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Psicoterapia

PSICOTERAPIA: Visão introdutória

André Luiz Moraes Ramos


Centro Universitário Salesiano de São Paulo - Lorena

Ao propor uma visão introdutória, este artigo aborda os seguintes temas relacionados à psicoterapia: a
conceituação, os objetivos do processo terapêutico, as características da psicoterapia, de quem procura
terapia, a características do terapeuta e finaliza com a eficácia da abordagem terapêutica.

O conceito de psicoterapia

De acordo com Cordioli (2008), há uma relação profissional, não são consideradas
controvérsias sobre até que ponto a psicoterapia no sentido estrito. Métodos
psicoterapia se distingue de outras relações baseados em crenças religiosas (rituais de cura
humanas, nas quais uma pessoa ajuda outra a e libertação, rituais mágicos, como bênçãos,
resolver problemas pessoais. trabalhos de macumba, curandeirismo, etc.)
Psicoterapia é um termo genérico também são excluídos, mesmo que provoquem
usado para as várias técnicas terapêuticas alívio de sintomas.
empregadas para melhorar as funções Neste sentido mais estrito, psicoterapia
psicológicas e o ajustamento da vida do refere-se apenas às terapias usadas por
indivíduo (Huffman, Vernoy e Vernoy, 2003). profissionais de saúde mental. Nos Estado
Há um consenso, segundo Strupp Unidos, psicólogos, psiquiatras, enfermeiras
(mencionado por Cordioli, 2008, p.21), de que psiquiátricas, assistentes sociais, profissionais
a psicoterapia é um método de tratamento de aconselhamento e membros do clero. No
mediante o qual um profissional treinado, Brasil, no entanto, esta atuação é restrita a
valendo-se de meios psicológicos, médicos e psicólogos (Huffman, Vernoy e
especialmente a comunicação verbal e a Vernoy, 2003).
relação terapêutica, realiza, deliberadamente,
uma variedade de intervenções, com o intuito
de influenciar um cliente ou paciente, Objetivos do processo psicoterapêutico
auxiliando-o a modificar problemas de O processo terapêutico pode envolver,
natureza emocional, cognitiva e segundo Gerrig e Zimbardo (2005), quatro
comportamental, já que ele o procurou com tarefas ou objetivos principais:
essa finalidade. 1. Chegar a um diagnóstico sobre o que
Como o tratamento envolve um está acontecendo de errado com o
profissional treinado e um paciente ou cliente cliente, determinando, se possível, uma
portador de um problema, queixa ou transtorno denominação psiquiátrica adequada
mental, pode-se afirmar, conforme fez Cordioli (através da classificação de doenças
(2008), que a psicoterapia é uma atividade mentais, tais como DSM ou CID) ao
eminentemente colaborativa entre paciente e problema presente.
terapeuta, que envolve uma interação face a 2. Propor uma provável etiologia (causa
face. do problema) e identificar as prováveis
Por conta disto, outras formas de ajuda, origens e funções atingidas pelos
como a biblioterapia (difundida principalmente sintomas.
através de livros de auto-ajuda: como resolver 3. Fazer um prognóstico, ou estimativa,
tal problema...), tratamentos através do do rumo que o problema irá tomar,
computador (como a exposição virtual), a com e sem tratamento.
conversa de amigos ou o aconselhamento por 4. Prescrever e aplicar alguma forma de
telefone (como o realizado pelo Centro de tratamento, uma terapia voltada a
Valorização da Vida – CVV) ou virtual, quando minimizar ou eliminar os sintomas
utilizadas fora de um contexto interpessoal e de problemáticos e, talvez, suas fontes.
Psicoterapia

Características da psicoterapia

Estudos sobre psicoterapia indicam a diplomas, a credibilidade pode ser


existência de fatores que estariam presentes em determinada pelo fato de ter servido
todas as psicoterapias, conhecidos como fatores como aprendiz de um curandeiro
não-específicos (Isolan, Pheula e Cordioli, venerado;
2008). 4. Colocar o problema dentro de um
Mesmo considerando que exista uma quadro familiar: se o cliente acredita
variedade de modelos e concepções, Frank que espíritos do mal estão causando os
(mencionado por Cordioli, 2008) apresenta três transtornos psicológicos, o terapeuta
elementos que seriam comuns a todas as irá direcionar o tratamento para esses
psicoterapias: espíritos. De forma equivalente, se o
1. A psicoterapia ocorre num contexto de cliente acredita na importância das
uma relação de confiança experiências precoces da infância e na
emocionalmente carregada em relação importância do inconsciente, a
ao terapeuta; psicanálise será o provável tratamento
2. A psicoterapia ocorre em um contexto escolhido;
terapêutico, no qual o paciente acredita 5. Utilizar técnicas que promovam alívio:
que o terapeuta irá ajudá-lo e acredita em todas as culturas, a terapia envolve
que este objetivo será alcançado; ação. O cliente ou o terapeuta precisa
3. Existe um racional, um esquema fazer alguma coisa. Além disso, o que
conceitual (teoria) ou um mito que eles fizerem deve-se encaixar nas
provê uma explicação plausível para o expectativas do cliente. Por exemplo,
desconforto (sintoma ou problema) e as pessoas que acreditam que espíritos
um procedimento ou ritual para ajudar do mal as estão possuindo esperam que
o paciente a resolvê-lo. o curandeiro execute a cerimônia para
exorcizar os demônios. Nos modelos
Brislin (apud Huffman, Vernoy e ocidentais, os clientes esperam revelar
Vernoy, 2003), ao estudar as psicoterapias em seus sentimentos e pensamentos e
diversas culturas, identificou seis fornecer informações sobre seu
características universais: passado. Essas terapias verbais
1. Nomear o problema: um passo também podem ter componentes
importante para a melhora do biológicos ou comportamentais; no
funcionamento psicológico é a entanto, as pessoas que procuram
classificação do problema. As pessoas terapia geralmente esperam falar sobre
sentem-se melhores só em saber que seus problemas;
outras pessoas experimentam os 6. Um momento e um espaço especiais: o
mesmos problemas que os seus e que o fato de a terapia ocorrer à parte das
terapeuta possui experiência com esse experiências do dia-a-dia da pessoa
tipo de problema em particular; parece ser um aspecto importante em
2. Qualidades do terapeuta: os clientes qualquer terapia. As pessoas
devem sentir que o terapeuta é aparentemente precisam reservar um
cuidadoso, competente, acessível e momento especial e ir a um lugar
preocupado em encontrar soluções para especial para concentrar-se em seus
seu problema; problemas.
3. Estabelecer credibilidade: testemunhos
verbais e símbolos de status (como Por sua vez, Isolan, Pheula e Cordioli
diplomas na parede) determinam a (2008), apresentam os seguintes fatores como
credibilidade do terapeuta. Entre os responsáveis pela mudança em psicoterapia:
curandeiros nativos, no lugar de

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1. uma relação intensa de confiança e 2. A relação paciente-terapeuta:


emocionalmente carregada com a englobando os fenômenos
pessoa que ajuda; transferenciais, a aliança terapêutica, o
2. uma teoria explicativa das causas dos vínculo afetivo com o terapeuta, além
problemas do paciente; da identificação com a pessoa do
3. o acesso a novas informações sobre a terapeuta, o apoio do terapeuta como
natureza dos problemas e alternativas forma de aceitação incondicional do
de como lidar com eles; paciente e a catarse capaz de produzir
4. o aumento da esperança de auxílio em o alívio da tensão do paciente, os quais
virtude das qualidades e capacidades seriam os fatores não-específicos,
do terapeuta; comuns a praticamente todas as
5. a possibilidade de realizar com sucesso terapias.
novas experiências de vida, 3. Fatores sociais (interpessoais),
acarretando um aumento na grupais ou sistêmicos: em maior ou
autoconfiança; menor grau, as diferentes modalidades
6. a oportunidade para expressar emoções de psicoterapia procuram obter
pessoais. mudanças por meio de intervenções
que visam modificar o ambiente social
Tentando explicar como as ou familiar no qual o paciente vive (o
psicoterapias agem, Cordioli e Giglio (2008) sistema), em suas formas de interagir
dividiram os fatores responsáveis pela com os outros indivíduos, ou, ainda,
mudança em três grandes grupos: utilizam os chamados fatores grupais
1. As técnicas utilizadas: específicas de como ingredientes terapêuticos
cada modelo e que englobariam as (Cordioli e Giglio, 2008).
diferentes intervenções do terapeuta,
bem como a forma como são
estruturadas e conduzidas as sessões;

Quem procura psicoterapia

O sofrimento psíquico é o principal conjugais dúvidas existenciais, sensação de


fator que determina a procura por um vazio e sentimentos de estagnação pessoal. A
tratamento psicológico, sendo que este terapia é procurada por aqueles que se sentem
sofrimento pode ser determinado por um perturbados, mas a natureza e a gravidade
problema, queixa ou transtorno mental. desse problema variam de um para o outro. Os
Isolan, Pheula e Cordioli (2008) dois problemas mais comuns que se
destacam que é necessário que o paciente apresentam são ansiedade e depressão (Narrow
apresente algum grau de sofrimento psíquico e colaboradores, citado por Weiten, 2002).
que cause prejuízo em seu funcionamento Especificamente em relação às áreas de
mental. Todavia, um elevado grau de atuação, Huffman, Vernoy e Vernoy (2003)
sofrimento é diretamente associado com a afirmam que a maioria dos terapeutas trabalha
intensidade da psicopatologia, o que pode com seus clientes cinco áreas em psicoterapia:
comprometer a aliança terapêutica, como no 1. Transtornos do pensamento:
caso de pacientes com diagnóstico de psicose e indivíduos perturbados tipicamente
de transtorno borderline que apresentam desenvolvem algum grau de confusão
limitada capacidade de lidar com estresses mental, padrões de pensamento
agudos e têm dificuldade de estabelecer destrutivos, ou bloqueio na
vínculo com o terapeuta. compreensão de seus problemas;
As pessoas levam à terapia uma 2. Transtornos das emoções: as pessoas
completa variedade de problemas humanos: que procuram terapia geralmente
ansiedade, depressão, relações interpessoais sofrem intenso desconforto emocional.
insatisfatórias, hábitos problemáticos, Ao encorajar a livre expressão dos
autocontrole ruim, baixa auto-estima, conflitos sentimentos e ao proporcionar um

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ambiente de acolhimento e suporte, os sofrimento psíquico suficiente para motivá-lo


terapeutas ajudam seus clientes a ao tratamento e pela capacidade de estabelecer
substituir os sentimentos de desespero um vínculo e uma aliança de trabalho com o
ou incompetência por esperança e terapeuta.
autoconfiança; O Instituto Nacional de Saúde Mental
3. Transtornos do comportamento: dos Estados Unidos (citado por Huffman,
indivíduos perturbados freqüentemente Vernoy e Vernoy, 2003) identificou cinco
exibem comportamentos principais áreas de preocupação para o
problemáticos. Os terapeutas ajudam atendimento de clientes do sexo feminino:
seus clientes a eliminarem 1. As mulheres são diagnosticadas e
comportamentos inadequados e os tratadas em decorrência de problemas
orientam para um tipo de vida mais mentais em maiores proporções do que
satisfatório; os homens. Será que elas adoecem
4. Dificuldades interpessoais e nas mais, estão mais dispostas a admitir
situações de vida: os terapeutas ajudam seus problemas ou será que as
seus clientes a melhorar seu categorias diagnósticas de doença
relacionamento com a família, com mental apresentam um viés em favor
amigos e com colegas de trabalho. dos homens?
Também os ajudam a eliminar ou 2. Sabe-se que a pobreza é um fator
minimizar as fontes de estresse em causador de estresse e, devido à maior
suas vidas, tais como exigências de sensibilidade feminina, a pobreza
trabalho ou conflitos familiares; acaba se tornando um fenômeno de
5. Distúrbios biomédicos: pessoas sofrimento para a mulher;
problemáticas algumas vezes 3. Os múltiplos papéis assumidos pelas
apresentam distúrbios biológicos que mulheres, tais como mãe, esposa,
causam diretamente ou contribuem dona-de-casa, profissional, estudante,
para as dificuldades psicológicas (por etc., geram demandas conflitantes, que
exemplo, desequilíbrios químicos que freqüentemente são responsáveis pelo
levam à depressão). desenvolvimento do estresse.
4. O processo de envelhecimento traz
Dependendo do treinamento individual preocupações especiais para as
do terapeuta e de sua abordagem teórica, assim mulheres. Elas vivem mais do que os
como das necessidades do cliente uma ou mais, homens, mas tendem a ser mais pobres,
dentre essas cinco áreas, poderão ser mais ter um nível menor de instrução e
enfatizadas. sofrer problemas de saúde mais sérios.
A capacidade de estabelecer um 5. Violência contra a mulher, incluindo
vínculo e uma aliança de trabalho com o estupro, incesto, perseguição sexual,
terapeuta é, segundo Isolan, Pheula e Cordioli produzem um efeito extremamente
(2008), um outro fator relacionado ao paciente negativo na saúde mental da mulher, o
que é fundamental para o bom andamento de que pode acarretar depressão, insônia,
uma psicoterapia. Como característica pessoal, transtornos de estresse pós-traumático,
exige-se do paciente que ele tenha interesse em transtornos alimentares e outros
falar com a outra pessoa, em ser ouvido, problemas.
valorizado e compreendido, que tenha uma
expectativa positiva em relação ao curso do Um cliente em tratamento não tem
tratamento. Há um mal prognóstico para a necessariamente um transtorno identificável.
intervenção terapêutica com pacientes que Alguns procuram ajuda profissional para
combinam pouca motivação, baixa tolerância à problemas do dia-a-dia (decisões de carreira,
ansiedade e déficits nas relações interpessoais, por exemplo) ou sentimentos vagos de
além aqueles com traços de psicopatia e descontentamento (Strupp, citado por Weiten,
narcisismo. 2002). Dessa forma, terapia inclui tanto
Há certo consenso de que o paciente esforços para fornecer o crescimento pessoal
que irá aproveitar ou que irá fazer mudanças dos clientes como intervenções profissionais
em psicoterapia é caracterizado por um para transtornos mentais. As pessoas variam

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consideravelmente em sua disposição para motivos. Alguns não têm consciência de que
procurar psicoterapia. ela está disponível, e outros acreditam que ela
Infelizmente, muitos dos que sempre é cara. O maior bloqueio é que para
necessitam de terapia não a recebem (Pekarik, muitos estar numa terapia é admitir uma
citado em Weiten, 2002). Os que poderiam fraqueza pessoal.
beneficiar-se dela não a procuram por inúmeros

As características do terapeuta

Rogers, mencionado por Isolan, Pheula adotada pelo terapeuta, de modo que seguir
e Cordioli (2008), sugeriu que a empatia, o uma teoria rigidamente é sinal de competência
calor humano e a autenticidade seriam as e compromisso profissional, pois indica que ele
condições necessárias e suficientes para a está embasado em um corpo teórico.
mudança terapêutica. Essas três condições Em relação ao método, a formação do
podem ser traduzidas em comportamentos terapeuta deve incluir o domínio dos recursos
concretos do terapeuta, que depois podem ser que lhe permitirão promover o
avaliados e relacionados com o resultado da desenvolvimento do processo terapêutico. A
terapia. técnica terapêutica, determinada pela
Estes autores definem empatia como o abordagem teórica adotada, fornece as
entendimento do ponto de vista do paciente e a estratégias de intervenção, informando como
sua visão de mundo, podendo ser expressa de deve ser a relação terapeuta-cliente, como
muitas maneiras, como, por exemplo, repetindo conduzir a sessão terapêutica, o que fazer e
o que o paciente disse em palavras diferentes como fazer, apontando o que é e o que não é
ou formulando perguntas sobre o que ele falou. adequado para cada situação.
O calor humano, por sua vez, envolve a atitude Weiten (2002) dá algumas orientações
de aceitação, respeito, afirmação, apoio, para que uma pessoa interessada em fazer
compaixão, carinho e elogios por parte do terapia possa escolher adequadamente seu
terapeuta. Enquanto que a autenticidade inclui psicoterapeuta.
a coerência, a transparência e a sinceridade, e 1. procure cordialidade pessoal e
envolveria tanto uma autoconsciência por parte preocupação sincera. Tente julgar se
do terapeuta quanto uma disposição para será capaz de conversar com ele de
compartilhar esta consciência. maneira franca e não defensiva.
Nem todo cliente se sente à vontade 2. procure empatia e entendimento. A
para perguntar aos seus prováveis terapeutas pessoa é capaz de apreciar seu ponto
sobre treinamentos realizados, tempo de de vista?
experiência, o tipo de abordagem adotada, etc. 3. procure autoconfiança. Terapeutas
Porém são perguntas pertinentes e a imensa seguros transmitirão competência, e
maioria dos terapeutas fornecerá estas não entrarão intimidá-lo com o jargão
informações de modo natural. profissional ou gabar-se a respeito
A formação teórica e metodológica daquilo que poderão fazer por você.
também é importante para a prática terapêutica. 4. Quando tudo for dito e feito, você
Um esquema conceitual que funcione deverá gostar de seu terapeuta. Caso
como um quadro teórico de referência contrário, será difícil estabelecer o
permitirá ao terapeuta interpretar os conteúdos necessário entendimento.
apresentados pelo cliente na terapia. Uma boa
teoria é capaz de apresentar a estrutura dos Beutler e colaboradores (apud Isolan,
fenômenos, fornece uma conceituação, diz Pheula e Cordioli, 2008) afirmam que o poder
como se fazem o diagnóstico e prognóstico, dos bons terapeutas é maior do que qualquer
explica as suas causas e suas conseqüências e contribuição terapêutica de suas teorias. Para
oferece uma modalidade de tratamento, No eles, os melhores terapeutas, além de formarem
Brasil, há um posicionamento muitas vezes uma boa relação terapêutica, seriam aqueles
dogmático em relação à abordagem teórica que proporcionariam um tratamento que seria

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condizente com as expectativas e preferências pacientes, além de serem pessoalmente bem


dos pacientes, seriam criativos e perceberiam integrados.
novas formas de lidarem com os problemas dos

Eficácia da abordagem terapêutica

Outra questão importante refere-se à não são generalizadas para situações da vida
abordagem teórica do terapeuta. A psicoterapia real (Atkinson, Atkinson, Smith e Bem, 1995).
é considerada efetiva se a melhora do cliente, Os pesquisadores, então, puseram-se a
após a terapia, é maior do que qualquer formular metodologias mais precisas para
melhora que ocorra sem a terapia, durante o avaliar a eficácia da terapia. O
mesmo período (Atkinson, Atkinson, Smith e desenvolvimento de uma nova técnica
Bem, 1995). estatística chamada meta-análise (Huffman,
Em 1952, o terapeuta britânico Hans Vernoy e Vernoy, 2003), e um maior rigor
Eysenck causou furor ao declarar que a quanto a grupos de controle e à avaliação do
psicoterapia simplesmente não funciona efeito da remissão espontânea do sintoma,
(Gerrig e Zimbardo, 2005). Ele analisou permitiu que todos esses estudos e outros
publicações disponíveis que informavam os semelhantes pudessem ser agrupados em
efeitos de várias terapias e concluiu que os médias gerais, produzindo um resultado
pacientes que não receberam qualquer abrangente (Gerrig e Zimbardo, 2005).
tratamento tinham uma taxa de recuperação tão Os estudos de meta-análise, em vez de
alta quanto aqueles que passaram por comparar os resultados isolados da terapia para
psicanálise ou outros tipos de terapia baseada cada sujeito a ela submetido, investigaram
em insight (que visam a compreensão das resultados de pesquisas sobre a eficácia da
relações entre os sintomas atuais e as origens psicoterapia. Várias revisões de meta-análises
passadas). Segundo Eysenck, cerca de dois sobre estudos publicados, verificaram que
terços dos pacientes com problemas neuróticos pessoas tratadas com psicoterapia estão, em
se recuperariam espontaneamente dentro de média, 80% melhor se comparadas com
dois anos a partir do início do problema. pessoas não-tratados (Isolan, Pheula e Cordioli,
Para piorar a situação, um problema 2008), sendo que para os casos de transtorno de
importante, na avaliação da psicoterapia, é a personalidade a melhora obtida com a
medição do resultado. Como saberemos se uma psicoterapia era sete vezes maior do que a
pessoa foi ajudada pela terapia? Nem obtida com a evolução natural da doença
sempre podemos confiar na avaliação do (Cordioli, 2008).
próprio sujeito. Tem sido observado na prática Com base nestes dados, pode-se refutar
clínica um fenômeno denominado olá-adeus a hipótese da remissão espontânea dos
(Atkinson, Atkinson, Smith e Bem, 1995). No sintomas, proposta por Eysenck, que defendia
início da terapia (olá), os clientes tendem a que os efeitos da psicoterapia não seriam
exagerar sua infelicidade e os seus problemas; maiores do que os obtidos com a simples
e ao final do tratamento (adeus), eles passagem do tempo.
costumam a exagerar seu bem estar, seja para Superada esta discussão sobre a
agradar o terapeuta, seja para se convencerem eficácia da psicoterapia (Isolan, Pheula e
de que o dinheiro foi bem gasto. Cordioli, 2008), você poderia esperar que as
A avaliação do terapeuta sobre a diversas abordagens à terapia variassem em
efetividade do tratamento também não pode ser termos de eficácia. Entretanto, isso não é o que
sempre considerada como um critério efetivo. os pesquisadores encontraram na maioria das
O terapeuta possui um interesse intrínseco em vezes. Depois de revisar muitos estudos sobre a
declarar que o seu cliente está melhor. Há casos eficácia terapêutica, Weiten (2002) apresenta
em que as mudanças observadas no consultório dados muito próximos.

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Figura 1: Estimativa da eficácia de várias abordagens psicoterápicas.

Mas estas descobertas são um pouco 2. Os pacientes tratados com psicoterapia


enganosas, uma vez que estas estimativas sobre alcançam melhores resultados se
a eficácia global foram extraídas de uma média comparados com os que permanecem
de muitos tipos de pacientes e de problemas. em lista de espera para serem tratados;
Grande parte dos especialistas parece achar 3. Na maioria dos transtornos, a
que, para certos tipos de problemas, algumas psicoterapia costuma manter seus
abordagens terapêuticas são mais eficazes do resultados por mais tempo;
que outras. Segundo Seligman (citado por 4. Em termos gerais, não foi possível
Weiten, 2002), os transtornos de pânico determinar a superioridade de um
respondem melhor à terapia cognitiva, as enfoque terapêutico em relação ao
fobias específicas e os transtornos obsessivos outro.
compulsivos são mais suscetíveis ao tratamento Como atividade humana, a psicoterapia
comportamental. Para Beutler e colaboradores é, de acordo com Cordioli (2008), também uma
(citados por Isolan, Pheula e Cordioli, 2008), arte, na medida em que depende das
pacientes mais reflexivos, introspectivos e/ou características pessoais do terapeuta, das
introvertidos teriam maior probabilidade de habilidades adquiridas em prolongados
responder à psicoterapia de base psicanalítica. treinamentos e supervisões e do tipo de par
Entretanto, não tem sido fácil fazer paciente-terapeuta que se estabelece em cada
comparações entre estudos que se referem a psicoterapia.
terapias diferentes. Como alertam Gerrig e Para Lazarus (citado por Weiten,
Zimbardo (2005), é difícil controlar as 2002), o ponto-chave é que uma terapia eficaz
diferenças nas experiências de cada terapeuta, a requer habilidade e criatividade e os terapeutas
duração das terapias, a precisão do diagnóstico estão sobre o muro entre a ciência e a arte. A
inicial, o tipo de transtorno, as diferenças na terapia é científica em termos de que as
gravidade e nos tipos de dificuldades dos intervenções se baseiam em extensa teoria e
pacientes, os tipos de avaliações de resultados pesquisas empíricas. Mas cada cliente é um ser
utilizadas, a adequação entre as expectativas de humano único e o terapeuta tem de moldar
um paciente e o tipo de terapia oferecido, e a criativamente um programa de tratamento que
duração dos tempos de acompanhamento ajude esse indivíduo.
posteriores, apenas para citar alguns fatores. Além do conhecimento do instrumento
Cordioli e Giglio (2008) chegaram às próprio de cada modelo de terapia, o bom
seguintes conclusões gerais sobre os resultados senso e o timming são essenciais para o uso
dos estudos sobre a eficácia da psicoterapia: otimizado de tais recursos. Conclui Cordioli
1. A psicoterapia é mais efetiva e rápida (2008) que utilizar tais recursos é uma arte.
do que as mudanças naturais dos
pacientes sem tratamento;

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Considerações finais

Os temas relacionados à psicoterapia Neste sentido, para adequada formação


aqui abordados refletem uma visão geral que se de profissionais da área clínica, não se pode
aplica, em sua quase totalidade, a qualquer desprezar os conhecimentos teóricos e as
abordagem psicoterapêutica. estratégias de intervenção terapêutica, assim
De certo que o domínio teórico e o como deve-se, igualmente, investir na
manejo das técnicas são fatores determinantes formação profissional e humana do terapeuta,
dos resultados da prática clínica, porém este para que se possa colher de forma efetiva os
texto ressalta, entre outros aspectos, a resultados desejados da psicoterapia.
relevância da relação terapêutica como
ferramenta privilegiada da psicoterapia.

Referências:

Atkinson, R. L., Atkinson, R. C., Smith, E. E. e


Ben, D. J. Introdução à Psicologia. Porto
Alegre: Artes Médicas, 2005.

Cordioli, A. V. As principais psicoterapias:


fundamentos teóricos, técnicas, indicações e
contra-indicações. In Cordioli, A. V (Org.),
Psicoterapias: abordagens atuais. Porto
Alegre: Artmed; 2008, 19-41.

Cordioli, A. V. e Giglio, L. Como atuam as


psicoterapias: os agentes de mudança e as
principais técnicas de intervenções
psicoterápicas. In Cordioli, A. V (Org.),
Psicoterapias: abordagens atuais. Porto
Alegre: Artmed; 2008, 42-57.

Gerrig, R. J. e Zimbardo, P. G. A Psicologia e


a vida. Porto Alegre: Artmed, 2005.

Huffman, K., Vernoy, M. e Vernoy, J.


Psicologia. São Paulo: Atlas, 2003.

Isolan, L., Pheula, G. e Cordioli, A. V. Fatores


comuns e mudança em psicoterapia. In
Cordioli, A. V (Org.), Psicoterapias:
abordagens atuais. Porto Alegre: Artmed;
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Weiten, W. Psicologia: temas e variações. São


Paulo: Pioneira Thomson, 2002.

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