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Revista Brasileira de Nutrição Esportiva


ISSN 1981-9927 versão eletrônica
Periódico do Instituto Brasileiro de Pesquisa e Ensino em Fisiologia do Exercício
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O EFEITO DA SUPLEMENTAÇÃO DE LEUCINA NA SÍNTESE PROTÉICA MUSCULAR

Guilherme Rossi da Mata1, Francisco Navarro1,2

RESUMO
The effect of leucine supplementation on
Introdução: Leucina, isoleucina e valina – muscular protein synthesis
aminoácidos de cadeia ramificada (AACR) –
são componentes essenciais na dieta humana, Introduction: Leucine, isoleucine and valine -
representam um terço de toda nossa proteína branched chain aminoacids (BCAA) - are
muscular e, ultimamente, têm ganhado certa essencial components in human diet,
atenção pelas suas propriedades fisiológicas. represents 30% of our all muscular protein and
Objetivo: através desta revisão de literatura, lately has gaining attention due your
pretende-se reunir o maior número de estudos physiological properties. Objective: Through
e outras revisões relevantes com humanos ou this review, collect the most studies and others
animais, que abordem os efeitos da reviews as possible, with humans or animals,
suplementação de AACR, principalmente with shows the effects of the BCAA, and
leucina no aumento da síntese protéica leucine mainly, in the increase of the muscular
muscular. Revisão de literatura: Foram protein synthesis. Literature review: 10 studies
avaliados 10 estudos, sendo 6 deles com ratos were mentioned in this review, which 6 with
e 4 com humanos. Os protocolos de rats and 4 with humans. The intervention
intervenção variaram entre a presença ou não protocols ranged between the presence or not
de atividade física e privação ou não de of physical activities and the privation or not of
alimentação. Exemplo semelhante de feeding. The supplementation protocols also
diferenciação ocorre entre os estudos no que changed between studies. Analyzing the
diz respeito aos protocolos de suplementação. results, we found that in 100% of the studies
Ao analisar os resultados, vimos que, em the leucine supplementation was effective
100% dos estudos, a suplementação com rising the muscular protein synthesis. Leucine
leucina mostrou-se eficaz em aumentar a promotes the protein synthesis through
síntese protéica muscular. A leucina promove mechanisms involving a kinase protein called
a síntese protéica via mecanismos envolvendo mammalian target of rapamycin (mTOR) and it
uma proteína quinase denominada alvo da stimulates the protein synthesis through 3 key
rapamicina em mamíferos (mTOR) e esta proteins: p70s6K, 4E-BP1 and eIF4G.
estimula a síntese por meio de três proteínas Conclusions: The leucine supplementation
chaves: a proteína quinase ribossomal S6 de stimulates the muscular protein synthesis in
70 kDA (p70S6k); a proteína 1 ligante do fator rats and in humans, submitted to physical
de iniciação eucariótico 4E (4E-BP1); e o fator activities or not, and also preventing
de iniciação eucariótico 4G (eIF4G). sarcopenia in elderly. Although the positive
Conclusão: A suplementação de leucina results, more studies are needed to shows the
estimula a síntese muscular protéica em ratos leucine benefits separately from the other
e em humanos, submetidos a uma atividade BCAAs.
física ou não, podendo também prevenir a
sarcopenia em idosos. Apesar de os Key Words: BCAA, Leucine, Protein
resultados serem positivos, fazem-se Synthesis, Muscle.
necessários outros estudos e pesquisas que
sejam capazes de averiguar de fato a ação da Endereço para correspondência:
leucina separadamente de outros damattanutri@gmail.com
aminoácidos.

Palavras-chave: AACR, Leucina, Síntese


Protéica, Músculo.
1 – Programa de Pós-Graduação Lato-Sensu 2 – Instituto Brasileiro de Pesquisa e Ensino
da Universidade Gama Filho Nutrição em Fisiologia do Exercício.
Esportiva.
ABSTRACT INTRODUÇÃO

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crônicas induzem adaptações por parte das


Leucina, isoleucina e valina – proteínas no que diz respeito à estrutura e
aminoácidos de cadeia ramificada (AACR) – performance. Mudanças abruptas no
são componentes essenciais na dieta humana, metabolismo dos aminoácidos ocasionadas
pois enzimas para a síntese de novo de pelo exercício são extremamente catabólicas
aminoácidos de cadeia ramificada não estão levando a um balanço protéico negativo e a
presentes em nossas células (Mero, 1999). uma taxa maior de oxidação desses
Os aminoácidos de cadeia ramificada aminoácidos. A extensão desses processos
somam 35% dos aminoácidos indispensáveis catabólicos depende do tipo do exercício.
nas proteínas musculares e aproximadamente Embora os efeitos agudos dos exercícios
40% dos aminoácidos pré-formados sejam catabólicos, o exercício não leva à
necessários para os animais. Contando que perda muscular; pelo contrário, atividades
40% do peso total de um indivíduo é de massa físicas regulares são essenciais para otimizar
muscular, há uma grande quantidade de o crescimento muscular e a hipertrofia. Sendo
aminoácidos de cadeia ramificada presente assim, o exercício requer uma sequência de
em nossas proteínas musculares. Os animais ajustes metabólicos do período catabólico para
têm uma concentração limite a qual é mantida o período anabólico de recuperação (Norton e
constante de aminoácidos livres circulantes, Layman, 2006).
estando, no músculo esquelético, o maior pool Para a síntese protéica muscular, os
de aminoácidos livres do corpo (Shimomura e aminoácidos essenciais são tão eficientes
Colaboradores, 2006). quanto à mistura completa de aminoácidos e,
Dos 20 aminoácidos que constituem uma mistura de aminoácidos de cadeia
nosso corpo, apenas os aminoácidos de ramificada é tão eficiente na promoção da
cadeia ramificada, a alanina, o glutamato e o síntese protéica como todos os aminoácidos
aspartato são oxidados em uma taxa essenciais reunidos (Maestá e Colaboradores,
considerável no nosso músculo esquelético. 2008).
Quantitativamente, a alanina parece ser Sabe-se que os aminoácidos de
oxidada em proporção maior (de 30% a 70% cadeia ramificada podem ser oxidados no
mais que a leucina). Devido o fato de os músculo esquelético, ao passo que os demais
aminoácidos de cadeia ramificada somarem aminoácidos essenciais são catabolizados
um terço de toda nossa proteína muscular, principalmente no fígado. O exercício aumenta
eles são facilmente utilizados como substratos o gasto energético e promove a oxidação dos
para formação de alanina e glutamina, e, além aminoácidos de cadeia ramificada. Sabe-se
disso, existem evidências que demonstram o que os aminoácidos de cadeia ramificada
papel fundamental dos aminoácidos de cadeia contribuem para o metabolismo energético
ramificada, especialmente a leucina na durante o exercício como substrato energético
regulação de processos anabólicos e também aumentam o pool de intermediários
envolvendo tanto a síntese quanto a do ciclo do ácido-cítrico (anaplerose). Dentre
degradação protéica muscular (Mero, 1999). os aminoácidos de cadeia ramificada, a
Em estudos recentes, foi visto que os leucina é um aminoácido especial, pois
aminoácidos de cadeia ramificada apresentam promove a síntese muscular in vivo quando é
potenciais efeitos terapêuticos, uma vez que administrada oralmente em animais. Como
esses aminoácidos podem atenuar a perda de consequência de novas descobertas, os
massa magra durante a redução de massa aminoácidos de cadeia ramificada têm
corporal; favorecer o processo de cicatrização; recebido atenção especial por serem
melhorar o balanço protéico muscular em considerados suplementos alimentares
indivíduos idosos; e propiciar efeitos benéficos bastante úteis para indivíduos praticantes de
no tratamento de patologias hepáticas e renais atividades físicas (Shimomura e
(Rogero e Tirapegui, 2008). Colaboradores, 2004).
O exercício produz diversas alterações Os efeitos anabólicos da leucina na
no metabolismo dos aminoácidos e no proteína muscular têm sido estudados há mais
turnover de proteínas no músculo esquelético. de vinte anos, porém, apenas recentemente os
Alterações agudas são acompanhadas de pesquisadores começaram a descobrir e
demanda energética e disponibilidade de entender os efeitos metabólicos deste
aminoácidos, ao passo que mudanças mais aminoácido. A leucina participa do nosso

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metabolismo das seguintes formas: 1) como que se exercitam em ambientes quentes


um substrato para a síntese protéica; 2) como (Rogero e Tirapegui, 2008).
substrato energético; e 3) como um sinalizador Portanto o objetivo desta revisão
metabólico. A ação mais conhecida e óbvia de bibliográfica é averiguar o que há publicado
qualquer aminoácido é na construção de sobre os efeitos da suplementação de leucina
proteínas. Como um substrato para a síntese na síntese protéica muscular, tanto em
protéica muscular, a ação da leucina se humanos quanto em ratos, submetidos a
parece com a ação dos demais vinte algum esforço físico ou não; levantar o que é
aminoácidos; porém, no músculo esquelético a fato e o que ainda permanece incomprovado
leucina é incorporada nas proteínas de uma pelas pesquisas e esclarecer os mecanismos
forma desproporcional e estima-se que apenas de ação.
9% da leucina seja incorporada nas proteínas
(Layman, 2002). REVISÃO DE LITERATURA
O pool de aminoácidos de cadeia
ramificada circulantes é pequeno quando Diversos estudos têm demonstrado a
comparado com a concentração total de importância dos aminoácidos e o quanto eles
aminoácidos de cadeia ramificada presentes são essenciais para a regulação da síntese
nas proteínas musculares. Isto é importante, protéica observada no músculo esquelético em
pois os aminoácidos de cadeia ramificada um período pós-refeição. Entretanto, poucos
livres, especialmente a leucina, promovem a estudos têm avaliado se o consumo de largas
síntese e inibem a degradação protéica via doses de um aminoácido isolado é capaz de
mecanismos envolvendo uma proteína reproduzir os mesmos efeitos de uma refeição
quinase denominada alvo da rapamicina em completa (Anthony e colaboradores, 2002).
mamíferos (mammalian Target of Rapamycin - Nos últimos anos, o tema leucina e
mTOR). O mTOR estimula a síntese protéica sua importância na alteração da síntese
principalmente por meio de três proteínas protéica têm sido bastante estudado, o que
regulatórias chaves: a proteína quinase implica um avanço no entendimento dos
ribossomal S6 de 70 kDA (p70S6k); a proteína mecanismos da regulação nutricional da
1 ligante do fator de iniciação eucariótico 4E síntese protéica a nível molecular (Garlick,
(4E-BP1); e o fator de iniciação eucariótico 4G 2005). Entretanto, os efeitos da
(eIF4G). Tais descobertas mostram que a suplementação com leucina na síntese
leucina desempenha papéis importantes além protéica têm sido demonstrados desde os
do seu papel como um aminoácido essencial primeiros estudos de Buse e Reid (1975).
(Rogero e Tirapegui, 2008). Juntamente com esta ação isolada, a leucina é
Em um estudo realizado com ratos, a considerada atualmente não apenas um
leucina mostrou-se eficaz em aumentar a aminoácido constituinte de uma proteína, mas
síntese muscular na mesma proporção, também uma substância físico-farmacológica,
quando foram observados os resultados pela na qual sua administração é capaz de
ação de todos os aminoácidos de cadeia promover efeitos anti-catabólicos importantes,
ramificada juntos. Isso indica que a leucina assim como uma atenuação do catabolismo
estimula a síntese muscular esquelética muscular esquelético durante perda de peso,
independente dos outros aminoácidos de facilitação de um processo de cura ou mesmo
cadeia ramificada (Anthony e Colaboradores, melhora do turnover protéico muscular
2001). esquelético (Zanchi, Nicastro e Lancha Jr.,
No que se refere à nutrição esportiva, 2008).
os aminoácidos de cadeia ramificada são Em geral, a suplementação com
frequentemente utilizados por atletas, os quais leucina consistentemente demonstra queda na
se baseiam nas premissas de que estes proteólise muscular esquelética quando
aminoácidos podem promover o anabolismo infundida via intravenosa, incubada com
protéico muscular, atuar em relação à fadiga tecidos musculares, incubada com células
central, favorecer a secreção de insulina, musculares esqueléticas e sob alimentação via
melhorar a imunocompetência, diminuir o grau oral (Zanchi, Nicastro e Lancha Jr., 2008).
de lesão muscular induzido pelo exercício Foi recentemente publicado que a
físico e aumentar a performance de indivíduos administração oral de leucina, isolada ou em
combinação com carboidrato, restaura as

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taxas de síntese protéica muscular no período no mix 41% Leu, porém, este último, não
pós-absortivo em ratos a valores semelhantes apresentou aumento em relação ao anterior.
1 hora após estes ratos serem livremente Em contraste, nos dois grupos idosos, a TSF
alimentados. Além disso, a leucina mostra-se não se alterou quando submetidos ao mix 26%
tão efetiva como uma proteína completa de Leu, mas aumentou após a suplementação do
uma refeição na capacidade de aumentar a mix 41% Leu. Similar à resposta da TSF, o
recuperação da síntese protéica muscular. balanço protéico manteve-se positivo em todos
Sendo assim, pode-se dizer que a leucina os grupos, com exceção do grupo de idosos
media o efeito anabólico da alimentação na suplementados com o mix 26% Leu. Este
síntese protéica muscular esquelética resultado sugere que aumentando a
(Anthony e colaboradores, 2002). concentração de leucina num mix de
Em um estudo realizado por Koopman aminoácidos essenciais pode-se reverter a
e Colaboradores (2005), para avaliar a síntese resposta atenuada da síntese muscular nos
muscular pós-treino e o balanço protéico após idosos, porém sem efeitos adicionais em
a ingestão de carboidratos com ou sem jovens.
proteína e/ou leucina livre, oito jovens foram Koopman e Colaboradores (2006),
randomicamente divididos em três grupos de investigaram o balanço protéico e a taxa de
acordo com suas respectivas bebidas: grupo síntese muscular sob uma suplementação de
carboidrato (CHO), grupo carboidrato com apenas carboidrato (CHO) e outra
proteína (CHO+PRO) e carboidrato com suplementação a base de carboidrato
proteína e leucina (CHO+PRO+LEU). Estas associado à proteína e leucina
bebidas eram ingeridas seguidas de 45 (CHO+Pro+Leu). Neste estudo, 8 jovens e 8
minutos de um treinamento resistido. Os idosos participaram e foram submetidos
valores de insulina foram mais altos no grupo randomicamente à suplementação com uma
CHO+PRO+LEU, comparados com os demais das bebidas (CHO ou CHO+Pro+Leu) 30
grupos. A degradação muscular foi menor, e a minutos após atividades da vida diária com um
síntese protéica foi maior nos grupos posterior treino resistido leve. Os autores
CHO+PRO e CHO+PRO+LEU, respectiva- verificaram um balanço protéico negativo em
mente. A adição de leucina no grupo ambos os grupos suplementados com CHO,
CHO+PRO+LEU resultou numa menor mas positivo nos grupos CHO+PRO+LEU e
oxidação protéica comparada com o grupo taxa de síntese protéica muscular foi
CHO+PRO. O balanço protéico foi negativo significantemente maior em CHO+PRO+LEU
durante o período de recuperação do grupo do que em CHO, em ambos os grupos.
CHO, mas foi positivo nos grupos CHO+PRO Rieu e Colaboradores (2006),
e CHO+PRO+LEU. No grupo CHO+PRO+LEU estudaram o efeito da suplementação com
o balanço protéico total foi significantemente leucina na síntese protéica muscular em
maior comparado com os valores dos demais idosos. Vinte idosos foram selecionados e
grupos. A taxa de síntese fracional (TSF), foram analisados antes e após uma
medida 6 horas após o exercício resistido, foi alimentação rica em leucina ou não. Não foi
maior no grupo CHO+PRO+LEU que no grupo observada alteração na cinética protéica pela
CHO, e intermediária no grupo CHO+PRO. suplementação. Em contraste, foi observado
No mesmo ano Katsanos e um aumento na taxa de síntese fracional no
Colaboradores (2005), estudaram o efeito de grupo suplementado nas 5 horas seguintes da
um mix de aminoácidos essenciais (AE) suplementação. Este efeito foi observado
enriquecido com leucina no metabolismo juntamente com apenas um aumento na
protéico muscular de jovens e de idosos. disponibilidade de leucina, pois apenas a
Quatro grupos (2 de jovens e 2 de idosos) concentração de leucina sérica diferiu entre os
foram submetidos à suplementação de dois grupos analisados. Os autores concluíram que
mix de aminoácidos essenciais diferentes: o a suplementação de leucina durante as
mix de whey protein [com 26% de leucina refeições aumenta a síntese protéica muscular
(26% Leu)] ou o mix enriquecido com leucina em idosos independente do aumento da
[com 41% de leucina (41% Leu)]. A taxa de concentração dos outros aminoácidos.
síntese fracional (TSF), indicativa da síntese Em um estudo, para avaliar a
protéica, aumentou nos dois grupos jovens capacidade da leucina em estimular a
suplementados tanto pelo mix 26% Leu como recuperação muscular após o exercício,

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Anthony, Anthony e Layman (1999), dividiram após, foram submetidos à administração de


5 grupos de ratos: grupo sedentário privado de leucina ou de uma solução placebo (solução
alimentação (SA); exercitados, privados de salina). Observou-se que a infusão de leucina
alimentação (EA); exercitados, alimentados após a administração da solução veículo
com carboidratos (EC); exercitados, aumentou a liberação de insulina nos minutos
alimentados com leucina (EL); e exercitados, 15 a 45, assim como a síntese protéica,
alimentados com carboidrato e leucina (ECL). voltando aos valores basais aos 60 minutos.
Os grupos que se alimentaram receberam a Já na infusão de leucina após a administração
refeição imediatamente após o término do de somatostatina, observou-se atenuação no
exercício. Após a análise dos resultados, os aumento induzido pela leucina sobre
autores viram que o exercício não alterou as fosforilação da 4E-BP1 e da S6K1, porém não
concentrações de glicose ou insulina. A tem efeito sobre a associação do eIF4E e
ingestão de carboidrato associado com leucina eIF4G. O resultado desse estudo sugere que a
aumentou as concentrações de insulina indução da síntese protéica pela leucina
semelhantemente aos grupos sedentário seguida da fosforilação das proteínas 4E-BP1
privado de alimentação e exercitados privados e S6K1 é facilitada pelo aumento nas
de alimentação, produziram uma completa concentrações séricas de insulina, enquanto
recuperação na taxa de síntese muscular e do os efeitos independentes de insulina são
glicogênio para valores não diferentes mediados por um mecanismo ainda não
observados nos grupos sedentário privado de totalmente esclarecido, que envolve a
alimentação. A administração de apenas fosforilação do eIF4E e/ou sua associação
leucina restabeleceu a taxa de síntese com o eIF4G.
muscular similar à taxa observada no grupo Já em outro estudo, realizado por
sedentário privado de alimentação sem afetar Crozier e Colaboradores (2005), foi avaliado o
nos valores de glicose ou insulina. A ingestão efeito da administração de leucina na síntese
de carboidrato isolado aumentou a taxa de protéica em ratos privados de alimentação.
resíntese do glicogênio quando comparado ao Para verificar o quanto pequenas doses de
grupo privados de alimentação, leucina estimulam a síntese protéica, ratos
concomitantemente com um aumento na foram suplementados com quantidades de
glicemia e insulinemia. Através desse estudo 0,068 a 1,35g/kg de peso corporal. Foi
os autores concluíram que a leucina estimula a observado que o grupo sob a suplementação
síntese protéica muscular pós-exercício, de 0,135g/kg de peso corporal de leucina já
independentemente do aumento das apresentaram taxas maiores de síntese
concentrações de insulina. muscular quando comparados com o grupo
Anthony e colaboradores (2000a), placebo, suplementados com solução salina.
realizaram outro experimento, onde verifica- Segundo os autores, o aumento na síntese
ram que a leucina foi a única entre os protéica nos ratos suplementados foi
aminoácidos de cadeia ramificada capaz de associada à maior atividade dos
estimular a síntese protéica em ratos privados biomarcadores da translação do mRNA:
de alimentos. proteína s6 de 70KDA (p70S6k), proteína 1
Outra pesquisa, também realizada por ligante do fator de iniciação eucariótico 4E
Anthony e colaboradores, (2000b), evidenciou (4E-BP1) e o fator de iniciação eucariótico 4G
que o consumo de leucina aumentou os níveis (eIF4G).
de síntese de proteína muscular independente Rieu e colaboradores (2007), além de
do aumento da insulina plasmática. comprovarem que proteínas ricas em leucina
Em 2002, Anthony e Colaboradores aumentam a síntese protéica em ratos,
avaliaram a contribuição da insulina na síntese sugeriram que a leucina poderia ser eficiente
protéica muscular pela ingestão de leucina. para prevenir a sarcopenia no envelhecimento,
Ratos privados de alimentação foram visto que seu estudo trabalhou com ratos
submetidos à infusão de somatostatina ou de Wistar de 21 meses de idade.
uma solução veículo (NaCl) e, 30 minutos

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Tabela 01 - Estudos e efeitos da suplementação de Leucina em ratos


Estudo Protocolos de intervenção Resultados
Amostra Intervenção Suplemento

Anthony, 30 ratos da -7h privados de alimentação -Por gavagem -Grupo ECL


Anthony e raça até o experimento. -Os suplementos  síntese de proteína
Layman, 1999. Sprague- -G1: sedentário s/ eram oferecidos muscular e maior
Dawley suplementação com 15% do total liberação insulínica
com peso de -G2: 2h exercícios (2h de Kcal diárias pós suplementação
140-150g esteira) e 1h privados. -G3 e G5: 2,63g
suplementados -G3: 2h exercício e ingeriu carboidrato
por 1 dia somente carboidrato -G4 e G5:
-G4: 2h exercícios e ingeriu receberam o
somente Leucina equivalente a
-G5: 2h exercícios e ingeriu 270mg de Leu
carboidrato e Leucina

Anthony e Ratos da raça -Estudo 1 -Estudo 1: -A leucina foi a única


colaboradores, Sprague- (18h s/ comer) entre os AACR capaz
2000a. Dawley 1,35g/Kg/peso de de estimular a
com peso de G1: Valina, Isoleucina ou AACR (no total síntese protéica (via
200g Leucina foram usados mTOR) aumentando
G2: Salina 270mg AACR) a fosforilação de: eIF-
4E, 4e-BP1 e S6
-Estudo 2 -Estudo 2: 0,75mg
(16h sem comer) rapamicina/Kg/ -Na presença de
Receberam injeção peso e 1,35g rapamicina (inibidora
Rapamicina Leucina/Kg/peso de mTOR) os efeitos
da leucina foram
G1: recebeu salina bloqueados, indican-
G2: recebeu Leu do que leucina induz
a síntese protéica
através da mTOR.

Anthony e Ratos da raça -G1: recebeu comida à -Por gavagem -Grupos com leucina
colaboradores, Sprague- vontade (grupo controle) tiveram maiores
2000b. Dawley -G2: 18h privados de -270mg de Leu e taxas de síntese
com peso de alimentação e 2,63g de protéica muscular.
200g recebeu salina carboidrato foram
-G3: 18h privados e recebeu oferecidos aos -Ingestão de somente
carboidrato grupos leucina induziu a
-G4: 18h privados e recebeu que receberam síntese muscular em
Leucina suplementação níveis semelhantes
-G5: 18h privados e recebeu aos ratos livremente
carboidrato e Leucina alimentados.

Anthony e Ratos da raça -Ratos foram induzidos ao -Por gavagem -Sugere que a
colaboradores, Sprague- diabetes com administração -Leucina leucina realça a
2002a. Dawley 1 de Alloxam 1,35g/kg/peso síntese protéica
grupo de ratos Todos ficaram 18h sem -Imediatamente tanto na presença
Diabéticos comer após ingestão de (mecanismos
pesando 173g -G1: recebeu salina (não Leu os ratos conhecidos) quanto
e diabético) diabéticos na ausência de
um grupo -G2: recebeu Leucina receberam ou não insulina (mecanismos
controle (não diabético) infusão de insulina ainda
pesando 198g -G3: recebeu salina desconhecidos).
(diabético)
-G4: recebeu Leucina
(diabético)

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Crozier e 66 ratos da - 18h privados de alimentos -Por gavagem -O aumento na


colaboradores, raça - 5 grupos G1: solução com síntese protéica foi
2005. Sprague- -suplementados com NaCl proporcional às
Dawley diferentes concentrações G2: 5% Leucina doses de leucina
com peso de de leucina (0,068g/Kg/peso) aplicadas.
200g G3: 10% Leucina
e não foi citado (0,135g/kg/peso)
o período de G4: 25% Leucina
suplementação (0,338g/kg/peso)
G5: 50% Leucina
(0,675g/kg/peso)
G6: 100% Leucina
(1,35g/kg/peso)

Rieu e 60 ratos Wistar - 5 grupos -G1 (controle): -Resultados indicam


colaboradores, com idade de - s/ exercícios, somente dieta base que as proteínas
2007. 21 meses não suplementação -G2: lactoglobulina mais ricas em leucina
sendo (14,5% Leucina) (lactoglobulina e
citado o peso e -G3: prolactina prolactina) foram
suplementados (13,4% Leucina) mais eficientes para
por um período -G4: lactoalbumina aumentar a síntese
de 30 dias (10,9% Leucina) protéica em ratos
-G5: caseína (10% idosos.
Leucina) -Sugere que possa
ser eficiente para
prevenir sarcopenia
no envelhecimento.
-O efeito benéfico foi
mantido mesmo após
os 30 dias de
suplementação.

Tabela 02 - Estudos e efeitos da suplementação de Leucina em humanos


Estudo Protocolos de intervenção Resultados
Amostra Tipo de treino Suplemento

Koopman e 8 jovens 8 séries de 8 repetições CHO – 0,3g -Grupo CHO+PRO


Colaboradores, (idade 22,3 ±0,9 de leg press horizontal carboidrato/Kg (50% +LEU:
2005. anos) e banco extensor glicose e 50% Maior liberação de
- 2min de intervalo maltodextrina) insulina;
entre séries Maior síntese
- 80% de 1RM PRO- 0,2g/kg de muscular;
proteína hidrolisada Menor degradação
protéica;
LEU- 0,1g/kg de TSF 6h após o
leucina. exercício foi maior.

Katsanos e 4 grupos: 26% Leucina – 15g - Aumento na Taxa


Colaboradores, Grupo idoso 26% - de Whey Protein com de síntese fracional
2005. Leu: n°=10 1,7g de Leucina (26% (TSF) nos dois
66,7±2,0 anos dos aminoácidos grupos jovens, sem
essenciais) diferença entre 26 ou
Grupo idoso 41% 41% Leu. Já nos
Leu: n°=10 41% Leucina- 15g de grupos idosos, houve
66,5±2,2 anos Whey Protein com aumento na TSF
2,7g de Leucina (41% apenas no grupo 41%
dos aminoácidos Leu.

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essenciais)
Grupo jovem - Balanço protéico
26% Leu: N°=8 positivo em todos os
30,6±2,0 anos grupos, com exceção
do grupo idoso com
Grupo jovem 26% Leu.
41% Leu: N°=8
28,8±2,6 anos

Koopman e 8 idosos (75±1) e - 30 minutos de Grupo CHO: Balanço protéico


Colaboradores, 8 jovens exercícios de 1,33ml/kg/30min negativo no CHO e
2006. (20±1) intensidade moderada 0,49g cho/kg positivo no
(atividades do dia-dia) Fornecido até CHO+PRO+LEU, em
- musculação: completar 330min. ambos os grupos.
Leg press horizontal e TSF
banco extensor - 6 Grupo significantemente
séries de 10 repetições. CHO+PRO+LEU: maior no
Intervalo 2min. Adição de 0,16g/kg CHO+PRO+LEU, em
de whey protein c/ ambos os grupos, e
0,03g/kg leucina. sem diferenças entre
eles.

Rieu e 20 idosos (70±1) - Dieta semi-líquida TSF miofibrilar


Colaboradores, ofertada durante 5h significantemente
2006. após 12h de jejum maior no grupo
noturno. Leucina do que no
placebo.
Grupos:
Placebo (g/kg):
Maltodextrina 1.3
Caseína 0,4

Leucina(g/kg):
Adição de:
Leucina 0.052
Isoleucina 0.011
Valina 0.0068

A leucina exerce os seus efeitos em A 4E-BP1 é uma inibidora do fator de


nível pós-transcricional e mais comumente iniciação da tradução protéica conhecida como
durante a fase de iniciação da tradução do eIF4E. Quando a 4E-BP1 é fosforilada, o
RNA-mensageiro em proteína. O mecanismo eIF4E é liberado e pode unir-se ao eIF4G – o
pelo qual a leucina estimula a tradução de qual está também sob o controle do mTOR – e
proteínas está relacionado ao fato do aumento ao eIF4A, o que forma o complexo eIF4F. A
da concentração intracelular desse aminoácido montagem desse complexo é necessária para
promover a ativação de uma proteína quinase a continuação da etapa de iniciação da
denominada alvo da rapamicina em mamíferos tradução do RNA-mensageiro em proteína
(mammalian Target of Rapamycin - mTOR). O (Anthony e colaboradores, 1999).
mTOR estimula a síntese protéica A mTOR também ativa a p70S6k, que
principalmente por meio de três proteínas estimula a iniciação da tradução bem como a
regulatórias chaves: a proteína quinase elongação da síntese protéica por diferentes
ribossomal S6 de 70 kDA (p70S6k); a proteína mecanismos. A p70S6k, quando ativada,
1 ligante do fator de iniciação eucariótico 4E fosforila e inativa a enzima quinase do fator de
(4E-BP1); e o fator de iniciação eucariótico 4G elongação 2 (eEF2K), fato este que permite
(eIF4G) (Anthony e colaboradores, 2001; que o eEF2 seja ativado, o que promove a
Anthony e colaboradores, 2000) (Figura 1). elongação. Consistente com esses fatos, a

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administração de leucina para ratos induz eIF4E quanto para a ativação do eIF4G
hiperfosforilação da 4E-BP1, promove (Norton e Layman, 2006).
formação do complexo eIF4F, causa
hiperfosforilação da p70S6k e estimula a Leucina, insulina e síntese protéica
síntese protéica. Similarmente, dietas para muscular
ratos contendo 20% de proteína estimulam a
síntese protéica hepática e muscular, que é A leucina influencia o controle de curto
associada ao aumento da fosforilação da 4E- prazo da etapa de tradução da síntese
BP1 e à conseqüente redução da ligação do protéica e este efeito é sinérgico com a
eIF4E para a 4E-BP1, além do aumento da insulina, que é um hormônio anabólico, com
formação do complexo eIF4F. Esses fatos papel crítico na manutenção da síntese
permitem relacionar a resposta anabólica protéica muscular. Contudo, a insulina de
sobre a síntese protéica muscular induzida modo isolado não é suficiente para estimular a
pela ingestão de proteínas, por meio da síntese protéica muscular no estado pós-
capacidade do mTOR detectar alterações na absortivo, sendo necessária a ingestão de
concentração intracelular de leucina (Kimball e proteínas ou de aminoácidos para restaurar
Jefferson, 2006a; Kimball e Jefferson, 2006b) completamente as taxas de síntese protéica. É
Embora importante, não podemos proposto que o efeito da insulina na síntese
considerar que a mTOR é a única ativadora da protéica muscular esteja relacionado ao papel
síntese muscular pela leucina. Por exemplo, a desse hormônio em potencializar o sistema de
co-administração de leucina com inibição da tradução de proteínas, ao invés de regular
mTOR apenas induz a uma inibição parcial da diretamente tal processo, ou seja, a insulina
síntese muscular induzida pela leucina. Além exerce um efeito permissivo sobre a síntese
disso, a administração de leucina em ratos protéica na presença de aminoácidos (Norton
diabéticos induziu ao aumento da síntese e Layman, 2006). Aliado a isto, cabe ressaltar
protéica muscular sem que aumentasse a que a administração oral de leucina produz
fosforilação de 4E-BP1 e p70S6k (Norton e ligeiro e transitório aumento na concentração
Layman, 2006). de insulina sérica, fato este que age também
Um conhecido mecanismo de de modo permissivo para a estimulação da
estimulação da síntese protéica pela leucina síntese protéica induzida por este aminoácido
independente da ativação da mTOR é através (Bolster, Jefferson, Kimball, 2004; Anthony e
da ativação direta da eIF4G. Bolster e colaboradores, 2002a).
colaboradores viram que a fosforilação de Em estudos sobre a interação entre os
eIF4G foi significantemente aumentada em efeitos estimulatórios da leucina e da insulina
ratos suplementados com leucina. Eles sobre a síntese protéica no músculo
concluíram que aumentando a fosforilação da esquelético, verifica-se que a administração de
eIF4G aumenta-se a disponibilidade de eIF4G somatostatina – a qual inibe a secreção de
para eIF4E, então aumentando a formação do insulina – atenua o aumento induzido pela
complexo eIF4E-eIF4G e da síntese protéica leucina sobre a fosforilação da 4E-BP1 e da
independente da mTOR. Esses resultados p70S6k, porém não tem efeito sobre a
foram confirmados por Crozier e associação do eIF4E e eIF4G. Além disso,
colaboradores (2005), os quais demonstraram estudos em ratos diabéticos demonstram que
que um pequeno aumento de leucina, mesmo parte da resposta da leucina sobre a síntese
em quantidades fisiológicas, aumenta a protéica no músculo esquelético ocorre tanto
fosforilação de eIF4G e da síntese protéica por meio de mecanismos independentes de
comparando com grupos controles. Estas insulina quanto dependentes de insulina
descobertas indicam que as quantidades de (Kimball e Jefferson, 2006a). Portanto, conclui-
eIF4G disponíveis para a formação do se que os efeitos estimulatórios da leucina
complexo eIF4E-eIF4G são limitadas e mesmo sobre a síntese protéica muscular ocorrem por
uma pequena liberação do eIF4E pelo mecanismos dependentes de insulina, que
complexo 4E-BP1- eIF4E já fornece incluem a sinalização mediada pela proteína
quantidades necessárias de eIF4E para uma mTOR para a 4E-BP1 e a p70S6k, enquanto
máxima formação do complexo eIF4E-eIF4G. os efeitos independentes de insulina são
Sendo assim, a concentração de leucina é mediados por um mecanismo ainda não
importante tanto para a disponibilidade de totalmente esclarecido, que envolve a

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fosforilação do eIF4G e/ou sua associação e Colaboradores, 2000a; Gautsch e


com o eIF4E (Crozier e colaboradores, 2005; Colaboradores, 1998). Em contraste, quando
Deldicque, Theisen, Francaux, 2005; Anthony ratos privados de alimentação recebem uma
e colaboradores, 2002b). mistura isocalórica de carboidrato com leucina,
as taxas de síntese protéica são estimuladas
em 40% e equivalentes aos ratos livremente
alimentados. As concentrações de insulina
sérica tanto de ratos alimentados por
carboidrato quanto de ratos alimentados por
carboidratos e leucina são similares, por isso,
o aumento na taxa de recuperação não pode
ser atribuído à resposta diferenciada da
insulina entre os grupos. Esses resultados
sugerem que a leucina tem uma ação única
facilitadora da recuperação da síntese
muscular esquelética em ratos privados de
alimentação. Além disso, a administração oral
de leucina estimula a síntese muscular
esquelética após o exercício, privação
alimentar e tratamento com glicocorticóides. A
estimulação da síntese protéica após a
administração oral de leucina isolada é tão
eficiente quanto fornecendo uma combinação
de leucina com carboidrato. Contudo, quando
a leucina é administrada isoladamente não há
um aumento conseqüente de insulina
circulante 1 hora após a ingestão (Anthony e
colaboradores, 1999; Anthony e
colaboradores, 2000).
Estes resultados são inicialmente
interessantes, pois a leucina mostrou-se
anteriormente capaz de estimular a liberação
de insulina. Contudo, estudos mostraram que
fornecendo leucina a ratos privados de
alimentação promove um breve aumento na
insulina sérica entre os minutos 15-45 após a
administração. A concentração da insulina
circulante é máxima aos 30 minutos após a
administração de leucina e retorna a
Figura 1 - Sinalização envolvida na síntese concentração basal entre 45 e 60 minutos.
protéica mediada pela leucina (Anthony e Este breve aumento na insulina sérica deve
Colaboradores, 2001). facilitar o efeito estimulatório da leucina no
anabolismo protéico muscular. Garlick e Grant
A relativa contribuição da insulina na (1988) mediram taxas de síntese protéica no
estimulação da síntese protéica muscular músculo esquelético de ratos após serem
dependente de leucina permanece a ser submetidos à administração intravenosa de
determinado. Diversos estudos indicam que várias combinações de insulina e aminoácidos.
um aumento fisiológico da insulina sérica não Eles concluíram que, apesar da insulina
é suficiente para estimular a taxa de síntese estimular a síntese protéica muscular, maiores
protéica no período pós-absortivo em ratos efeitos são observados somente em
(Anthony, Anthony e Layman, 1999). Quando concentrações acima da fisiológica. Em
administrado carboidrato isolado em ratos contraste, quando uma mistura completa de
privados de alimentação, nenhuma alteração aminoácidos é co-administrada com insulina,
nas taxas de síntese protéica é observado um aumento nas taxas de síntese protéica é
comparando com ratos alimentados (Anthony obtido quando as concentrações de insulina

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estão próximas aos 100 pmol/L, bem dentro 5- Anthony, J.C.; Reiter, A.K.; Anthony, T.G.;
das concentrações fisiológicas para ratos Crozier, S.J.; Lang, C.H.; Maclean, D.A.;
privados de alimentação. Apesar de esses Kimball, S.R.; Jefferson, L.S. Orallly
resultados indicarem necessária a contribuição Administered Leucine Enhances Protein
de ambas – insulina e leucina – para promover Synthesis in Skeletal Muscle of Diabetic Rats
o anabolismo muscular pós-refeição, os in the Absence of Increases in 4E-BP1 or
mecanismos mediadores do aumento neste S6K1 Phosphorylation. Diabetes. Vol. 51.
anabolismo permanecem para serem 2002a. p. 928-936.
elucidados (Anthony e colaboradores, 2001).
6- Anthony, J.C.; Yoshizawa, F.; Anthony,
CONCLUSÃO T.G., Vary, T.C.; Jefferson, L.S.; Kimball, S.R.
Leucine Stimulates Translation Initiation in
A suplementação de leucina mostrou- Skeletal Muscle of Postabsorptive Rats via a
se eficaz em estimular o processo de síntese Rapamycin-sensitive Pathway. J Nutr. Vol.
protéica muscular em ratos e em humanos, 100. 2000a. p. 2413- 2419.
após serem submetidos a uma atividade física
ou mesmo após jejum e sem esforço físico. Os 7- Bolster, D.R.; Jefferson, L.S.; Kimball, S.R.
mecanismos pelos quais isto se dá envolvem Regulation of protein synthesis associated with
vias relacionadas à ativação da proteína chave skeletal muscle hypertrophy by insulin-, amino
mTOR e também vias ainda desconhecidas. acid- and exerciseinduced signalling. Proc.
Neste contexto, fazem-se necessárias novas Nutr. Soc. Vol. 63. Num. 2. 2004. p. 351-356.
pesquisas que abordem o efeito da leucina
paralelamente a outros aminoácidos, para 8- Bolster, D.R.; Vary, T.C.; Kimball, S.R.;
assim vermos sua real superioridade em Jefferson, L.S. Leucine Regulates Translation
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