Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
O triângulo brasileiro
Colocando os rituais nacionais em seus devidos ‘’tempos’’, pode-se constatar que o carnaval
está numa cronologia cíclica, na qual não permite uma data fixa e é marcado pela aproximação
entre Deus e homem; focalizando não somente a cultura brasileira, mas cristã (DAMATTA,
1997). Assim, o carnaval é localizado na cronologia cósmica, encaminhando seus participantes
para outro cenário, fora da realidade brasileira e em contato com o divino, o sagrado e o
sobrenatural. O Dia da Pátria, por sua vez, é colocado num momento histórico específico, a
temporalidade pode ser registrada em uma data fixa no calendário e representa um momento
primordial para o Estado brasileiro. Desse modo, o Dia da Pátria está enquadrado no conceito
de tempo histórico1, colocando seus participantes no contexto específico da história Nacional.
Por certo, os ritos brasileiros enfatizam as formas nas quais se constituiu o ordenamento social
no país, mediante a manifestação de características específicas que trazem à tona importantes
aspectos do sociedade em questão; a primeira manifestação que será tratada é o Dia da Pátria,
ritual construído a partir de aspectos ligados à rotina na ordem social e a hierarquia (a bandeira
nacional, o hino nacional, a língua nacional e etc.), processo que fortalecem pontos
1
‘’ [...] Tal temporalidade é assim marcada pelo sentido de ’progresso’, ‘evolução’ e, sobretudo, ‘não-repetição’,
como ciclo de crescimento de um indivíduo - no caso, a Nação Brasileira [...] os eventos históricos e
empiricamente registrados são tomados como paradigmáticos e os personagens que engendraram, como heróis
nacionais oficiais ‘’ (DAMATTA, 1997, p. 54).
internalizados do sistema social. A segunda manifestação a ser tratada é o carnaval, através de
aspectos indefinidos em sua ação no ordenamento social, o rito é composto por valores,
condutas, categorias e grupos que diariamente são desencorajados por representarem algo
indesejados; porém, seu ritual cumpre outra função, a de representar um período que antecede
o ciclo de penitência e arrependimentos. Conectado com isso vem a terceira manifestação, a
Semana Santa, que diferente dos dois primeiros ritos abortados por DaMatta, está conectada
com o universo local e exterior ou mesmo tempo, fazendo o autor supor que: ‘’ [...] haja uma
tentativa nesses festivais de conciliar povo com o Estado por meio do culto a Deus (ou ao
santo), permitindo o encontro e a convivência dos diversos elementos descontínuos da estrutura
social sob a égide da Igreja’’ (DAMATTA, 1997, p. 70). Dessa forma, o ritual parte do mundo
cotidiano e dele tira suas próprias características, definindo cada um desses ritos como agentes
da estrutura social, não necessariamente sendo funcionais e coerentes, mas representando os
símbolos da inversão, o reforço e a neutralização (DAMATTA, 1997).
Os mecanismo que dão base aos ritos surgem em situações específicas, construídos pela
sociedade, de modo que estão sob a sustentação de um sistema social e podem ser classificados
em três domínios: reforço2, inversão e neutralização. Os rituais que reforçam a ordem e a
hierarquia (Dia da Pátria), são utilizados em sociedades nas quais o autoritarismo necessita da
dominação; os ritual de inversão3 fica evidente através do carnaval, devido ao rompimento com
as estruturas estabelecidas de hierarquia e o aparecimento do marginal como algo descolado
dos seus encargos negativos; por último, os rituais de neutralização4 partem do princípio da
evitação, como argumenta o autor, ocorrendo em momentos o reforço e em outros a inversão,
exemplos possíveis são as missas e relação paradoxal entre homem/Deus, o sagrado e o humano
em confusão.
Portanto, os rituais presentes na sociedade brasileira fazem parte substancial da rotina, mas
necessitam de momentos específicos para sua aplicação. Todos os eventos descritos neste texto
não carecem de uma transformação vital do ordenamento social, entretanto, DaMatta (1997)
2
‘’ O reforço é, pois, um mecanismo em que a escolha parece ser daquilo que está submerso (ou em vias de
submergir), do que está dentro e, por isso mesmo, não está sendo devidamente percebido. Quando tal mecanismo
é aplicado e a situação ambíguo resolvida, cria-se um campo formal ou respeitoso ‘’ (DAMATTA, 1997, p. 79).
3
‘’ [...] Desse modo, quando se inverte, procede-se juntando categorias e papéis sociais que, no mundo cotidiano
estão rigidamente segregados. O ambiente chamado ‘ritual’ é, consequentemente, criado quando se coloca lado a
lado o ladrão e o policial, a prostituta e a dona-de-casa, o presidiário e o diplomata, o travesti e o machão ‘’
(DAMATTA, 1997, p. 80).
4
‘’ [...] é, paradoxalmente, a conjunção na disjunção, e o resultado é uma evitação que se manifesta num conjunto
de gestos controlados. Mas é preciso observar que esses dois momentos estão gramaticalmente relacionados: a
inversão vem depois do reforço. Somente depois que se acentua a posição de pecador a comunhão é realizada e o
perdão, concedido! ‘’ (DAMATTA, 1997, p. 82).
ressalta que é preciso observar o ritual como um foco das relações; pois, eles são ferramentas
que podem dar maior clareza às mensagens sociais e contribuir para uma construção mais
completa da compreensão do que ‘’faz o Brasil, Brasil’’.