básicos de SID citados anteriormente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo foi elaborado a partir uma revisão de literatura de artigos


publicados nos últimos anos bem como o auxílio da opinião de autores, pesquisadores e
estudiosos acerca do assunto envolvendo redes DTN, sendo possível desta maneira
levantar informações e aspectos pertinentes que permitam explicar as vantagens de seu
uso a bordo de navios da MB que realizam missões de caráter humanitário em
comunidades ribeirinhas remotas da Amazônia, levando um meio de se estabelecer uma
conexão de rede nessas comunidades, fato que pode trazer inúmeros benefícios, como por
exemplo informações que possam auxiliar na prevenção de doenças, auxílio médico, entre
outros benefícios.

Como explicitado no artigo, usar NAsHs como mula de dados pode ser uma
alternativa barata de se estabelecer comunicações em áreas pobres, que são difíceis de
alcançar com uma estrutura de rede convencional, como é o caso das comunidades
ribeirinhas na região amazônica. Essa solução não depende de empresas de
telecomunicações e tem um amplo número de potenciais usos. A forma de enviar os dados
que foi descrita neste artigo tem propósitos gerais: e-mail, multimídia, dados simples,
além de outras informações que podem ser transmitidas.

REFERÊNCIAS

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<http://fas-amazonas.org/versao/2012/wordpress/wp-content/uploads/2013/06/Recortes-
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Acesso em: 17 mar. 2019.
BRASIL. Diretoria de Comunicações e Tecnologia da Informação da Marinha. DCTI-
MARINST Nº 30-13: Uso de Redes Sem Fio na MB. Brasília: DCTIM, 2014.

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