O Paiz Daqui a greve terrível de Armentières, onde,

Rio de Janeiro segundo os últimos telegramas, os

02 de julho de 1893. operários saquearam as fábricas e as casas
Edição nº 4073 – Ano IX dos patrões, ferindo os contramestres e os
Capa gendarmes que queriam restabelecer a
Telegramas ordem.
A Greve de Armentières, cidade industrial da
Paris, 30 de junho. província, foco de socialistas violentos e de
(noite) anarquistas enérgicos, foi provocada pela
Os cocheiros contratados para o serviço de demissão de seis operários tecelões, que
transportes, nesta cidade, foram agredidos trabalhavam na fábrica de tecelagem do
pelos grevistas, resultando grande número Senhor Villard.
de feridos. A milícia dispersou os Os operários das outras oficinas quiseram
desordeiros e prendeu os mais exaltados. impor a readmissão dos seus companheiros
despedidos e os patrões recusaram aceder
Londres, 1. ao desejo expresso pelos tecelões reunidos
Foram presos alguns anarquistas que num meeting celebrado fora da cidade.
afixaram hoje cartazes insultuosos à corte Exasperados, uns 5.000 tecelões, grupo
inglesa e verberando a exibição do luxo que que depois cresceu com o apoio dos
vai ser efetuado o casamento do filho do anarquistas, fizeram toda a casta de
príncipe de Gales. desordens nas ruas de Armentières,
cantando a marcha Internacional e os
O Paiz refrains das oito horas de trabalho. Os
Rio de Janeiro gendarmes tentaram dissolver os grupos,
02 de julho de 1893. mas foram recebidos a cacetada e a
Edição nº 4073 – Ano IX pedrada, ficando vários soldados
Página 2 gravemente feridos. Acudiram reforços
Cartas Parisienses policiais, a cavalo e a pé, e os amotinados
Os trabalhadores reclamam o talher a que fugiram, mas opondo sempre grande
tem direito no banquete da vida e essas resistência. Quando se encontraram longe
reclamações que até agora se faziam em das vistas da polícia, cercaram a casa de
estilo lírico nas gazetas revolucionárias e alguns fabricantes e diretores de
nos discursos dos clubes, tomam neste estabelecimentos fabris e acabaram por
momento uma feição atrevida e quase saquear e destruir tudo que encontraram! O
brutal. Os agitadores anarquistas combatem prefeito do departamento do Norte
as palavras calorosas dos socialistas telegrafou imediatamente para Lisle,
autoritários e excitam os operários à revolta. pedindo com urgência um forte
destacamento de tropa de linha a pé e a
cavalo.
A burguesia de Armentières está aterrada,
porque receia as violências dos anarquistas,
que estão à frente deste terrível movimento
grevista. Os caixeiros e moços de padeiro
de Bordéus estão também em greve
reclamando aumento de salário
diminuição de horas de trabalho. Os patrões
não estão dispostos a atender
reclamações dos seus operários e Bordéus
ficaria sem pão, se não fosse o precioso
auxilio das autoridades militares,
puseram a disposição do público os fornos
dos quartéis, onde durante o dia e a noite se
achava neste momento fabricando pão os
soldados da 18º secção da administração
militar.
Em Paris há neste momento duas ou três
pequenas greves parciais sem importância.
O operariado parisiense é suficientemente
pago e por isso raras vezes reclama
aumento de salário. Apenas as mulheres é
que são indecorosamente exploradas nos
atelier e na pequena indústria. O movimento
grevista na província está dando que pensar
aos governantes em França, por causa das
violências destes últimos tempos.
O Paiz
Rio de Janeiro
03 de julho de 1893.
Edição nº 4074 – Ano IX
Capa
e Telegramas
as Madri, 2.
Foram presos na Corunha vários indivíduos
que afixavam proclamações ao povo,
que incitando-os a revolta.
New York, 2.
Estão em greve, nesta cidade, 30.000
operários de diversas condições.
Relativamente ao desastre ocorrido na
Estrada de Ferro da Leopoldina, linha de
Pádua, temos os seguintes pormenores. O
lamentável sucesso ocorreu entre os
quilômetros 166 e 168. Ficaram feridos
gravemente os seguintes passageiros:
Astrogilda India do Brazil, Luiz Augusto dos
Santos Júnior, Paulo José de Almeida,
Domingos José Ferreira Pinto, Padre Tito
Affonso Capellani e Maciel Pedro do
Nascimento, que faleceu assim que chegou
a São Fidelis.
Comparecendo ao local do desastre a
autoridade policial de São Fidelis, efetuou a
prisão de diversos empregados da estrada,
que julgou culpados, detendo-os na cadeia.
O chefe das oficinas estabelecidas nessa
cidade intervindo, perante a mesma
autoridade, para que fossem soltos os seus
companheiros, foi também preso.
O pessoal do movimento, por essa razão,
considerou-se em greve no dia seguinte, o
que fez paralisar a carreira dos trens de São
Fidelis para cima. O povo levantando-se em
seguida e indignado com a interrupção do
trânsito, entrou a danificar a linha em sofrível
extensão, arrancando trilhos. Além disso,
incendiou pilhas de dormentes, o depósito
do material técnico, amontoou madeira
sobre o leito da estrada, no centro da
cidade, e cometeu outras tropelias. E,
nessas condições, estavam exaltadíssimos
os ânimos em São Fidelis. Estas
informações colhemos na Gazeta do Povo,
de Campos, número de ontem.
O Paiz
Rio de Janeiro
05 de julho de 1893.
Edição nº 4075 – Ano IX
Capa
Telegramas
Madri, 4.
Consta que o ministro da fazenda insiste no
pedido de demissão, tendo recusado a
aceder aos grandes cortes no orçamento
geral, de que os conservadores faziam
questão para aprova-lo.
- Toma cada vez maior vulto a oposição do
povo aos novos impostos. Por este motivo,
dão-se diariamente tumultos de gravidade
em vários pontos da Espanha. O presidente
do conselho declarou que serão demitidos
todos os governadores que de qualquer
sorte hostilizar o governo e processara os
republicanos que promoverem desordens.
Paris, 4.
Durante a noite de ontem houve ainda
conflitos bastante sérios, no Bairro Latino e
nos boulevards. Grupos de estudantes
percorreram as ruas, destruindo lampiões e
quiosques, promovendo assuados e
exigindo a demissão do Chefe da
Segurança Pública. Atacaram a polícia que
os procurava conter e desses encontros
resultaram 20 agentes e mais de 100
estudantes feridos. A excitação ainda
continua receiam-se novos conflitos.
Paris, 4.
Os conflitos que temos narrado continuaram
durante todo o dia de hoje. Os estudantes
prosseguiram nos desacatos. Quebraram
lampiões da iluminação pública e as
vidraças do senado e do palácio da justiça e
queimaram os quiosques do boulevard Saint
Michel. O governo, considerando a policia
impotente para restabelecer a ordem,
substituiu-a pela tropa de linha.
New York, 4.
Pela paralisação do serviço nas minas de
diversos Estados é grande a miséria entre
os respectivos operários.
Greve Paris, 5.
Em aditamento a nossa noticia de ontem Repetiram-se os tumultos nesta cidade, com
sobre a greve dos operários da Companhia caráter mais violento. Uma coluna de cerca
Industrial do Brazil, temos outras de mil estudantes dirigiu-se a Câmara dos
informações. O pessoal não obstante se Deputados. Subiu uma comissão de dez
haver harmonizado com a administração da rapazes e formulou queixa contra a polícia.
Companhia, revoltou-se novamente ontem. Em seguida dirigiram-se ao Palácio da
Exige agora a demissão do Doutor Prefeitura, onde pararam, dando vaias,
Engenheiro, Gerente das Oficinas, assobios e morras ao chefe da repartição.
profissional distinto, em quem a diretoria Atacados os rapazes, conservaram-se
deposita toda a confiança. firmes, travando-se então combate, que
ficou indeciso, havendo grande número de
O Paiz feridos, de lado a lado. Os estudantes,
Rio de Janeiro depois, seguiram pela Praça do Chatelet e
06 de julho de 1893. boulevard Saint Michel, fazendo com eles
Edição nº 4076 – Ano IX junção grandes grupos de operários,
Capa camelos e vendedores ambulantes. Ai
Telegramas recomeçaram as violências. Os quiosques
Paris, 05 foram derrubados e queimados; os lampiões
e vidraças foram destruídos. Travou-se
Madrid, 5 novo combate, sendo desta vez um
Foram hoje encontrada a porta da casa do regimento de cavalaria que veio dispersar os
Senhor Canovas del Castillo algumas desordeiros. Os soldados acutilaram a
bombas explosivas. multidão a espada. Caíram logo mortos três
- Em Sevilha, explodiu uma bomba de e mais de cem ficaram feridos, quase todos
dinamite, quando passava uma deputação gravemente. Ontem à noite os estudantes
provincial. Não foram presos os criminosos ergueram barricadas no Bairro Latino. As
e não houve desgraças a lamentar. enormes trincheiras eram formadas de
ônibus, bondes, carros e móveis das casas.
Pela manhã as barricadas achavam-se
cercadas de tropas de linha. Os estudantes
foram intimados a desalojarem as posições
e recusaram. Deu-se então assalto as
barricadas, sendo todas tomadas, com
alguma resistência, resultando mortes e
feridos. O movimento insurrecional, ajudado
pelos operários, estende-se aos subúrbios
de Paris, para onde o governo fez seguir
tropa.
Paris, 5.
Continua desoladora a situação nesta
cidade. Os estudantes e os operários
levantaram hoje barricadas nas praças de
Saint Germain e do Luxemburgo, para
resistirem às cargas de cavalaria. A O Paiz
infantaria atacou-os nestes redutos,
desalojando-os a baioneta e acutilando-os
sem piedade. Vencidos, os populares
debandaram em várias direções e a força
pública continuou a prossegui-los, a espada
e a bala. Quase toda a guarnição de Paris
acha-se em armas, dominando e impondo
ordens em todos os pontos da cidade. Entre
todas as ruas, é o boulevard Saint Michel
que apresenta aspecto mais desoladoras as
vidraças de todos os edifícios quebrada,
lampiões tombados, quiosques queimados,
outros partidos e abandonados. Os ladrões
e vagabundos tem aproveitado a situação, e
casa e quiosques tem sido roubados. As
perversidades tem ido até o incêndio de
vários mercados, aliás, prontamente
extintos pelo corpo de bombeiros, auxiliados
pelos sapadores. A imprensa unanime pede
ao governo que envide todos os esforços
para restabelecer a ordem e que castigue os
culpados nos conflitos e depredações.
- Nos últimos 60 dias, houve em vários
pontos da França 700 mortos pelo cólera.
Londres, 5.
Em Tornhill, no Yorkshire, houve explosão
de grisou, morrendo na mina mais de 140
operários.
S. Petersburgo, 5.
Noticiam de Varsóvia que um grupo de
anarquistas arrancou os trilhos da estrada
de ferro em Duburg.
Rio de Janeiro
07 de julho de 1893.
Edição nº 4077 – Ano IX
Capa
Telegramas
Paris, 06
Conforme prevíamos, terminada a luta que
sustentaram os estudantes, recomeçou
mais alarmante nos bairros operários. É
quase toda a população de trabalhadores
que se acha revolta e o movimento adquire
a extensão do vasto âmbito de Paris. O
governo decidido a restabelecer a ordem a
todo o transe acaba de decretar o Estado de
Sitio para a Capital da República.
Esperamos gravíssimos sucessos. Aos
20.000 homens de infantaria e cavalaria
acantonados na Praça da Republica,
juntaram-se duas brigadas de artilharia. O
General Sanssier, dirigindo as operações,
moveu dois corpos de 30.000 homens para
os pontos onde a resistência aguarda-se
terrível. Todos os edifícios públicos estão
guardados militarmente e com ordens
terminantes as guarnições, como se em
campanha.
Paris, 6.
Nos conflitos que ontem terminaram houve
46 agentes policiais feridos. Dos populares
morreram 5 e excede de 500 o número dos
feridos. Acreditamos que se oculta o
algarismo exato dos mortos. Sabemos
também que o correspondente do Graphific
de Londres quando em serviço
reportagem foi ontem maltratado
espancado por alguns sergents de ville. O
jornalista assim atropelado queixou-se a
embaixada inglesa que interpôs
reclamação.
O Paiz
Rio de Janeiro
08 de julho de 1893.
Edição nº 4078 – Ano IX
Capa
Telegramas
Paris, 07
Durante a noite de ontem, apesar da forte
chuva e vento, repetiram-se com maior
violência os tumultos no boulevard Saint-
Michel. Na Rua das Escolas, o populacho
unido a alguns estudantes atacou a polícia.
Intervindo a cavalaria do exército, os
desordeiros dispersaram, refugiando-se no
Palácio Maubert. Do interior fizeram-se
fortes apedrejando a tropa e usando
também de armas de fogo. Os soldados
puseram pé em terra e desalojaram o
palácio. Entretanto os desordeiros não
debandaram e pretenderam resistir, o que
conseguiram durante algum tempo, sendo
afinal rechaçados a pata de cavalo e
baioneta calada, tendo a cavalaria sido
auxiliada pela infantaria.
Neste encontro, segundo informações
oficiais, houve um morto e 53 feridos,
atribuindo-se o fato a não terem os soldados
dado uma só descarga. Podemos,
entretanto garantir que os policiais fizeram
fogo contra o povo. Contrastando com o
exército, ou por certeza do auxilio da força
de de linha, os policiais mostraram-se de uma
e insolência verdadeiramente irritante e digna
de repressão. Ontem foram por eles
espancados e presos seis médicos do Hotel
Dieu, acusados pelos agentes de haverem
assoviado quando passavam.
O Doutor Vilegean protestou contra a dupla
injuria. Entretanto a detenção demorou-se
em ser relaxada. Hoje manifestaram-se
novas desordens no bairro Oberkampf. O
populacho queimou quiosques e destruiu
lampiões e vidraças. Nesse ponto a ordem
foi restabelecida só pela polícia que fez uso
de todas as armas. Entraram nos hospitais
muitos indivíduos feridos por bala e alguns
mortalmente. Um grupo de vagabundos
destruiu alguns bondes do Chateau d’Eau.
Um destacamento de infantaria do quartel
próximo impediu maior atentado,
dispersando os malvados a ponta de sabre.
De ordem superior e atendendo a
necessidade de impedir maior alteração da
ordem, foi fechado o Banco do Trabalho. As
sociedades operárias protestaram e
ameaçam o governo de promover greve
geral.
Paris, 7
Acham-se agora à tarde aglomerados O Paiz
50.000 homens da guarnição de Paris, só Rio de Janeiro
nos quarteirões centrais da cidade. Este 09 de julho de 1893.
aparato militar impressiona a população Edição nº 4079 – Ano IX
ordeira, afastada dos movimentos que há Capa
alguns dias aqui se desdobram. O Telegramas
populacho, corrido pela cavalaria, do Paris, 08
boulevard da República, refugiou-se no Durante a noite de ontem, repetiram-se com
cemitério do Père Lachaise, acendendo ai maior violência as desordens nas Praças do
fogueiras. A propósito do fechamento da Chateau d’Eau e da Bastilha. Os operários
Bolsa do Trabalho, o ministro da justiça revoltados entrincheiraram-se, fazendo
declarou que esta providência era tomada, barricadas com os ônibus e bondes, que
por ser aquilo um foco de desordens. Na retiraram dos trilhos e derrubaram. A
Maison du Peuple realizou-se hoje um resistência à tropa de linha foi curta. Os
meeting de protesto contra a referida soldados levaram-nos de vencida, a
deliberação. Estiveram representados 170 baioneta, causando-lhes grande número de
sindicatos operários e votaram por feridos e alguns mortos. Estão em armas
unanimidade a grande greve. dentro de Paris 60.000 homens da
guarnição. Começou o processo contra 55
indivíduos, indiciados como chefes do
movimento. O conselho municipal de Paris
protestou contra o fechamento da Bolsa do
Trabalho, condenando a situação política.
O Paiz Os deputados socialistas e radicais dirigiram
Rio de Janeiro um manifesto aos operários, atacando o
10 de julho de 1893. governo e as autoridades francesas.
Edição nº 4080 – Ano IX Recomendaram, entretanto a máxima
Capa ordem. O Prefeito do Sena declarou que a
Telegramas Bolsa do Trabalho vai se reabrir.
Paris, 09
O Paiz
Rio de Janeiro
19 de julho de 1893.
Edição nº 4090 – Ano IX
Capa
Telegramas
Paris, 18
O governo francês, atendendo as reiteradas
reclamações do governo italiano, resolveu
expulsar do território da Republica o
agitador Cipriani. Esta resolução tornou-se
hoje efetiva e o grande revolucionário
italiano seguiu para a fronteira
acompanhado de agentes de segurança
François Claudius Koënigstein pública.

A policia proibiu a manifestação

comemorativa do aniversário da morte de
O Paiz
Ravachol. Os manifestantes obedeceram,
Rio de Janeiro
protestando, entretanto, o que provocou
25 de julho de 1893.
desordens e prisões, intervindo a policia
Edição nº 4096 – Ano IX
para dispersá-los. Na Praça da República
Capa
deu-se um encontro entre os estudantes e a
Telegramas
polícia, de que resultaram mortes e
Madrid, 24
ferimentos. Tem-se efetuado algumas
Foram presos vários anarquistas que
prisões, elevando-se a 200 o número de
projetavam nesta cidade a destruição de
pessoas detidas. No bulevar Parmentier
vários edifícios.
repetem-se os tumultos com caráter mais
violento. Entre os dez feridos contam-se
estudantes, deputados e outras pessoas
importantes.
O Paiz
Rio de Janeiro
06 de agosto de 1893.
Edição nº 4108 – Ano IX
Página 2
Cartas Parisienses
Vamos relatar os sucessos que tem
ensanguentado Paris desde o começo da
semana. As arruaças do bairro latino que
principiaram por um protesto de estudantes
contra a liga do senador Beranger,
envenenaram-se de um dia para o outro
com o assassinato infame de um pobre
empregado do comercio, crime praticado
pela polícia contra o pobre Nuger, de quem
já nos ocupamos na nossa crônica passada.
Houve depois o ataque a prefeitura, a luta a
mão armada, as barricadas no bairro latino,
os quiosques de jornais incendiados, as
colunas Morris destruídas, etc., etc. Tudo
relatamos circunstanciadamente em
telegramas e na Carta Parisiense última.
Mas quando todos nós julgávamos que o
período da estéril agitação havia terminado
com o enterro clandestino de Nuger e com a
repressão brutal das brigadas centrais do
Senhor Lozé, eis que o governo sopra nas
cinzas mal extintas e levanta de novo a
labareda do incêndio revolucionário. Foi o
ato da força do Senhor Presidente do
Conselho, o Senhor Dupuy, mandando
invadir a Bolsa do Trabalho por um
regimento de infantaria e mandando
expulsar os sindicatos legais e ilegalmente
constituídos. E isso vinte e quatro horas
depois de ter prometido obrar em paz e por
de lado a questão da Bolsa do Trabalho! É
inacreditável!
A noticia da ocupação militar da Bolsa do
Trabalho causou em todos os bairros de
Paris um movimento de espanto e ao
começo do mesmo de incredulidade, porque
ninguém esperava esta provocação da parte
do governo, quando os tumultos do bairro
latino pareciam ter acabado de vez. Mas a
noticia era verdadeira, para vergonha deste
ministério reacionário e impopular que hoje
governa a França, empregando dentro da
República os mesmos processos de
intimidação que o Czar de todas as Rússias.
A barbárie asiática a serviço dos falsos
democratas de 1893. Um século depois do
terror vermelho, a ressureição do terror
branco de Carlos X. A operação militar,
como lhe chamou depois o Senhor Dupuy,
realizou-se por volta das 4 horas da tarde.
Na Bolsa do Trabalho achavam-se apenas
22 delegados em vez de 150 – o que nos
prova como ninguém desconfiava da traição
do governo. O Senhor Clement, antigo
esbirro de Napoleão 3º e hoje o comissário
das delegações judiciais na 3ª República,
lutou na Bolsa do Trabalho à frente de cem
policiais e seguido por um regimento de
infantaria, com as armas carregadas.
Mandou expulsar todos os empregados, que
não ofereceram a menor resistência. Ao
mesmo tempo todas as ruas vizinhas a
Bolsa eram cercadas por fortes
destacamentos de cavalaria e infantaria. O
povo principiou a juntar-se, comentando o
acontecimento de um modo bastante
desfavorável para o governo.
Nos clubes e nos centros operários foi
grande a indignação apenas se soube do
fato despótico do governo. Os deputados
eleitos por Paris e camaristas do município
reuniram-se todos no salão da cervejaria do
Languedoc e redigiram um veemente
protesto, que foi assinado pelos seguintes
deputados:
MM. Barodet, Baulard, Henri Brisson,
Hiassaing, Chautemps, Camile Dreyfus,
Chumay, Charles Flequet, Hovelacque,
Jacques, Lavy, Henri Mathê, A. Maujan,
Mesurer, Mitterand, Pichon e Tony Rechon.
E pelos camaristas municipais radicais e
socialistas:
MM. Attont-Tailfer, Bassinet, Pierre Baudin,
Bellan, P. Bernard, Berthant, Blendeau,
Blondel, Brard, Brousse, Gaumeau,
Dianpoudry, Chausse, Chauviére,
Deschamps, Delhomme, Lubois, Foussier,
Faqlet, Fourest, Girou, Gros, Alph, Humber,,
Lampué, Charles Laurent, Levraud, Lucipia,
Lyon-Alemand, Marsoulan, Martey, Navarre,
Opportun, Patenne, Picrard, Prudent-
Dervillers, Pican, Petrot, Puven, Réties,
Rouanel, Rousselle, Sauton, Paul Struss,
Thuillier, Vaillant, Viguier, Vorkie e Weber.
Este mesmo manifesto devia ser no dia
seguinte assinado pelo Senador Goblet e
pelos deputados restantes nos salões da
redação do Germinal.
Depois das 9 horas a agitação aumentou de
uma maneira extraordinária no bairro de
Bellevile e nas cercanias da Bolsa do
Trabalho. A polícia intentou afastar o povo,
mas foi recebida a tiros de revolver e a
pedrada. Veio então um regimento de
dragões que de sabre em punho carregou
sobre os manifestantes. Mas estes não se
deram por batidos e derrotados. Apenas se
viram longe da policia armaram barricadas,
formadas de ônibus e chalés de venda de
jornais. A polícia carregou-os de novo e os
manifestantes fugiram, disparando tiros de
revolver. Outros se entrincheiraram em um
hotel de dois andares e dali fizeram fogo
durante 20 minutos contra os agentes. A
batalha nas ruas durou até a meia noite.
Durante este período de desordem e de
verdadeiro terror realizaram-se mais de 200
prisões. A polícia ficou com 15 agentes
feridos. O povo defendia-se a tiros de
revolver e a facada. Um dos indivíduos
presos trazia consigo 22 punhais para
distribuir pelos amotinados. Nessa noite
foram incendiados seis Quiosques de
jornais e quatro ônibus. O segundo dia das
manifestações socialistas foi um pouco mais
calmo, mas em compensação mais enérgico
pelas medidas tomadas, quer em parte dos
deputados radicais socialistas, quer do lado
da população parisiense. O Senhor Dupuy,
o irascível presidente do conselho de
ministros recebeu logo de manhã o anuncio
de três interpelações na Câmara para a
sessão de hoje.
A primeira deve ser feita pelo deputado Os boulangistas redigiram logo um protesto,
boulangista Paulin Mery, a segunda pelo uma espécie de contra manifesto bastante
deputado pelo deputado radical Camillo violento, dizendo que os radicais fingem
Dreyfus e a terceira em nome da extrema combater o governo, mas que no fim de
esquerda pelo deputado Tony Revillon. É contas são os auxiliares do Senhor Dupuy.
provável que estas três interpelações deem O governo deve esfregar as mãos de
com o ministério em terra. Houve desde contentamento com a divisão dos partidos
longo conselho de ministros e o governo da oposição. Enquanto na redação do
decidiu aceitar os debates, a pé firme. O Germinal se praticava a disparatada
Senhor Dupuy quer cair na arena subdivisão dos combatentes, na sala
parlamentear heroicamente, como os Pastouville reunia-se a comissão
gladiadores da antiga Roma no Coliseu administrativa da Bolsa do Trabalho. Pouco
diante do Imperador. Neste momento o czar depois a sala estava inteiramente cheia de
é o povo soberano, o triste e pouco membros do partido operário e chefes
respeitado povo soberano que o Senhor socialistas. Vimo na reunião os deputados
Lozé manda espaldeirar nas ruas e Baudin, Barby, Boyer, Dumay, Fernoul,
assassinar nas encruzilhadas. Jaurés, Jourete, Lachisé, Laforgue, Lavy,
Thivrier. Estavam presentes também quase
Os deputados e conselheiros municipais todos os conselheiros municipais
socialistas reuniram-se todos numa das socialistas.
salas da redação do Germinal, a vibrante Entre os indivíduos presentes distinguia-se
folha radical da manhã, para redigirem e a bela e enérgica figura de Cipriani, com as
assinarem o manifesto ao povo de Paris, a suas barbas negras, até ao peito, largo
que já nos referimos. Deu-se por essa chapéu desabado, olhos cheios de fogo,
ocasião um conflito grave, que francamente excitado e animado.
desaprovamos. Os deputados e camaristas
presentes não quiseram aceitar nem a
colaboração nem o apoio do senador
Alfredo Naquet e dos deputados
boulangistas Farcy e Roche. Por quê? O
camarista radical Chantemps explicou que,
existindo desde 1889 uma nova divisão dos
partidos, não se podia admitir que os
boulangistas, os defensores do golpe de
Estado e do cesarismo tentassem uma
aproximação qualquer dos republicanos.
O deputado Mitterand combateu a exclusão
dos boulangistas, como sendo um ato Amilcare Cipriani

impolítico neste momento.

Ficou resolvido organizar a greve geral quer
em Paris, quer na Província. Mas os
operários estarão organizados para esta
resistência? Cremos que ainda não,
infelizmente para a causa dos
trabalhadores. À noite, a hora da saída das
fábricas a praças da República principiou a
apresentar a animação da véspera.
Magotes de operários a entrada dos
bulevares e dos faubourgs assobios, gritos
de morra a polícia, e aqui e ali vários vivas a
Cumuna. Uns duzentos policiais,
comandados por 10 comissários, tentaram
varrer a praça, e o povo retirou-se pouco a
pouco para os lados da Avenida da
República e bulevar Voltaire. Eram 10 horas
da noite. Os candeeiros estavam quase
todos apagados nos locais onde a batalha
se ferira com coragem na véspera e onde
parecia agora querer concentra-se de novo.
Um grupo de 400 a 500 indivíduos,
operários ou amotinadores de profissão
fizeram frente a policia nas alturas da rua
Saint Ambroise, deitaram por terra dois
bonds, quebraram os bancos do bulevar
Voltaire e formaram uma barricada que
defenderam durante meia hora de revolver
em punho. A repressão foi terrível. Os
agentes da polícia caíram sobre os
amotinados, espaldeirando a direita e a
esquerda. Um horror!
A meia noite, os operários de Belleville
armaram novas barricadas que a polícia
destruiu, apoiada pelos dragões a cavalo e
pela guarda republicana de baioneta calada.
A repressão durou até a 1 hora da noite.
Efetuaram-se mais de 200 prisões e ficaram
feridas talvez umas 10 a 15 pessoas
gravemente. O terror é enorme em todo o
bairro. Todos receiam o prolongamento
deste triste estado de coisas.
A polícia parisiense portou-se de uma
maneira ignóbil para com os jornalistas, e
tais foram os vexames que a Associação
dos Jornalistas Parisienses se viu obrigada
a publicar um protesto em todos os jornais
contra os estúpidos e miseráveis esbirros do
Senhor Lozé. Na Avenida da República uns
vinte e tantos jornalistas que estavam
tomando notas dos acontecimentos foram
cercados pelos avinhados sergots e
ameaçados de cutiladas! Quando um bando
de sergots encontrava um jornalista isolado
caia sobre ele, deitava-o por terra e pisava-
o a pés juntos. Esta operação, como eles
diziam, os miseráveis, foi empregada
frequentemente durante os tumultos do
bairro latino e depois durante os tumultos da
Praça da República. A polícia transformou
num bando de capoeiras, que até já anda a
crivar de facadas as pessoas que odeia,
como sucedeu ontem a Jean Carrère, o
digno e simpático estudante e poeta,
assassinado por um agente de polícia,
diante dos grandes armazéns do Bon
Marché, a 1 hora da tarde!
É incrível que tais fatos se deem ainda em
pleno regime republicano, depois de vinte e
tantos anos de governo democrático!
A última proeza policial: o assassinato de
Jean Carrère, o presidente da comissão
acadêmica de resistência. Carrère ia a
entrar em casa quando foi assaltado por
dois agentes de polícia a paisana que o
provocaram e insultaram. O simpático
agitador acadêmico voltou-se para
responder, mas os dois bandidos caíram-lhe
em cima, crivando-o de punhaladas!
Estamos em pleno segundo império. O
Senhor Dupuy usa os mesmos processos
dos homens de 2 de dezembro.