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Parecer
1. A questão posta
“Vejam só as idéias do Juiz conservador de 1º Grau que nos negou o livre direito
de manifestação. Será mal-informado? (sic) Acionista em alguma empresa de
armamentos, de segurança privada ou de leitos psiquiátricos? Ou seria mais um
mero leitor de Zero-Hora (sic), com um adesivo ‘crack-nem pensar’ no carro?
Decidam aí o naipe.”
“Aí estão os fatos: este juiz de posse de sua caneta, decide que a) Se um policial
achar que um cartaz verde é ‘apologia’, isto justificaria descer porrada n@s
manifestantes; que b) o nome ‘Marcha da Maconha’ faz apologia às drogas; e c)
As drogas sumiriam automaticamente do planeta caso não fossem ‘toleradas’.
Perguntamos: será que o juiz sentiu vontade de consumir psicoativos ao ler o
nome Marcha da Maconha? Temos certeza que não, mas nós até toleramos sua
pretensão aparente, de acabar com o problema contemporâneo das drogas
alimentando-se o tráfico de armas.”
1
Declaração Universal dos Direitos Humanos – Artigo 19. Pacto Internacional dos Direitos Civis e
Políticos – Artigo 19. Constituição Federal brasileira – Artigo 5º, incisos IV, IX e XIV.
exteriorizar seus pensamentos e crenças, manifestar suas ideias, suas opiniões, enfim, se
expressar sobre o que quer que seja2.
Qual outro lado da mesma moeda, o indivíduo há de ter também livre acesso às
informações transmitidas e divulgadas através dos pensamentos, ideias, crenças e
opiniões dos demais indivíduos, inclusive para poder avaliar e melhor elaborar seus
próprios pensamentos, ideias, crenças e opiniões.
2
Tive oportunidade de abordar o tema no volume 4 de meus Escritos sobre a Liberdade – Liberdade,
Intimidade, Informação e Expressão. Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2009, ao qual me reporto.
3
Estas as clássicas palavras de John Adams, no ensaio “A Dissertation on the Canon and Feudal Law” in
The Revolutionary Writings of John Adams (selected and with a Foreword by C. Bradley Thompson).
Indianapolis: Liberty Fund, 2000: “And liberty cannot be preserved without a general knowledge among
the people, who have a right, from the frame of their nature, to knowledge, as their great Creator, who
does nothing in vain, has given them understandings, and a desire to know; but besides this, they have a
right, an indisputable, unalienable, indefeasible, divine right to that most dreaded and envied kind of
knowledge, I mean, of the characters and conduct of their rulers. Rulers are no more than attorneys,
agents, and trustees, for the people; and if the cause, the interest and trust, is insidiously betrayed, or
wantonly trifled away, the people have a right to revoke the authority that they themselves have deputed,
and to constitute abler and better agents, attorneys, and trustees”.
Nenhum tema pode ser excluído do debate. Nenhum tema pode ser proibido. A garantia
do direito fundamental à liberdade de informação e expressão e a garantia da
democracia não conhecem temas tabus.
Por mais absurda que pareça uma opinião, por mais que a maioria repudie um
determinado pensamento ou uma determinada forma de ver qualquer aspecto da vida,
por mais chocante ou repugnante que seja uma ideia, o indivíduo tem o direito de
expressar tais opiniões, ideias, pensamentos, pontos de vista ou convicções. E mais do
que isso, todos têm o direito de conhecer e ser informados sobre tais opiniões, ideias,
pensamentos, pontos de vista ou convicções.
Decisões judiciais são atos emanados de órgão que exerce uma função do
Estado, uma função pública, devendo, como tal, receber a avaliação crítica dos
indivíduos. Como já assinalado, é da essência da democracia o controle dos indivíduos
sobre o poder do Estado, aí naturalmente incluído o Poder Judiciário. E, como também
assinalado, a crítica é uma das formas de exercício deste controle.
4
Francisca Sauquillo e Antonio Gomes Rufo. “El derecho y el deber de discrepar con las resoluciones
judiciales”, in Derecho Penal y Criminología, 30, Universidad Externado de Colombia, Bogotá, 1986,
p.99-104).
a necessidade de se criticar o Poder Executivo, o que se vê a toda hora e a todo lugar,
enquanto, ao contrário, o Poder Judiciário se esconde atrás de uma couraça de proteção,
mantendo sua premissa de infalibilidade.
Com efeito, a simples leitura dos textos transcritos na inicial da ação penal
condenatória logo revela a manifesta inocuidade das expressões utilizadas, já no plano
da tipicidade objetiva: não há naquelas meramente irônicas e vagas expressões
imputação de qualquer fato concreto e determinado ofensivo à reputação que pudesse se
adequar ao tipo objetivo da difamação, tampouco havendo atribuição de qualquer vício
ou defeito vexatório que pudesse se adequar ao tipo objetivo da injúria.