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I. Descobrir
A descoberta da América
Mas cada um dos outros é um eu também, sujeito como eu. Somente meu ponto de
vista, segundo o qual todos estão lá e eu estou só aqui, pode realmente separa-los e distingui-
los de mim. Posso conceber os outros como uma abstração, como uma instância da
configuração psíquica de todo indivíduo, como o Outro, outro ou outrem em relação a mim.
Ou então como um grupo social concreto ao qual não pertencemos. Esse grupo por sua vez
pode estar contido numa sociedade. Ou pode ser exterior a ela, uma outra sociedade que,
dependendo do caso, será próxima ou longínqua.
Colombo: não podia ter certeza de que o retorno era possível. Ao ler seus escritos
poderíamos ter a impressão de que seu motivo principal e o desejo de enriquecer. Os
marinheiros e os reis da Espanha, mandatários da expedição também esperam lucro, o ouro
era uma espécie de chamariz para que os reis aceitassem financia-los.
Colombo se importa com a riqueza porque ela significa o reconhecimento do seu papel
de descobridor, mas ele tinha outro objetivo: queria encontrar o Grande Can, ou imperador da
China, cujo retrato inesquecível tinha sido deixado por Marco Polo, objetivo ligeiramente
afastado, por causa do trabalho que dava as descobertas, mas nunca esquecido. A expansão
do cristianismo é mais importante para Colombo do que o ouro. A vitória universal do
cristianismo é o que anima Colombo. Dinheiro e Deus não se excluem, um é meio e o outro
fim. Colombo queria partir em cruzada e liberar Jerusalém.
Colombo por um lado, submete tudo a um ideal exterior e absoluto (a religião cristã), e
todas as coisas terrestres não passam de meios em vista da realização deste ideal.
Colombo hermeneuta
Há três esferas que dividem o mundo de Colombo: uma natural, uma divina e outra
humana.
Para nós existem apenas dois intercâmbios reais: com a natureza e com os homens. A
relação com Deus não implica a comunicação, embora possa influenciar, e até predeterminar,
toda forma de comunicação.
Colombo não se preocupa em entender melhor as palavras dos que se dirigem a ele,
pois pensava que já sabia o que encontraria.
Pra Colombo a natureza tem certamente mais afinidade com Deus do que os homens,
ele presta atenção constante aos fenômenos naturais. Sabe interpretar os sinais da natureza
em função de seus interesses. Colombo prefere beleza à utilidade. Sua convicção é sempre
anterior a experiência.
A observação atenta da natureza conduz a três direções diferentes: a interpretação
puramente eficaz, quando se trata de aspectos de navegação; a interpretação finalista, em que
os sinais confirmam as crenças e esperanças; e esta recusa de interpretação que a admiração
intransitiva da natureza, a submissão absoluta da beleza.
Colombo não reconhece a diversidade das línguas, e por isso, quando se vê diante de
uma língua estrangeira, só há dois comportamentos possíveis, e complementares:
reconhecer que é uma língua, e recusar-se a aceitar que seja diferente, ou então reconhecer
a diferença e recusar-se a admitir que seja uma língua. Colombo age da segunda maneira,
mais tarde consegue reconhecer que é uma língua.
Colombo e os índios
Suas menções aos habitantes das ilhas aparecem sempre no meio de anotações sobre
a natureza. Suas observações limitam-se, frequentemente, ao aspecto físico das pessoas.
Decide tudo admirar.
Dois traços parecem, a primeira vista, menos previsíveis do que os outros: são a
generosidade e a covardia.
Colombo não compreende que os valores são convenções, para ele um sistema de
trocas diferente significa, para ele, a ausência de um sistema. Os índios também têm outra
relação com a propriedade privada.
Na prática, a conquista terá estes dois aspectos essenciais: os cristãos vêm ao Novo
Mundo imbuídos de religião, e levam, em troca, ouro e riquezas.
Propagar a religião significa que os índios são considerados como iguais (diante de
Deus). E se eles não quiserem entregar suas riquezas? Então será preciso subjuga-las, militar
e politicamente, para poder toma-las a força: em outras palavras, colocá-los, agora do ponto
de vista humano, numa posição de desigualdade (de inferioridade).
Ser índio e ainda por cima mulher, significa ser posto, automaticamente, no mesmo
nível que o gado.
II. Conquistar
As razões da vitória
O caso dos textos que exprimem o ponto de vista dos índios é particularmente
grave: dada a inexistência de escuta indígena, são todos posteriores a conquistae,
portanto, influenciados pelos conquistadores.
Durante a segunda fase da guerra, um outro fator começa a ter papel decisivo: a
exploração que Cortez faz das dissensões internas entre as diversas populações que
ocupam o solo mexicano.
Os índios das regiões atravessadas por Cortez no início não ficam muito
impressionados com suas intenções colonizadoras, porque esses índios já foram
conquistados e colonizados, pelos astecas. O México de então não é um estado
homogêneo, e sim um conglomerado de populações subjugadas pelos astecas, que
ocupam o topo da pirâmide. Cortez frequentemente aparecerá como um mal menor,
como um libertador, mantidas as proporções, que permite acabar com uma tirania
particularmente detestável, porque muito mais próxima.
Os astecas eram o povo mais cruel e mais demoníaco que se possa imaginar,
devido a maneira como tratam seus vassalos.
Montezuma e os signos
Os astecas descrevem o início de seu próprio fim como silêncio que cai: os deuses não
lhes falam mais.
Para os astecas as práticas verbais são altamente estimadas, alunos tem que aprender
a ser bons falantes e bons interpretes.
Não é o uso efetivo da escrita que conta, a escrita como instrumento, e sim a escrita
enquanto índice da evolução das estruturas mentais.
Maior eficácia dos discursos cristãos: o diálogo é bastante assimétrico, pois as palavras
dos evangelizadores ocupam um lugar não somente maior, como também crescente; tem-se a
impressão de que a voz dos sacerdotes mexicanos, afirmando a ligação com o passado, é
progressivamente abafada pelos abundantes discursos dos franciscanos.
A religião qualquer que seja o seu conteúdo, é um discurso transmitido pela tradição,
e que importa enquanto garantia de uma identidade cultural.
Não podemos conceber uma linguagem sem a possibilidade da mentira, assim como
não há palavras que ignore as metáforas. Mas uma sociedade pode favorecer ou, desencorajar
completamente toda a palavra que, em vez de descrever fielmente as coisas, preocupa-se
principalmente com seu efeito, e desconsidera, pois a dimensão da verdade.
Cortez e os signos
A diferença entre Cortez e os que o precederam talvez esteja no fato de ter sido ele o
primeiro a possuir uma consciência política, e até mesmo histórica, de seus atos. O que Cortez
quer, inicialmente, não é tomar, mas compreender; são os signos que interessam a ele em
primeiro lugar, não os referentes. Sua expedição começa com uma busca de informação e não
de ouro. A primeira ação importante que executa é procurar um interprete: Aguilar e la
Malinche (esta pode representa o primeiro exemplo da mestiçagem das culturas, glorifica a
mistura em detrimento da pureza, não se submete simplesmente ao outro, adota aideologia
do outro e a utiliza para compreender melhor a sua). Cortez não deixa escapar nenhuma
oportunidade de reunir novas informações. É graças a esse sistema de informações, que ele
conseguiu perceber a existência de divergências internas. É a conquista eficaz da comunicação
que conduz a queda final do império asteca, a conquista da informação leva a conquista do
reino.
A primeira preocupação de Cortez quando está fraco é fazer com que os outros
pensem que é forte, e simula fraqueza quando está forte.
De modo geral, o discurso não é determinado pelo objeto que descreve, nem pela
conformidade a uma tradição, mas é construído unicamente em função do objetivo que se
procura atingir.
Definitivamente graças ao domínio dos signos dos homens que Cortez garante seu
controle sobre o antigo império asteca.
Para os índios a língua fica situada no espaço delimitado pelo intercambio dos homens
com os deuses o mundo em vez de ser concebida como instrumento de ação sobre outrem.
III. Amar
Cortez fica em êxtase diante das produções astecas, mas não reconhece seus autores
como individualidades humanas equiparáveis a ele. O outro era reduzido ao estatuto de
objeto.
Os autores espanhóis podem falam dos índios, mas nunca falam aos índios, pois é
falando ao outro que reconheço nele uma qualidade de sujeito, comparável ao que eu mesmo
sou.
Extermínio: por assassinato direto (guerras), maus tratos, choque microbiano (índios já
estavam vulneráveis a elas).
Motolinia pragas:
1- Falta de cuidados
2- Doenças
3- Fome
4- Maltrato
5- Impostos
6- Minas de ouro
7- Construção da Cidade do México
8- Escravização
9- Serviço nas minas
10- Divisões e facções entre os espanhóis
Igualdade ou desigualdade
Las Casas: defende os direitos dos índios. Coloca a igualdade como fundamento de
qualquer política humana, fazendo-a em nome da religião. Do ponto de vista doutrinário, a
religião cristã pode ser adotada por todos, e todas as nações estão destinadas a religião cristã,
convencido da universalidade do cristianismo. Os índios são dotados de virtudes cristãs, são
obedientes e pacíficos. Nenhum costume, ou pratica dos índios mostram que eles são seres
inferiores. Mas atribui o termo valorizados aos fiéis e não-valorizados aos infiéis.
Historicamente mantém uma visão egocêntrica, com um esquema evolucionista.
Para Las Casas só há uma religião verdadeira a sua, e essa verdade é universal.
Benefício da conversão para os índios: ir para o paraíso. Aceita a escravização dos negros, mas
não dos índios. O sonho de Las Casas é um estado teocrático, onde o poder espiritual esteja
acima do temporal. A submissão e a colonização devem ser mantidas, mas feitas de outro
modo. Vantagem material da colonização. Pede uma atitude mais humana em relação aos
índios, os índios devem ser pacificados e doutrinados, mas não devem ser de modo algum
prejudicados, pois buscamos unicamente seu bem-estar e sua conversão. Conversão proposta,
não imposta. O objetivo global continua a ser a submissão à Coroa Espanhola. Antes de
dominar é preciso estar informado. O escravidão reduz o sujeito a nível de objeto, se em vez
de ser considerado um objeto ele fosse considerado um sujeito capaz de produzir seria mais
rentável, preocupações: manter os sujeitos como intermediários e quanto mais bem tratado
mais produtivo.
Paradoxo da pena de morte: a instância penal executa o próprio ato que condena,
mata para melhor proibir de matar.
IV. Conhecer