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Em busca de um território do desenvolvimento - análise do estágio do


PROCAD

Allain Wilham Silva de Oliveira

allain@ufv.br

RESUMO

Este artigo é sobre resultados alcançados no estágio


PROCAD/CASADINHO/UFRN/UNESP, realizado durante o período de treinamento em
nível de doutorado em Geografia na FCT/UNESP. Foi analisada a inserção da fruticultura
irrigada em uma nova economia do Rio Grande do Norte. Foram realizadas visitas e
entrevistas em órgãos públicos, empresas rurais, associações e pequenos produtores. Os
resultados podem ser divididos em dois: no primeiro, observou-se um modelo de
desenvolvimento via mercado globalizado, com significativa inovação técnica, no caso a
fruticultura irrigada, com articulação de componentes internos e externos ao território, com
crescimento econômico, mas com exclusões socioespaciais. No segundo, ao deparar com
uma realidade distinta da Tese em estudo, pode-se avançar no resultado do estudo, assim,
com considerações afirmativas sobre esse estágio no desenvolvimento do treinamento de
doutorado.

Palavras-chave : Agricultura Irrigada, Procad , Rio Grande do Norte

Abstract
This article about results achieved in PROCAD stage / Casadinho / UFRN / UNESP,
performed during the training period at the doctoral level in Geography at the FCT /
UNESP. the insertion of irrigated fruit in a new economy of Rio Grande do Norte was
analyzed. They were visited and interviews in public agencies, rural businesses,
associations and small producers. The results can be divided into two: the first, there was a
model of development through global market, with significant technical innovation, where
irrigated fruit growing, with coordination of internal and external components to the
territory with economic growth, but with exclusions sociospatial. Then, when faced with a
different reality of the thesis study, we can advance the result of the study, as with
affirmative thoughts on this stage in the development of doctoral training.

Key Words: irrigated fruit, Procad , Rio Grande do Norte


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INTRODUÇÃO

No treinamento em nível de Doutorado, desenvolvido no Programa de Pós-


Graduação em Geografia, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus Presidente Prudente, período de
março de 2011 a março de 2015, que resultou na tese intitulada “Desenvolvimento
Territorial, Políticas Públicas e Inovação Social no Alto Jequitinhonha – MG”, foram
realizadas análises referentes às políticas públicas e suas possibilidades de promover o
desenvolvimento rural.
A pesquisa da tese e o estágio no PROCAD tinham como pontos confluentes a
questão desenvolvimento rural que nos possibilitou realizar observações, estabelecendo um
contraditório na pesquisa, importante para sua ampliação e produção, ou seja,
desenvolvimento territorial, políticas públicas e inovação social no Vale do Jequitinhonha.
O estágio no PROCAD abriu a possiblidade de conhecer uma realidade bastante diversa da
existente no Vale do Jequitinhonha.
Foi-nos apresentada a possibilidade de participar do projeto desenvolvido em
parceria pelas equipes da Universidade Estadual Paulista (Campus de Presidente Prudente -
SP) e da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, por meio do Programa de
Cooperação Acadêmica (Casadinho/PROCAD) dos Programas de Pós-Graduação em
Geografia (Mestrado e Doutorado) das duas instituições. O objetivo do estágio no
PROCAD seria auxiliar na análise da fruticultura irrigada e sua inserção em uma nova
economia globalizada do Rio Grande Norte, com os professores tutores na UFRN: Prof.
Dr. Celso Donizete Locatel e Prof. Dr. Francisco Fransualdo de Azevedo (PPGe – UFRN)
e orientação e co-orientação do Prof. Antonio Nivaldo Hespanhol e da Profa. Rosangela
Aparecida. M. Hespanhol (FCT-UNESP). O período de estágio na UFRN teve início em 20
de agosto de 2014 e término em 23 de setembro de 2014.
O plano de trabalho elaborado consiste em: levantamento bibliográfico e documental
referente à fruticultura no Estado do Rio Grande do Norte, realização de trabalho de campo
nos Vale do Apodi-Mossoró e Açu. Foram feitas observações sistemáticas e realizadas
entrevistas com dirigentes de empresas processadoras de frutas, Cooperativa de
Fruticulturas dos Irrigantes, Cooperativa de Beneficiamento de Frutas Tropicais do Estado
do Rio Grande do Norte (COOPERFRUT), em Mossoró, Associação dos Produtores da
Agricultura Familiar de Ipanguaçu, em Ipanguaçu (DIBA). Também foram realizadas
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entrevista com produtores rurais irrigantes do Projeto de Irrigação Baixo Açu, irrigantes do
polo produtor de melão de Baraúna e Produtores de castanha no município de Serra do
Mel. Dados e informações de fonte secundária foram obtido na Secretaria da Agricultura e
Pecuária do Rio Grande do Norte, na Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do
Norte (EMPARN) e no Instituto de Defesa e Inspeção Agropecuária do Rio Grande do
Norte (IDIARN), além de participarmos de atividades acadêmicas coordenadas pelos
Professores Celso Donizete Locatel e Francisco Fransualdo de Azevedo, na UFRN, e
Sistematização dos resultados obtidos por meio das pesquisas bibliográfica, documental e
empírica.
Esse artigo, se constitui num memorial da experiência no PROCAD, contribuiu para
aprofundar e fazer contrapontos importantes com a pesquisa de doutorado que se
encontrava em fase final. No na primeira parte do artigo serão feitas considerações sobre a
fruticultura irrigada do Rio Grande do Norte, e na segunda, serão efetuadas as conexões
com o tema e os resultados da tese de doutoramento e, por fim, serão apresentadas as
considerações finais.

A fruticultura irrigada

A experiência no Rio Grande do Norte se inicia não propriamente em uma inserção


no processo de organização da fruticultura, mas em um trabalho de campo com a
finalidade de conhecer a gestão hídrica na região do Seridó, com encerramento no Vale do
Açu, um território com forte presença da fruticultura irrigada. No trabalho de campo,
coordenado pelo professor Francisco Fransualdo de Azevedo, foi observado que a questão
da gestão da água se apresenta como fundamental na região e a governança desse recurso
já se coloca como uma questão importante para a vida do sertanejo, para o
desenvolvimento regional, com especial destaque para a fruticultura irrigada e sua ligação
com os processos socioespaciais regionais e extra- regionais.
A segunda inserção na realidade da fruticultura irrigada foi uma investigação sobre
os órgãos do Estado do Rio Grande Norte, que poderiam ter uma vinculação com a
fruticultura irrigada. Assim, procedeu-se a uma visita seguida de uma entrevista na
Empresa de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Norte (EMPARN), que tem por
objetivo gerar, adaptar e transferir conhecimentos e tecnologias para o agronegócio,
visando o desenvolvimento sustentável, no Instituto de Assistência Técnica e Extensão
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Rural (EMATER), cujo objetivo é contribuir para a promoção do agronegócio e do bem-


estar da sociedade, com foco na agricultura familiar através do serviço de extensão rural
pública com qualidade, para o desenvolvimento sustentável, e também uma visita à cidade
de Baraúna. Por fim, no Instituto de Defesa e Inspeção Sanitária (IDIARN), cujo objetivo é
realizar a defesa e inspeção agropecuária, assegurando a oferta de produtos de qualidade,
contribuindo para a preservação da saúde pública e do meio ambiente e o aumento da
competitividade do Estado do Rio Grande do Norte.
Nos órgãos visitados, a EMPARN e a EMATER, a palavra citada nas entrevistas
com os técnicos que resume as atuações atuais no Estado é “esvaziamento”. Houve ao
longo do tempo um forte sucateamento das entidades em termos de recursos humanos e
equipamentos. Na EMPARN boa parte de seus servidores é cedida pela EMBRAPA. A
EMATER, municipalizando suas ações, se transforma em órgão expedidor de Declarações
de Aptidão ao PRONAF (DAP), com predomínio de bolsistas entre os extensionistas.
Essa observação se complementa com a visita ao IDIARN que, diferentemente dos
dois primeiros órgãos, tem seus problemas, mas em menor proporção, pois a este sim se
conjuga o pretenso papel do Estado no desenvolvimento regional, que é o de fiscalizar e
auxiliar o mercado da fruticultura irrigada.
Nas visitas e realização de entrevistas nestes órgãos observamos que a fruticultura
irrigada absorve boa parte da atenção, esforço e recursos, buscando-se fortalecer um
modelo ligado ao mercado, com forte apoio do poder público. Adota-se nestes órgãos uma
visão neoliberal, por meio da qual se considera que o mercado é capaz de gerar o progresso
e a integração do território. Portanto, o mercado regula e ao mesmo tempo provoca
avanços econômicos. Uma primeira análise é a de que esse modelo minimiza o papel do
Estado como condutor e estimulador do processo de desenvolvimento.
Esse discurso é atinente nas suas proposições no atual momento. Logo, esse modelo
é uma visão de mercado que mostra a necessidade do crescimento, que corresponde, em
uma última análise, às melhorias dos indicadores econômicos, em especial do Produto
Interno Bruto (PIB) regional, com a inserção das frutas na pauta de exportação regional.
Pode-se afirmar que se trata de uma análise ortodoxa, a partir da qual o desenvolvimento
regional nada mais é que uma adequação do sistema à competição global, baseado no
crescimento econômico.
A segunda parte do trabalho se realizou com uma visita a agricultores na região da
fruticultura irrigada no município de Baraúna (RN) e no Vale do Açu (RN), onde se foram
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realizadas entrevistas e feitas observações de campo com o objetivo de conhecer a forma


de se produzir as frutas e, ao mesmo tempo, sua inserção no mercado.
As características da produção geral dos fruticultores são: elevado grau de
dependência de produtos químicos na produção; utilização de mão de obra familiar,
combinada com a utilização de força de trabalho assalariada; baixo nível de organização
sindical; não organização em associações ou cooperativas. Os principais destinos da
produção dos grandes e médios produtores são as centrais de abastecimentos, redes de
supermercados e atacadistas da região centro-sul do país.
Outro fato importante é a ausência do Estado no apoio a produção e na concessão de
serviços públicos de assistência técnica e extensão rural. Os produtores rurais demandam
essa assistência à iniciativa privada, com a prestação de serviços por parte de agrônomos e
das casas de produtos agropecuários. Mas ao reafirmar a ausência do Estado não podemos
negar a existência do poder público na cadeia produtiva da fruta, pois esses agricultores
têm em sua quase totalidade a garantia do binômio água-terra feita pelo Estado, que é a
base do sistema de produção da agricultura irrigada.
Uma importante característica do primeiro grupo de agricultores originários de uma
migração rural-rural, assentados da reforma agrária (irrigantes) ou, ainda, que adquiriram
as propriedades via compra de assentados é a forma de realizar o comércio de seus
produtos por meio das centrais de abastecimento ou da integração com empresas. A venda
pode ser efetuada tanto para as CEASAS como para exportação, como por exemplo para a
empresa capixaba Interfruit1, que estabelece parceria com alguns produtores e repassa as
frutas para o mercado interno ou para exportação. Pode-se observar, portanto, um grupo de
produtores associados aos círculos produtivos da globalização.
Um segundo grupo são produtores não originados de assentamentos, mas que
possuem terra e acesso à água para irrigação com a utilização de poços artesianos. A
diferenciação está na menor capitalização e na forma de se inserir no mercado, que se
processa por meio de atravessadores que revendem os produtos ao mercado local ou

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De acordo com as informações contidas no site da empresa, com sede em Linhares, no Espírito Santo “a
Interfruit distribui diariamente sua produção para diversos estados brasileiros, principais países da Europa,
Estados Unidos e Argentina. Com vasta experiência em logística de produtos perecíveis, a equipe da
Interfruit garante qualidade do produto, desde sua colheita até a distribuição aos clientes. A empresa
atende ao mercado externo através de embarque aéreos e marítimos, que saem dos estados do Rio de
Janeiro e São Paulo. Uma moderna frota de caminhões abastece o mercado interno e transporta
encomendas e transporta encomendas do interior até os pontos de embarque”.
Fonte: http://www.interfruit.com.br/
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regional, principalmente em supermercados e pequenos comércios, com uma inserção em


um círculo de produção regional.
Por fim, um tipo de agricultor altamente capitalizado que tem sua produção
direcionada para empresas, constituindo, de fato, uma média empresa agregada a outras
maiores, em especial no fator comercialização. Deste, o quê e o como plantar é definido
pela empresa integradora, um commodity típico agregado a um complexo agroindustrial da
fruticultura. Um processo de inserção no mercado, no qual o produto final é da empresa e
esta também é responsável pela venda para o circuito de comercialização da fruta.
As empresas rurais, além da produção de frutas, também realizam a comercialização
com elevada integração ao mercado global e com uma área logística de produção e
distribuição voltada para a exportação. Elas se associam ao Estado na pesquisa (no trabalho
de campo encontramos experimentos em conjunto com a EMBRAPA), na manutenção e
implantação de infraestrutura de transportes (estradas e portos) e mesmo na fiscalização e
liberações fitossanitárias. É um agronegócio associado a disponibilidade da irrigação,
providenciada pelo Estado e, ainda, com relações territoriais e locais importantes, como
sua relação com os trabalhadores e governança do recurso água para sua atuação.
Esse modelo de inserção regional se associa a novas formas de acumulação do
capital. O modelo, do ponto vista espacial, com condições de livre concorrência, sem
interferência do Estado, tende a dispersar as atividades econômicas com relativa
homogeneidade, onde houver a disponibilidade de irrigação. Percebe-se que o progresso
técnico é um elemento importante para esse modelo de espaço.
O modelo fruticultura irrigada não resulta no desenvolvimento territorial, mas pode
produzir uma ação que redundará no crescimento econômico em um território com fortes
desigualdades sociais e espaciais. Pode-se mesmo afirmar que ele depende absolutamente
da dinâmica do sistema econômico, assim não considera rupturas sob nenhum aspecto, seja
tecnológico, quadro socioeconômico, institucional, influenciando no comportamento
estratégico dos agentes sociais, econômicos e políticos. Na realidade, ele depende do
equilíbrio das leis do mercado e, no caso da agricultura irrigada, da disponibilidade hídrica.
Esse modelo acrescenta novas perspectivas ao semiárido, mas traz fragilidades ao
desenvolvimento, dentre as quais se podem apontar a ausência de uma articulação
socioespacial, além de ressaltar alguns aspectos e negligenciar outros, de acordo com
interesses de grupos que se apropriam do capital natural (água-solo).
Assim, a força de análise permanece frágil e parcelada, o que torna as ações de
âmbito político também frágeis e mesmo negligenciadas, repercutindo apenas em difusão
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de tecnologia exógena, e, como consequência, profundas rupturas socioespaciais, com


ampliação da exclusão social e subordinação a economias externas. Ainda, acredita-se que
os impactos resultantes desses projetos exógenos sobre organizações espaciais
preexistentes afetam o todo social nas esferas econômica, política, social, cultural e
ambiental.
O uso da irrigação associada ao trato com o solo, assim, uma inovação técnica na
ação do sistema solo-água, é algo que produz o crescimento econômico associado à
concentração de recursos naturais e tecnológicos, ou seja, constitui um reflexo da
necessidade de expansão do sistema, afirmando a teoria do desenvolvimento desigual e
combinado. O que permite concluir que a inovação tecnológica está onde ela pode permitir
maior rentabilidade e uma maior reprodução ampliada do capital, e sua presença indica
tanto a existência de condições especiais instaladas previamente para possibilitar seu uso
eficiente.
Desse modo, ao observar as ideias Schuperterianas de inovação por tecnologia, o
conceito de inovação estaria na base do capital, sendo a busca pelo lucro, principalmente,
tempo de trabalho e de rotação dos capitais socialmente necessários. Assim, constitui-se
um espaço a serviço do capital e de sua reprodução. Logo, a valorização capitalista está na
base da inovação e os aspectos espaciais e tecnológicos são importantes, bem como a
busca por uma competitividade.
Portanto, os comportamentos inovadores não são extraterritoriais, mas dependem de
variáveis no plano local ou regional, associados a vantagens competitivas locacionais e
retroalimentadas por articulação escalar, um local propício à difusão de inovação. A
inovação possui seu vínculo com o desenvolvimento tecnológico, e esta, analisada dentro
de processos de competividade regional, configuraria em modificações impostas nas
relações entre os produtores de frutas, em um sentido amplo do recrutamento de um espaço
para irrigação e a divisão territorial do trabalho, objetivando mudanças organizacionais nos
processo produtivos com o aumento da eficiência e eficácia, para a competição entre
regiões. Dessa forma, intrinsicamente associado a características do lugar e do território.

Por uma inovação socioespacial - um contraditório manifesto

Na tese de doutoramento analisamos a inovação social no Vale Jequitinhonha (MG),


um espaço periférico, objeto de políticas públicas voltadas ao atendimento de agricultores
excluídos do processo de modernização. É um paradoxo para a situação colocada pelo
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estágio do PROCAD, pois essa realidade é baseada na tecnologia, no capital e na


globalização, centrado nas relações do capital. Para o entendimento desse paradoxo, vamos
analisar o que seria a inovação social desejada e a inovação técnica territorializada na
agricultura irrigada para produção de frutas.
O conceito de inovação social rejeita o tradicional e a aplicação de tecnologia focada
do termo “inovação” que tem sido fundamental para a política de desenvolvimento em
favor de uma leitura mais sutil, pois valoriza os ativos de conhecimento e culturas das
comunidades e coloca em primeiro plano a reconfiguração criativa de relações sociais
(MACCALLUN et al., 2008). Por outro lado, difere da mera participação em serviço
público, pois é uma ação comunitária e não do Estado ou do mercado. Por isso, possui uma
base territorial, de inclusão social, empoderamento e atendimento de necessidades sociais.
Essa visão, na qual se originam os estudos realizados pelo CRISES2 (Centre de
Recherche sur les Innovations Sociales) - em um centro interuniversitário e interdisciplinar
que reúne diversos pesquisadores, inclusive muitos geógrafos – aborda a inovação social
através de três eixos complementares: território, condições de vida e trabalho e emprego.
As pesquisas sobre inovação social e território buscam analisar o papel dos atores sociais e
suas práticas inovadoras no âmbito local. Os estudos sobre inovação social e qualidade de
vida se inclinam para a melhoria das condições de emprego, renda, saúde, educação,
segurança e moradia. Nesse caso, os pesquisadores, sobre trabalho e emprego, atentam
para as dimensões organizacionais e institucionais que se relacionam com a regulação, a
governança, o emprego e a organização do trabalho (LÉVESQUE, 2008).
A principal análise do centro de estudos canadense é a confluência entre inovação e
transformação, entendendo a inovação social como

Um processo iniciado pelos atores sociais para responder a uma aspiração


humana, suprir uma necessidade, trazer uma solução ou aproveitar uma
oportunidade de ação na intenção de mudar as relações sociais, de
transformar um quadro de ação ou de propor novas orientações culturais.
(Tradução deste autor) (LÉVESQUE, 2008, p. 191).

Para Fontam (2008; 2010), a inovação social seria a institucionalização de


uma novidade, sendo que esse processo se desenvolve em três tempos precisos e
articulados. Primeiro, o espaço da criação, invenção ou descoberta, que pode ser um novo

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<http://crises.uqam.ca/>.
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conhecimento, uma nova forma de ação social ou de relações de poder. Posteriormente, a


adoção dessa novidade e sua integração ao uso social, e, finalmente, a territorialização, que
será marcada por sua institucionalização, podendo significar um modelo territorial de
desenvolvimento que passa a interferir na forma de produção e reprodução social. São três
períodos distintos, nos quais um conjunto complexo e diversificado de mecanismos de
seleção/disputas de uma novidade é efetivado por caraterísticas econômicas, culturais,
ambientais e políticas, transformando o espaço e, ao mesmo tempo, demarcando a
inovação de base social e territorial.
A partir dessa perspectiva, a inovação social não seria algo criado a partir do nada,
mas sim a partir de subsequentes “novidades” nas relações sociais, no espaço-território, de
modo que rompa suas inércias espaciais - nesse caso, a ausência de desenvolvimento, ou
seja, uma relação cuja concepção ideal produz relações socioterritoriais. As ações que
exibem um caráter individual sem a sua institucionalização podem ser classificadas como
novidade, pois, segundo Comeau (2004, p. 37), a inovação social “confronta o
estabelecido, ou seja, ela derrota o habitual, ela ultrapassa a rotina e desafia as restrições”.
Ela é, portanto, uma proposta desafiadora para os tempos atuais de mercado pleno. Logo,
pode-se defini-la como um paradigma que ultrapassa o tecnológico e o econômico, e tem
seu uso a partir da década de 1990 (MOULAERT 2005), na busca por um
desenvolvimento territorial crítico emancipatório.
Então, um paradoxo imposto pelo estágio do PROCAD, uma nova realidade dentro
de um quadro teórico, pois a inovação da fruticultura irrigada é técnica e do capital, mas a
adversidade pode ser um momento para confirmar nossa visão teórica. A irrigação para o
agronegócio não gera superação dos atrasos estruturais do semiárido ou do quadro regional
do nordeste, apenas é uma nova forma de se apropriar do espaço, originário nas capitanias
hereditárias com as plantations de cana-de-açúcar.
Assim, o contrário pode significar busca de novas utopias e confirmar o
paradigmático na busca da superação de atrasos estruturais não via mercado ou na
globalização, mas na base territorial, com inclusão social, empoderamento e atendimento
de necessidades sociais com origem nas comunidades, no local, como no caso do estudo da
tese defendida na UNESP. Um resultado positivo propiciado por um estágio, o PROCAD
(casadinho da UFRN/ UNESP).
O estágio do PROCAD/CASADINHO/UFRN/UNESP propiciou o desenvolvimento
de atividades relevantes no processo de treinamento do doutorado, não apenas pelo fato de
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conhecer novos lugares e enfrentar novos desafios, como pelo conhecimento adquirido e
mesmo no incremento da tese com novas ideias.
Então, vê-se no estágio do PROCAD uma realidade de sentido contrário de inovação
técnica, com sua origem e repercussões territoriais associadas ao capital do agronegócio,
ao mercado na sua expressão atual marcada pela forte globalização. Esse modelo de
fruticultura irrigada acrescenta novas perspectivas ao modelo do desenvolvimento regional,
com crescimento econômico, porém não é uma realização exógena, ela se articula
produzindo um novo território do agronegócio da fruticultura, que pode ser considerado do
ponto vista de suas relações externas, mas com fundamentais relações internas no lugar e
no território, com a apropriação cultural e natural pelo capital, apoiados por políticas
públicas.
Uma territorialidade sem significados de inclusão social ou de sustentabilidade, uma
fronteira do agronegócio e uma expressão da desigualdade socioespacial, num contexto em
que a adoção de inovações nas relações sociais poderia significar uma nova inserção na
globalização, não apenas no mercado, mas no atendimento das necessidades, preservação
ambiental, inclusão social, utopias para outros mundos possíveis.

REFERÊNCIAS

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