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06 Sumário executivo
40 6. Referências
Apresentação
O
Instituto Brasileiro A pandemia de covid-19
de Defesa do evidenciou como a carência
Consumidor (Idec) e do acesso à energia elétrica
o Instituto Socioambiental (ISA) fragiliza as condições de vida
são integrantes da Rede Energia em particular das populações
e Comunidades, constituída por indígenas. A disponibilidade
um grupo de organizações que do serviço nas regiões remotas
implementa projetos modelo representa não só uma
de energia limpa em prol do alternativa de melhoria da
desenvolvimento regional qualidade de vida, bem como a
sustentável das populações garantia de condições mínimas
tradicionais e indígenas1. Esses de resiliência frente a questões
projetos visam contribuir para de saúde.
que as comunidades isoladas
Nesse contexto, este relatório
tenham acesso à energia
propõe uma discussão inicial
limpa e sustentável no âmbito
sobre a urgência e os desafios
das políticas públicas de
para o provimento do serviço.
universalização do serviço.
O texto é dividido em quatro
1
. Para mais informações consultar o link:
https://www.energiaecomunidades.com.br/.
5
Sumário
executivo
A
pandemia de criação do Programa Mais Luz para a
covid-19 evidenciou Amazônia (MLA). Estimativas indicam
a vulnerabilidade dos que existam atualmente cerca de
povos que vivem em localidades 1 milhão de pessoas sem acesso à
remotas da Amazônia Legal. A falta energia elétrica na região.
de acesso a serviços essenciais
Importante observar que boa parte
como a energia elétrica é associada
da Amazônia não está conectada às
a níveis superiores de óbitos pela
linhas de transmissão elétricas do
doença na região em comparação
Sistema Interligado Nacional (SIN).
às demais regiões do país. Esse
O atendimento dos municípios e
cenário indica a urgência de se
localidades onde já existe o serviço é
promover a universalização do
feito, portanto, por meio de sistemas
acesso ao serviço na Amazônia
isolados que, em sua maioria, utilizam
Legal. Afinal, além de melhorar a
geradores a diesel. Esses sistemas
qualidade de vida, a energia elétrica
pode auxiliar no enfrentamento da possuem elevados custos de geração,
crise de saúde pública e favorecer a baixa eficiência e necessidade
resiliência das comunidades. frequente de manutenção, além de
implicarem uma complexa logística de
O Brasil empreendeu um transporte do combustível e emissões
esforço significativo em favor de gases de efeito estufa. Por outro
da universalização elétrica nos
lado, o uso de diesel na região é
últimos anos. O Programa Luz para
amplamente difundido, as cadeias de
Todos (LpT) beneficiou um total
fornecedores estão estruturadas e a
de 16,5 milhões de pessoas entre
comercialização desse combustível
2004 e meados de 2019, segundo
gera receita estadual por meio da
informações da Eletrobras. Mas o
cobrança de impostos.
desafio das comunidades remotas
na Amazônia Legal só começou a Projetos desenvolvidos pelo Instituto
ser enfrentado recentemente, com a Socioambiental (ISA) na região do
7
8
da Superintendência de
A
região amazônica Desenvolvimento da Amazônia
brasileira é definida (Sudam)2. No total, a região
territorialmente compreende 58,9% do território
como a Amazônia Legal, que brasileiro, conforme apresentado
corresponde à área de atuação na Figura 1 (1).
2
. A área de atuação da Sudam é delimitada no Art. 2º da Lei Complementar nº 124,
de 03 de janeiro de 2007. A Sudam tem por finalidade promover a integração
econômica da região constituída por 52 municípios de Rondônia, 22 do Acre, 62
do Amazonas, 15 de Roraima, 144 do Pará, 16 do Amapá, 139 do Tocantins, 141 do
Mato Grosso e 181 do Maranhão situados ao oeste do Meridiano 44º (dos quais 21
deles estão parcialmente integrados à Amazônia Legal). Possui uma superfície de
5.015.067,749 km.
9
A Amazônia apresenta ampla
diversidade sociocultural. Essa
diversidade se dá pela intensa
migração de populações de
outras regiões e, de maneira
mais importante, pela grande
diversidade de povos indígenas
e outras populações tradicionais.
No início desta década, havia
411 Terras Indígenas (TIs) na
acima, equivale a quase 60%
Amazônia Legal, cujas áreas
do território nacional. A renda
correspondiam a 21,7% do seu
e o Índice de Desenvolvimento
território e abrigavam 173 povos,
Humano (IDH) dessa população
uma população total aproximada
são inferiores aos do restante
de 250 mil pessoas (2).
do país, conforme exposto
De modo geral, a região na Tabela 1 (3). De acordo
apresenta baixa densidade com o Programa das Nações
demográfica. A totalidade da Unidas para o Desenvolvimento
sua população corresponde a (PNUD), dentre os dez
praticamente 12% da população municípios com menor IDH,
brasileira distribuída em uma todos estão localizados na
área que, conforme visto região da Amazônia Legal (4).
11
12
A
crise desencadeada maior nível de soroprevalência
pela pandemia de do Sars-CoV 2, sendo mais
covid-19 evidenciou acentuada em indígenas e pardos.
a vulnerabilidade dos povos O mesmo estudo mostra que o
da Amazônia Legal. As espalhamento do vírus ocorreu
populações que vivem mais pela via fluvial e atingiu cidades
distantes dos centros urbanos da calha do Rio Amazonas
e, por conseguinte, de leitos como Breves, no Pará, onde foi
hospitalares, estão sujeitas a constatado que 25% da população
maiores riscos (6). A falta de teve contato com o vírus (8).
acesso à energia elétrica limpa e
Análise do Instituto de Energia e
confiável, a serviços básicos de
Meio Ambiente (IEMA), por sua
saúde e saneamento, também
vez, identificou uma correlação
constituem fatores que agravam a
entre as mortes por covid-19
condição desses povos.
e o acesso à energia elétrica
Vale observar que o isolamento (Figura 2) (9). Nas regiões
de boa parte da população com maior vulnerabilidade –
poderia ajudar a evitar o contágio. onde predominam populações
O problema é que o avanço do indígenas, ribeirinhas e
desmatamento e do garimpo quilombolas – o nível de óbitos
ilegal colocam em risco esse por habitantes é mais elevado.
isolamento. Segundo pesquisa
anterior à pandemia, essas
atividades já eram percebidas
pelos indígenas como problemas
de saúde pública (7).
A pandemia está afetando de
maneira significativa a Região
Norte. Estudo indica que há
13
Figura 2. Mapa de óbitos causados por covid-19 - Fonte: IEMA (2020)
700
650
600
550
500
450
400
Casos
350
300
250
200
150
100
50
0
Abr/20 Mai/20 Jun/20 Jul/20 Ago/20 Set/20 Out/20 Nov/20 Dez/20 Jan/21 Fev/21 Mar/21 Abr/21
Indígenas mortos pela COVID-19 (Comitê) Indígenas mortos pela COVID-19 (Sesai)
4
. Foram criadas UAPIs em locais estratégicos em diversas áreas da Amazônia como
TI do Xingu, TI Rio Negro, TI Yanomami, TI Panará, TI Mekrangoti, TI Baú, Reserva
Extrativista (RESEX) Riozinho do Anfrísio, RESEX Rio Iriri, RESEX Rio Xingu, TI Kaiapó,
TI Capoto/Jarina, TI Juminá, TI Uaça, TI Waiãpi, TI Parque do Tucumaque, TI Zoé, TI
Kaxuyana/Tunayana, TI Trombetas-Mapuera e TI Nhamundá-Mapuera.
15
Essas unidades são capazes para apoiar as ações voltadas à
de atender pacientes de baixa área de saúde no enfrentamento
complexidade, com uso de da covid-19, ao possibilitar o
equipamentos para estabilizar funcionamento de equipamentos,
doentes de covid-19 com a refrigeração e a conservação de
problemas respiratórios. Nesses vacinas (12).
locais o acesso à energia elétrica é
Como será discutido, o acesso à
fundamental para o atendimento
energia elétrica é indispensável
aos pacientes.
para o sucesso de iniciativas
Além disso, surgiram iniciativas desse tipo, na medida em
para viabilizar que as populações que fortalece a resiliência dos
indígenas ficassem em suas povos, favorece sua subsistência
aldeias, como campanhas para e cria condições para que
levantar recursos para adquirir as comunidades possam se
materiais de limpeza e higiene, desenvolver e ter acesso a outros
alimentos e ferramentas de serviços públicos essenciais.
agricultura (14). Cabe ressaltar
que a eletrificação também é
um dos fatores que facilitam que
as pessoas permaneçam em
isolamento social.
Somando-se a essas ações de
controle da pandemia, foi iniciada
a vacinação das populações
indígenas. No TIX, por exemplo,
quase metade da população já
recebeu a primeira dose (12).
Nesse contexto, a disponibilidade
de eletricidade é fundamental
5
. A maioria das distribuidoras que operam na Região Norte foram privatizadas
recentemente. Apenas a Companhia de Eletricidade do Amapá (CEA) continua
sendo estatal.
19
Figura 1 - Sistemas Isolados - Ciclo 2019
Figura 5. Localização dos Sistemas Isolados. - Fonte: EPE (2019)
21
de 2020, o Programa Mais Luz
para a Amazônia (MLA). O foco
do MLA é o atendimento às
Mas, após todos esses anos de
populações remotas da região
políticas para universalização
da Amazônia Legal (24). Esse
do acesso à energia, o desafio
programa, apesar de ser muito
das comunidades remotas na
similar ao LpT, orienta esforços
Amazônia Legal só começou a
para o atendimento dessa região
ser enfrentado recentemente.
a partir de fontes renováveis
Segundo estimativas do IEMA,
de energia. A meta inicial do
há atualmente cerca de 1 milhão
programa é atender 70 mil
de pessoas sem acesso à energia
famílias até 2022 (25).
elétrica na região (9). Desse
total, aproximadamente 500 Algumas constatações indicam
mil pessoas estão localizadas que é preciso definir estratégias
em comunidades remotas, cujo para acelerar e melhorar esse
atendimento depende da adoção processo, tendo em vista que
de sistemas de geração off- o país está alijando uma parte
grid, isto é, sem conexão com significativa da população do
a rede de distribuição. Apesar exercício do seu direito à energia.
das estimativas de exclusão do No atual contexto, é provável
acesso relativamente inferiores que o programa seja adiado,
aos números históricos do Luz pois, segundo informações
para Todos, os desafios não do MME, espera-se que a
serão menores. As dificuldades região da Amazônia Legal seja
de acesso às comunidades, as completamente universalizada em
prioridades de investimentos das 2030 e o programa se estende, a
concessionárias da Região Norte e princípio, até 2022 (26).
a falta de um modelo de negócios As possíveis prorrogações do
que atraia investidores tendem a prazo para universalização estão
impactar o processo. ligadas a dois fatores principais.
Diante desses desafios, o O primeiro é a maneira pela qual
Ministério de Minas e Energia a política de universalização está
(MME) criou, por meio do organizada, em que o prazo dos
Decreto 10.221, de 05 de fevereiro processos se dá muito mais em
6
. Com essa realidade é urgente a revisão dos subsídios que impactam a Conta de
Desenvolvimento Energético, mantendo-se aqueles que são necessários e com alto
retorno social, como é o caso das políticas de universalização.
7
. De acordo com a International Energy Agency (IEA) (27), nos domicílios o acesso
à eletricidade deve viabilizar, inicialmente, alguns serviços básicos, como iluminação,
recarga de celular, rádio, refrigerador, ventilador e aparelho televisor; e o ideal é que
haja aumento da disponibilidade de energia ao longo do tempo, até atingir os níveis
da média regional. Considerando o uso de equipamentos padrão, o acesso a esses
serviços corresponde a um consumo mensal de 104 kWh, e, no caso de uso de apa-
relhos eficientes, 35 kWh.
23
O Mais Luz para a Amazônia renovável em comunidades
avança no sentido de indicar isoladas da Amazônia, onde
essa prioridade. Porém, seria mais de 8.900 pessoas foram
importante que ela também beneficiadas diretamente. Os
estivesse prevista nos normativos usos finais da energia podem
regulatórios do programa. Isso ser observados no Quadro 1
daria mais clareza tanto às (29). As demandas energéticas
distribuidoras como à Eletrobras e encontram similaridade nos
ao Ministério de Minas e Energia. serviços essenciais, distribuídos
Deve-se considerar que há uma nas atividades produtivas,
demanda reprimida significativa. domésticas e serviços públicos.
Em paralelo ao caso do Xingu,
Além disso, será fundamental que
detalhado a seguir, são comuns as
os processos de implantação dos
demandas por abastecimento de
sistemas de geração distribuída
água, saneamento, comunicação,
considerem protocolos de consulta
iluminação, conservação de
às comunidades e apresentem
alimentos, entre outros serviços.
certo grau de flexibilidade
para adaptações, conforme Mas aspectos culturais e o modo
as necessidades específicas de organização de cada povo
de cada comunidade. Dada a influenciam na sua relação com a
multiplicidade de povos e suas energia elétrica: aldeias maiores,
diferentes reivindicações, os usos por sua população, e os pólos-
de energia elétrica podem variar base, por sua posição estratégica,
de acordo com a forma pela qual a tendem a ter uma demanda
comunidade se organiza (28). maior de energia. Esses fatores
Nesse contexto, o Fundo podem conferir necessidades
Mundial para a Natureza (WWF) específicas, justificando as
compilou os resultados de diferenças na demanda de
diferentes iniciativas de energia energia de cada comunidade.
8
. A Resolução Normativa 493 de 2012 da Aneel, que regulamenta os critérios para
atendimento por meio de Sistema Individual de Geração de Energia Elétrica com
Fonte Intermitente (SIGFI) ou Microssistema Isolado de Geração e Distribuição de
Energia Elétrica (MIGDI), estabelece um limite de 80 kWh de disponibilidade mensal
de energia por unidade consumidora.
Abastecimento
Irrigação, limpeza
Abastecimento de humano (beber,
e processamento
água, irrigação e tomar banho, lavar Saneamento
de produtos
saneamento louça, lavar roupa
extrativistas
etc.)
Refrigeração e
produção de gelo
Conservação de
para conservação Refrigeração de Refrigeração de
alimentos e outros
de produtos alimentos vacinas
produtos
comercializados
(pescados etc.
Escolas e
Iluminação de
Iluminação estabelecimentos
Iluminação currais, granjas,
residencial comunitários
campos etc.
funcionando à noite
Lazer,
Produção de
Geração de Eletrodomésticos entretenimento
artesanatos, uso de
energia (ventilador etc.) e diversos usos
cerca elétrica etc.
comunitários
25
26
A
Bacia do Rio Xingu
representa grande
patrimônio da
diversidade socioambiental Queimadas no Corredor Xingu
da Amazônia (30). Possui o de Diversidade Socioambiental
segundo maior corredor de
Terras Indígenas em território
nacional, com um total de
139.517 km2. Quando somadas
às unidades de conservação
(UCs) da bacia, essas terras
formam o maior corredor
contínuo de áreas protegidas do
Brasil, com aproximadamente 27
milhões de hectares localizados
em 40 municípios dos estados
do Pará e Mato Grosso. Nele,
vivem centenas de famílias
ribeirinhas e 26 povos indígenas,
compondo uma população de
mais de 17 mil pessoas.
O corredor se encontra na
fronteira agrícola da Amazônia,
região que está sob intensa
pressão do agronegócio,
mineração e de atividades
ilegais ligadas à grilagem,
exploração madeireira e
desmatamento, conforme se
apresenta na Figura 6.
A maior parte dos povos que
habita o corredor garante sua
subsistência a partir da floresta
com a produção de itens como a Figura 6. Corredor de Terras Indígenas
castanha, borracha, mel, cumaru e e unidades de conservação na Bacia
óleos vegetais. do Rio Xingu - Fonte: ISA.
27
Algumas dessas produções
são realizadas há muito
tempo e outras estão
em desenvolvimento por
associações comunitárias
participantes da Rede
Xingu+. Gradualmente, essas
associações têm aderido à
iniciativa Origens Brasil, que visa
a comercialização da produção
da floresta com critérios de
comércio justo que valorizem Trata-se de um território
os serviços socioambientais multiétnico, plurilinguístico e
prestados por esses povos. com sistemas cosmológicos
O sistema proporciona e organização política interna
rendimentos acima da média na distinta. As aldeias estão
região, estimulando iniciativas distribuídas ao longo dos 1.500
sustentáveis de geração de km de rios que atravessam os
renda, a cultura dos povos da municípios mato grossenses de
floresta e o fortalecimento das Canarana, Paranatinga, São Félix
associações locais. do Araguaia, São José do Xingu,
Gaúcha do Norte, Feliz Natal,
Na parte sul do corredor
Querência, União do Sul, Nova
localiza-se o TIX, que é formado
Ubiratã e Marcelândia.
pelo conjunto dos territórios
contíguos do Parque Indígena Os limites geográficos do TIX
do Xingu e das Terras Indígenas com a maior parte desses
Wawi, Batovi e Pequizal municípios impõem um desafio
do Naruvotu, distribuídos de gestão. Os povos indígenas
em uma área de 2.825.470 devem ser capazes de planejar
hectares que compartilha uma e priorizar suas demandas,
mesma estrutura de gestão organizando sua participação
administrativa. Ao todo, são 16 política em cada uma das
povos indígenas em mais de 100 cidades sem perder de vista a
aldeias, com uma população de condição do TIX como unidade
aproximadamente 7 mil pessoas. territorial principal. Isso se
9
. Em muitas comunidades o fornecimento de diesel não é suficiente para se manter
um atendimento regular com número de horas definidas ao longo do dia e há sérios
problemas com a manutenção desses sistemas.
29
As iniciativas para fornecimento de gestão territorial, protocolo
de energia elétrica no TIX, como de consulta, associativismo,
o Projeto Xingu Solar, descrito a produtos da floresta, formação
seguir, exemplificam algumas das de técnicos locais em energia e
muitas realidades encontradas estudo com análise de impacto
na Amazônia e desafios a serem do acesso à energia. Por isso,
enfrentados. Essas iniciativas podem auxiliar na proposição
merecem destaque por de ações para ampliar a
incluírem estudos de potencial infraestrutura energética para o
energético, projetos-piloto atendimento das comunidades, o
para o acesso à energia de uso que deve ser feito com diálogo,
comunitário, análise de cenários tecnologias adequadas a cada
de atendimento, assembleias realidade e estímulos à gestão e
de governança interna, plano inovação locais.
10
. O Xingu Solar foi desenvolvido a partir do apoio da Fundação Mott que, dentro
do seu portfólio de Acesso à Energia, visa fornecer subsídio financeiro para o
desenvolvimento de projetos de energia limpa.
31
A experiência acumulada pelo
ISA em 25 anos de trabalho e
diálogo permanente com as
comunidades locais possibilitou
a identificação das principais
necessidades por energia nas
aldeias e polos do território,
conforme exibido no Quadro
2. Enquanto as demandas
Para cumprir essas disposições, básicas são comuns às aldeias,
foram instaladas energia solar independentemente do número
e mini redes, com linhas de de habitantes, as demandas
transmissão elétrica enterradas. adicionais geralmente são
O projeto forneceu eletricidade requeridas em aldeias mais
no TIX para abastecer 4 escolas populosas – denominadas
e 52 salas de aula anexas; 37 centrais ou principais –, e
instalações de saúde; internet também nos pólos-base.
em 14 locais; 12 escritórios
Dentre as alternativas para
comunitários; 7 casas para
auxiliar no suprimento de
produção de mel e 4 casas para
energia elétrica para atender
processamento de sementes.
essas demandas, a opção de
Além disso, técnicos indígenas
maior viabilidade foi a energia
foram treinados na instalação e
fotovoltaica, por conta da
gestão dos sistemas solares.
facilidade de apropriação
Portanto, de maneira mais tecnológica pelas comunidades,
ampla, a iniciativa contribui pelo fato de a maioria das
na formulação de políticas necessidades se referir a usos
públicas que atendam a intermitentes e por não dificultar
demanda por energia elétrica as atividades cotidianas das
das comunidades isoladas famílias. Em contrapartida,
considerando as especificidades possui limitações e restrições
culturais desses povos. quanto a fornecer grandes
33
semelhantes. Elas recaem sobre
os usos não comunitários da
energia elétrica – principalmente
pelos jovens –, a necessidade
de mais capacitação técnica
para manutenção dos sistemas,
a ausência de recursos
conservação adequada dos soros
para reposição de peças e
antiofídicos e vacinas, segundo
a insuficiência de potência
Marité Txicao, agente indígena de
de energia elétrica para os
saúde (32).11
equipamentos das aldeias.
Os indígenas também
Segundo Paulo Junqueira,
reconhecem que os painéis
coordenador adjunto do
solares causam menor impacto
Projeto Xingu Solar, como a
ambiental em relação aos
organização dessas comunidades
geradores a diesel. Dentre os
é baseada em grande medida
motivos, destacam-se a ausência
no atendimento aos interesses
de barulhos, ausência ou menor
coletivos, as questões referentes
emissão de gases de efeito
à disponibilidade de energia
estufa e a não dependência de
elétrica, seus usos e a operação
combustível fóssil para a geração
do sistema são discutidas em
de energia (31).
grupo, levando-os a encontrar
As preocupações sobre a soluções mais adequadas ao seu
energia elétrica dos grupos que modo de vida, isto é, soluções
receberam sistemas e os que xinguanas que são muito mais
não os receberam são muito eficazes para os problemas (32).
. Existe estrutura nos pólos para armazenamento dos soros antiofídicos, mas os
11
mesmos ainda não estão disponíveis, pois os protocolos de saúde exigem a presença
de médico no local de atendimento.
35
36
C
omo descrito
anteriormente, este
documento consiste
em uma contribuição do IDEC
e do ISA para as discussões da
Rede Energia e Comunidades
e da sociedade em geral sobre
as políticas de universalização
do acesso à energia elétrica na
Nesse contexto, cabe avaliar
Amazônia Legal.
estratégias que poderiam
A pandemia de covid-19 acelerar esse processo, pois,
evidenciou a situação de no ritmo previsto, uma parte
vulnerabilidade dos povos que significativa da população do país
vivem em localidades remotas da continuará alijada do exercício
região devido à falta de acesso a de seu direito por muito tempo.
serviços essenciais. Como visto, Essa avaliação deve estabelecer
o acesso à energia elétrica, além uma agenda comum a partir da
de melhorar a qualidade de vida, articulação entre os diferentes
pode auxiliar no enfrentamento da atores – sociedade civil, MME,
crise de saúde pública e favorecer concessionárias e Aneel –,
a resiliência das comunidades. em regime de colaboração
com as lideranças indígenas e
De acordo com o MME, a
comunitárias.
universalização do acesso à
energia elétrica no país está Para isso, o ponto de partida é a
prevista para ocorrer em um prazo realização de um mapeamento
de seis a dez anos. Na forma completo das comunidades das
como está organizada, o prazo áreas remotas sem acesso à
dos processos se dá muito mais energia, para a elaboração de um
em função do ritmo e tempo plano nacional de eletrificação
estabelecido pelas distribuidoras, rural atualizado. Esse plano
do que pelas necessidades das deve ser construído a partir
comunidades. dos protocolos de consulta
37
às comunidades, de forma
a assegurar o atendimento
integral das demandas familiares
e produtivas de cada povo,
tendo em vista a diversidade
sociocultural existente.
Assim, poderá incentivar o
desenvolvimento sustentável
a partir do fomento às cadeias
produtivas ligadas à economia
florestal de baixo impacto,
deve prever a implementação
conservação da natureza e
de um programa robusto de
proteção do território.
treinamento e capacitação
Além disso, é preciso haver para a gestão dos sistemas. O
integração com outras políticas mapeamento de iniciativas bem-
e programas do governo, pois o sucedidas mostra que a operação
desenvolvimento sustentável das e manutenção dos sistemas pelas
comunidades também depende próprias comunidades ou suas
de ações nas áreas da saúde, associações contribuem para a
educação, moradia, saneamento maior autonomia desses povos.
básico e alimentação. Isso
Por fim, considerando essas
pode contribuir com a melhoria
recomendações e os pontos
da sua qualidade de vida e a
levantados ao longo deste
manutenção de sua cultura.
documento, as duas organizações
Ainda, além da implantação indicam os seguintes aspectos
dos sistemas de geração a serem considerados para a
distribuída em regiões remotas implementação e a aceleração
para expansão do atendimento, das políticas de universalização
a política de universalização nos próximos anos:
39
6. Referências
41
(9) INSTITUTO DE ENERGIA E MEIO AMBIENTE (IEMA). Contribuições para a
identificação de prioridades de atendimento para o Programa Mais Luz para
a Amazônia. 2020.
(13) RADLER, J.; HANDAM, A.A. Rio Negro combate covid-19 com
cooperação entre autoridades e sociedade civil. Socioambiental.org, 16.
jun. 2020. Disponível em: <https://www.socioambiental.org/pt-br/noticias-
socioambientais/rio-negro-combate-covid-19-com-cooperacao-entre-
autoridades-e-sociedade-civil>.
(14) HARARI, I.; MOAN, S. Xingu contra a covid-19: de norte a sul parceiros se
articulam para enfrentar pandemia. Socioambiental.org, 17 jul. 2020. Disponível
em: <https://www.socioambiental.org/pt-br/noticias-socioambientais/xingu-
contra-a-covid-19-de-norte-a-sul-parceiros-se-articulam-para-enfrentar-
pandemia>.
43
(23) EMPRESA DE PESQUISA ENERGÉTICA (EPE). Planejamento do
Atendimento aos Sistemas Isolados: Horizonte 2024 – Ciclo 2019. Dez. 2019.
Disponível em: <https://www.epe.gov.br/sites-pt/publicacoes-dados-abertos/
publicacoes/PublicacoesArquivos/publicacao-452/EPE-NT-Planejamento%20
SI-ciclo_2019_rev1.pdf>.
(26) HAJE, L. Governo prevê prazo de 7 a 10 anos para que luz chegue a 72
mil famílias da Amazônia. Camara.leg.br, 26 nov. 2019. Disponível em: <https://
www.camara.leg.br/noticias/617876-governo-preve-prazo-de-7-a-10-anos-para-
que-luz-chegue-a-72-mil-familias-da-amazonia/>.
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