Você está na página 1de 13

ISSN: 2525-9571

Eixo TEMÁTICO: Educação, uso de


Vol. 4 | Nº. 1 | Ano 2019 tecnologias e sociedade do
conhecimento

Italan Carneiro
Instituto Federal da Paraíba MÚSICA E FÍSICA:
italancarneiro@gmail.com
interdisciplinaridade em sala de aula

MÚSICA Y FÍSICA:
interdisciplinariedad en el aula

571
Anais da IV Jornada Ibero-Americana de Pesquisas em Políticas Educacionais e Experiências Interdisciplinares na Educação. Anais...Salvador (BA), 2019.
RESUMO

O trabalho apresenta possibilidades interdisciplinares entre os conhecimentos musicais e os


conhecimentos da área da Física. A partir das reflexões levantadas, advindas de pesquisa
bibliográfica, concluímos que as duas áreas dispõem de significativas possibilidades de integração
curricular que explicitam o aspecto lógico e racional da música, ao mesmo tempo em que ilustram
um aspecto prático, material e concreto da física, contribuindo assim para a ampliação do
entendimento de ciência e de arte dos estudantes.
Palavras-chave: Interdisciplinaridade. Currículo Integrado. Música. Física. Educação
Omnilateral.

RESUMEN

El trabajo presenta posibilidades interdisciplinares entre los conocimientos musicales y los


conocimientos del área de la Física. A partir de las reflexiones levantadas, surgidas de investigación
bibliográfica, concluimos que las dos áreas disponen de significativas posibilidades de integración
curricular que explicitan el aspecto lógico y racional de la música, al mismo tiempo que ilustran un
aspecto práctico, material y concreto de la física, contribuyendo así para la ampliación del
entendimiento de ciencia y de arte de los estudiantes.
Palabras Clave: Interdisciplinariedad. Currículo Integrado. Música. Física. Educación
Omnilateral

572
1. INTRODUÇÃO

Anais da IV Jornada Ibero-Americana de Pesquisas em Políticas Educacionais e Experiências Interdisciplinares na Educação. Anais...Salvador (BA), 2019.
Este trabalho apresenta um pequeno recorte da pesquisa de doutorado intitulada “Curso
Técnico Integrado ao Ensino Médio em Instrumento Musical do IFPB: reflexões a partir dos
perfis discente e institucional”1 que definiu como um dos seus objetivos específicos a reflexão
acerca das possibilidades de integração entre os conteúdos relacionados à Música e os
conhecimentos associados às disciplinas do currículo do Ensino Médio.
Neste texto, a partir de pesquisa bibliográfica, abordamos possibilidades de aproximação
entre conhecimentos musicais e conteúdos da disciplina Física presente no currículo do Ensino
Médio. Ressaltamos que a integração entre os conhecimentos das diversas áreas do saber
contribui efetivamente para que os sujeitos compreendam as conexões estabelecidas em seu
contexto histórico, social, cultural, e político. Nestes termos, acreditamos que a integração entre
os diversos conhecimentos amplia a “compreensão de mundo” dos estudantes, contribuindo
para que os mesmos sejam formados numa perspectiva integral.

2. A DISCIPLINA “FÍSICA” NO CONTEXTO BRASILEIRO


Sobre o desenvolvimento da disciplina Física no contexto brasileiro atual, Rosa e Rosa
(2005, p. 6) ressaltam que apesar da sua inserção curricular em escolas no Brasil ter ocorrido
há mais de cem anos, “sua abordagem continua fortemente identificada com aquela praticada
há cem anos atrás: ensino voltado para a transmissão de informações através de aulas
expositivas utilizando metodologias voltadas para a resolução de exercícios algébricos”.
Refletindo sobre a histórica tendência que direciona o ensino de Física prioritariamente à
resolução matemática de problemas (cuja ênfase muitas vezes encontra-se atrelada ao
desenvolvimento dos cálculos) presente nos materiais didáticos utilizados no contexto
brasileiro, Rosa e Rosa (2005) apontam que:

A maioria dos livros que circulam nas escolas apresentam os conteúdos como
conceitos estanques, dando o caráter de Ciência acabada e imutável à Física.
Porém, o mais problemático das obras está na forte identificação que elas
agregam entre a Física e os algoritmos matemáticos. Os textos e,
principalmente, os exercícios são apresentados como matemática aplicada, na

1
Pesquisa desenvolvida no Programa de Pós Graduação em Música, subárea Educação Musical, da Universidade Federal da Paraíba – UFPB,
sob a orientação do prof. Dr. Luis Ricardo Silva Queiroz. Disponível em:
<https://www.academia.edu/35060454/Curso_T%C3%A9cnico_Integrado_ao_Ensino_M%C3%A9dio_e
m_Instrumento_Musical_do_IFPB_reflex%C3%B5es_a_partir_dos_perfis_discente_e_institucional>. Acesso em 14/05/2019. 573
qual a questão fundamental se resume a treinar o estudante na resolução de
problemas algébricos. (ROSA; ROSA, 2005, p. 2)

Reforçando esta perspectiva e apresentando o panorama que ainda caracteriza, via de

Anais da IV Jornada Ibero-Americana de Pesquisas em Políticas Educacionais e Experiências Interdisciplinares na Educação. Anais...Salvador (BA), 2019.
regra, o desenvolvimento dos conteúdos relacionados à disciplina Física, como por exemplo os
conceitos relacionados à acústica, e seu distanciamento das demais áreas do conhecimento,
Monteiro Jr. e Carvalho (2011) tecem a seguinte reflexão:

[...] parte expressiva dos professores de ciências naturais e, em particular, dos


professores de física, continua alheia à história de tal desenvolvimento [da
Música] e o ensino da acústica continua confinado a um modo que se encerra
no mundo físico e de suas tecnologias, desconsiderando as ligações com a
biologia, psicologia, fisiologia, sociologia, medicina e música. (MONTEIRO
Jr.; CARVALHO, 2011, p. 138)

Diante deste panorama, destacamos a reflexão contida nos Parâmetros Curriculares


Nacionais apontando que “espera-se que o ensino de Física, na escola média, contribua para a
formação de uma cultura científica efetiva, que permita ao indivíduo a interpretação dos fatos,
fenômenos e processos naturais, situando e dimensionando a interação do ser humano com a
natureza como parte da própria natureza em transformação” (BRASIL, 2000, p. 22). Ainda
nessa perspectiva, o documento sinaliza que,

Para tanto, é essencial que o conhecimento físico seja explicitado como um


processo histórico, objeto de contínua transformação e associado às outras
formas de expressão e produção humanas. É necessário também que essa
cultura em Física inclua a compreensão do conjunto de equipamentos e
procedimentos, técnicos ou tecnológicos, do cotidiano doméstico, social e
profissional. (BRASIL, 2000, p. 22)

Corroborando com a perspectiva de integração entre a Física e as demais áreas do


conhecimento, Jaime e Ponczek (2015, p. 2) ressaltam a importância de “discutir o
conhecimento físico relativo aos fenômenos do cotidiano, à cultura, aos eventos nos quais o
estudante está em contato constantemente”. Desse modo, os autores refletem que “é necessário
explicitar em aulas o vínculo dos conteúdos de Física com outras disciplinas, em particular,
com os eventos sonoros do cotidiano como a Música” (JAIME; PONCZEK, 2015, p. 2).

3. APROXIMAÇÕES ENTRE MÚSICA E FÍSICA

A aproximação entre os conhecimentos musicais e os conhecimentos associados à Física


574
historicamente coincide com o vínculo que surge entre a Música e a Matemática no período da
Antiguidade Clássica. Refletindo sobre a referida aproximação entre conhecimentos físicos e
musicais, Donoso e colaboradores (2008) indicam que:

Anais da IV Jornada Ibero-Americana de Pesquisas em Políticas Educacionais e Experiências Interdisciplinares na Educação. Anais...Salvador (BA), 2019.
O elo entre a física e a música constitui um importante fator motivador para o
aprendizado, pois estimula os estudantes a encararem a física através de uma
visão mais ampla e interdisciplinar. Acreditamos também que o ensino da
física dos instrumentos musicais em cursos de formação de professores de
Ensino Médio contribuirá para abordagens didáticas mais ricas e abrangentes.
(DONOSO et al. 2008, p. 19)

Caracterizando um dos conteúdos que se localiza na intersecção entre as áreas, Rui e


Steffani (2007) discutem as diversas e ricas possibilidades oriundas do trabalho realizado a
partir do “som”, incluindo seu potencial de integração com as demais áreas do conhecimento.
Nesse sentido, conforme os autores,

O som é talvez um dos temas mais fascinantes tanto por sua diversidade
quanto por sua complexidade. A produção, a propagação e a percepção do som
envolvem conceitos físicos, biológicos, artísticos e psíquicos que perpassam
todas as áreas do conhecimento humano. Afinal, o que diferencia, fisicamente,
o barulho e o som musical? Quantas e quais sensações são despertadas por
uma seqüência de notas musicais em diferentes pessoas? Por sua vez, no
contexto da Física, o estudo da produção, propagação e percepção do som
introduz uma gama enorme de conceitos físicos: vibração, freqüência,
período, velocidade, comprimento de onda, energia, pressão, ressonância, etc.
Já no contexto artístico, conceitos como ritmo, harmonia, tom, melodia e
outros parecem em nada se relacionarem com os conceitos físicos
mencionados. Ademais, o estudo da audição humana nas aulas de biologia
quase sempre tem caráter essencialmente informativo, restringindo-se, via de
regra, à identificação das partes que compõem o ouvido e descrições de suas
funções básicas. Já é tempo de romper com este modelo de ensino
fragmentado e desarticulado. (RUI; STEFFANI, 2007, p. 2)

Apresentando uma proposta de trabalho que envolveu de forma integrada os


conhecimentos das áreas da Física e da Música, no contexto de um projeto de iniciação
científica, Cavalcante e colaboradores (2012) abordaram questões relacionadas à acústica,
fenômenos ondulatórios e teoria musical. A atividade culminou na construção de um
instrumento musical denominado “tubofone”, construído a partir de tubos de 100 mm de PVC,
possuindo duas oitavas cromáticas e afinado em Sol (G). Conforme Cavalcante e colaboradores
(2012, p. 103), “o estudo de tubos sonoros, uma das atividades de um ramo da física chamado
acústica, permite saber qual deve ser o comprimento e o diâmetro exato do tubo para que ele
ressoe em frequências da escala musical e isso permite construir instrumentos musicais
bastante razoáveis, musicalmente falando”. Sobre as questões físicas envolvendo o
575
funcionamento do instrumento, os autores apontam que:

[...] o som que escutamos quando batemos, com raquetes de tênis de mesa, em
uma das extremidades do cano é provocado pelas vibrações das colunas de ar

Anais da IV Jornada Ibero-Americana de Pesquisas em Políticas Educacionais e Experiências Interdisciplinares na Educação. Anais...Salvador (BA), 2019.
no interior do tubo. Essas vibrações podem ser estudadas como ondas
estacionárias resultantes da interferência do som enviado numa extremidade
com o som refletido na outra. Em uma extremidade aberta o som reflete-se em
fase, formando um ventre (ou antinó) e constituindo o que chamamos de
interferência construtiva. (CAVALCANTE et al., 2012, p. 105)

Além de utilizarem-se dos tubos sonoros, os autores abordaram os conteúdos de acústica


fazendo uso das “cordas vibrantes” e indicaram que, a partir do trabalho realizado, “os
estudantes puderam visualizar os padrões das ondas estacionárias produzidas tanto numa corda,
como nos tubos sonoros (fechados e abertos), e assim, puderam também comparar as equações
que descrevem as frequências das ondas com o comprimento do tubo ou da corda”
(CAVALCANTE et al., 2012, p. 104). Apresentando alguns dos resultados obtidos através da
atividade, os autores concluem que “a experimentação de fato estimula a participação efetiva
do estudante no processo ensino-aprendizagem, permitindo a percepção de que a ciência está
presente em seu dia-a-dia, e assim, está ao alcance de todos” (CAVALCANTE et al., 2012, p.
103).
Também partindo da experimentação desenvolvida com base na montagem de
instrumentos musicais, Coelho e Machado (2015) propuseram a construção de um “móbile com
tubos sonoros” na busca da caracterização de sons e abordagem dos princípios físicos
envolvidos nos fenômenos acústicos. Conforme as autoras, sua proposta de trabalho:

Utiliza a contextualização com fenômenos musicais reais por meio da


experimentação, na qual o aluno tem contato sensível com o fenômeno e
percebe sua complexidade na abordagem matemática por meio de modelos.
Confronta resultados teóricos e experimentais, sendo o modelo matemático
que se adequa para descrever o funcionamento de um móbile com tubos
sonoros (carrilhão) diferente dos apresentados nos livros para descrever o
funcionamento dos tubos abertos e fechados. (COELHO; MACHADO, 2015,
p. 211)

Ressaltando a relevância da utilização dos instrumentos musicais no desenvolvimento


dos conteúdos da disciplina Física, Donoso e colaboradores (2008, p. 1) sinalizam que “a Física
dos instrumentos musicais é uma área de estudos fascinante e de grande potencial pedagógico
pelas aplicações práticas das oscilações & ondas, e do fenômeno de ressonância”. Para ilustrar
o trabalho realizado a partir da análise dos processos de construção e funcionamento dos
instrumentos musicais, Donoso e colaboradores (2008, p. 1) realizam “uma descrição geral da
física do violino, analisando os conceitos que lhes dão sustentação física e que revelam toda a 576
riqueza e o potencial pedagógico do assunto. Segundo os autores,

Seu estudo [da construção e funcionamento do violino] envolve um


considerável conhecimento de física básica, tais como o entendimento do

Anais da IV Jornada Ibero-Americana de Pesquisas em Políticas Educacionais e Experiências Interdisciplinares na Educação. Anais...Salvador (BA), 2019.
fenômeno de ressonância na caixa acústica do violino, a função dos orifícios
em forma de “f” que permitem considerar o violino como um ressoador de
Helmholtz, o estudo dos modos normais de vibração dos tampos de madeira e
do cavalete, e o problema das vibrações produzidas numa corda friccionada
por um arco. Este último tópico resulta também numa interessante análise da
transferência de energia entre os modos de vibração naturalmente estimulados
pelo arco (torsionais) e aqueles que efetivamente acoplam com o meio em que
a perturbação acústica se propaga. (DONOSO et al. 2008, p. 1)

Refletindo sobre os aspectos físicos do violino que estão relacionados aos conteúdos da
Física, Donoso e colaboradores (2008, p. 10) analisam a construção do cavalete e apontam que
sua principal função consiste em “transformar o movimento da vibração das cordas – paralela
ao tampo superior – em forças aplicadas a cada um dos dois pés, as quais atuam perpendiculares
ao tampo superior do instrumento”. Ou seja, “sua função é ‘girar’ a força transversal da corda
vibrante em forças normais aplicadas ao corpo do instrumento” (DONOSO et al. 2008, p. 10).
Sobre a construção do cavalete, os autores assinalam que:

Gerações de luthiers descobriram que a forma e a geometria do cavalete


influencia a resposta acústica do violino. Ele atua como um transdutor
mecânico, acoplando os modos de vibração transversais das cordas em modos
vibracionais da caixa de ressonância. Ele atua também como filtro acústico,
suprimindo certas frequências indesejáveis. (DONOSO et al. 2008, p. 4)

Sobre a “alma” do violino , os autores ressaltam que as pesquisas desenvolvidas pelo


físico francês Félix Savart no século XIX mostraram que sua função não se limitava a transmitir
as vibrações do tampo superior para o inferior. Conforme Donoso e colaboradores (2008),

Ela [a alma] também altera os modos vibracionais de ambos os tampos ao


impor um ponto nodal praticamente estacionário nos pontos de contato entre
eles. A alma também ajuda a suportar a força exercida pelas cordas sobre o
tampo superior, distribuindo parte do esforço ao tampo inferior. (DONOSO et
al. 2008, p. 6)

Refletindo sobre a construção e o processo de afinação das cordas do instrumento, cuja


tensão é ajustada a partir do giro das cravelhas até que a corda atinja o valor da frequência
desejada, os autores indicam que:

As cordas do violino são confeccionadas em aço. O coeficiente de elasticidade


do aço (módulo de Young) vale Y = 200 GPa. A tensão de ruptura ou
resistência de tração do aço é (F/A) = 520 MPa. Considerando-se, por
exemplo, a corda Mi do violino, cujo diâmetro é aproximadamente 0.2 mm
577
(área da seção transversal: πr ˜ 3 x 10 m ), e supondo-se uma tração aplicada
2 -8 2

de F ≈ 63 N, a deformação tolerada pela corda pode ser estimada através da


expressão:

Anais da IV Jornada Ibero-Americana de Pesquisas em Políticas Educacionais e Experiências Interdisciplinares na Educação. Anais...Salvador (BA), 2019.
Substituindo estes parâmetros na Eq. 3, obtemos (ΔL/L) 1%. Isto significa que
a corda Mi vai estourar se a deformação relativa for maior que 1%. Como o
comprimento da corda do violino, desde a cravelha até o microafinador, é de
cerca de 34 cm, basta uma volta na cravelha para atingir esse 1% de tolerância.
De fato, como o diâmetro do eixo da cravelha é de 0.5 cm, uma volta na
cravelha encurta a corda em aproximadamente 3 mm, chegando-se assim
próximo à tensão de ruptura do aço. Ao apertar-se um pouco mais a cravelha,
a corda rompe-se. (DONOSO et al. 2008, p. 7)

Analisando a resposta acústica do violino, a partir dos modos de vibração dos tampos do
violino, Donoso e colaboradores (2008, p. 7) indicam que estes “precisam se comportar como
verdadeiras tábuas harmônicas, com modos normais de vibração cujas frequências formam
uma sequência harmônica (ou seja, que as frequências dos sobretons sejam múltiplos inteiros
de uma frequência fundamental)”. Sobre a natureza dos dois orifícios em forma de “f”
localizados no tampo superior, Donoso e colaboradores (2008, p. 8) indicam que estes
“permitem - em primeira aproximação - considerar a caixa do violino como um ressoador de
Helmholtz”. Os autores apontam ainda que:

Este ressoador consiste de uma cavidade de volume V cheia de ar e conectada


ao exterior por um tubinho de comprimento l e área da seção reta A. Quando
este ressoador oscila, as colunas de ar se movimentam através das aberturas
produzindo oscilações na pressão interna da cavidade. (DONOSO et al. 2008,
p. 8)

Refletindo sobre a ação realizada pelo violinista de friccionar o arco nas cordas do
instrumento, movimento conhecido como “arcada”, e ainda sobre a influência da utilização do
breu no arco, os autores analisam as características físicas inerentes ao ângulo de inclinação do
arco e os coeficientes de atrito que caracterizam o movimento, ilustrando possibilidades de
trabalho a serem desenvolvidos nas aulas de Física:

Podemos determinar o coeficiente de atrito estático (µe) entre a superfície


formada pelas crinas e a superfície da corda metálica, medindo-se o ângulo de
inclinação (Θ) no qual um pequeno objeto posicionado sobre as crinas começa
a deslizar. Neste caso se cumpre a relação µe = tg Θ. Os resultados da
experiência foram Θ ≈ 20 para o arco sem breu e Θ ≈ 30 para o arco com
o o

breu, dando coeficiente de atrito de µe = 0.36 e = 0.6 para o arco sem e com
breu, respectivamente. Estes valores estão de acordo com os encontrados na
literatura, µe = 0.56 nos arcos com breu, e 0.21 nos sem breu. Estes resultados

578
indicam que o coeficiente de atrito estático aumenta cerca de 60% com a
aplicação do breu. (DONOSO et al. 2008, p. 13)

Descrevendo e diferenciando as sonoridades resultantes de duas diferentes possibilidades

Anais da IV Jornada Ibero-Americana de Pesquisas em Políticas Educacionais e Experiências Interdisciplinares na Educação. Anais...Salvador (BA), 2019.
de extrair som das cordas do instrumento, a produção sonora resultante do estímulo pelo arco
(arcada) X a sonoridade da técnica pizzicato, os autores analisam que:

O som musical emitido por uma corda vibrante é determinado pelo tom
fundamental e seus parciais, ou harmônicos. A quantidade e a intensidade dos
harmônicos presentes na vibração da corda dependem da forma como ela for
excitada. A vibração da corda friccionada por um arco é diferente da vibração
de uma corda tangida, ou seja, puxada e depois solta. Ao beliscar uma corda
os parciais produzidos são ligeiramente inarmônicos, mas quando a corda é
friccionada a oscilação é auto-sustentada e a relação entre o tom fundamental
e seus parciais praticamente harmônica. Por este motivo seus timbres também
são diferentes. A forma da onda da corda excitada pelo arco pode ser descrita
por uma onda “dente-de-serra” modificada. Esta forma de onda, muito
encontrada em eletrônica, pode ser representada como uma série de Fourier
de ondas senoidais e tem como característica um espectro de som rico em
harmônicos. (DONOSO et al. 2008, p. 15)

Ainda explorando as possibilidades de integração entre música e física contidas nos


processos de construção e execução dos instrumentos musicais, destacamos a proposta de Costa
e Soltau (2016) na qual os autores exploram as propriedades físicas da flauta doce. Conforme
os autores,

A flauta doce é um instrumento de sopro antigo e muito simples, que pode ser
usado como objeto no estudo das propriedades físicas relacionadas à acústica,
tais como frequência, modos normais etc., associando-as com os aspectos da
teoria musical para se obter maior compreensão da relação entre a Física e a
Música. (COSTA; SOLTAU, 2016, p. 1)

Partindo de raciocínio semelhante, Silva Jr. e Miltão (2015) também destacam o potencial
de integração entre os conhecimentos físicos e musicais, especialmente os conteúdos
relacionados à acústica, através das particularidades dos instrumentos musicais. Os autores
abordam os conceitos acústicos a partir do instrumento cavaquinho, sob a seguinte justificativa:

[...] como uma maneira de dar concretude aos conceitos associados com a
acústica faremos uso da música através de instrumentos musicais, em especial
o cavaquinho, o que possibilita abordar este conhecimento por meio de uma
linguagem acessível para professores e estudantes do ensino médio, com o
intuito de aprofundar o ensino e a aprendizagem. (SILVA Jr.; MILTÃO, 2015,
p. 1)

Entendemos que as aproximações entre a Física e a Música apresentam-se enquanto


possibilidades de trabalhos a serem desenvolvidos nas disciplinas relacionadas às duas áreas 579
que contribuem para o desenvolvimento dos conhecimentos das duas disciplinas nos mais
diversos espaços escolares. Tal contribuição torna-se ainda mais relevante quando
identificamos autores, como Barros e colaboradores (2014), que apontam o desenvolvimento

Anais da IV Jornada Ibero-Americana de Pesquisas em Políticas Educacionais e Experiências Interdisciplinares na Educação. Anais...Salvador (BA), 2019.
de determinados conteúdos da Física, como a acústica por exemplo, como um desafio para os
docentes. Nesse sentido, os autores afirmam que “aplicar o conteúdo de acústica assim como
outros conteúdos da física, pode significar um desafio até para o mais experiente dos
professores, isso porque conteúdos deste tipo exigem um nível de abstração tão singular que às
vezes o próprio locutor se enrola na tentativa de explicitar certos conceitos” (BARROS et al.,
2014, p. 5).
É necessário ressaltar que além das questões e dificuldades metodológicas relacionadas
à prática docente no ensino da acústica, diversos autores ressaltam que frequentemente os livros
didáticos também encontram dificuldades em abordar o tema, ambos os casos sendo reflexo da
complexidade conceitual que permeia a temática. Nessa perspectiva, Coelho e Machado (2015,
p. 210) sinalizam que “nos livros-texto, normalmente a acústica é apresentada de forma
simplificada e descontextualizada de suas importantes implicações no campo musical”.
Partindo de raciocínio semelhante, Donoso e colaboradores (2008, p. 1) indicam que “embora
a maioria dos textos de física básica discuta as propriedades e a propagação das ondas sonoras,
a produção dos sons nos instrumentos musicais não é abordada em profundidade”.
Confirmando o distanciamento da música nos livros didáticos da disciplina Física, Jaime e
Ponczek (2015) a partir de estudo que realizou análise dos livros indicados pelo Programa
Nacional do Livro Didático para o Ensino Médio (PNLEM) do ano de 2009 apontam que “um
dos fatores que dificulta a visualização da relação entre Física e Música pela sociedade em sua
amplitude é a insuficiente discussão apresentada nos livros a favor deste vínculo” (JAIME;
PONCZEK, 2015, p. 8). Ainda apontando a ausência da música nos materiais de Física, a partir
da análise de livros didáticos voltados para a 8ª série do Ensino Fundamental e para o 2º ano
do Ensino Médio, Monteiro Jr. e Medeiros (1998) detectaram a presença de distorções
conceituais na apresentação dos conceitos relativos aos “atributos psicofísicos do som”
(conceitos de altura, intensidade fisiológica e timbre) e apontam que:

Com respeito à forma como os conteúdos analisados são apresentados pelos


livros didáticos, nossa análise evidenciou uma forte ênfase no aspecto
abstrato, não havendo uma preocupação em contextualizar tais conteúdos com
situações próximas da vivência dos estudantes. Passaria por aí a necessidade
de entrar-se no enorme universo das experiências musicais, que todos
possuem, em maior ou menor quantidade. Associado a isto, tais conteúdos são
apresentados de uma forma superficial e fundamentalmente física, não
580
relevando a importância da percepção humana na construção da ciência da
acústica. (MONTEIRO Jr.; MEDEIROS, 1998, p. 10-11)

Dando continuidade ao trabalho de Monteiro Jr. e Medeiros (1998), Monteiro Jr. e

Anais da IV Jornada Ibero-Americana de Pesquisas em Políticas Educacionais e Experiências Interdisciplinares na Educação. Anais...Salvador (BA), 2019.
Carvalho (2011) realizaram nova análise dos conteúdos referentes à acústica encontrados nos
livros didáticos da disciplina Física recomendados pelo PNLEM e constataram que “tais textos
pouco evoluíram em comparação com as apresentações textuais analisadas em 1998”
(MONTEIRO Jr.; CARVALHO, 2011, p. 137). Refletindo sobre a abordagem encontrada nos
livros, os autores argumentam que:

[...] apesar de todo um esforço institucional na busca por uma melhora do livro
didático oferecido aos estudantes de nível médio, ainda há falhas a serem
corrigidas, conceitos a serem melhorados e inserções históricas que realmente
revelem a natureza humana da construção da ciência e suas imbricações
sociais, políticas e econômicas. Apresentações textuais que levem os
estudantes a refletirem sobre os problemas do seu tempo, de sua sociedade.
(MONTEIRO Jr.; CARVALHO, 2011, p. 152)

4. REFLEXÕES FINAIS

Acreditamos que a configuração do currículo escolar precisa contemplar a aproximação


entre as diversas áreas do conhecimento, gerando integração entre os mais “distintos”
conhecimentos, trabalhados a partir da sua inserção histórico-contextual com o objetivo de
contribuir no processo de formação humana dos estudantes.
A partir das possibilidades elencadas ao longo deste texto, entendemos que a
aproximação entre as áreas da Física e da Música pode contribuir de forma expressiva para o
desenvolvimento dos conteúdos curriculares de ambas as áreas. A abordagem dos
conhecimentos físicos inerentes à construção e execução dos instrumentos musicais, por
exemplo, caracteriza um caminho extremamente frutífero, especialmente quando
compreendemos que temos instrumentos de naturezas muito distintas (cordas, madeiras,
metais, teclas, percussivos) e que estes possuem singularidades que abarcam uma quantidade
significativa de conceitos físicos para análise e trabalho em sala de aula. Nesse sentido,
apontamos as práticas interdisciplinares como estratégias de extrema importância para a
ampliação da “perspectiva de mundo” dos sujeitos.

581
5. REFERÊNCIAS
BARROS, Luís Paulo Bizerra de et al. A música no ensino de acústica: usando software de
edição de áudio na compreensão de conceitos físicos. In: SEMINÁRIO NACIONAL

Anais da IV Jornada Ibero-Americana de Pesquisas em Políticas Educacionais e Experiências Interdisciplinares na Educação. Anais...Salvador (BA), 2019.
DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E TECNOLÓGICA, 4., 2014, Belo Horizonte.
Anais... Belo Horizonte: CEFET-MG, 2014. Disponível em:
<http://www.senept.cefetmg.br/galerias/Anais_2014/GT01/GT_01_x10x.pdf>. Acesso
em: 13/04/2019.

BRASIL. Ministério da Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais (Ensino Médio):


Parte III - Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasília: MEC, 2000.
Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/ciencian.pdf>. Acesso em:
01/02/2019.

CAVALCANTE, João Carlos Leal et al. Física e Música: uma proposta interdisciplinar.
Revista Areté, Manaus/AM, v. 5, n. 9, p. 101-111, ago./dez. 2012. Disponível em:
<http://periodicos.uea.edu.br/index.php/arete/article/view/113/124>. Acesso em:
11/11/2018.

COELHO, Suzana Maria; MACHADO, Gisele Ramires. Acústica e música: uma abordagem
metodológica para explorar sons emitidos por tubos sonoros. Caderno Brasileiro de
Ensino de Física, Florianópolis/SC, v. 32, n. 1, p. 207-222, abr. 2015. Disponível em:
<https://periodicos.ufsc.br/index.php/fisica/article/view/2175-
7941.2015v32n1p207/29043>. Acesso em: 11/12/2018.

COSTA, Kleyton D’Martin; SOLTAU, Samuel Bueno. A física da flauta doce: um estudo das
notas nas posições comuns e alternativas. Caderno de Física da UEFS, Feira de
Santana/BA, v. 14, n. 1, 2016. Disponível em:
<http://dfis.uefs.br/caderno/vol14n1/s4Artigo01Kleyton_Flauta_e_Fisica.pdf>. Acesso
em: 16/01/2019.

DONOSO, José Pedro et al. A física do violino. Revista Brasileira de Ensino de Física, São
Paulo/SP, v. 30, n. 2, 2008. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/rbef/v30n2/a06v30n2.pdf>. Acesso em: 13/05/2019.

JAIME, Pedro Javier Gómez; PONCZEK, Roberto León. Música e ruído: uma discussão
sobre estes fenômenos no Ensino Médio de Física. Caderno de Física da UEFS, Feira
de Santana/BA, v. 13, n. 2, 2015. Disponível em:
<http://dfis.uefs.br/caderno/vol13n2/s6Artigo3PedroPonczek_Musica.pdf>. Acesso em:
16/11/2018.

MONTEIRO Jr., Francisco Nairon; MEDEIROS, Alexandre. Distorções conceituais dos


atributos do som presentes nas sínteses dos textos didáticos: aspectos físicos e
fisiológicos. Ciência e Educação, Bauru/SP, v. 5, n. 2, p. 01-14, 1998. Disponível em:

582
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-73131998000200001>.
Acesso em: 16/04/2019.

Anais da IV Jornada Ibero-Americana de Pesquisas em Políticas Educacionais e Experiências Interdisciplinares na Educação. Anais...Salvador (BA), 2019.
MONTEIRO Jr., Francisco Nairon; CARVALHO, Washington Luiz Pacheco de. O ensino de
acústica nos livros didáticos de física recomendados pelo PNLEM: análise das ligações
entre a Física e o mundo do som e da Música. Holos, Natal/RN, ano 27, v. 1, 2011.
Disponível em: <http://www2.ifrn.edu.br/ojs/index.php/HOLOS/article/view/516/423>.
Acesso em: 21/03/2019.

ROSA, Cleci Werner da; ROSA, Álvaro Becker da. Ensino de Física: objetivos e imposições
no Ensino Médio. Revista Electrónica de Enseñanza de las Ciencias, v. 4 n. 1, 2005.
Disponível em: <http://reec.uvigo.es/volumenes/volumen4/ART2_Vol4_N1.pdf>.
Acesso em: 18/03/2019.

RUI, Laura Rita; STEFFANI, Maria Helena. Um recurso didático para ensino de física,
biologia e música. In: ENCONTRO ESTADUAL DE ENSINO DE FÍSICA – RS, 1.,
Porto Alegre/RS, 2005. Anais... Porto Alegre: Instituto de Física – UFRGS, 2005.
Disponível em:
<http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/614/000554032.pdf?...#page=85>.
Acesso em: 10/09/2018.

_______; _______. Física: som e audição humana. In SIMPÓSIO NACIONAL DE ENSINO


DE FÍSICA, 17., 2007, São Luís/MA. Anais... São Luís/MA, 2007.
<http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/30450>. Acesso em: 08/11/2018.

SILVA Jr., Romualdo S.; MILTÃO, M. S. R.. O fenômeno acústico e o Ensino Médio:
utilização de instrumentos musicais como incentivo para o ensino de acústica: o caso do
cavaquinho. Caderno de Física da UEFS, Feira de Santana/BA, v. 13, n. 2, 2015.
Disponível em:
<http://dfis.uefs.br/caderno/vol13n2/s4Artigo1RomualdoMiltao_Acustica.pdf>. Acesso
em: 26/04/2019.

583

Você também pode gostar