Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
RESUMO:Há na escrita dos autores e autoras afro-brasileiros, que dá corpo à literatura negra,
uma experiência compartilhada que busca revisar, reelaborar e reinventar o lugar do negro na
literatura e na sociedade brasileira.Nesse contexto, estão, especialmente, situados os escritos
de mulheres negras, uma vez que, em razão da incidência do racismo e sexismo, um lugar de
inferiorização foi a elas imposto. Este artigo pretende, com base no aporte teórico fornecido
pelos estudos de gênero e a partir da análise dos poemas “Eu-mulher” e “A noite não
adormece nos olhos das mulheres”, criados por Conceição Evaristo, refletir sobre
possibilidade de recriação do discurso literário vigente, através da autoria afrofeminina.
Palavras-Chaves:recriação; identidade; representação.
ABSTRACT: There in writing of the authors and african - Brazilian authors, embodying the
black literature, a shared experience that seeks to revise, rework and reinvent the place of
black literature and Brazilian society. In this context , are especially located the writings of
black women, since, due to the impact of racism and sexism , a place of inferiority was
imposed to them. This article aims , based on the theoretical framework provided by gender
studies and from analysis of the poems "I - woman" and " The night did not fall asleep in the
eyes of women ", created by Conceição Evaristo , reflect on the possibility of recreating the
speech literary force through afrofeminina authorship.
1
Pós-graduanda em Estudos Étnicos e Raciais: Identidades e Representações, pelo IFBA; atualmente desenvolve
pesquisas relacionadas ao alcance político de produções literárias declamadas no Sarau JACA de Poesia,um
sarau literário da periferia de Salvador. Email :lissandra.ramos@hotmail.com
2
Professora Doutora, docente do IFBA/Campus Salvador - Líder do Grupo de Pesquisa Linguagem e
Representação. Email: conra_araujo@hotmail.com
2
3
Neste artigo, os termos Literatura Negra e Literatura Afro-Brasileira são empregados como sinônimos, embora
exista correntes contrárias a esse pensamento.
3
É também neste esforço pelo reconhecimento e pela legitimação que estão situados os
escritos de mulheres, especialmente de mulheres negras, uma vez que, numa sociedade que se
apresenta racista e sexista, um lugar de inferioridade foi a elas imposto. Num passeio por
considerável parcela do discurso literário produzido no Brasil, percebe-se a representação das
mulheres em condições de submissão ao homem. E num recorte ainda mais profundo, quando
as mulheres em questão são as negras, constata-se a propagação da imagem de um corpo
submisso,explorado como objeto sexual e escravizado. Tais representações fundamentam
estereótipos de incapacidade e inferioridade contestados pela escrita de autoria feminina na
literatura afro-brasileira.
As problemáticas vivenciadas por estas autoras, por serem mulheres e negras, refletem
diretamente na perspectiva de sua abordagem e nas representações de feminino que postulam
em suas obras. Conforme pontua Santiago:
crítica e, como consequência disso, não são amplamente conhecidos entre os leitores,
encontram dificuldades no mercado editorial e aparecem, raramente, no contexto da educação
formal. Todavia, o movimento feminista e os estudos de gênero contribuíram, através da
crítica feminista, para a visibilização da escrita de autoria feminina. Nesse sentido, é também
importante pontuar que ao promover reflexões sobre os espaços ocupados pela mulher na
sociedade foram ampliadas as possibilidades de sua participação, inclusive no campo literário.
Os estudos sobre mulher e literatura, desse modo, não estão restritos ao universo dos
livros e dos textos, pois, em verdade, tratar sobre a mulher na literatura consiste em pensar
sobre uma temática que está situada no meio social no qual surgem as representações que
figuram no corpus literário. Para uma reflexão mais efetiva, levemos em consideração o
comentário de Schmidt ao falar de estudos envolvendo mulher e literatura.
5
EU-MULHER
Um exemplo disto está no trecho “meia palavra mordida me foge da boca” que é
bastante representativo da imposição de um silêncio, afinal, em uma sociedade machista, a
7
garantia de lugares de fala ainda são lutas deste grupo. Além disso, no poema,a representação
de mulheraparece como “moto-contínuo do mundo”, força que o move continuamente,
trazendo para ele “o que há de vir”. De mais a mais, trata-se de um sujeito portador do novo,
que trará ao mundo novidades. Coaduna com essa idéia os fragmentos “abrigo da semente”,
“inauguro a vida” que metaforizam o corpo e sua capacidade de gerar.
No segundo poemas analisado, “A noite não adormece nos olhos das mulheres”, a
autora faz uma homenagem a Beatriz Nascimento4.
Esse poema apresenta, além de ter sido criado por uma mulher e ter como temática a
memória feminina, também homenageia uma personalidade feminina. Na primeira e segunda
estrofe, ao tratar das memórias e das lembranças, a autora sinaliza para a impossibilidade de
esquecer a história marcada pelo sofrimento que não é possível apagar. Além disso,
aproximada a imagem da mulher à da lua, colocando-a como participante de uma natureza.
Ainda no que diz respeito à relação entre a produção de autoria feminina na literatura
afro-brasileira e as representações de mulher, Palmeira evidencia que:
Conclusão
Há de se considerar, porém, que esta relação tão íntima com a temática apresentada
nos poemas é possibilitada pelas experiências autorais, as mulheres negras escritoras
vivenciam as experiências dessa condição numa sociedade machista e racista. Há uma relação
entre as subjetividades e a produção literária que costuma aproximar os poemas das histórias
de vida presentes no grupo social do qual fazem parte. Sobre isto, Evaristo declara:
10
REFERÊNCIAS:
AUGEL, Moema Parente. Aurora nas mãos: O papel da literatura para a construção da
identidade do afrobrasileiro. In; Revista Exu. Salvador; Fundação casa de Jorge Amado, nº
27. Mai/jun 1992, p. 20-25.
DUARTE, Eduardo de Assis. Literatura Afro-brasileira:um conceito em construção. In:
AFOLABI, Niyi; BARBOSA, Márcio; RIBEIRO, Esmeralda (Orgs). A mente afro-brasileira.
Trenton-NJ/Asmara, Eritréia: Africa World Press, 2007, p.103-112.
11
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 10. ed. Rio de Janeiro, RJ: DP &
A, 2005.
SANTIAGO, Ana Rita. Vozes literárias de escritoras negras. Cruz das Almas, BA. UFRB,
2012.
SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. In: Educação e Realidade,
jul./dez. 1995, p. 71–99. Disponível em:
http://www.4shared.com/get/XCWKugpJ/joan_Scott_-
_Gnero_uma_categor.html;jsessionid=DCADFA8C27E7F9BC503AE12DBE4F2532.dc210
SILVA, Luiz. O leitor e o texto afro-brasileiro. In: FIGUEIREDO, Maria do Carmo Laura;
FONSECA, Maria Margareth Soares. Poéticas Afro-brasileiras. BH: Mazza: PUC Minas,
2002.