Você está na página 1de 4

A MULHER NO MERCADO DE TRABALHO VS.

ÉTICA EMPRESARIAL
Ketleen Moretto Santana

O papel da mulher no mercado de trabalho ganhou força com a convocação dos homens para
a I e II Guerras Mundiais, neste período foi necessário que os homens deixassem suas casas e
famílias para lutarem, fazendo com que as mulheres assumissem suas posições seja nos
negócios da família ou nos postos de trabalho para que pudessem garantir o sustento da
família. Este papel se manteve em alta após as guerras, uma vez que alguns homens não
chegaram a retornar para casa e os que conseguiram tal façanha, acabaram voltando
mutilados e impossibilitados de retornarem ao trabalho.

Conforme Probst (2003), após a fixação do sistema capitalista e com a evolução tecnológica
das fábricas, a mão-de-obra feminina foi extremamente importante, pois as mulheres
passaram a constituir o quadro de funcionários das fábricas. Sendo assim, se fez necessário a
criação de leis que favorecessem as mulheres neste cenário. Portanto, a Constituição de 32
consagrou que direitos para melhorar o cenário de trabalho, tais como: salário igual para
trabalho de igual valor, sem distinção de sexo; o trabalho feminino não poderia ser executado
entre às 22 horas e às 5 da manhã; nas quatro semanas que precedem o parto e nas quatro
semanas posteriores é vedado o trabalho da mulher, bem como, a demissão motivada
justamente pela gravidez.

Este espaço de conquista das mulheres aumentou gradativamente, porém, ainda há uma
grande diferença entre a participação dos homens e das mulheres. Conforme o relatório
“Perspectivas Sociais e de Emprego no Mundo: Tendências para Mulheres 2018”, publicado
pela Organização Internacional do Trabalho - OIT, em março de 2018, a taxa de participação
das mulheres no mercado do trabalho contabilizou 48,5%, ficando 26,5 pontos percentuais
abaixo da taxa de participação dos homens. Também é possível observar no relatório que a
taxa de mulheres desempregadas ficou em 6%, estando 0,8 ponto percentual acima da taxa de
desemprego dos homens.

Mesmo com o aumento do espaço adquirido pelas mulheres, é possível identificar que poucas
assumem o cargo de gestão ou qualquer cargo de liderança. Conforme os dados:
No Brasil, as mulheres são 41% da força de trabalho, mas ocupam somente 24% dos
cargos de gerência. O balanço anual da Gazeta Mercantil revela que a parcela de
mulheres nos cargos executivos das 300 maiores empresas brasileiras subiu de 8%,
em 1990, para 13%, em 2000. No geral, entretanto, as mulheres brasileiras recebem,
em média, o correspondente a 71% do salário dos homens. (PROBST, 2003, p. 3)

Na sociedade contemporânea podemos vincular a ascensão das mulheres no mercado de


trabalho à pressão externa exercida nas organizações, uma vez que ter mulheres como
funcionárias trata-se de uma questão de ética e responsabilidade para com a sociedade. Tendo
em vista este viés da ética empresarial, percebemos que:

Na concepção de WRIGHT et al (2000), o modelo de administração estratégica


começa com a análise de oportunidades e ameaças ambientais. ANSOFF &
MCDONNALD (1993) enfatizam a relação entre organização e ambiente quando
denominam a atividade estratégica da empresa como o projeto e implementação do
ajuste da empresa a seu ambiente externo. (PENA, 2003, p. 2)

Sendo assim, podemos adotar que a admissão das mulheres passa a ser uma exigência nas
empresas, tendo em vista a imposição de uma adaptação às necessidades apresentadas pela
sociedade contemporânea e seguindo a ideia da ética empresarial. Além disso, “[...] a ética se
torna uma exigência estratégica (externa) por causa das demandas sociais”, (PENA, 2003).

Esta adaptação estratégica pode justificar a resistência à igualdade salarial e à ascensão das
mulheres aos cargos de liderança ou gerência. Uma vez que a necessidade de contratação
feminina faz parte de um planejamento estratégico para cumprimento de uma imposição
ética, estes detalhes referentes à remuneração e plano de carreira deixam de ser importantes,
pois o dever foi cumprido já no momento da admissão.

Ainda conforme Pena (2003), a ética acaba fundamentando o planejamento estratégico das
organizações e dentre diversas opções para representação desta ética, as organizações irão
direcionar-se para as que irão lhe favorecer no contexto social e, principalmente, no setor de
qual faz parte, objetivando a promoção da imagem institucional e tentando ser assertivo na
exigência do ambiente quanto ao seu papel na sociedade.

Além disso, é possível identificar alguns dos motivos que dificultam o ingresso da mulher
neste espaço de poder. Os cargos das altas cúpulas são tidos para os colaboradores como uma
posição almejada, um papel a ser seguido ou até mesmo um herói que irá guiar o futuro de
todos. Além disso, algumas características são necessárias para o desempenho deste papel:

[...] Da literatura “administrativa” - mais precisamente dos textos dos grandes


autores da administração - se sobressai que um “administrador” é um “profissional”,
que ser “administrador”, é primeiro e sobretudo ser competente. A competência em
questão não saberia ser reduzida ao bom senso ou à experiência: trata-se de “um
corpo organizado de conhecimentos e saberes”. Esta competência é, essencialmente,
o resultado do trabalho da Razão. [...] O que caracteriza, fundamentalmente, este
personagem heróico, é mais precisamente a associação
Razão-Saber-Legitimidade-Poder-Bem. (SOLÉ, 2003, p. 5)

Fica visível, então, a necessidade da legitimidade e do poder para poder exercer o papel de
administrador em uma organização. O poder é tido como um fator para a sobrevivência e está
vinculado, principalmente, à relação de força entre os indivíduos e suas posses. Esta falta de
legitimidade quando há uma mulher no poder fica explícita quando, conforme:

[...] Revela ainda que tanto homens quanto mulheres sentem-se desconfortáveis sob
o comando de uma mulher e que o sentimento, nesse caso, perpassado pelos seus
superiores, é de condescendência. Na posição de liderança, enfatiza Beauvoir (1999,
p. 471), o homem tem o hábito de se impor e fazer com que acreditem em sua
competência. Já a mulher não transmite esse mesmo sentimento de segurança,
porque se torna afetada, exagerada e faz demais. “Nos negócios, na administração,
mostra-se escrupulosa, minuciosa, facilmente agressiva”. (KANAN, 2010, p. 249)

A mulher tende a percorrer um caminho muito maior para ser aceita e ainda assim, há muita
relutância dos funcionários perante à liderança feminina. As principais características da
mulher são a delicadeza e a fragilidade, características estas que são advindas principalmente
de uma comparação física entre homens e mulheres. Esta percepção acaba sendo vinculada à
necessidade de apoio masculino para a maioria das tarefas em sua trajetória.

Em virtude da visão machista de que as mulheres não são capazes de administrarem os


negócios ou não conseguirem liderar um grupo, as questões de igualdade são deixadas de
lado. Portanto, a admissão para execução de tarefas simples já é tida como um prêmio e deixa
de se ver a necessidade de continuar promovendo a igualdade - tanto salarial, quanto de
cargos -, uma vez que a necessidade ética e social já foi sanada. A dificuldade dos grupos de
trabalho de se sentirem confortáveis e não espantados ao verem uma mulher na liderança,
também é uma grande barreira para a ascensão da mulher no mercado de trabalho. Esta
dificuldade é ainda mais intensa nos locais em que os profissionais da alta cúpula são eleitos,
pois, os votantes não se sentem seguros para entregar o futuro de uma organização nas mãos
de uma mulher. Para isso, é preciso desmistificar a ideia da fragilidade e da falta de controle
feminina, pois estas são tão competentes quanto os homens para o exercício da liderança.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

PROBST, Elisiana Renata; RAMOS, Paulo. A evolução da mulher no mercado de trabalho.


Santa Catarina: Instituto Catarinense de Pós-Graduação​, p. 1-8, 2003.

PENA, Roberto P. M. ​Responsabilidade Social da Empresa e Business Ethics: uma


relação necessária?​ Anais do XXVII EnANPAD, Atibaia/SP, 2003, 21-24 set. 2003.

SOLÉ, Andreu. ​Essa imagem da qual somos tão prisioneiros. ​Gestão.org, 2003.

KANAN, Lilia Aparecida. Poder e liderança de mulheres nas organizações de trabalho.


Organizações & Sociedade​, v. 17, n. 53, 2010.

Organização Internacional do Trabalho. ​Perspectivas Sociales y del Empleo en el Mundo:


Tendencias del Empleo Femenino. Genebra, 2018. 15 p. Disponível em:
<http://www.ilo.org/global/research/global-reports/weso/trends-for-women2018/WCMS_619
603/lang--es/index.htm>. Acesso em: 29 nov. 2018.

Você também pode gostar